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quarta-feira, 4 de março de 2020

PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE NULIDADE DE MARCA.



RECURSO ESPECIAL Nº 1.832.148 - RJ (2019⁄0137378-9)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE: GOIÁS REFRIGERANTES S⁄A
ADVOGADOS: EURICO BARBOSA DOS SANTOS FILHO  - GO012702 - SILVERLENE OLIVA BARBOSA DOS SANTOS  - GO023224 
RECORRIDO:COCA COLA INDUSTRIAS LTDA
RECORRIDO:THE COCA COLA COMPANY
ADVOGADOS: PAULO PARENTE MARQUES MENDES  - RJ059313 - FELIPE BARROS OQUENDO  - RJ163788
 BÁRBARA ÂNGELA MOISÉS LEITÃO  - RJ207599
JOSÉ ROBERTO DE ALMEIDA JUNIOR  - RJ162697
INTERES.:INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

EMENTA - RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE NULIDADE DE MARCA. RENÚNCIA AO REGISTRO. EFEITOS EX NUNC. PERDA DO OBJETO DA AÇÃO. INOCORRÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO VERIFICADO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. SÚMULA 7⁄STJ. EMBARGOS DECLARATÓRIOS REITERADOS. INTUITO PROTELATÓRIO. APLICAÇÃO DA MULTA DO ART. 1.026, § 2º, DO CPC⁄15. REEXAME DE FATOS. SÚMULA 7⁄STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA NÃO DEMONSTRADA.
1. Ação ajuizada em 25⁄8⁄2014. Recurso especial interposto em 17⁄9⁄2018. Autos conclusos à Relatora em 17⁄6⁄2019.
2. O propósito recursal é verificar (i) se houve perda superveniente do objeto da ação; (ii) se o acórdão apresenta nulidade em razão do indeferimento da prova pericial postulada; (iii) se a fundamentação do aresto é suficiente para amparar as conclusões nele apostas; (iv) se a distribuição dos ônus sucumbenciais foi feita de acordo com as circunstâncias da espécie; e (v) se deve ser afastada a multa do art. 1.026, § 2º, do CPC⁄15.
3. Como os efeitos decorrentes da renúncia ao registro operam-se prospectivamente – ex nunc –, sua extinção por esse motivo não enseja a perda do objeto da ação que veicula pretensão de declaração de nulidade da marca, pois a invalidação produz efeitos ex tunc – a partir da data do depósito do pedido (art. 167 da LPI).  
4. O entendimento consolidado do STJ acerca da interpretação do conteúdo normativo dos arts. 130 e 131 do CPC⁄73 (arts. 370 e 371 do CPC⁄15) aponta no sentido que compete ao juiz a direção da instrução probatória, apreciando livremente as provas produzidas a fim de formar a sua convicção, não havendo que se falar na violação desses dispositivos legais quando o juiz, sopesando todo o conjunto probatório produzido e carreado aos autos, julga a causa em sentido oposto ao pretendido pela parte, como no particular. Precedente.
5. O acórdão recorrido apresenta fundamentação adequada, tendo os julgadores reconhecido, à unanimidade, com base nas circunstâncias específicas dos autos, a necessidade de invalidação da marca JOCA COLA, em face da similitude existente com a marca das recorridas (COCA-COLA).
6. Não há nulidade processual quando o Tribunal julga integralmente a lide e soluciona a controvérsia em conformidade com o que lhe foi apresentado. O julgador não é obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos trazidos pelas partes em defesa de suas teses, devendo, apenas, enfrentar a demanda observando as questões relevantes e imprescindíveis à sua resolução.
7. A análise da insurgência quanto aos critérios orientadores da distribuição e da quantificação dos honorários sucumbenciais esbarra no óbice da Súmula 7⁄STJ.
8. Evidenciado, pelo Tribunal a quo, o propósito manifestamente protelatório na oposição de três embargos de declaração, é imperativa a aplicação da multa prevista no art. 1.026, § 2º, do CPC⁄15.
9. A análise do dispositivo precitado demandaria, no particular, reexame do conjunto fático dos autos, o que é inviável em recurso especial, sob pena de violação da Súmula 7⁄STJ.
10. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico entre acórdãos que versem sobre situações fáticas idênticas.
RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.




ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Dr(a). JHONES FERREIRA DA SILVA, pela parte RECORRIDA: COCA COLA INDUSTRIAS LTDA.
Brasília (DF), 20 de fevereiro de 2020(Data do Julgamento)


MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Documento: 106534203          EMENTA / ACORDÃO   - DJe: 26/02/2020

quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Prédio registrado com o nome Recreio Natura não viola direito de propriedade da Natura Cosméticos








A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou um recurso da Natura Cosméticos contra o registro de um prédio com o nome Recreio Natura, na cidade de São Paulo, por entender que a exclusividade conferida pelo direito marcário se limita às atividades empresariais, sem atingir os atos civis como o registro do nome de um edifício ou condomínio.



A Natura Cosméticos ajuizou ação para impedir que o prédio usasse o nome Recreio Natura, por entender que tal registro violaria direito de propriedade industrial de sua titularidade.



O pedido da Natura foi rejeitado em primeira e segunda instâncias. Na sentença, o juiz afirmou que "nome de condomínio não é marca", e por isso não haveria violação.



O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), ao analisar a apelação, afirmou que o ato civil de registrar o nome de um edifício como Recreio Natura não torna esse ato comercial, não caracterizando depreciação ou prejuízo da marca.



No recurso especial, a Natura afirmou que sua marca goza de proteção especial em todos os ramos de atividade, e não está sujeita ao princípio da especialidade.



