sexta-feira, 24 de outubro de 2014

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. ESTELIONATO (ART. 171, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL) E FRAUDE NO PAGAMENTO POR MEIO DE CHEQUE (ART. 171, § 2º, INCISO VI, DO CÓDIGO PENAL).

Apelação Criminal n. 2012.018594-1, de LagunaRelator: Des. Paulo Roberto SartoratoAPELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. ESTELIONATO (ART. 171, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL) E FRAUDE NO PAGAMENTO POR MEIO DE CHEQUE (ART. 171, § 2º, INCISO VI, DO CÓDIGO PENAL). RÉU QUE OFERECE COMO PAGAMENTO CHEQUE DE TERCEIRO SEM PROVISÃO DE FUNDOS. DOLO EVIDENCIADO A PARTIR DAS CIRCUNSTÂNCIAS QUE PERMEIAM O CASO. ACUSADO QUE NEGOU TER OFERTADO A CÁRTULA EM QUESTÃO, QUE SE ESQUIVOU A TODO MOMENTO DO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO CONTRAÍDA, QUE POSSUI OUTROS BOLETINS DE OCORRÊNCIA LAVRADOS EM SEU DESFAVOR E QUE RESPONDE A OUTRA AÇÃO PENAL POR ESTELIONATO. CONDENAÇÃO PELO CRIME DE ESTELIONATO QUE SE IMPÕE. ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL. RÉ QUE EMITE CHEQUE PÓS-DATADO (OU PRÉ-DATADO), A PEDIDO DE SEU PAI, E PROVIDENCIA SUA SUSTAÇÃO, SOB A TESE DE DESAVENÇA NEGOCIAL, FRUSTRANDO O PAGAMENTO. INEXISTÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES DO DOLO ESPECÍFICO DE FRAUDAR QUANDO DA EMISSÃO DO CHEQUE. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.1. O agente que oferece cheque de terceiro como pagamento por mercadorias adquiridas sabendo que não prestará ao adimplemento da obrigação, dada a insuficiência de fundos, possui o nítido propósito de obter vantagem em prejuízo alheio mediante fraude, razão pela qual comete, sem dúvidas, o delito previsto pelo art. 171, caput, do Código Penal.
2. Os Tribunais pátrios, via de regra, tem afastado a ocorrência de estelionato, tanto em sua forma fundamental quanto na modalidade prevista no § 2º, inciso VI, do art. 171 do CP, nas hipóteses em que o negócio é frustrado em razão de cheque pós-datado inábil a cumprir a obrigação, considerando subsistir, em tais casos, simples ilícito civil.
Entendo, todavia, que a materialidade do crime de estelionato não deve ficar condicionada a tal fórmula simplista, mas, pelo contrário, estará evidenciada, sem dúvida, sempre que verificada, no caso concreto, a concorrência das elementares insculpidas no tipo penal pertinente e do animus lucri faciendi do agente, ou seja, se as circunstâncias do caso concreto denotarem, de forma incontestável, ter estado o agente imbuído do dolo de fraudar quando da emissão do cheque, ainda que tenha antedatado este.Por outro lado, quando não comprovado cabalmente que o acusado estava contaminado pelo dolo específico necessário à configuração do crime de estelionato, isto é, de obter vantagem ilícita mediante engodo, deverá ser absolvido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 2012.018594-1, da comarca de Laguna (Vara Criminal), em que são apelantes Sumahya Abdel Rahman e outro, e apelado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento parcial, a fim de absolver a ré/apelante Sumahya Abdel Rahman, com fulcro no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pela Exma. Desa. Marli Mosimann Vargas, com voto, e dele participou o Exmo. Des. Carlos Alberto Civinski.
 Funcionou na sessão pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Paulo Roberto de Carvalho Roberge. Florianópolis, 18 de dezembro de 2012.   Paulo Roberto Sartorato
   Relator









quinta-feira, 23 de outubro de 2014

ESTELIONATO - EMISSÃO DE CHEQUES SEM FUNDOS - FORMA PÓS DATADA - DESCARACTERIZAÇÃO DO DOCUMENTO, QUE DEIXA DE SER UMA ORDEM DE PAGAMENTO À VISTA

Apelação criminal n. 97.010230-5, de Itajaí.
Relator: Des. José Roberge.

