quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Prédio registrado com o nome Recreio Natura não viola direito de propriedade da Natura Cosméticos








A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou um recurso da Natura Cosméticos contra o registro de um prédio com o nome Recreio Natura, na cidade de São Paulo, por entender que a exclusividade conferida pelo direito marcário se limita às atividades empresariais, sem atingir os atos civis como o registro do nome de um edifício ou condomínio.



A Natura Cosméticos ajuizou ação para impedir que o prédio usasse o nome Recreio Natura, por entender que tal registro violaria direito de propriedade industrial de sua titularidade.



O pedido da Natura foi rejeitado em primeira e segunda instâncias. Na sentença, o juiz afirmou que "nome de condomínio não é marca", e por isso não haveria violação.



O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), ao analisar a apelação, afirmou que o ato civil de registrar o nome de um edifício como Recreio Natura não torna esse ato comercial, não caracterizando depreciação ou prejuízo da marca.



No recurso especial, a Natura afirmou que sua marca goza de proteção especial em todos os ramos de atividade, e não está sujeita ao princípio da especialidade.



Alto renome



Segundo o autor do voto vencedor na Terceira Turma, ministro Moura Ribeiro, embora o princípio da especialidade não se aplique às marcas de alto renome – caso da Natura –, a proteção conferida pela Lei de Propriedade Industrial não abrange o nome atribuído a edifícios ou outros empreendimentos imobiliários.



Ele explicou que a marca é parte do patrimônio da empresa, designativa de um produto ou serviço – situação diversa dos nomes dados a prédios e condomínios.



  • "Os nomes atribuídos aos edifícios e empreendimentos imobiliários não gozam de exclusividade, sendo comum receberem idêntica denominação e, por isso, proliferam as homonímias, sem que um condomínio possa impedir o outro de receber idêntica denominação", explicou Moura Ribeiro.



Para o magistrado, esses nomes não qualificam produtos ou serviços, "apenas conferem uma denominação para o fim de individualizar o bem", situação diversa do nome empresarial – o qual, de acordo com o artigo 1.163 do Código Civil, deve-se distinguir de qualquer outro nome já registrado.



  • "A proteção à exclusividade da marca ou do nome empresarial é criação do direito, sendo, portanto, uma opção legislativa. Tal conceito jurídico exerce uma função e, por isso, presta-se a determinadas finalidades. O nome que individualiza um imóvel é de livre atribuição pelos seus titulares e não requer criatividade ou capacidade inventiva, tampouco lhe é conferido o atributo da exclusividade", afirmou Moura Ribeiro.



Atos distintos



O ministro destacou entendimento do doutrinador português José de Oliveira Ascensão, adotado pelo STJ no Recurso Especial 862.067, sobre a distinção entre o ato civil de registro de um prédio e o ato comercial do registro de nomes e marcas.



Segundo aquele jurista, nem mesmo as marcas de alto renome podem interferir na liberdade de nomear edifícios ou condomínios com qualquer expressão.



"Em suma, o registro de uma expressão como marca, ainda que de alto renome, não afasta a possibilidade de utilizá-la no nome de um edifício", concluiu o ministro.



RECURSO ESPECIAL Nº 1.804.960 - SP (2019/0080321-7) RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO MOURA RIBEIRO RECORRENTE : NATURA COSMÉTICOS S/A

RECORRENTE : INDUSTRIA E COMERCIO DE COSMETICOS NATURA LTDA.

ADVOGADOS : ANTONIO FERRO RICCI - SP067143

PEDRO HENRIQUE FORMAGGIO JORGE - SP299714

CARLOS EDUARDO NELLI PRINCIPE - SP343977

RECORRIDO : ROSSI RESIDENCIAL SA

ADVOGADO : NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES E OUTRO(S) - SP128341



EMENTA - RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE ABSTENÇÃO DE USO DE MARCA E DE REPARAÇÃO DE DANOS. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. MARCA DE ALTO RENOME “NATURA”. EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO DENOMINADO “RECREIO NATURA”. DISTINÇÃO ENTRE ATO CIVIL E ATO EMPRESARIAL. RECURSO NÃO PROVIDO.



  • 1. Inexistindo omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido, a rejeição dos embargos de declaração contra ele interpostos não configura negativa de prestação jurisdicional.


  • 2. O propósito recursal visa analisar se houve violação ao art. 125 da Lei nº 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial), que confere proteção especial às marcas de alto renome, no caso a marca “NATURA”, diante do seu uso no empreendimento imobiliário “RECREIO NATURA”.



  • 3. A marca é um sinal distintivo que tem por funções principais identificar a origem e distinguir produtos ou serviços de outros idênticos, semelhantes ou afins.



  • 4. Os nomes atribuídos aos edifícios e empreendimentos imobiliários não gozam de exclusividade, sendo comum receberem idêntica denominação. Estes nomes, portanto, não qualificam produtos ou serviços, apenas conferem uma denominação para o fim de individualizar o bem.