Alto renome



Segundo o autor do voto vencedor na Terceira Turma, ministro Moura Ribeiro, embora o princípio da especialidade não se aplique às marcas de alto renome – caso da Natura –, a proteção conferida pela Lei de Propriedade Industrial não abrange o nome atribuído a edifícios ou outros empreendimentos imobiliários.



Ele explicou que a marca é parte do patrimônio da empresa, designativa de um produto ou serviço – situação diversa dos nomes dados a prédios e condomínios.



  • "Os nomes atribuídos aos edifícios e empreendimentos imobiliários não gozam de exclusividade, sendo comum receberem idêntica denominação e, por isso, proliferam as homonímias, sem que um condomínio possa impedir o outro de receber idêntica denominação", explicou Moura Ribeiro.



Para o magistrado, esses nomes não qualificam produtos ou serviços, "apenas conferem uma denominação para o fim de individualizar o bem", situação diversa do nome empresarial – o qual, de acordo com o artigo 1.163 do Código Civil, deve-se distinguir de qualquer outro nome já registrado.



  • "A proteção à exclusividade da marca ou do nome empresarial é criação do direito, sendo, portanto, uma opção legislativa. Tal conceito jurídico exerce uma função e, por isso, presta-se a determinadas finalidades. O nome que individualiza um imóvel é de livre atribuição pelos seus titulares e não requer criatividade ou capacidade inventiva, tampouco lhe é conferido o atributo da exclusividade", afirmou Moura Ribeiro.



Atos distintos



O ministro destacou entendimento do doutrinador português José de Oliveira Ascensão, adotado pelo STJ no Recurso Especial 862.067, sobre a distinção entre o ato civil de registro de um prédio e o ato comercial do registro de nomes e marcas.



Segundo aquele jurista, nem mesmo as marcas de alto renome podem interferir na liberdade de nomear edifícios ou condomínios com qualquer expressão.



"Em suma, o registro de uma expressão como marca, ainda que de alto renome, não afasta a possibilidade de utilizá-la no nome de um edifício", concluiu o ministro.



RECURSO ESPECIAL Nº 1.804.960 - SP (2019/0080321-7) RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO MOURA RIBEIRO RECORRENTE : NATURA COSMÉTICOS S/A

RECORRENTE : INDUSTRIA E COMERCIO DE COSMETICOS NATURA LTDA.

ADVOGADOS : ANTONIO FERRO RICCI - SP067143

PEDRO HENRIQUE FORMAGGIO JORGE - SP299714

CARLOS EDUARDO NELLI PRINCIPE - SP343977

RECORRIDO : ROSSI RESIDENCIAL SA

ADVOGADO : NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES E OUTRO(S) - SP128341



EMENTA - RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE ABSTENÇÃO DE USO DE MARCA E DE REPARAÇÃO DE DANOS. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. MARCA DE ALTO RENOME “NATURA”. EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO DENOMINADO “RECREIO NATURA”. DISTINÇÃO ENTRE ATO CIVIL E ATO EMPRESARIAL. RECURSO NÃO PROVIDO.



  • 1. Inexistindo omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido, a rejeição dos embargos de declaração contra ele interpostos não configura negativa de prestação jurisdicional.


  • 2. O propósito recursal visa analisar se houve violação ao art. 125 da Lei nº 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial), que confere proteção especial às marcas de alto renome, no caso a marca “NATURA”, diante do seu uso no empreendimento imobiliário “RECREIO NATURA”.



  • 3. A marca é um sinal distintivo que tem por funções principais identificar a origem e distinguir produtos ou serviços de outros idênticos, semelhantes ou afins.



  • 4. Os nomes atribuídos aos edifícios e empreendimentos imobiliários não gozam de exclusividade, sendo comum receberem idêntica denominação. Estes nomes, portanto, não qualificam produtos ou serviços, apenas conferem uma denominação para o fim de individualizar o bem.



  • 5. A proteção à exclusividade da marca é criação do direito, sendo, portanto, uma opção legislativa. O nome que individualiza um imóvel é  de livre atribuição pelos seus titulares e não requer criatividade ou capacidade inventiva, tampouco lhe é conferido o atributo da exclusividade.



  • 6. O registro de uma expressão como marca, ainda que de alto renome, não afasta a possibilidade de utilizá-la no nome de um edifício. A exclusividade conferida pelo direito marcário se limita as atividades empresariais, sem atingir os atos da vida civil.



  • 7. Recurso especial não provido.



ACÓRDÃO

Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Moura Ribeiro, vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, em negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Moura Ribeiro, que lavrará o acórdão.



Vencida a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Votaram com o Sr. MINISTRO

MOURA RIBEIRO, os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas



Cueva e Marco Aurélio Bellizze.

Brasília, 24 de setembro de 2019(Data do Julgamento)

MINISTRO MOURA RIBEIRO

Relator




Restaurante tradicional vence disputa pelo nome Bar do Alemão no interior paulista


 

Fonte: STJ - Superior Tribunal de Justiça

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão de segunda instância que impediu uma empresa de Campinas (SP), a Parmegiana Factory, de usar o nome Bar do Alemão – registrado há mais de 30 anos por outra empresa, que possui restaurantes naquela cidade e em Itu, na mesma região.

O colegiado entendeu que a marca desfruta de amplo reconhecimento e prestígio perante o público, havendo no processo provas da confusão causada pelo uso da expressão idêntica por parte do outro restaurante.

Segundo os autos, a Parmegiana Factory Campinas Comércio de Alimentos Ltda. passou a atuar no mesmo ramo de atividade que a Steiner & Cia. Ltda. – detentora da marca Bar do Alemão –, comercializando o prato pelo qual essa empresa é famosa entre seus consumidores (filé à parmegiana), em um estabelecimento também chamado Bar do Alemão.