ESTELIONATO - EMISSÃO DE CHEQUES SEM FUNDOS - FORMA PÓS DATADA - DESCARACTERIZAÇÃO DO DOCUMENTO, QUE DEIXA DE SER UMA ORDEM DE PAGAMENTO À VISTA - ATIPICIDADE - APELO PROVIDO PARA ABSOLVER A RÉ.
O cheque pós-datado, dado para pagamento futuro, por ter sido descaracterizado como verdadeiro cheque, não tipifica o delito do artigo 171, § 2º, VI, do CP.
Vistos, relatados e discutidos, estes autos de Apelação Criminal n. 97.010230-5, da comarca de Itajaí, em que é apelante Vera Lúcia Lara, sendo apelada a Justiça, por seu Promotor:
ACORDAM, em Segunda Câmara Criminal, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento para absolver a apelante.
Custas legais.
1. Vera Lúcia Lara foi denunciada pelo Ministério Público da 2ª Vara Criminal da comarca de Itajaí como incursa nas sanções do art. 171, § 2º, VI, do Código Penal, porque nos dias 3 de março e 7 de fevereiro de 1995, em uma transação comercial com a vítima Odair Mendes, emitiu os cheques nºs. 194062 e 194061, do Unibanco - União de Bancos Brasileiros S/A, agência de Itajaí, conta-corrente nº 110795-8, nos valores, respectivamente, de R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais) e R$ 500,00 (quinhentos reais), sendo que as referidas cártulas, ao serem apresentadas ao banco sacado, foram devolvidas, inicialmente, por insuficiência de fundos e, na reapresentação, por conta encerrada.
Regularmente instruído o feito, resultou condenada às penas de um (1) ano e dois (2) meses de reclusão e doze (12) dias-multa, com sursis, pelos fatos articulados na denúncia, c/c o art. 71, caput, do CP.
Inconformada, apelou a tempo e modo, objetivando em preliminar, o retorno dos autos à origem, "a fim de que a Meritíssima Juíza a quo se digne mandar expedir um ofício ao Banco Unibanco - Agência 775, a fim de que o mesmo possa confirmar o depósito interagência efetuado no dia 6 de março de 1995 pela apelante, na conta da vítima Odair Mendes, no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), de conformidade com o artigo 616 do Código de Processo Penal" (fl. 76).
No mérito, pretende se ver absolvida, ao argumento de que os cheques foram emitidos em garantia de dívida, na forma pré-datada, inocorrente a fraude necessária à tipificação do delito.
Com as contra-razões, ascenderam os autos a esta instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça opinado pelo improvimento do recurso.
É o relatório.
2. A preliminar é inacolhida. Sabe-se da viabilidade de baixar o processo em diligência, conforme preceito contido no art. 616, do CPP. Entretanto, não é o caso dos autos. Como bem salienta o douto parecer de fls., trata-se de pretensão à diligência de interesse da parte, que deveria ter sido requerida na fase do art. 499, do CPP, posto que não se trata de documento de produção superveniente aos fatos, até então estranhos a eles.
Mas no mérito, sobram-lhe razões para sucesso de sua pretensão absolutória. É que, como é de fácil ver, os documentos que estão às fls. 8 e 9, em seus originais, foram, ambos, expedidos na mesma oportunidade, com data pós fixada. A boa prova trazida pela defesa é maciça neste sentido.
Como se vê, os cheques têm numeração contínua, 794061 e 794062, o primeiro de R$ 500,00 para ser apresentado em 7 de fevereiro e o segundo em 7 de março; quase trinta dias um do outro. No dia 7 de fevereiro, o primeiro cheque foi apresentado e devolvido por insuficiência de fundos e, o segundo, em 3 de março. Seguramente, quem estava em poder de um cheque sem fundos de R$ 500,00, não iria receber, como pagamento, outro de R$ 2.200,00 cerca de um mês depois. Anota-se, ainda, que em 9 de fevereiro, o primeiro cheque foi reapresentado e, desta vez, a conta da emitente houvera sido encerrada. Assim, se verdade fosse que não houvera cheque pós datado, o credor jamais iria receber outro cheque de quem, sabia, não mais tinha conta no banco e, se recebesse, não estava sendo enganado, pois tinha ciência do encerramento da conta. Desaparece ou inexiste, assim, o elemento "engano", um dos requisitos do estelionato. Nenhuma dúvida há que trata-se de cheque pós datado. Além da evidência decorrente do acima exposto, observa-se que a recorrente provara, documentadamente, que entre as datas 7 de fevereiro e 3 de março (cheques 794061 e 794062), expediu diversos cheques daquele talonário, como se vê dos documentos de fls. 39, 85 e seguintes.
Anota-se que a recorrente foi condenada por infração ao artigo 171, § 2º, inciso VI, vale dizer, por fraude no pagamento por meio de cheque, salientando, sempre, que quando da emissão dos cheques, sua conta não estava encerrada; aliás, se estivesse, seu credor sabia.
Ora, o cheque é uma ordem de pagamento à vista. Entre as partes ele representa "dinheiro". É uma ordem dada pelo emitente para que um estabelecimento (o sacado) pague ao apresentador ou portador, o valor que no documento se contém. Se esse documento foge à sua função precípua que é o "pagamento à vista" e é emitido para pagamento futuro, passa a ser uma promessa de pagamento ou um quirógrafo comum, mas não um cheque, e faz desaparecer o elemento moral consistente no "manter em erro", que é o engano característico do estelionato. É que falta o artifício ou ardil, pelo qual alguém é mantido em erro.
Ora, "o cheque pós-datado, dado para pagamento futuro, por ter sido descaracterizado como verdadeiro cheque, não tipifica o delito do artigo 171, § 2º, VI, do CP".
Face o exposto, dá-se provimento ao recurso para absolver a recorrente.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Alberto Costa e Álvaro Wandelli, e lavrou o parecer, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Vilmar José Loef.
Florianópolis, 27 de novembro de 1997.
José Roberge
PRESIDENTE E RELATOR
Ap. Crim. nº 97.010230-5

APELAÇÃO. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. ESTELIONATO. PAGAMENTO COM CHEQUES PÓS-DATADO.

APELAÇÃO. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. ESTELIONATO.  PAGAMENTO COM CHEQUES PÓS-DATADO. DOLO EM LESAR AS VÍTIMAS. PROVA SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO.
O pagamento com cheque pós-datado evidencia que não foi emitido como promessa de pagamento à vista. Entretanto, a frustração do pagamento configura ilícito penal, quando comprovado o dolo da conduta do acusado em lesar as vítimas.

CONTINUIDADE DELITIVA
Em se tratando de dois crimes, a pena deve ser aumentada à razão de 1/6, consoante critérios que vem sendo adotados pelas instâncias superiores para a definição do aumento pela continuidade delitiva. Pena reduzida.
PENA DE MULTA.
A pena de multa decorre da condenação, está expressa no tipo penal e inexiste previsão para ser isenta. Porém, considerando que o réu é assistido pela Defensoria Pública, reduzo ao mínimo legal.
Apelação parcialmente provida.
 