  • 5. A proteção à exclusividade da marca é criação do direito, sendo, portanto, uma opção legislativa. O nome que individualiza um imóvel é  de livre atribuição pelos seus titulares e não requer criatividade ou capacidade inventiva, tampouco lhe é conferido o atributo da exclusividade.



  • 6. O registro de uma expressão como marca, ainda que de alto renome, não afasta a possibilidade de utilizá-la no nome de um edifício. A exclusividade conferida pelo direito marcário se limita as atividades empresariais, sem atingir os atos da vida civil.



  • 7. Recurso especial não provido.



ACÓRDÃO

Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Moura Ribeiro, vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, em negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Moura Ribeiro, que lavrará o acórdão.



Vencida a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Votaram com o Sr. MINISTRO

MOURA RIBEIRO, os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas



Cueva e Marco Aurélio Bellizze.

Brasília, 24 de setembro de 2019(Data do Julgamento)

MINISTRO MOURA RIBEIRO

Relator




Restaurante tradicional vence disputa pelo nome Bar do Alemão no interior paulista


 

Fonte: STJ - Superior Tribunal de Justiça

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão de segunda instância que impediu uma empresa de Campinas (SP), a Parmegiana Factory, de usar o nome Bar do Alemão – registrado há mais de 30 anos por outra empresa, que possui restaurantes naquela cidade e em Itu, na mesma região.

O colegiado entendeu que a marca desfruta de amplo reconhecimento e prestígio perante o público, havendo no processo provas da confusão causada pelo uso da expressão idêntica por parte do outro restaurante.

Segundo os autos, a Parmegiana Factory Campinas Comércio de Alimentos Ltda. passou a atuar no mesmo ramo de atividade que a Steiner & Cia. Ltda. – detentora da marca Bar do Alemão –, comercializando o prato pelo qual essa empresa é famosa entre seus consumidores (filé à parmegiana), em um estabelecimento também chamado Bar do Alemão.

Uso comum

A sentença proibiu a Parmegiana Factory de utilizar a marca, sob pena de multa diária, e condenou-a a pagar indenização de R$ 20 mil por danos morais e de R$ 20 mil por danos materiais. Em segundo grau, os danos materiais foram reduzidos a 20% do faturamento com a venda do filé à parmegiana, limitados a R$ 20 mil.

No recurso especial, a Parmegiana Factory alegou que a expressão adotada na marca é de uso comum, razão pela qual seria possível o convívio entre os restaurantes com o mesmo nome. Afirmou ainda que, antes do ajuizamento da ação, havia depositado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) o pedido de registro da marca Bar do Alemão Parmegiana Factory – o que lhe garantiria o direito de utilizá-la.

Marca fraca

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, disse que, no caso de marca com baixo grau de distintividade, o STJ entende que a exclusividade conferida ao titular do registro pode ser mitigada. Assim, quem optou por uma marca considerada fraca pode ter de suportar o ônus da coexistência com marca semelhante.

No entanto, segundo ela, mesmo que se reconheça que a expressão Bar do Alemão é marca fraca, isso não significa, por si, a licitude do uso de nome idêntico pela Parmegiana Factory. "Mesmo às marcas dotadas de baixa distintividade é assegurada proteção contra atos de concorrência desleal ou aproveitamento parasitário, situações que ficam evidenciadas a partir da constatação de que o consumidor esteja sendo confundido quanto ao produto adquirido ou quanto à sua origem comercial", declarou a relatora.

Para Nancy Andrighi, possibilitar o uso simultâneo do nome Bar do Alemão por empresas que atuam no mesmo segmento subverteria as principais funções da marca, pois impediria que se pudesse diferenciar um produto ou serviço do outro, levando a equívocos acerca de sua procedência, em evidente prejuízo do público.

Associação indevida

"Havendo possibilidade de associação indevida ou de confusão quanto à origem comercial do produto ou serviço, não há como se reconhecer que marcas semelhantes possam coexistir num mesmo segmento de mercado", afirmou.

A ministra destacou trechos da sentença e do acórdão recorrido, segundo os quais ficou demonstrado que os consumidores foram, de fato, confundidos pelo uso da marca pelas duas empresas.

Segundo a relatora, a impossibilidade de uso simultâneo da marca é corroborada pela informação de que o INPI indeferiu, no último dia 10, o pedido de registro apontado no recurso especial, "justamente por constatar que a expressão Bar do Alemão Parmegiana Factory reproduz ou imita, indevidamente, diversas marcas anteriormente registradas, entre elas a de titularidade da recorrida".