Uso comum

A sentença proibiu a Parmegiana Factory de utilizar a marca, sob pena de multa diária, e condenou-a a pagar indenização de R$ 20 mil por danos morais e de R$ 20 mil por danos materiais. Em segundo grau, os danos materiais foram reduzidos a 20% do faturamento com a venda do filé à parmegiana, limitados a R$ 20 mil.

No recurso especial, a Parmegiana Factory alegou que a expressão adotada na marca é de uso comum, razão pela qual seria possível o convívio entre os restaurantes com o mesmo nome. Afirmou ainda que, antes do ajuizamento da ação, havia depositado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) o pedido de registro da marca Bar do Alemão Parmegiana Factory – o que lhe garantiria o direito de utilizá-la.

Marca fraca

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, disse que, no caso de marca com baixo grau de distintividade, o STJ entende que a exclusividade conferida ao titular do registro pode ser mitigada. Assim, quem optou por uma marca considerada fraca pode ter de suportar o ônus da coexistência com marca semelhante.

No entanto, segundo ela, mesmo que se reconheça que a expressão Bar do Alemão é marca fraca, isso não significa, por si, a licitude do uso de nome idêntico pela Parmegiana Factory. "Mesmo às marcas dotadas de baixa distintividade é assegurada proteção contra atos de concorrência desleal ou aproveitamento parasitário, situações que ficam evidenciadas a partir da constatação de que o consumidor esteja sendo confundido quanto ao produto adquirido ou quanto à sua origem comercial", declarou a relatora.

Para Nancy Andrighi, possibilitar o uso simultâneo do nome Bar do Alemão por empresas que atuam no mesmo segmento subverteria as principais funções da marca, pois impediria que se pudesse diferenciar um produto ou serviço do outro, levando a equívocos acerca de sua procedência, em evidente prejuízo do público.

Associação indevida

"Havendo possibilidade de associação indevida ou de confusão quanto à origem comercial do produto ou serviço, não há como se reconhecer que marcas semelhantes possam coexistir num mesmo segmento de mercado", afirmou.

A ministra destacou trechos da sentença e do acórdão recorrido, segundo os quais ficou demonstrado que os consumidores foram, de fato, confundidos pelo uso da marca pelas duas empresas.

Segundo a relatora, a impossibilidade de uso simultâneo da marca é corroborada pela informação de que o INPI indeferiu, no último dia 10, o pedido de registro apontado no recurso especial, "justamente por constatar que a expressão Bar do Alemão Parmegiana Factory reproduz ou imita, indevidamente, diversas marcas anteriormente registradas, entre elas a de titularidade da recorrida".

RECURSO ESPECIAL Nº 1.778.887 - SP (2018/0295785-2)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : PARMEGIANA FACTORY CAMPINAS COMERCIO DE ALIMENTOS
LTDA
ADVOGADOS : CRISTIANO ARAUJO CATEB E OUTRO(S) - MG104687
DIEGO ANDRADE VIDAL - MG146198
RECORRIDO : STEINER & CIA LTDA
ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS GONÇALVES JUNIOR E OUTRO(S) - SP107645
ANTÔNIO BENTO DE SOUZA - SP123814
CELINO BENTO DE SOUZA - SP108745
MARCELO ANTONIO DA SILVA - SP258216
JOICE MARTINS DE OLIVEIRA - SP236393

EMENTA - RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE ABSTENÇÃO DE
USO DE MARCA E INDENIZATÓRIA. DIREITO DE EXCLUSIVIDADE. MARCA
FORMADA POR EXPRESSÃO DE USO COMUM. CONCORRÊNCIA DESLEAL.
SÚMULA 7/STJ.

  • 1. Ação distribuída em 30/6/2015. Recurso especial interposto em 9/2/2018.
  •  
  • Autos conclusos à Relatora em 4/12/2018.
  •  
  • 2. O propósito recursal é verificar se o uso da expressão BAR DO ALEMÃO, em estabelecimento comercial da recorrente, viola direitos titularizados pela recorrida sobre marca constituída pelos mesmos termos.
  •  
  • 3. Tratando-se de marca que apresenta baixo grau de distintividade, este Tribunal tem reconhecido que a exclusividade conferida ao titular do registro pode comportar mitigação, a depender da verificação de outros elementos que confirmem a não ocorrência de violação aos ditames da legislação de regência.
  •  
  • 4. O âmbito de proteção de uma marca é delimitado, acima de tudo, pelo risco de confusão ou associação que o uso de outro sinal, designativo deproduto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, possa ser capaz de causar perante o consumidor.
  •  
  • 5. Possibilitar o uso simultâneo de sinais distintivos compostos pelos mesmos elementos nominativos por empresas que atuam no mesmo segmento de atividade, como na espécie, subverteria as principais funções marcárias, pois: (i) impediria que se pudesse diferenciar um produto ou serviço de outro, prejudicando a concorrência; e (ii) obstaria o reconhecimento da origem comercial do produto ou serviço adquirido, levando a equívocos acerca de sua procedência, em evidente prejuízo ao público consumidor.
  • Precedente.
  •  
  • 6. Hipótese concreta em que a marca da recorrida, registrada há mais de 30 anos, desfruta de amplo reconhecimento e prestígio perante o público consumidor, havendo provas concretas nos autos, segundo os juízos de origem, acerca da confusão causada pelo uso de expressão idêntica pela recorrente, que passou a atuar no mesmo ramo de atividades (restaurante) para comercializar o famoso prato pelo qual a titular da marca violada é identificada pelos consumidores (filé a parmegiana).

RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS. ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, com majoração de honorários advocatícios, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 24 de setembro de 2019(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora


sábado, 12 de outubro de 2019

É inegável a crescente importância da proteção aos elementos imateriais da empresa, entre os quais o nome empresarial, o nome de fantasia, a marca, a embalagem e o conjunto-imagem (trade dress) constituem importantes elementos de atração do consumidor e identificação dos produtos e seus fabricantes.


RECURSO ESPECIAL Nº 1.353.451 - MG (2012⁄0239555-2)


RELATÓRIO


O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:

Cuida-se de recurso especial interposto por Fábrica de Tecidos São João Evangelista S.A. fundamentado nas alíneas a e c do permissivo constitucional.

Depreende-se dos autos que Companhia Manufatora de Tecidos de Algodão propôs ação de obrigação de não fazer cumulada com reparação de danos na modalidade lucros cessantes e compensação de danos morais contra a recorrente.

Em sua inicial, sustentou ser titular da marca APOLO de algodão hidrófilo e derivados, cujos produtos seriam comercializados em embalagens especialmente desenvolvidas com padrão de cores e design afeitos à marca. Asseverou que a recorrente, sua concorrente no mesmo segmento de mercado há longa data, sob a marca FAROL, passou, repetinamente, a utilizar embalagens que faziam "clara alusão ao produto" (e-STJ, fl. 7) da recorrente.

Em sentença, o pedido foi julgado parcialmente procedente, a fim de condenar a recorrente a se abster "de comercializar o produto algodão hidrófilo (em caixa), com a marca 'FAROL', que imite a embalagem de idêntico produto da marca 'APOLO', sob pena de multa a ser fixada por este juízo, em caso de descumprimento" (e-STJ, fl. 444), bem como a pagar indenização a título de perdas e danos, a serem liquidadas por arbitramento.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em julgamento de apelações oportunamente interpostas por ambas as partes, negou provimento ao recurso da recorrente e deu provimento ao recurso da recorrida, nos termos da seguinte ementa (e-STJ, fl. 563):
AÇÃO ORDINÁRIA - CERCEAMENTO DE DEFESA - PRELIMINAR AFASTADA - CONCORRÊNCIA DESLEAL CONFIGURADA - SIMILARIDADE ENTRE AS EMBALAGENS DOS PRODUTOS POSTOS NO MERCADO - DETERMINAÇÃO DE ABSTENÇÃO DE COMERCIALIZAÇÃO - DANO MATERIAL DEVIDO - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - FIXAÇÃO DO QUANTUM - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. - Em matéria de colheita de provas, predomina prudente discrição do magistrado no exame da pertinência das provas requeridas ou não, para a formação do convencimento ante as circunstâncias de cada caso concreto. - Restando evidenciada a concorrência desleal, é procedente o pedido para que a demandada se abstenha de comercializar os produtos com embalagem semelhante à da autora. - Diagnosticada a contrafação e o comportamento reprovável da ré ao obrar em concorrência desleal, a indenização por reparação patrimonial é medida que se impõe. - Independentemente da qualidade do produto contrafeito, o consumidor é enganado e tem subtraída, de forma ardil, sua faculdade de escolha. Ele adquire o produto imbuído em erro, acreditando estar comprando o produto original e de determinada marca, o que ocasiona, por ricochete, usurpação de parte da identidade do fabricante, gerando lesão aos direitos da personalidade. - Tratando-se de ação condenatória, a verba honorária deve ser arbitrada com base no art. 20, §3º, do CPC.


Opostos dois embargos de declaração, ambos foram rejeitados.

Nas razões do recuso especial, alega a violação dos arts. 128, 333, 420, 460 e 535 do CPC⁄1973; 2º, 122, 123, 128, 131, 132, 195, 208, 209 e 210 da Lei n. 9.279⁄1996; e 186, 187 e 297 do CC⁄2002, bem como dissídio jurisprudencial.

  • Em síntese, a recorrente sustenta que a ausência de registro da embalagem, bem como dos signos distintivos nela utilizados perante o INPI inviabiliza a proteção pretendida nesta demanda. Conclui que não havendo registro, não há proteção marcária. Assevera ainda que era necessária a produção de prova pericial requerida, a fim de verificar, concretamente, a possibilidade de confusão dos consumidores diante das embalagens confrontadas, de modo que o indeferimento da prova requerida configurou cerceamento de defesa, em especial por se tratar de nicho em que as embalagens são assemelhadas. Afirma, por fim, a inexistência de presunção de danos morais, uma vez que não se trata de caso de contrafação de produtos, mas de uso de desenho gráfico não registrado e que, na eventualidade de ser mantida a condenação, os valores arbitrados em R$ 30.000,00 (trinta mil reais) é exacerbado, impondo-se sua redução.


Foram apresentadas as contrarrazões (e-STJ, fls. 699-718).

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.353.451 - MG (2012⁄0239555-2)


VOTO


O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE(RELATOR):

Cinge-se a controvérsia a verificar, a par da adequação da prestação jurisdicional entregue, a extensão da proteção assegurada ao conjunto-imagem de produto ou serviço (trade dress) no que tange à caracterização de danos morais e patrimoniais.

1. Alegação de violação dos arts. 128, 460 e 535 do CPC⁄1973

No que se refere à alegada negativa de prestação jurisdicional adequada, assevera a recorrente que o Tribunal de origem teria deixado de enfrentar os seguintes pontos:

i) dies ad quem das astreintes, uma vez que no curso da demanda houve alteração da embalagem impugnada;

ii) a inexistência do registro do trade dress da embalagem de algodão, o que afastaria a tutela jurisdicional para sua proteção; e

iii) a impossibilidade de presunção de dano moral em razão da suposta violação a direito de marca.