Apelação Crime

Sétima Câmara Criminal
Nº 70060679966 (N° CNJ: 0260559-41.2014.8.21.7000)

Comarca de Teutônia
ALCERI SEVERO

APELANTE
MINISTERIO PUBLICO

APELADO
 ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento à apelação.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des. Carlos Alberto Etcheverry (Presidente e Revisor) e Des. José Antônio Daltoé Cezar.
Porto Alegre, 09 de outubro de 2014.
  DES.ª JUCELANA LURDES PEREIRA DOS SANTOS,
Relatora.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Dívidas contraídas após deferimento da recuperação judicial têm prioridade


São extraconcursais e, portanto, pagos primeiro, os créditos decorrentes de obrigações contraídas pelo devedor após a decisão que defere o processamento da recuperação judicial. Assim entendeu a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça em julgamento desta quarta-feira (15/10). 
A questão central do julgamento foi definir o significado do termo “durante a recuperação judicial” contido nos artigos 67 e 84 da Lei 11.101/2005, a Lei de Recuperação e Falências: se a partir do ajuizamento do pedido de recuperação, do deferimento de seu processamento ou da decisão que a concede. Há doutrina favorável a cada um dos sentidos. 
Relatora do recurso que pautou a discussão, a ministra Isabel Gallotti defendeu que a aplicação do benefício legal aos credores somente se daria a partir do momento em que concedida a recuperação judicial. Ela entendeu que, até a decisão concessiva da recuperação, o magistrado não faz juízo de valor acerca da viabilidade da empresa recuperanda, e “o pedido poderá ou não ser deferido, a depender do cumprimento dos requisitos previstos em lei”.
No entanto, a maioria dos magistrados acompanhou o voto do ministro Antonio Carlos Ferreira. Ele observou que a letra da lei não é precisa e que o papel do Judiciário é aplicar a lei ao fim social a que ela se dirige. No caso da Lei 11.101, o procedimento “deve visar, em primeiro plano, ao restabelecimento da força econômica e produtiva da pessoa jurídica em convalescença”, afirmou o ministro. 
Ele disse que desde, quando deferido o processamento da recuperação (artigo 52), o legislador coloca a empresa recuperanda sob fiscalização do administrador judicial, por preocupação com a sua manutenção e para evitar a utilização do instituto para a prática de ilegalidades. 
Para o ministro, trata-se de um momento processual “relevante” em que se dá a avaliação, ainda que superficial, das condições da empresa e dos requisitos para o deferimento da recuperação. “O administrador judicial não é mero adorno ou coadjuvante no processo”, disse. 
O ministro Antonio Carlos também ponderou que, se o entendimento da relatora fosse o vencedor, que o benefício fosse dado apenas aos créditos constituídos após a concessão da recuperação judicial. Ou seja, os valores decorrentes de operações praticadas no intervalo entre o pedido e a decisão concessória não gozariam do mesmo privilégio que aqueles relativos a operações posteriores, o que se mostraria discrepante do objetivo da lei.
“Os momentos que sucedem o requerimento de recuperação são os mais delicados para a empresa”, avaliou, destacando que a notícia das dificuldades da devedora, com a publicação obrigatória do edital informando sobre o pedido, leva os credores à postura natural de autodefesa. 
Antonio Carlos Ferreira acredita que, quando já deferida a recuperação, os credores conhecem o plano que visa a reerguê-la. Antes, porém, tem-se o momento de maior risco. “Se não houver estímulo aos fornecedores, nada mais será provido à empresa, exacerbando o risco da falência”, concluiu. 

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Dano moral in re ipsa

Trata-se de dano moral presumido. 
Em regra, para a configuração do dano moral é necessário provar a conduta, o dano e o nexo causal. 
Excepcionalmente o dano moral é presumido, ou seja, independe da comprovação do grande abalo psicológico sofrido pela vítima. 
Um exemplo de dano moral in re ipsa é o decorrente da inscrição indevida em cadastro de inadimplentes, pois esta presumidamente afeta a dignidade da pessoa humana, tanto em sua honra subjetiva, como perante a sociedade. 
Vejamos o entendimento do STJ: 
Resp 718618 RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. REGISTRO NO CADASTRO DE DEVEDORES DO SERASA. EXISTÊNCIA DE OUTROS REGISTROS. INDENIZAÇÃO. POSSIBILIDADE. A existência de registros de outros débitos do recorrente em órgãos de restrição de crédito não afasta a presunção de existência do dano moral, que decorre in re ipsa, vale dizer, do próprio registro de fato inexistente . Precedente. Hipótese em que o próprio recorrido reconheceu o erro em negativar o nome do recorrente. Recurso a que se dá provimento.

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. RECONVENÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA PRECRITA. AVAL. GARANTIA TIPICAMENTE CAMBIÁRIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA AVALISTA DECLARADA DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO

Processo     758822-7 Apelação Cível
 
Apelação Cível nº 758.822-7, da Comarca de Londrina - 2ª Vara Cível APELANTE : Wilma Calegari de Souza APELADO : João Roberto Teixeira Machado RELATOR : Juiz Substituto em 2º Grau Francisco Eduardo Gonzaga de Oliveira (em substituição ao Desembargador Joatan Marcos de Carvalho)
 
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. RECONVENÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA PRECRITA. AVAL. GARANTIA TIPICAMENTE CAMBIÁRIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA AVALISTA DECLARADA DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. - A prescrição prevista na Lei Uniforme não atinge o direito representado pela nota promissória, mas apenas a ação de execução que a assegura. Por isso, conquanto prescrita a ação de execução do título, pode o credor valer-se do procedimento ordinário de cobrança (ou especial monitório). - A ação monitória fundada em nota promissória prescrita está subordinada ao prazo prescricional de 5 (cinco) anos de que trata o artigo 206, § 5º, I, do Código Civil. - Prescrito o título que embasa o pedido, não provado o enriquecimento ilícito do avalista, não há que se falar na obrigação cambial do avalista que, como tal, é parte ilegítima para responder pelo pagamento da dívida. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NOTA PROMISSÓRIA PRESCRITA. PROTESTO EM DESFAVOR DO AVALISTA. AVAL. GARANTIA TIPICAMENTE CAMBIÁRIA. PROTESTO INDEVIDO. DANO MORAL PRESUMIDO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS NESTE SENTIDO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ COMPROVADA. ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS. DEVER DE INDENIZAR. PREJUÍZO DEMONSTRADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. PODER JUDICIÁRIO Estado do Paraná TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Cível nº 758.822-7
 
 
1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por Wilma Calegari de Souza contra sentença de fls. 107/114, proferida nos autos de ação declaratória c/c indenização por dano moral, movida pela ora Apelante, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, para o fim de ordenar o cancelamento definitivo do protesto e declarar que no caso não restaram comprovados os danos morais. Em face da sucumbência recíproca, condenou as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, pro rata.
Condenou, ainda, a parte autora, diante do reconhecimento da litigância de má-fé, ao pagamento de multa de 1% sobre o valor da causa, bem como a reembolsar a parte ré as despesas por ela pagas referentes as custas processuais e honorários advocatícios.
 