RECURSO ESPECIAL Nº 1.778.887 - SP (2018/0295785-2)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : PARMEGIANA FACTORY CAMPINAS COMERCIO DE ALIMENTOS
LTDA
ADVOGADOS : CRISTIANO ARAUJO CATEB E OUTRO(S) - MG104687
DIEGO ANDRADE VIDAL - MG146198
RECORRIDO : STEINER & CIA LTDA
ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS GONÇALVES JUNIOR E OUTRO(S) - SP107645
ANTÔNIO BENTO DE SOUZA - SP123814
CELINO BENTO DE SOUZA - SP108745
MARCELO ANTONIO DA SILVA - SP258216
JOICE MARTINS DE OLIVEIRA - SP236393

EMENTA - RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE ABSTENÇÃO DE
USO DE MARCA E INDENIZATÓRIA. DIREITO DE EXCLUSIVIDADE. MARCA
FORMADA POR EXPRESSÃO DE USO COMUM. CONCORRÊNCIA DESLEAL.
SÚMULA 7/STJ.

  • 1. Ação distribuída em 30/6/2015. Recurso especial interposto em 9/2/2018.
  •  
  • Autos conclusos à Relatora em 4/12/2018.
  •  
  • 2. O propósito recursal é verificar se o uso da expressão BAR DO ALEMÃO, em estabelecimento comercial da recorrente, viola direitos titularizados pela recorrida sobre marca constituída pelos mesmos termos.
  •  
  • 3. Tratando-se de marca que apresenta baixo grau de distintividade, este Tribunal tem reconhecido que a exclusividade conferida ao titular do registro pode comportar mitigação, a depender da verificação de outros elementos que confirmem a não ocorrência de violação aos ditames da legislação de regência.
  •  
  • 4. O âmbito de proteção de uma marca é delimitado, acima de tudo, pelo risco de confusão ou associação que o uso de outro sinal, designativo deproduto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, possa ser capaz de causar perante o consumidor.
  •  
  • 5. Possibilitar o uso simultâneo de sinais distintivos compostos pelos mesmos elementos nominativos por empresas que atuam no mesmo segmento de atividade, como na espécie, subverteria as principais funções marcárias, pois: (i) impediria que se pudesse diferenciar um produto ou serviço de outro, prejudicando a concorrência; e (ii) obstaria o reconhecimento da origem comercial do produto ou serviço adquirido, levando a equívocos acerca de sua procedência, em evidente prejuízo ao público consumidor.
  • Precedente.
  •  
  • 6. Hipótese concreta em que a marca da recorrida, registrada há mais de 30 anos, desfruta de amplo reconhecimento e prestígio perante o público consumidor, havendo provas concretas nos autos, segundo os juízos de origem, acerca da confusão causada pelo uso de expressão idêntica pela recorrente, que passou a atuar no mesmo ramo de atividades (restaurante) para comercializar o famoso prato pelo qual a titular da marca violada é identificada pelos consumidores (filé a parmegiana).

RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS. ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, com majoração de honorários advocatícios, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 24 de setembro de 2019(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora


segunda-feira, 14 de outubro de 2019

COMPRA ON-LINE. PRODUTO NUNCA ENTREGUE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SERVIÇOS BANCÁRIOS.

RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS. FRAUDE. COMPRA ON-LINE. PRODUTO NUNCA ENTREGUE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SERVIÇOS BANCÁRIOS. INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA ENTRE PARTICULARES. COMPRA E VENDA ON-LINE. PARTICIPAÇÃO. AUSÊNCIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. NÃO CONFIGURAÇÃO.


1. Ação ajuizada em 30/06/2015. Recurso especial interposto em 16/03/2018 e atribuído em 22/10/2018.


2. O propósito recursal consiste em determinar se o banco recorrido seria objetivamente responsável pelos danos suportados pelo recorrente, originados após ter sido vítima de suposto estelionato, perpetrado na internet, em que o recorrente adquiriu um bem que nunca recebeu.


3. Nos termos da Súmula 479/STJ, "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias".


4. O banco recorrido não pode ser considerado um fornecedor da relação de consumo que causou prejuízos à recorrente, pois não se verifica qualquer falha na prestação de seu serviço bancário, apenas por ter emitido o boleto utilizado para pagamento.


5. Não pertencendo à cadeia de fornecimento em questão, não há como responsabilizar o banco recorrido pelos produtos não recebidos.


Ademais, também não se pode considerar esse suposto estelionato como uma falha no dever de segurança dos serviços bancários prestados pelo recorrido.


6. Recurso especial não provido. (REsp 1786157/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/09/2019, DJe 05/09/2019)

DOR MORAL Empresa terá que indenizar consumidor por corpo estranho em garrafa de cerveja


O artigo 8 da Legislação Consumerista protege o consumidor quando a sua saúde é colocada em risco, tanto no que se refere a aspectos físicos como psicológicos.

Marca foi condenada a indenizar consumidor em R$ 8 mil em MG

Com esse entendimento, o juiz Sérgio Murillo Pacelli, da 8ª Vara Cível da Comarca de Juiz de Fora, condenou a marca de cervejas Heineken a indenizar um consumidor pela presença de um corpo estranho em uma garrafa do produto.