Com efeito, verifica-se que todos as questões apontadas como omissas encontram-se imbricadas com o próprio mérito do presente recurso.

Isso porque, na hipótese dos autos, afigura-se imprescindível a definição jurídica do pressuposto do registro e da espécie de direito lesado, a fim de se aquilatar a real necessidade de devolução dos autos ao Tribunal de origem para adequação da tutela jurisdicional.

2. Proteção ao conjunto-imagem (trade dress)

O trade dress ou conjunto-imagem, apesar de não ser questão inédita nesta Corte Superior, é ainda um tema consideravelmente novo e que tem suscitado diversos questionamentos em sede jurisdicional e doutrinária. Isso porque, a despeito de seu reconhecimento pelos Tribunais brasileiros, não há na nossa legislação sua definição, tampouco a previsão dos requisitos necessários para sua proteção ou a previsão clara de sanção na hipótese de eventual lesão.

  • Com efeito, um rápido levantamento da jurisprudência do STJ acerca do tema demonstra que, na maioria dos casos, a caracterização de afronta ao conjunto-imagem tem sido decidida, caso a caso, pelos Tribunais locais. Por consequência, esta Corte Superior tem se restringido a manter as conclusões dos acórdãos diante da inevitável incidência do óbice do enunciado n. 7 da Súmula do STJ. Nesse sentido, cita-se os seguintes acórdãos: REsp n. 1.306.690⁄SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 23⁄4⁄2012; REsp n. 1.284.971⁄SP, Rel. Min. Massami Uyeda, Terceira Turma, DJe 4⁄2⁄2013; e AgRg no REsp n. 1.391.517⁄SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 2⁄3⁄2015; além de decisões monocráticas, entre as quais: AgRg no AREsp n. 523.706⁄SP, Rel. Min. Marco Buzzi, de 16⁄12⁄2016; AREsp n. 969.085⁄SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, de 20⁄9⁄2016; AREsp n. 515.146⁄SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, de 9⁄9⁄2016; AREsp n. 963.276⁄SP, Rel. Min. Raul Araújo, de 8⁄9⁄2016; Resp n. 1.354.609⁄SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, de 5⁄8⁄2016; AREsp n. 527.000⁄SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, de 1º⁄7⁄2016; AREsp n. 688.881⁄SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, de 11⁄5⁄2015.


Esses reiterados julgamentos deixam evidente, por um lado, o reconhecimento da proteção jurisdicional ao conjunto-imagem e, por outro, que a caracterização de sua violação deve se assentar sobre um conjunto fático-probatório que, a princípio, inviabilizaria o controle por esta Corte Superior. Contudo, verifica-se que, diante da lacuna regulatória, os fatos concretos levados em consideração pelas Cortes locais não guardam um padrão, de modo a impor atuação do STJ no sentido de  balizar e uniformizar a atuação jurisdicional.

É inegável a crescente importância da proteção aos elementos imateriais da empresa, entre os quais o nome empresarial, o nome de fantasia, a marca, a embalagem e o conjunto-imagem (trade dress) constituem importantes elementos de atração do consumidor e identificação dos produtos e seus fabricantes. Esse patrimônio imaterial, para além de contribuir na captação de clientes, afeta de forma direta o desenvolvimento e sucesso de diversos empreendimentos, modulando seu prestígio no mercado consumidor. Não é à toa que o constituinte previu de forma expressa a proteção desses direitos no art. 5º, XXIX, da Constituição Federal:

  • XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País;



Nesse cenário, deve-se frisar que o conjunto-imagem, objeto do presente recurso, distingue-se dos institutos denominados marca e desenho industrial, muito embora possa ser formado pela utilização conjunta de ambos, acrescidos, ou não, de outros elementos visuais. Essa distinção é imprescindível para se divisar o tratamento jurídico dispensado a cada caso e as consequências advindas de condutas anticompetitivas praticadas em desrespeito a marca, desenho industrial ou conjunto-imagem. Com efeito, tem-se percebido uma confusão nas cortes locais quanto à utilização desses conceitos, como denuncia recente artigo de José Carlos Tinoco Soares (O emprego inadequado do termo trade dress. in Revista da ABPI, n. 144, set⁄out 2016, p. 3-15).

De fato, os três institutos - marca, desenho industrial e conjunto-imagem - têm, em comum, a finalidade mediata de designar um produto, mercadoria ou serviço, diferenciando-o dos concorrentes. Apesar da finalidade assemelhada, trata-se de institutos independentes.

Enquanto a marca é um sinal que designa a origem do produto, mercadoria ou serviço, o desenho industrial "protege a configuração externa de um objeto tridimensional ou um padrão ornamental (bidimensional) que possa ser aplicado a uma superfície ou a um objeto", conforme esclarece o próprio INPI (http:⁄⁄www.inpi.gov.br⁄menu-servicos⁄desenho⁄desenho-industrial-mais-informacoes). Noutros termos, enquanto a marca cria um vínculo duradouro entre o bem e a pessoa que o colocou em circulação, o desenho industrial insere no mercado uma inovação estética em objeto comum ou facilmente reproduzível em escala industrial. Essa distinção, apesar de parecer sutil, resulta numa gritante diferença quanto à proteção e aos requisitos para sua tutela legal.