Julgou, também, prejudicado o pedido de cobrança do reconvinte, em face do reconhecimento da prescrição e declarou extinto o processo. Condenou o reconvinte ao pagamento das custas processuais inerentes à reconvenção e honorários advocatícios, estes fixados me R$ 800,00 (oitocentos reais).
 
Nas razões de recurso (fls. 115/121) Wilma Calegari de Souza afirmou, em síntese, que: a) diante do reconhecimento da inexigibilidade da nota promissória, deveria o magistrado singular reconhecer o ato ilício praticado e condenar o apelado ao pagamento de danos morais; b) o recorrido utilizou o seu CPF inapropriadamente para emitir a nota promissória; c) o protesto do título com o número de seu CPF gerou anotações de seu nome nos registros do SERASA e SCPC o que acarretou prejuízos; d) a condenação em litigância de má-fé não pode prosperar, uma vez que a recorrente nada deve e teve seu nome e CPF incluídos em uma nota promissória protestada; e) a parte recorrida deve ser condenada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Postula, por fim, o conhecimento e provimento do recurso para reformar a decisão, nos termos da fundamentação.
 
O recurso foi recebido apenas no efeito devolutivo (fls. 122).
 
Conforme certidão de fls. 227-verso, a parte apelada deixou transcorrer o prazo in albis, sem apresentar contrarrazões.
 
Após, vieram-me conclusos os autos.
 
É o relatório.
 
2. Presentes os pressupostos processuais, o recurso comporta conhecimento.
 
A meu ver, as matérias de ordem pública não se sujeitam à preclusão, podendo ser objeto de novo pronunciamento após proferimento de sentença, independentemente de ter sido interposto recurso ou não.
Nesse sentido julgados desse E. Tribunal:
 
 
AGRAVO REGIMENTAL. DECISÃO QUE DETERMINA A SUSPENSÃO DO RECURSO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA ATÉ JULGAMENTO FINAL DO RECURSO ESPECIAL DE Nº 1.273.643/PR. MANUTENÇÃO. EXISTÊNCIA DE RISCO DE DECISÕES CONFLITANTES EM DEMANDAS IDÊNTICAS. PRESCRIÇÃO. MATÉRIA QUE PODE SER CONHECIDA INDEPENDENTE DE PROVOCAÇÃO DAS PARTES E EM QUALQUER GRAU DE JURISDIÇÃO. Tratando-se de matéria de ordem pública, cognoscível independente de provocação das partes e em qualquer grau de jurisdição, há de ser mantida a suspensão do recurso, pois pendente o julgamento do Recurso Especial de nº 1.273.643/PR, em que se discute o prazo prescricional das execuções de sentença prolatada em ação civil pública. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 16ª C.Cível - AR 909176-3/01 - Maringá - Rel.: Shiroshi Yendo - Unânime - J. 01.08.2012) (grifei)
 
 
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - SEGURO OBRIGATÓRIO DE DANOS PESSOAIS, CAUSADOS POR VEÍCULOS AUTOMOTORES - DPVAT - INDENIZAÇÃO POR MORTE - AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO OU PAGAMENTO PELA VIA ADMINISTRATIVA - PRESCRIÇÃO - MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA - OCORRÊNCIA - ART. 206, §3º, IX DO CÓDIGO CIVIL - PRAZO TRIENAL - CONTAGEM - ALCANCE DO ESTADO DE INCAPACIDADE RELATIVA. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO - INOVAÇÃO RECURSAL. 1. A prescrição é matéria de ordem pública, ou seja, pode e deve ser analisada pelo magistrado em qualquer tempo e grau de jurisdição (Art. 193, CC), podendo, inclusive, ser decretada de ofício (Art. 219, §5º, CPC). 2. Em face da inexistência de pagamento administrativo, ou sequer requerimento, e como o sinistro ocorreu já na vigência do Código Civil de 2002, torna-se imperioso adotar a regra do artigo 206, §3º, IX, que estabelece prazo trienal para a contagem da prescrição. 3. Muito embora, o art. 198 do Código Civil estabeleça o impedimento da contagem do prazo prescricional para os absolutamente incapazes, tal proteção se esvai quando a parte alcança o estado de incapacidade relativa. 4. Não se conhece do recurso por incorrer em inovação, quando inclusas, em suas razões, questões não decididas nem ofertadas pela via adequada, o que obsta sua apreciação nesta instância, ou ainda, quando matéria não tratada no pedido inicial. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 9ª C.Cível - AC 786343-2 - Pato Branco - Rel.: Rosana Amara Girardi Fachin - Unânime - J. 01.09.2011) (grifei)
 
 
Dessa maneira, o fato de o magistrado prolator da sentença ter acolhido tanto a alegação de prescrição do título de crédito embasado na Lei Uniforme (prazo trienal) como a prescrição do crédito representado pela nota promissória prescrita (art. 206, § 3º, inciso VIII do Código Civil) não impede que tais matérias sejam novamente analisadas por este Tribunal.
 
Contudo, ainda que se reconheça a prescrição da eventual pretensão da execução da nota promissória não se avista a prescrição do débito, tal como concluiu o juiz, pois em relação a este o prazo prescricional é o do art. 206, § 5º, inciso I, do Código Civil. Sublinhe-se ser inaplicável ao caso dos autos a regra prevista no artigo 206, § 3º, inciso VIII, do Código Civil, pois a ação de cobrança / reconvenção não tem fundamento na existência de título de crédito, mas sim na existência de prova escrita da dívida.
 
Assim, considerando que a nota promissória foi emitida em 23/03/1999; quando estava em vigor o Código Civil de 1916, que previa, em seu artigo 177, o lapso de vinte anos para prescrição de ações pessoais, contados da data em que poderiam ter sido propostas.
 