Ao analisar o caso, o magistrado citou audiência de conciliação que não resultou em acordo entre as partes e alegou que o reclamante apresentou duas testemunhas que foram advertidas na forma da lei e corroboraram os fatos descritos por ele.

Segundo os testemunhos o produto em questão foi adquirido de forma intacta tendo o garçom aberto a garrafa de cerveja na mesa em que estava o reclamante.

Por fim, o magistrado também ressaltou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de que “a simples exposição do risco a saúde ou mesmo da incolumidade física do consumir, bem como a mental, já é suficiente para configuração do instituto da dor moral, haja vista que o dano é presumido”. O reclamante foi representado pelo advogados Pedro Henrique Reis e Souza e Emmanuel Pedro Soares Pacheco.



Processo 5005173-69.2019.8.13.0145

Revista Consultor Jurídico, 13 de outubro de 2019, 16h37

domingo, 13 de outubro de 2019

Justiça obriga sogra a assumir dívida quase milionária de ex-genro



Colaboração para o UOL, em São Paulo



Resumo da notícia



  •     Sogra deverá assumir uma dívida quase milionária que o ex-genro tinha com um fundo
  •     Carlos......, o genro, era avalista de uma empresa que não quitou um empréstimo de mais de R$ 1 milhão
  •     No meio do processo, ele emprestou R$ 900 mil à ex-sogra por meio de contratos verbais
  •     A Justiça entendeu que, como o empréstimo do genro para a sogra também não havia sido pago, ela agora deveria ressarcir diretamente o fundo



    Segundo advogada, esta foi uma decisão é rara para um caso complexo



C...... devia dinheiro para Carlos, seu ex-genro, que devia dinheiro para um banco. Carlos nunca pagou o banco, e a sogra diz que pagou o genro, mas não tem como provar. Para resolver, a Justiça decidiu que C..... deverá assumir a dívida de Carlos e pagar diretamente para o banco.



A decisão foi do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo), que condenou a sogra a assumir uma dívida quase milionária do ex-genro. A Justiça levou em consideração um empréstimo de R$ 900 mil que ela havia tomado do genro, e sobre o qual não comprovou quitação, apesar de alegar ter pago tudo.



Agora, em vez de devolver a quantia para o ex-genro, C..... deverá pagar diretamente o fundo financeiro que comprou a dívida do banco. O valor hoje passa de R$ 1 milhão.



Genro declarou empréstimo para sogra



O caso começou quando Carlos ......., o ex-genro, pegou um empréstimo de R$ 370 mil para sua empresa, a CIA Têxtil, em um banco. O contrato foi assinado em nome da companhia, com ele como avalista.



Como o empréstimo não foi quitado, o banco entrou na Justiça, mas não foi encontrado nenhum bem ou imóvel nos nomes da CIA ou dele nas execuções de cobrança. A Justiça determinou, então, que fossem analisadas suas últimas declarações de Imposto de Renda.



É aí que a ex-sogra, C......, entra no processo. Nas declarações de IR, foram identificados quatro empréstimos de CARLOS para ela no valor total de R$ 900 mil. Os acordos foram feitos de forma verbal entre 2012 e 2015, quando o processo contra a CIA já rolava e ele ainda era casado com a filha de C......



Sogra confirma suposto empréstimo



C..... foi chamada à Justiça e confirmou que havia feito o suposto empréstimo por meio de acordos verbais, mas disse que já havia pago o ex-genro. O problema, disse ela, é que não tinha nenhum comprovante desse pagamento.



O fundo que comprou a dívida do banco pediu que os R$ 900 mil que a sogra devia fossem pagos diretamente ao fundo e não mais ao ex-genro.



Na primeira instância, a 7ª Vara Cível de São Paulo entendeu que o acordo verbal, sem contrato assinado, não serviria como prova e, dessa forma, o empréstimo não poderia ser comprovado.



O fundo recorreu em segunda instância, e a 11ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP decidiu que o acordo verbal e a confissão da sogra serviriam como prova do empréstimo. Agora, em vez de dever para o ex-genro, C..... deverá pagar sua dívida ao financeiro. Ainda cabe recurso contra a decisão.



É normal haver fraudes em casos de dívidas



Em casos como este, quando se descobre que o devedor fez transações financeiras enquanto evita pagar uma dívida, o mais comum é acusar que a transação foi uma fraude para evitar o pagamento (a pessoa passa os bens para um conhecido, de modo a não ser penhorado).



No caso da transferência de um imóvel, por exemplo, a transação seria desfeita e a casa seria penhorada para quitar a dívida, como se nunca tivesse sido vendida. "Só que existe um problema neste caso: com dinheiro não dá [para reaver], ele já foi", disse a advogada MTT, que assessorou o fundo.



Por isso, em vez de acusar fraude, ela decidiu pedir a penhora da quantia que a sogra devia a CALORS. "Se de fato existia este empréstimo, como existe, e ela ainda não havia devolvido o dinheiro, a lei permite que crédito seja penhorado", disse MTT.