Assim, as marcas, para serem registradas, devem atender à distintividade ou novidade relativa, ou seja, dentro do mercado em que se insere o produto, o sinal visivelmente perceptível deve se distanciar do domínio comum, a fim de propiciar a utilização comercial exclusiva por seu titular. Esta fruição exclusiva, que será assegurada por meio do registro,  pode se estender indefinidamente no tempo, desde que promovidas as tempestivas prorrogações. Isso porque o direito de exclusividade da marca tem por escopo assegurar ao consumidor a correspondência entre o produto designado e a empresa que o colocou em circulação.

Já o desenho industrial, por se caracterizar em uma inovação estética facilmente reproduzível em escala industrial, a partir de sua publicidade, passa a integrar o estado da técnica. Nota-se, portanto, que o desenvolvimento de desenhos industriais movimenta-se, ao longo do tempo, numa crescente, podendo ser posteriormente incorporada pelos produtos de seus concorrentes de forma lícita e regular. Ao seu desenvolvedor (autor) é assegurado, mediante registro, o direito de exploração exclusiva, porém temporária (até, no máximo, 25 anos), nos termos do art. 108 da Lei n. 9.279⁄1996:
Art. 108. O registro vigorará pelo prazo de 10 (dez) anos contados da data do depósito, prorrogável por 3 (três) períodos sucessivos de 5 (cinco) anos cada.


Deve-se sublinhar que não são protegidos pelo registro de desenho industrial inovações que resultem em funcionalidades, vantagens práticas, materiais ou formas de fabricação - bens industriais protegidos por meio de patentes. Assim, o escopo imediato do instituto é a geração de incentivo à inovação estética, e a distintividade é dada em relação ao próprio bem, sem o estabelecimento de um vínculo com aquele que introduz essa inovação no mercado.

Em síntese, do ponto de vista do consumidor, a marca identifica o produtor⁄fornecedor, enquanto o desenho industrial identifica o próprio bem, que poderá vir a ser regularmente produzido por terceiros após o prazo de validade de seu registro.

Por sua vez, o denominado trade dress, não disciplinado na legislação nacional atual, tem por finalidade proteger o conjunto visual global de um produto ou a forma de prestação de um serviço. Materializa-se, portanto, pela associação de variados elementos que, conjugados, traduzem uma forma peculiar e suficientemente distintiva de inserção do bem no mercado consumidor, vinculando-se à identidade visual dos produtos ou serviços.

Sua proteção vem sendo assegurada com fundamento no dever geral de garantia de livre mercado, ou seja, no dever estatal de assegurar o funcionamento saudável do mercado, de forma a expurgar condutas desleais tendentes a criar distorções de concorrência. Nesse cenário, dispôs o legislador, no art. 209 da LPI, o direito do prejudicado pela prática de concorrência desleal ao ressarcimento dos prejuízos materiais decorrentes, bem como o respectivo poder-dever de determinar a sustação de eventual violação aos diretos de propriedade industrial atribuído ao Estado-juiz. In verbis:
Art. 209. Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os produtos e serviços postos no comércio.
§ 1º Poderá o juiz, nos autos da própria ação, para evitar dano irreparável ou de difícil reparação, determinar liminarmente a sustação da violação ou de ato que a enseje, antes da citação do réu, mediante, caso julgue necessário, caução em dinheiro ou garantia fidejussória.


Os limites concorrenciais, no quanto se entrelaçam ao direitos de propriedade industrial, introduzem conceitos e vetores imprescindíveis para a definição da amplitude da proteção da propriedade industrial. Não podem, porém, servir de discurso para chancelar o prolongamento temporal da proteção de inventos e desenhos industriais para além dos prazos estabelecidos em lei, tampouco dar proteção de maior envergadura que aquela legalmente estabelecida para bens equivalentes. Noutros termos, não se pode admitir que a pretexto de se proteger o conjunto-imagem de um produto, se assegure o uso exclusivo e indeterminado de uma determinada funcionalidade não registrada, por exemplo.

Assim, o diálogo entre concorrência e direitos exclusivos decorrentes de propriedades industriais é limitado e somente justificará a intervenção do Judiciário para afastar as condutas concorrenciais que desbordem a razoabilidade da disputa legítima, encontrando suas balizas ora na confusão do consumidor decorrente de imitação desleal, ora na usurpação de vantagem alheia decorrente da associação de seu produto ou serviço com a prestação de seu concorrente, situação em que é notório o intuito de "pegar carona" no sucesso obtido pelo investimento de outrem, e não para meramente assegurar um direito de exploração exclusiva a bem não registrado na forma legalmente exigida.

Tendo em vista que, na hipótese dos autos, a recorrida deixou evidente que sua causa de pedir se funda na confusão de seus consumidores (petição inicial à fl. 8, e-STJ) será esta a hipótese de concorrência desleal examinada no presente julgamento, ressalvando-se para outra oportunidade a perquirição necessária sobre os limites resultantes da utilização de associação desleal.

Ao se analisar a confusão entre marcas, Gama Cerqueira, na década de 1980, propunha a necessidade de se levar em conta, para além das semelhanças de apresentação do produto, o grau de atenção do consumidor comum, a natureza do produto e o meio em que seu consumo era habitual (Tratado de propriedade industrial, 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982, v. 2, p. 919), sustentando tratar-se sempre de matéria fática.

Com efeito, ao se enfocar a pretensão de registro de sinal como marca e a proteção exclusivamente marcária, a análise fica adstrita à demonstração de uma distintividade relativa, resultante do confronto com os demais signos registrados em determinada classe. Este exame é realizado em abstrato e levado a cabo pelo órgão técnico competente, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI. Isso porque o potencial de confusão entre marcas depositadas para registro, será analisado a priori e levará em consideração tão somente o signo cujo registro é pretendido e o confronto com os demais preexistentes no mesmo ramo mercadológico, o que se afasta da lição clássica de Gama Cerqueira. Nesse sentido, posicionava-se o saudoso prof. Denis Borges Barbosa (Proteção das marcas: uma perspectiva semiológica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 87-88).