Desde a emissão da nota promissória em 23.03.1999 até a entrada em vigor do novo Código Civil em janeiro de 2003, não transcorreu mais da metade do prazo de 20 anos (art. 2028 do CC). Aplicam-se, pois, as regras do novo Código Civil.
 
Assim, tendo em vista que a lei nova reduziu o prazo exigido para a prescrição (art. 206, § 5º, inciso I, CC - 05 anos) atendendo-se ao princípio da segurança jurídica, do direito adquirido e da irretroatividade legal, aplica-se o prazo prescricional de 5 (cinco) anos, contado a partir da vigência do Novo Código Civil, ou seja, 11 (onze) de janeiro de 2003.
 
Este é o critério adotado pela jurisprudência:
 
 
No caso em que a lei nova reduz o prazo exigido para a prescrição, a lei nova não se pode aplicar ao prazo em curso, sem se tornar retroativa. Daí resulta que o prazo novo que ela estabelece correrá somente a contar de sua entrada em vigor (RT 343/510, RE 51.076).
 
 
AÇÃO DE COBRANÇA. CHEQUE SEM FORÇA DE TÍTULO EXECUTIVO. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PRAZO QUINQUENAL. REGRA DE TRANSIÇÃO DO NOVO CÓDIGO CIVIL. PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECONVENÇÃO IMPROCEDENTE COM TRÂNSITO EM JULGADO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. - A ação de cobrança fundada em cheque prescrito está subordinada ao prazo prescricional de 5 (cinco) anos de que trata o artigo 206, 5º, I, do Código Civil, a contar da data de início da vigência de tal Codex. (TJPR, 6º Câmara Cível, Apelação Cível 0761605-1, Rel.: Ângela Khury, Dj. 29.03.2012 - DJ 833) (grifei)
 
Assim, considerando que o Novo Código Civil entrou em vigor em 11.01.2003 e a demanda foi ajuizada em 04.01.2008, a pretensão não se encontra prescrita, pois o ajuizamento da reconvenção deu-se dentro do prazo previsto que é de cinco anos, no termos do art. 206, § 5º, I, do Código Civil, de onde se extrai: Art. 206. Prescreve: (...) §5º Em 5 (cinco) anos: I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular.
 
É o raciocínio que se aplica no manejo de ação de cobrança da dívida representada pelo título de crédito, como se constata do seguinte acórdão do C. Superior Tribunal de Justiça:
 
Direito civil e processo civil. Ação monitória. Cobrança de nota promissória prescrita. Emissão vinculada a boletim individual de subscrição de cotas-parte de capital, em sociedade cooperativa.
 
Crédito decorrente da relação jurídica-base também prescrito, com fundamento no art. 36, § único, da Lei nº 5.764/71. Reconhecimento de sub-rogação do titular da nota promissória nesse crédito.
 
Impossibilidade de sua cobrança. Recurso não conhecido.
- É pacífica a jurisprudência do sentido de admitir a cobrança de crédito decorrente de nota promissória prescrita pela via da ação monitória.
- Todavia, nessas hipóteses, o crédito não se torna automaticamente imprescritível, mas vinculado à relação jurídica-base.
- Se, do ponto de vista dessa relação jurídica, também estiver prescrita a pretensão a cobrança, correta a decisão que a reconheceu.
 
 
Do voto da relatora, extrai-se:
 
É assente a jurisprudência do STJ no sentido de que a prescrição de um título de crédito não impede a cobrança do débito nele representado pela via da ação monitória. Todavia, o fundamento dessa cobrança se altera. Antes da prescrição, a abstração da nota promissória garantiria a cobrança com base exclusivamente nesse título. Após a prescrição, porém, ele se converte em simples documento escrito indicativo da existência de uma dívida, de forma que o fundamento da cobrança não é mais a cártula, autonomamente, mas a dívida de que ela é prova. Tanto que já se pacificou a jurisprudência desta Corte no sentido de que, com a prescrição do título de crédito, o credor não poderá promover ação monitória em face do avalista, mas apenas daquele que teria se locupletado ilicitamente com o não pagamento da dívida (REsps nºs 549.924/MG e 457.556/SP, ambos de minha relatoria, publicados, respectivamente, nos DJs de 5/4/2004 e 16/12/2002, além do REsp nº 200.492/MG, relatado pelo Min. Eduardo Ribeiro - DJ de 21/8/2000, entre outros).
 
Tendo isso em vista, a prescrição da cobrança tem de ser analisada, não à luz dos dispositivos relativos ao título de crédito, mas da lei que regula a relação jurídica que lhe deu origem. (STJ, REsp 682559 (2004/0121260-4 - 01/02/2006), Rel. Min. NANCY ANDRIGHI)
 
De fato, a prescrição como cambial não implica na prescrição do direito pessoal de cobrança do crédito.
 
Com efeito, embora não haja sido formulado recurso do autor reconvinte, nada obsta ao Tribunal em se tratando de matéria de ordem pública, corrigir de ofício o equívoco do juiz, para afastar o reconhecimento da prescrição do crédito.
 
Assim, como a reconvenção foi proposta em 04.01.2008, não há que se falar em prescrição do crédito na espécie, merecendo reforma a r.
sentença neste tópico.
 
Veja-se que não se consumou a prescrição do crédito representado pela Nota Promissória, contudo a executividade do título se encontra prescrita, o que torna a apelante parte ilegítima para figurar no pólo passivo da reconvenção, pois prescrito o título, desaparece a sua obrigação como avalista.
 
Com efeito, a obrigação da avalista relaciona-se com a nota promissória, e não com a dívida em si. Embora sirva de meio de prova da dívida que ela personificou, estando a nota promissória prescrita, as obrigações estritamente cambiárias que tiveram nela sua origem, estando tão somente a ela vinculadas, têm o mesmo destino do título. Desta sorte, como não foi demonstrado nos autos o locupletamento ilícito da avalista, ou a condição desta de devedora solidária do débito, ela não possui legitimidade ad causam para figurar no pólo passivo da ação de cobrança (reconvenção).
 