Não há provas do empréstimo para a sogra



O problema é que não havia nenhum documento que comprovasse que CARLOS havia emprestado o dinheiro para a então sogra. Por isso MTT elogia a decisão.



  • "O legal é que entenderam que, se o contrato físico não existe, a prova se dá por indícios, como o IR e a confirmação dada pela própria sogra", afirmou a advogada. "No passado, contratos de um valor tão alto assim não podiam ser verbais, tinham de ser escritos. Mas a lei hoje não exige mais."



Este é um caso raro. A advogada diz que não achou casos semelhantes a este quando fez a pesquisa para preparar a defesa. "O caso, como um todo, é bastante peculiar, complexo mesmo para advogados, embora a penhora de créditos esteja prevista no Código de Processo Civil", afirmou.

sábado, 12 de outubro de 2019

AÇÃO MONITÓRIA. JULGAMENTO COM BASE NO COSTUME E NO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. DISPOSITIVO LEGAL EXPRESSO. INTERPRETAÇÃO. CHEQUES EMPRESTADOS A TERCEIRO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.787.274 - MS (2016⁄0165869-4)

RELATORA :        MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE:        JOSÉ DIVONIR PERI
ADVOGADO:        FLÁVIA GIRALDELLI PERI  - MS059212
RECORRIDO:        DELAOR AFONSO VILELA
ADVOGADOS:        CYNTHIA RENATA SOUTO VILELA  - MS010909 
PAULO BELARMINO DE PAULA JÚNIOR E OUTRO(S) - MS013328
INTERES: WLADMIR MARTINS
ADVOGADO: ELIANE ARGUELO DE LIMA  - MS010932
INTERES: ADM FACTORING FIMENTO COMERCIAL LTDA

EMENTA

  • RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. OMISSÃO INEXISTENTE. AÇÃO MONITÓRIA. JULGAMENTO COM BASE NO COSTUME E NO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. DISPOSITIVO LEGAL EXPRESSO. INTERPRETAÇÃO. CHEQUES EMPRESTADOS A TERCEIRO. FATO INCONTROVERSO. RESPONSABILIDADE DO EMITENTE PELO PAGAMENTO. JULGAMENTO: CPC⁄73.
  •  
  • 1. Ação monitória ajuizada em 22⁄03⁄2011, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 22⁄09⁄2015 e atribuído ao gabinete em 25⁄08⁄2016.
  • 2. O propósito recursal é dizer sobre a possibilidade de julgamento com base no costume e no princípio da boa-fé, ante a existência de previsão legislativa em sentido diverso, bem como sobre a responsabilidade do emitente pelo pagamento dos cheques por ele emprestados a terceiro.
  •  
  • 3. Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e suficientemente fundamentado o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há falar em violação do art. 535, II, do CPC⁄73.
  •  
  • 4. Na ausência de lacuna, não cabe ao julgador se valer de um costume para afastar a aplicação da lei, sob pena de ofensa ao art. 4º da LINDB, conquanto ele possa lhe servir de parâmetro interpretativo quanto ao sentido e alcance do texto normativo.
  •  
  • 5. A boa-fé objetiva é princípio fundamental do ordenamento jurídico, com conteúdo valorativo e nítida força normativa, o qual não se confunde com os princípios gerais do direito, mencionados no art. 4º da LINDB, que têm caráter informativo e universal, e finalidade meramente integrativa, servindo ao preenchimento de eventual lacuna normativa.
  •  
  • 6. Na trilha da literalidade indireta, fundada na boa-fé objetiva, é possível admitir a inclusão de terceiro no polo passivo da ação monitória para exigir-lhe o pagamento do cheque, quando ele, inequivocamente, assumiu, perante o beneficiário, a obrigação a que corresponde o título.
  •  
  • 8. Do ponto de vista do princípio da abstração, igualmente, a boa-fé objetiva funciona como baliza, de modo a permitir que o beneficiário, com base no negócio jurídico subjacente, do qual participou, exija o pagamento, por meio da ação monitória, do terceiro que, embora não tenha firmado na cártula – seja como emitente, endossante, ou avalista – a obrigação de pagar, a ela está vinculado pela causa que deu origem ao título.
  •  
  • 9. A flexibilização das normas de regência, à luz do princípio da boa-fé objetiva, não tem o condão de excluir o dever de garantia do emitente do cheque, previsto no art. 15 da lei 7.357⁄85, sob pena de se comprometer a segurança na tutela do crédito, pilar fundamental das relações jurídicas desse jaez.
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  • 10. Hipótese em que, a despeito da nobre intenção do recorrido, deve ser condenado ao pagamento da quantia inscrita nos cheques por ele emitidos, sem prejuízo de posterior ação de regresso contra o interessado para reaver o valor que eventualmente venha a despender.
  •  
  • 11. Recurso especial conhecido e provido.
  •    
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 23 de abril de 2019(Data do Julgamento)


MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Documento: 94930856  EMENTA / ACORDÃO   - DJe: 26/04/2019

Titular da marca Chandelle utilizada para designar produto de chocolate em creme, e que a recorrida inseriu no mesmo mercado, sobremesa cremosa de chocolate sob a marca Chocomilk.