É verdade também que, àquela época, ainda não se debatia a proteção ao trade-dress tampouco se distinguia este dos demais institutos da propriedade industrial. De fato, a proteção ao conjunto-imagem tem origem temporal recente, ganhando contornos jurídicos próprios a partir de decisão da Suprema Corte Norte-Americana de 1992, no caso Taco Cabana, Inc. vs. Two Pesos, Inc (SOARES, José Carlos Tinoco. O emprego inadequado do termo trade dress. in Revista da ABPI, n. 144, set⁄out 2016, p. 5).

Assim, os critérios propostos por Gama Cerqueira parecem insuficientes e superados para o tratamento de conflito de marcas, seja em virtude da sofisticação do mercado global, em especial, em razão da difusão de condutas parasitárias por associação, seja pela praxe desenvolvida a partir da adoção do sistema marcário atributivo. Contudo, deve-se reconhecer que se tratam de critérios relevantes, ainda hoje, para a avaliação da confusão concreta implantada no espírito dos consumidores, especialmente nos casos de confronto de conjunto-imagem. Nesses casos, a argumentação transborda o mero confronto de marcas para alcançar a impressão global experimentada pelos consumidores diante de determinados produtos, a fim de averiguar a possibilidade concreta de induzi-los em erro.

Com efeito, os parâmetros anunciados por Gama Cerqueira já introduziam a importância fundamental dos elementos laterais à marca para captura da atenção e do interesse do público-alvo no momento do posicionamento de produtos no mercado. Nesse contexto, deve-se transpor a fronteira da questão de direito marcário para se adentrar ao campo fático da concorrência desleal, uma vez que se contrapõem marcas dessemelhantes ostensivamente utilizadas, como no caso dos autos, porém se alega que a imagem global do produto é capaz de implantar no imaginário do consumidor a confusão entre os produtos concorrentes.

Daí se extrai o destaque dado ao grau de atenção do consumidor-médio de um produto específico no momento em que é chamado a tomar a decisão de consumir.

Aqui parece ser relevante se reconhecer que, em alguns nichos mercadológicos, os produtos ou serviços são apresentados ao consumidor por meio de elementos comuns e bastante difundidos no mercado. Essa similaridade dispersa, ao contrário de configurar uma conduta anticompetitiva, resulta num benéfico acirramento da competição na medida em que facilita ao consumidor identificar as opções de produtos semelhantes existentes no mercado, para então concluir sua decisão em favor da marca que melhor lhe aprouver, seja pelo critério de preço, seja pelo critério de qualidade, seja por qualquer outro critério que eleja voluntariamente.

Aliás, a exigência do grau de distintividade parece ser uma constante na proteção de símbolos relacionados à exploração de bens de consumo de massa, conforme formulada pela Teoria da Distância alemã, de ampla aceitação na União Europeia, ou nas regras do direito norte-americano, onde também é exigida a distintividade. Nesse sentido, Geert W. Seelig afirma que as marcas muitas vezes idênticas ou semelhantes são usadas em áreas de atividade afim. Em geral, nesses casos, o público usuário está habituado à coexistência das marcas e presta mais atenção às diferenças entre elas. Se, posteriormente, são adicionadas novas marcas ainda semelhantes, não há confusão com as existentes, porque o consumidor já tem o hábito de prestar atenção às diferenças, ainda que pequenas, e, portanto, sabe distingui-las. A consequência deste processo é que o risco de confusão entre as marcas diminui." (apud BARBOSA, Dênis Borges. Da confusão e da associação em matéria de marcas. Disponível em  <http:⁄⁄www.denisbarbosa.addr.com⁄ arquivos⁄novidades⁄marca_de_industria.pdf>, acessado em 7⁄8⁄2017).

Com efeito, por incrementar a competição, a entrada de conjunto-imagem semelhante em mercado já assemelhado não deve ser obstada por meio de intervenção judicial. Esta deverá ser excepcional e sempre pautada pela verificação concreta de que se está diante de algo novo e peculiar a ponto de despertar o Estado de sua inércia, consequência da livre concorrência e da liberdade de iniciativa adotadas no Brasil.

Desse modo, para se caracterizar uma atitude anticompetitiva e desleal é imprescindível que a situação concreta demonstre um comportamento imprevisível aos olhos do mercado, o que não se pode reconhecer quando se utiliza elementos comuns, partilhados por uma multiplicidade de concorrentes no mesmo nicho do mercado. Nesses casos, ao contrário, a busca de proteção contra um novo competidor é que caracterizará um comportamento imprevisível a denunciar uma conduta anticompetitiva que pretende tão somente dificultar o incremento da competição. Afinal, por que se indignar com um competidor quando tantos outros se utilizam dos mesmos elementos e de trade dress similar?

Em razão dessas nuances trazidas, diferentemente das questões de confrontação de marca, em que, de regra, basta o cotejo de marca a marca, no caso de tutela da concorrência, o exame técnico é recomendável.

Enfatiza-se que no confronto de marca há um registro formal com data específica, que marca o início da proteção e da utilização exclusiva, de modo que em regra é suficiente o confronto entre ambas a fim de verificar a existência de cópia ou similitude. Por sua vez, no caso de tutela da concorrência, o exame acaba sendo mais amplo, devendo se adentrar à situação fática do mercado e à possibilidade real de confusão, e não mais se fazendo suficiente o mero potencial de confusão em razão da semelhança que é atraído pela presunção iuris tantum decorrente do registro perante o INPI e do sistema atributivo adotado pela Lei n. 9.279⁄1996. Daí a necessidade de conhecimento técnico para se avaliar o efeito real da entrada no mercado de produto ou serviço visualmente assemelhado, o que configura o ato de concorrência desleal que dá causa às pretensões de proteção do trade dress.