Nesse sentido é entendimento desse E. Tribunal de Justiça:
 
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO MONITÓRIA - CONTRATO DE DESCONTO DE TÍTULOS ACOMPANHADO DE NOTA PROMISSÓRIA. APELAÇÃO 1 - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO AVALISTA QUE FIGUROU NO TÍTULO PRESCRITO RECONHECIDA PELA SENTENÇA - INEXISTÊNCIA DE PACTUAÇÃO DE GARANTIA NO CONTRATO - SOLIDARIEDADE QUE NÃO SE PRESUME - INTELIGÊNCIA DO ART. 265 DO CÓDIGO CIVIL - SENTENÇA MANTIDA. 1. Sem embargo da possibilidade de manejar a via da ação monitória para a constituição de um título judicial contra o devedor principal constante da nota, não é admissível que o avalista do título permaneça vinculado a este, mesmo após a prescrição. 2. A responsabilidade do avalista do título de crédito chega a seu termo com o advento da prescrição, pois o aval é um ato puramente cambiário, que tem por fito garantir o pagamento do próprio título, sem guardar relação com a obrigação subjacente à cártula. Nesse sentido, prescrita a pretensão cambiária, dá-se a liberação do avalista por força da extinção do aval. 3. Inexistindo pactuação de solidariedade obrigacional no contrato, não há como mantê-la em relação ao avalista do título prescrito, até porque a solidariedade não se presume, conforme estabelecido no art. 265 do Código Civil. 4. Recurso da instituição financeira conhecido e desprovido. (...) (TJPR - 14ª C.Cível - AC 566814-6 - Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Themis Furquim Cortes - Unânime - J. 21.07.2010) (grifei)
 
 
APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS À EXECUÇÃO - TÍTULO EXTRAJUDICIAL COM GARANTIA PIGNORATÍCIA - NOTA PROMISSÓRIA (COM AVAL) VINCULADA A CÉDULA REPRESENTATIVA DE MERCADORIA - INEXISTÊNCIA DE ANUÊNCIA DO AVALISTA COMO DEVEDOR SOLIDÁRIO NO CONTRATO - RESPONSABILIDADE DO GARANTE UNICAMENTE SOBRE O TÍTULO CAMBIÁRIO E LIMITADO AO VALOR ALI CONSIGNADO - PRESCRIÇÃO - OCORRÊNCIA - PRAZO DE 03 (TRÊS) ANOS, COM BASE NOS ARTS. 70 E 77, DA LEI UNIFORME DE GENEBRA - ILEGITIMIDADE PASSIVA - CABIMENTO, POIS INEXIGÍVEL O TÍTULO DO GARANTE - PENHORA SOBRE BEM DE FAMÍLIA DO AVALISTA - AUSÊNCIA DE ENSEJO A SUA MANUTENÇÃO E IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA - O AVALISTA NÃO ESTARIA SUJEITO AS EXCEÇÕES DE IMPENHORABILIDADE DO ART. 3º, DA LEI 8.009/90 - CONSTRIÇÃO DEVERIA OCORRER PREFERENCIALMENTE SOBRE O BEM (CABEÇAS DE GADO) OFERECIDO EM GARANTIA, COM FULCRO NO ART. 655, §1º, CPC - INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA - DECISÃO REFORMADA. I - O APELANTE NÃO SE CONFIGURA COMO DEVEDOR SOLIDÁRIO NA PRESENTE RELAÇÃO JURÍDICA, UMA VEZ QUE INEXISTIU CLÁUSULA EXPRESSA NESTE SENTIDO EM QUALQUER DOS DOCUMENTOS, A SABER, NA CÉDULA REPRESENTATIVA DE MERCADORIA Nº 19795, BEM COMO NA NOTA PROMISSÓRIA E ANEXO. LOGO, O REQUERENTE AVALISTA NÃO POSSUI RESPONSABILIDADE (SOLIDÁRIA) ACERCA DO ESTIPULADO CONTRATUALMENTE, SEGUNDO SE DEPREENDE DO ENUNCIADO DA SÚMULA 26, DO STJ: "O AVALISTA DO TÍTULO DE CRÉDITO VINCULADO A CONTRATO DE MÚTUO TAMBÉM RESPONDE PELAS OBRIGAÇÕES PACTUADAS, QUANDO NO CONTRATO FIGURAR COMO DEVEDOR SOLIDÁRIO.". II - EM RELAÇÃO À NOTA PROMISSÓRIA, DEVEM-SE APLICAR AS MESMAS DISPOSIÇÕES CONCERNENTES À LETRA DE CÂMBIO, DESTE MODO O PRAZO PRESCRICIONAL DO TÍTULO É DE 03 (TRÊS) ANOS, COM FULCRO NOS ARTIGOS 70 E 77, DA LEI UNIFORME DE GENEBRA. ASSIM, EM QUE PESE A NATUREZA DO CONTRATO SEJA DE OBRIGAÇÃO PESSOAL (SEGUINDO A PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA, COM BASE NO ART. 177, DO ANTIGO CÓDIGO CIVIL), O TÍTULO CAMBIÁRIO AVALIZADO JÁ SE ENCONTRA PRESCRITO. III - A PRESTAÇÃO DE AVAL NÃO SE ENCONTRA NO ROL TAXATIVO DE POSSIBILIDADES EM QUE SE EXCETUA A IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. IGUALMENTE, DEVE-SE ATENTAR QUE O CONTRATO RELACIONA OS BENS DADOS EM PENHORA MERCANTIL, 223 CABEÇAS DE GADO, POR ESTE MOTIVO A CONSTRIÇÃO DEVERIA OCORRER PRIMEIRO SOBRE A GARANTIA PIGNORATÍCIA, POR OBEDIÊNCIA A REGRA DO ARTIGO 655, §1º, DO CPC. APELAÇÃO PROVIDA. (TJPR - 13ª C.Cível - AC 532830-5 - Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Gamaliel Seme Scaff - Unânime - J. 01.07.2009) (grifei)
 
 
Assim, Wilma Calegari de Souza, que assinou o título somente como avalista, figura como parte ilegítima para responder a presente ação de cobrança (reconvenção), tendo em vista que, prescrito o título que embasa o pedido, não provado o enriquecimento ilícito desta, desaparece a obrigação cambial da avalista.
 