RECURSO ESPECIAL Nº 1.591.294 - PR (2014⁄0025337-9)


RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:

Cuida-se de recurso especial interposto por BRF Brasil Foods S.A. fundamentado nas alíneas a e c do permissivo constitucional.

Depreende-se do autos que Nestlé Brasil Ltda. e outras propuseram ação inibitória cumulada com perdas e danos contra a recorrente.

Em sua inicial, afirmou ser titular da marca Chandelle utilizada para designar produto de chocolate em creme, e que a recorrida inseriu no mesmo mercado, sobremesa cremosa de chocolate sob a marca Chocomilk. Alegou, em síntese, que o novo produto possui composição visual que imita o conjunto-imagem (trade dress) dos produtos que comercializa.

Em sentença, o pedido foi julgado improcedente.

Interposto recurso pelas ora recorridas, o Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade, deu parcial provimento à apelação, nos termos da seguinte ementa (e-STJ, fls. 950-951):

  • PROPRIEDADE INDUSTRIAL - AÇÃO COMINATÓRIA CUMULADA COM PERDAS E DANOS - OCORRÊNCIA DE CONTRAFAÇÃO E CONCORRÊNCIA DESLEAL - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA - AGRAVO RETIDO - ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA - PREJUDICADO - OS PEDIDOS SE CONFUNDEM COM O MÉRITO DO RECURSO DE APELAÇÃO - APELAÇÃO CÍVEL - PROTEÇÃO AOS OUTROS SIGNOS DISTINTIVOS (ART. 5, XXIX DA CF) EM COMBATE AOS ATOS DE CONCORRÊNCIA DESLEAL (ART. 195 E INCISOS DA LEI N.º 9.279⁄96) - CONTRAFAÇÃO AO CONJUNTO IMAGEM, "TRADE-DRESS" - OCORRÊNCIA - SEMELHANÇA ENTRE OS ELEMENTOS POSTOS NA EMBALAGEM - INDIVIDUALMENTE SÃO SIGNOS DISTINTOS, MAS QUANDO ANALISADOS PERANTE O CONJUNTO DE IMAGEM GERAM CONFUSÃO AOS CONSUMIDORES - AS PEQUENAS DISTINÇÕES NAS EMBALAGENS NÃO LHES GARANTEM DISTINTIVIDADE - PRESENTES OS REQUISITOS CARACTERIZADORES DA CONCORRÊNCIA DESLEAL FUNDADA NA CONFUSÃO: ANTERIORIDADE DO PRODUTO CONCORRENTE; EXISTÊNCIA DE IMITAÇÃO E SUSCETIBILIDADE DE SE ESTABELECER A CONFUSÃO - PROTEÇÃO AO "TRADE-DRESS" DO PRODUTO CHANDELLE - NÃO RECONHECIMENTO DE AMPARO AO PRODUTO CHANDELLE LIGHT - AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO A CONCORRÊNCIA ENTRE OS PRODUTOS CHANDELLE LIGHT E BATAVO CREAMY LIGHT - CONDENAÇÃO EM PERDAS E DANOS - LUCRO CESSANTE NOS TERMOS DO ARTIGO 210 DA LEI DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL - DANOS MORAIS - AFASTAMENTO - AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO AO DANO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO - RECURSO ADESIVO - OCORRÊNCIA DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - AFASTAMENTO - MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - PREJUDICADO - NEGADO PROVIMENTO - READEQUAÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - SENTENÇA MODIFICADA.

Opostos embargos de declaração por ambas as partes, foram eles rejeitados.

Nas razões do presente recurso especial, as recorrentes alegam violação dos arts. 124 e 195 da Lei n. 9.279⁄1996; 186 e 944 do CC⁄2002; e 14, 16, 17, 18 e 333 do CPC⁄1973, bem como dissídio jurisprudencial.

Assevera a recorrente que foi atribuída a proteção ao conjunto-imagem (trade dress) da recorrida, em razão da utilização de sinais comuns e da cor da embalagem, elementos que sequer seriam passíveis de registro para utilização exclusiva.

Acrescenta que não ficou demonstrada a utilização anterior do mesmo conjunto-imagem, e que o Tribunal de origem concluiu pela anterioridade da utilização em razão da existência do produto desde 1986, quando o produto da recorrida não era ainda denominado Chandelle, mas sim Chamborcy. Afirma o descumprimento da regra de distribuição do ônus da prova, de modo que o tribunal de origem teria presumido fato que dependia de prova não produzida pela autora, ora recorrida.

Pleiteia ainda o reconhecimento de litigância de má-fé, uma vez que a recorrida apontou, na petição inicial, a imitação de conjunto marcário de Chandelle Light quando este produto ainda não era produzido nem comercializado.