3. Alegação de violação dos arts. 333 e 420 do CPC⁄1973

No que tange à necessidade de produção de prova pericial, nota-se que o acórdão recorrido enfrentou o tema de forma direta, concluindo pela manutenção do indeferimento da perícia técnica ao fundamento unânime de sua desnecessidade para demonstrar a notória semelhança visual entre as embalagens dos produtos de ambas as litigantes. Acrescentou-se, ainda, que a dispersão de embalagens semelhantes seria juridicamente irrelevante. O voto condutor assim fundamentou (e-STJ, fl. 569):
Demais disso, não se pode antever aceitável a embalagem da ré porque haveria outras embalagens semelhantes àquela no mercado. Ora, embora as embalagens das outras concorrentes possuam características que as diferenciam daquela da demandada e da autora, não se poderia aceitar o argumento de que, havendo certa semelhança entre todas, inexistiria, por si só, concorrência desleal, ou melhor, pelo fato de outras empresas, em tese, exercerem concorrência desleal, a ré estaria eximida de qualquer responsabilidade nesse âmbito.
De outra banda, ainda que conste do Parecer Técnico da ABTG (Associação Brasileira de Tecnologia Gráfica), que as cores e os demais elementos das embalagens são diferentes, é importante registrar que tal análise foi feita de forma técnica, o que nenhum consumidor faz ao adquirir o produto.


Contudo, ao contrário do fundamentado no acórdão recorrido e na linha das considerações acima, inexistindo registro da embalagem em favor de algum dos litigantes, não se cogita da existência de um direito de exploração exclusiva, de modo que a vedação à utilização por alguma das partes depende mesmo da caracterização efetiva de ato de concorrência desleal. Nesses casos, em que a causa de pedir é exatamente prática de atos anticoncorrenciais por meio da utilização de conjunto-imagem assemelhado e apto a causar confusão no mercado consumidor, deve-se reconhecer que o cerne do processo repousa em fato cuja caracterização depende, a priori, de conhecimento técnico especial não exigível de um juiz de direito, devendo, por isso, o juiz se servir do auxílio técnico de expert.

Deve-se enfatizar que a necessidade de prova técnica, ainda que passível de dispensa pelo juiz da causa e pelos graus ordinários de jurisdição, conforme reiterada jurisprudência desta Corte Superior, não pode ser afastada ao livre-alvedrio do Julgador, mas em situações justificadas e respaldadas em alguma das hipóteses taxativamente previstas no parágrafo único do art. 420 do CPC⁄1973, vigente à época, e repetidas no atual art. 464, § 1º, do CPC⁄2015. E, uma vez verificado que a justificativa apontada para seu afastamento não corresponde àquelas hipóteses, estar-se-á diante de uma violação legal sujeita ao controle desta Corte Superior.

Esse é o caso dos autos. Ainda que se esteja diante de uma notória semelhança entre os dois produtos – o que foi reconhecido pelo TJ⁄MG – a questão posta nos autos vai além, sendo imperioso determinar se esta similitude é aceitável do ponto de vista legal, como consectário de técnicas mercadológicas tendentes ao posicionamento de um determinado produto no mercado, ou se na realidade estamos diante de um ato abusivo, usurpador de conjunto-imagem alheio e passível de confundir o consumidor. E a dificuldade que daí emerge reside no fato de que muitas das características que assemelham os produtos se situam numa zona limítrofe entre o que se admite como concorrência saudável – e até desejável – e o que se reputa concorrência desleal e parasitária.

Nesses casos, todavia, não é possível ao julgador consultar única e exclusivamente o seu íntimo para concluir pela existência de confusão de forma ampla e genérica, quando não há sequer o registro de embalagem em favor de alguma das partes. Em síntese, a exclusiva violação da concorrência não é fato dado a presunções atécnicas, mesmo porque sua tipificação legal não é objetiva e taxativa, dependendo do resultado concreto dessas ações, o qual depende, antes de mais nada, de uma análise técnica de propaganda e marketing.

Nota-se que, em situações como a dos autos, quando inexiste perícia técnica, as conclusões alcançadas são comumente extraídas de máximas da experiência – ou quiçá da inexperiência. Embora disciplinadas as presunções judiciais, entre as quais se disciplinou expressamente a utilização das regras de experiência comum ou técnicas, nos termos do art. 335 do CPC⁄1973, não se pode olvidar que essas regras não são meios de prova nem se realizam mediante a participação dos litigantes em contraditório. Nesse sentido, vale ainda o alerta de que "o fato que requer conhecimento técnico não interessa apenas ao juiz, mas fundamentalmente às partes, que têm o direito de discuti-lo de forma adequada, mediante, se for o caso, a indicação de assistentes técnicos" (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Prova e convicção: de acordo com o CPC de 2015. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 850).

Portanto, uma vez que os fatos postos nesses autos na condição de causa de pedir são essenciais ao deslinde da controvérsia e demandam de conhecimento técnico para sua caracterização e que houve oportuno requerimento para a produção de prova pericial pela parte sucumbente, reconheço a existência de violação do art. 420 do CPC⁄1973, que resultou no cerceamento de defesa da recorrente.

Com esses fundamentos, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para cassar a sentença proferida, determinando-se o retorno dos autos à origem para a realização da prova pericial requerida.

É como voto.



Documento: 69332209  RELATÓRIO E VOTO