Com estas considerações, de ofício, declaro a ilegitimidade passiva da apelante Wilma Calegari de Souza, e extingo o feito reconvencional, sem resolução de mérito, com base no art. 267, IV, do Código de Processo Civil, cabendo à parte reconvinte arcar com as custas do processo e honorários de sucumbência, estes já fixados na sentença em R$ 800,00 (oitocentos reais), devidos ao patrono da apelante.
Conforme o exposto acima, a prescrição do título de crédito torna ineficaz a pretensão pecuniária contra a pessoa do avalista, motivo pelo qual o protesto efetuado nos autos, em que consta o CPF da avalista (fls. 17), evidencia o abuso de direito.
 
Assim, entendo que o protesto da nota promissória prescrita foi indevido, pois prescrito o título desaparece a obrigação da apelante como avalista.
 
Em suma, o credor não poderia, em hipótese alguma, permitir que o protesto fosse efetivado em desfavor da avalista. Deveria diligenciar (e monitorar as providências) para que o protesto do título apontado ocorresse apenas contra o devedor principal, o que, entretanto, não fez.
 
Dessa forma, o protesto do título em questão realmente foi indevido, devendo ser cancelado.
 
Por fim, quanto à indenização por danos morais erroneamente o magistrado singular declarou que a recorrida não sofreu danos morais em virtude do protesto da nota promissória, não fazendo, nesse sentido, jus a indenização.
 
Entretanto, restou inequívoca a ocorrência do protesto indevido de um título prescrito em desfavor da avalista, situação esta que configura os chamados danos "in re ipsa", os quais independem de prova do efetivo abalo moral da pessoa.
 
Pacífico o entendimento jurisprudencial neste sentido:
 
APELAÇÃO CÍVEL - RESPONSABILIDADE CIVIL - DÍVIDA INEXISTENTE - PROTESTO INDEVIDO - ABUSO DE DIREITO - OCORRÊNCIA DANO MORAL IN RE IPSA - VALOR DA INDENIZAÇÃO - REDUÇÃO - NÃO CABIMENTO - QUANTUM CORRETAMENTE FIXADO EM SENTENÇA RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO 1. Sempre que a parte extravasar os limites para os quais o direito foi criado, embora à primeira vista esteja exercendo direito seu, adentrará na esfera do abuso de direito. 2. A obrigação advinda de danos morais manifesta-se in re ipsa, ou seja, a responsabilidade do ofensor se opera pela simples violação do direito, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto. 3.
 
Ao arbitrar o quantum da indenização por danos morais, devem ser considerados: as circunstâncias do caso concreto, o alcance da ofensa e a capacidade econômica das partes, não se olvidando que a indenização pecuniária deve cumprir seu papel satisfatório/punitivo sem, no entanto, configurar abuso ou provocar enriquecimento ilícito do ofendido. Recurso não provido. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJPR - 11ª C.Cível - AC 854101-9 - Londrina - Rel.: Gamaliel Seme Scaff - Unânime - J. 04.07.2012) (grifei)
NULIDADE DE LETRA DE CÂMBIO E DANOS MORAIS. 1. EMISSÃO IRREGULAR DA LETRA DE CÂMBIO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL. CONSEQUENTE PROTESTO IRREGULAR. 2. DANO MORAL CONFIGURADO IN RE IPSA. VALOR MANTIDO. 3. COMPENSAÇÃO.
 
INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. 4. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA MANTIDO. 5. LITIGÂNCIA DE MÁ- FÉ. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE MULTA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 13ª C.Cível - AC 828428-2 - Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Luiz Taro Oyama - Unânime - J. 14.12.2011) (grifei)
 
 
Portanto, desnecessária é a demonstração efetiva do dano moral, bastando o simples protesto indevido do título para que reste ele configurado.
 
No que concerne ao quantum indenizatório, sabido é que o seu valor deve ser fixado com moderação e razoabilidade para não gerar enriquecimento ilícito a quem recebe. A respeito desse valor, Carlos Alberto Bittar (Reparação Civil por Danos Morais. 3. ed. São Paulo: RT, 1993, p. 233) leciona:
 
 
A indenização por danos morais deve traduzir-se em montante que represente advertência ao lesante e à sociedade de que não se aceita o comportamento assumido, ou evento lesivo advindo.
Consubstancia-se, portanto, em importância compatível com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se, de modo expressivo, no patrimônio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. Deve, pois, ser a quantia economicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio do lesante.
 
Como também se sabe, não há norma legal que ampare a fixação do quantum indenizatório, cabendo ao magistrado, sopesados os elementos do caso concreto, arbitrar o valor da indenização por danos morais moderadamente, observando os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
 
Sendo assim, calcado nas particularidades do processo, entendo que o montante de R$ 2.000,00 (dois mil reais) se afigura satisfatório, evitando-se desse modo o enriquecimento sem causa do apelante e a ausência de resposta à conduta do ora recorrido.
 
Necessário destacar que fixada a indenização em valor certo, a correção monetária deverá incidir da data do arbitramento, na forma da Súmula 362, do STJ, que assim dispõe: Súmula 362: "A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento."
 
E no tocante aos juros moratórios aplica-se o que dispõe a Súmula 54 do STJ: "os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual". Dessa forma, determino que os juros de mora incidam a partir da data do evento danoso.
 
Neste sentido:
 
APELAÇÃO CÍVEL 1, 2 E 3. AÇÃO DE CANCELAMENTO DE PROTESTOS INDEVIDOS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. (...) II - DANOS MORAIS. PRESCINDIBILIDADE DA PROVA. PROTESTO INDEVIDO QUE, POR SI SÓ, GERA A PRESUNÇÃO DA OCORRÊNCIA DO DANO. III - VALOR DA INDENIZAÇÃO. PEDIDO DE REDUÇÃO REJEITADO. IV - JUROS DE MORA. TERMO INICIAL A PARTIR DA DATA DO EVENTO DANOSO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 54 DO STJ. (...) IV - Conforme a súmula 54, do STJ: "Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual." (Súmula 54, Corte Especial, julgado em 24.09.1992, DJ 01.10.1992 p. 16801).  (TJ/PR, 14ª Câmara Cível, Apelação Cível n. 634.851-4, Rel. Des. Shiroshi Yendo, j. 18.08.2010).
 