Por fim, concluem que não houve a prática de ato de concorrência desleal, uma vez que seus produtos são comercializados mediante marca própria ostensivamente apresentada na embalagem de forma a afastar a confusão pontencial entre os consumidores.

Contrarrazões apresentadas (e-STJ, fls. 1.272-1.306).

Em juízo prévio de admissibilidade, o Tribunal de origem não admitiu o recurso especial, dando azo à interposição do AREsp n. 472.356-PR, provido para determinar a reautuação do presente recurso.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.591.294 - PR (2014⁄0025337-9)


VOTO

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE(RELATOR):

Cinge-se a controvérsia a verificar o preenchimento dos requisitos para proteção assegurada ao conjunto-imagem de produto ou serviço (trade dress) no que tange à concorrência desleal por confusão.

Esta Terceira Turma, recentemente, apreciou a questão da proteção ao trade dress sob o enfoque da concorrência desleal por confusão, no intuito de balizar e uniformizar a atuação jurisdicional. Trata-se do julgamento do recurso especial n. 1.353.451⁄MG, assim ementado:

  • PROPRIEDADE INDUSTRIAL. RECURSO ESPECIAL. CONJUNTO-IMAGEM (TRADE DRESS). COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTO AFIM. EMBALAGENS ASSEMELHADAS. CONCORRÊNCIA DESLEAL. ART. 209 DA LEI N. 9.279⁄1996 (LPI). PERÍCIA TÉCNICA REQUERIDA. DISPENSA INJUSTIFICADA. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
  • 1. O conjunto-imagem (trade dress) é a soma de elementos visuais e sensitivos que traduzem uma forma peculiar e suficientemente distintiva, vinculando-se à sua identidade visual, de apresentação do bem no mercado consumidor.
  • 2. Não se confunde com a patente, o desenho industrial ou a marca, apesar de poder ser constituído por elementos passíveis de registro, a exemplo da composição de embalagens por marca e desenho industrial. 3. Embora não disciplinado na Lei n. 9.279⁄1996, o conjunto-imagem de bens e produtos é passível de proteção judicial quando a utilização de conjunto similar resulte em ato de concorrência desleal, em razão de confusão ou associação com bens e produtos concorrentes (art. 209 da LPI).
  • 4. No entanto, por não ser sujeito a registro - ato atributivo do direito de exploração exclusiva - sua proteção não pode servir para ampliar direito que seria devido mediante registro, de modo que não será suficiente o confronto de marca a marca para caracterizar a similaridade notória e presumir o risco de confusão.
  • 5. A confusão que caracteriza concorrência desleal é questão fática, sujeita a exame técnico, a fim de averiguar o mercado em que inserido o bem e serviço e o resultado da entrada de novo produto na competição, de modo a se alcançar a imprevisibilidade da conduta anticompetitiva aos olhos do mercado.
  • 6. O indeferimento de prova técnica, para utilizar-se de máximas da experiência como substitutivo de prova, é conduta que cerceia o direito de ampla defesa das partes.
  • 7. Recurso especial conhecido e provido.
  • (REsp n. 1.353.451⁄MG, desta relatoria, Terceira Turma, DJe 28⁄9⁄2017)

Na oportunidade, reconhecendo a inegável importância crescente dos elementos imateriais da empresa para atração do consumidor e identificação dos produtos e seus fabricantes, assinalou-se a necessidade de se esclarecer a distinção entre marca, desenho industrial e conjunto-imagem (trade dress) e, por consequência, divisar o tratamento jurídico dispensado a cada um. Nessa trilha, enfatizando a ausência de previsão legal específica para o amparo do trade dress, o qual consiste em conjunto visual global de um produto ou a forma de prestação de um serviço,  lembrou-se que sua proteção se fundamenta no dever geral de garantia de livre mercado, especialmente disposto no art. 209 da Lei n. 9.279⁄1996.

Todavia, ao se entrelaçar conceitos e vetores do direito concorrencial no direito de proteção à propriedade industrial, mormente em casos que não se debate propriedades registradas e objetivamente protegidas, a análise da confusão passa do plano abstrato (questão de direito) ao plano concreto (questão de fato) e, assim, inerentemente dependente de prova.

Isso porque não se pode ignorar que, em alguns nichos mercadológicos, os produtos ou serviços são apresentados ao consumidor por meio de elementos comuns e bastante difundidos no mercado. Essa similaridade dispersa, ao contrário de configurar uma conduta anticompetitiva, resulta num benéfico acirramento da competição na medida em que facilita ao consumidor identificar as opções de produtos semelhantes existentes no mercado, para então concluir sua decisão em favor da marca que melhor lhe aprouver, seja pelo critério de preço, seja pelo critério de qualidade, seja por qualquer outro critério que eleja voluntariamente. Desse modo, por resultar em incremento à competição, a entrada de conjunto-imagem semelhante em mercado já assemelhado não deve ser obstada por meio de intervenção judicial. Esta deverá ser excepcional e sempre pautada pela verificação concreta de que se está diante de algo novo e peculiar a ponto de despertar o Estado de sua inércia, consequência da livre concorrência e da liberdade de iniciativa adotadas no Brasil.

Desse modo, para se caracterizar uma atitude anticompetitiva e desleal é imprescindível que a situação concreta demonstre um comportamento imprevisível aos olhos do mercado, o que não se pode reconhecer quando se utiliza elementos comuns, partilhados por uma multiplicidade de concorrentes no mesmo nicho do mercado. Daí esta Terceira Turma ter sublinhado que, nos casos de alegação de concorrência desleal pela utilização de conjunto-imagem assemelhado apta, em tese, a causar confusão nos consumidores, é imprescindível uma análise técnica que tome em consideração o mercado existente, o grau de distintividade entre os produtos concorrentes no meio em que seu consumo é habitual e ainda o grau de atenção do consumidor comum.

2. Alegação de violação do art. 333 do CPC⁄1973

Muito embora seja imprescindível a prova técnica em casos como o dos autos, em que se debate a violação de trade dress por confusão, o acórdão recorrido, ao dar provimento à apelação interposta pela recorrida, entendeu suficiente a aplicação de máximas da experiência para concluir pelo potencial danoso da aproximação visual das embalagens. É o que se evidencia do seguinte trecho (e-STJ, fl. 962):

b) O outro requisito se configura pela simples suscetibilidade de estabelecer confusão entre os produtos, logo, o uso de signos distintivos de forma semelhante é o suficiente para caracterizar uma confusão.
c) Quanto à imitação; ao contrário do que mencionou o apelante, acredito que a nítida semelhança na estilização da linha de produtos da marca nominativa CHOCOMILK se dê pela padronização e não pela má-fé de captar uma classe consumidora (requisito não-obrigatório à concorrência desleal). A padronização das embalagens [de produtos diferentes da mesma fornecedora] é uma técnica de marketing comum às empresas de produtos alimentícios, pois visa promover o aumento nas vendas dos outros segmentos dessa mesma linha.
Todavia, essa tentativa de padronização tornou os conjuntos de imagens empregados pelas partes confundíveis, prática esta que deve ser combatida.

Contudo, ao contrário do fundamentado no acórdão recorrido e na linha das considerações acima, inexistindo registro da embalagem em favor de algum dos litigantes, não se cogita da existência de um direito de exploração exclusiva, de modo que a vedação à utilização por alguma das partes depende mesmo da caracterização efetiva de ato de concorrência desleal. Nesses casos, em que a causa de pedir é exatamente a prática de atos anticoncorrenciais por meio da utilização de conjunto-imagem assemelhado e apto a causar confusão no mercado consumidor, deve-se reconhecer que o cerne do processo repousa em fato cuja caracterização depende, a priori, de conhecimento técnico especial não exigível de um juiz de direito, devendo, por isso, o juiz se servir do auxílio técnico de expert.

Deve-se enfatizar que a necessidade de prova técnica, ainda que passível de dispensa pelo juiz da causa e pelos graus ordinários de jurisdição, conforme reiterada jurisprudência desta Corte Superior, não pode ser afastada ao livre-alvedrio do Julgador, mas em situações justificadas e respaldadas em alguma das hipóteses taxativamente previstas no parágrafo único do art. 420 do CPC⁄1973, vigente à época, e repetidas no atual art. 464, § 1º, do CPC⁄2015.

No caso dos autos, todavia, nem sequer houve o pleito da recorrida, autora da presente ação, para produção de prova apta a demonstrar a existência da confusão entre os produtos concorrentes, o que a ela competia nos termos do art. 333, I, do CPC⁄1973. Ao contrário, na fase de especificação de provas e saneamento processual, a recorrida se manifestou, de forma expressa, pela desnecessidade de produção de provas adicionais de qualquer natureza. É o que se denota do seguinte trecho de sua petição (e-STJ, fls. 443):

5. Informa a Requerente, portanto, que não possui interesse na produção de provas adicionais, reservando-se, obviamente, ao direito de contraditar eventuais provas pleiteadas pela Requerida.

Por essa trilha, uma vez que a notória semelhança entre os dois produtos – reconhecida pelo TJ⁄PR – não é suficiente para caracterizar a concorrência desleal e que a prova técnica não foi oportunamente requerida (aliás, foi expressamente dispensada), a presente causa se resolve pela distribuição estática do ônus da prova, o qual recai, portanto, sobre a ora recorrida. Assim, não tendo a recorrida se desincumbido de provar o fato constitutivo de seu direito, qual seja, a existência de ato de concorrência desleal, deve mesmo ser provido o presente recurso para julgar improcedente a ação condenatória por ela proposta.

Com esses fundamentos, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para restabelecer a sentença proferida, fixando os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) do valor atualizado da causa.

É como voto.


Documento: 69689931  RELATÓRIO E VOTO