Veja-se que diante da reforma da r. sentença, deve a parte ré, ora apelada, arcar com a integralidade do pagamento das custas processuais e honorários advocatícios
 
No que se refere à litigância de má-fé, em princípio, há que se considerar que as partes agem com boa-fé, na busca do direito. A boa-fé é presumida. A má-fé, que não se presume, pressupõe má conduta processual, com o propósito evidente de prejudicar.
 
A propósito leciona Nelson Nery Júnior:
 
 
Conceito de litigância de má-fé. É a parte ou interveniente que, no processo, age de forma maldosa, com dolo ou culpa, causando dano processual à parte contrária. É o improbus litigator, que se utiliza de procedimentos escusos com o objetivo de vencer ou que, sabendo ser difícil ou impossível vencer, prolonga o andamento do processo procrastinando o feito. As condutas aqui previstas, definidas positivamente, são exemplos do descumprimento do dever de probidade estampado no CPC 14". (NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 10ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 213.
 
Segundo o entendimento do STJ, para que a litigância de má-fé seja configurada, é necessário que reste comprovado dano causado à outra parte e dolo da parte por tê-lo provocado, dentro das hipóteses taxativamente enumeradas no art. 17 do CPC.
 
Nesse sentido:
 
PROCESSUAL CIVIL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. RECONHECIMENTO. PRESSUPOSTOS. I - Entende o Superior Tribunal de Justiça que o artigo 17 da Código de Processo Civil, ao definir os contornos dos atos que justificam a aplicação de pena pecuniária por litigância de má-fé, pressupõe o dolo da parte no entravamento do trâmite processual, manifestado por conduta intencionalmente maliciosa e temerária, inobservado o dever de proceder com lealdade.
II - Na interposição de recurso previsto em lei, cujos defeitos se devem à inequívoca inaptidão técnica do patrono da parte, não se presume a má-fé, para cujo reconhecimento seria necessária a comprovação do dolo da parte em obstar o trâmite do processo e do prejuízo da parte contrária, em decorrência do ato doloso. Recurso conhecido e provido. (STJ, 3ª Turma, REsp 418.342-PB, Rel. Castro Filho, DJ. 5.08.02, p. 337)
 
Com efeito, a dinâmica dos fatos denuncia que foi promovida ação declaratória de inexistência de relação jurídica c/c indenização por danos morais, sendo oferecida ao Judiciário falsa versão dos fatos, já que a parte apelante figurava como avalista no título de crédito (ver nota promissória acostada às fls. 78), porém afirmou que desconhecia a origem da cártula.
 
Nesse sentido, corretamente manifestou-se o magistrado singular: No que se refere à litigância de má-fé, entendo que a autora alterou a verdade dos fatos (CPC, art. 17, inciso II) quando alegou desconhecer a origem da dívida referente à nota promissória, pois a cambial acostada às fls. 78 prova que a autora foi avalista do título, sendo oportuno destacar que na resposta à reconvenção ela (autora) não impugnou a autenticidade de sua assinatura na referida cártula (fls.111/112).
 
Com efeito, a má-fé da recorrente salta aos olhos, pois tentou alterar a verdade dos fatos em juízo para prejudicar o apelado, devendo referida conduta ser reprimida pelo Poder Judiciário, razão pela qual a r. sentença deve ser mantida neste tópico.
 
Da analise dos autos, extrai-se que a indenização é consequência da condenação em litigância de má-fé, nos termos do art. 18 do CPC, in verbis: Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou. § 1o Quando forem dois ou mais os litigantes de má-fé, o juiz condenará cada um na proporção do seu respectivo interesse na causa, ou solidariamente aqueles que se coligaram para lesar a parte contrária. § 2o O valor da indenização será desde logo fixado pelo juiz, em quantia não superior a 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, ou liquidado por arbitramento.
 
Sobre a indenização devida pelo litigante de má-fé, em comentário ao art. 18 do CPC, esclarece José Miguel Garcia Medina: I. Distinção entre a multa e a indenização por litigância de má-fé. Embora tenham pressuposto comum (a conduta daquele que age com má-fé), as sanções referidas no art. 18 - multa e indenização por perdas e danos - têm requisitos distintos. Assim, p. ex., a indenização por perdas e danos só têm cabimento se demonstrado prejuízo, o mesmo não ocorrendo com a multa (cf. STJ, REsp 140.482/RS, rel. Min. Sávio De Figueiredo Teixeira, 4ª T., 25.11.97) (MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 57).
 
Portanto, verificada a litigância de má-fé o magistrado singular pode fixar indenização por perdas e danos.
No caso dos autos, o prejuízo experimentado pelo réu será o pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, motivo pelo qual o magistrado transferiu tal ônus para a parte recorrente. Assim, nesse aspecto a r. sentença deve ser mantida nos termos em que proferida, para que a apelante reembolse a parte apelada as despesas referentes as custas processuais e os honorários advocatícios, a título de indenização por perdas e danos, diante da litigância de má-fé.
 
3. Ante o exposto, voto no sentido de declarar de ofício a ilegitimidade da parte apelante para figurar no pólo passivo da ação de cobrança/ reconvenção, extinguindo o feito sem resolução do mérito, e conhecer e dar parcial provimento ao recurso de apelação cível, uma vez verificado o protesto indevido e consequente dano moral.
 
ACORDAM os Magistrados integrantes da Décima Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, declarar, de ofício, a ilegitimidade da parte apelante para figurar no pólo passivo da cobrança, extinguindo o feito sem resolução do mérito, e conhecer e dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto relator.
 
O julgamento foi presidido pelo Desembargador Paulo Cezar Bellio (com voto), e dele participou a Desembargadora Maria Mercis Gomes Aniceto.
 
Curitiba, 29 de maio de 2013.
 
FRANCISCO EDUARDO GONZAGA DE OLIVEIRA
 
Juiz de Direito Substituto em 2º Grau - Relator