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segunda-feira, 15 de abril de 2024

As maiores marcas de moda do mundo, H&M and Zara, usam algodão ligado a grilagem de terras, desmatamento ilegal, violência, violações de direitos humanos e corrupção no Brasil.

Durante um ano, a Earthsight investigou o que acontece no Cerrado e concluiu que empresas e consumidores na Europa e na América do Norte estão impulsionando essa destruição de uma nova maneira. Não é pelo que vem, mas pelo que veste. A Earthsight descobriu que o algodão usado pelas gigantes da fast fashion H&M e Zara está ligado ao desmatamento em grande escala, grilagem de terras, violação de direitos humanos e violentos conflitos fundiários no Cerrado brasileiro.

A H&M e a Inditex, donas da Zara, são as maiores empresas de vestuário do mundo. Eles obtiveram lucros combinados de cerca de 41 bilhões de dólares em 2022. A H&M tem 4.400 lojas em todo o mundo, enquanto a Zara e outras marcas da Inditex – Pull&Bear, Bershka, Massimo Dutti, Stradivarius – têm quase 6.000. H&M e Zara são líderes globais do mercado de fast fashion e lançam inúmeras coleções de roupas todos os anos.

Veja a matéria completa 



 A Earthsight é uma organização sem fins lucrativos que utiliza investigações aprofundadas para expor o crime ambiental e social, a injustiça e as ligações ao consumo global.

Quando a moda e o sistema financeiro dão aquela forcinha para o desmatamento

Estudo relaciona Zara e H&M com algodão de áreas cortadas no Cerrado; bancos são acusados de bancar desmate na Amazônia 


Não é confortável, eu sei, mas você costuma pensar de onde vem o algodão da roupa que você veste, ou onde foi criado o boi que virou o bife no seu prato? Qual foi o caminho do campo até seu guarda-roupa, até sua cozinha? Se você soubesse que houve alguma irregularidade em algum ponto dessa produção, você deixaria de comprar esses produtos? 

É mais ou menos nisso que apostam dois estudos elaborados a partir de investigações de ONGs ambientalistas divulgados nesta semana. Quer dizer: mais do que apontar o dedo diretamente para quem está no fim dessa cadeia – eu, você, o consumidor comum –, eles jogam luz sobre as relações entre possíveis crimes ambientais e os fornecedores. Ou entre esses crimes e suas fontes de financiamento. Com a expectativa de que, ao revelar essas relações, seja possível combatê-los, ou ao menos para inibi-los. 

Leia a matéria completa

12 de abril de 2024


terça-feira, 27 de junho de 2023

FUNÇÃO SOCIAL - Juíza aplica "capitalismo humanista" e nega leilão de cortiço por massa falida

25 de junho de 2023, 14h49

Por Renan Xavier

Seguindo os conceitos que norteiam o capitalismo humanista, a 3ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo confirmou tutela de urgência e determinou o cancelamento definitivo da indisponibilidade de um imóvel reivindicado pela massa falida de uma empresa que quebrou há 41 anos, mas que está ocupado por uma família há 32. O síndico pedia a ida do imóvel a leilão.

Magistrada lembrou que a massa falida deixou o espaço parado por décadas

A juíza Clarissa Somesom Tauk considerou uma série de características socioeconômicas da família que ocupa o espaço, caracterizado como um cortiço. São oito pessoas em situação "extremamente vulnerável", incluindo idosos e uma criança portadora de deficiência.

A família comprou o espaço há 32 anos e, ao longo desse tempo, promoveu melhorias na estrutura do imóvel. O líder da família apresentou comprovantes de quitação de IPTU, bem como certidão negativa de tributos imobiliários.

Ao analisar o caso, a magistrada lembrou que a massa falida deixou o espaço parado por décadas e que a família pagou pelo bem e se estabeleceu por lá por mais de 30 anos. "Destaco que não se trata de caso clássico de usucapião de imóvel da massa falida, cuja decretação de quebra interrompe o prazo prescricional, mas de caso em que a família quitou devidamente o valor do imóvel. Tudo isso à revelia da atuação sindical, a qual foi nitidamente irresponsável para com o concurso de credores e com a Justiça brasileira", afirmou a juíza.

Um cálculo anexado ao processo mostrou que o impacto da arrecadação do imóvel para a massa falida seria pequeno. Perícia avaliou o espaço em R$ 219 mil, sendo que R$ 71 mil são referentes à construção do imóvel pela família. A unificação das contas judiciais apresentou o saldo atualizado da falência no valor de R$ 1,284 milhão. 

"Resta claro que a utilização do imóvel como moradia, em respeito ao programa constitucional da dignidade humana (artigo 1º, III, da CF/88), se trata de utilização correta da propriedade, atendendo-se à sua função social", destacou.

A juíza Clarissa Somesom Tauk ponderou que Constituição de 1988 organiza a ordem econômica sob o sistema capitalista, pautado na livre iniciativa, mas também na valorização do trabalho, mas, ao mesmo tempo, cuidou de alçar ao mesmo patamar a dignidade da pessoa humana, colocando-a lado a lado com a soberania, a cidadania e o pluralismo político.

"A visão que deve permear a atuação do Poder Judiciário, mormente nestes casos, em que se destaca o valor supremo da dignidade da pessoa humana, reside no resgate dos ideais consagrados pelo capitalismo humanista, que propõe um novo enfrentamento do capitalismo, enquanto regime econômico, de modo a assegurar a concretização dos Direitos Humanos, relativizando o direito à propriedade e à livre iniciativa", afirmou.

Ao concluir o voto, a juíza destacou que o novo marco teórico representando pelo capitalismo humanista reside na intenção de se concretizar os direitos humanos e a fraternidade sem macular os princípios que orientam o regime econômico prevalecente no seio social, ou até mesmo as normativas do sistema empresarial vigente.

"Não se quer subverter a ordem implementada pelo sistema de insolvência, mas sim adequá-la a parâmetros fraternos e que resguardem os menos favorecidos, que acabam por ser os mais vulneráveis, como no caso em apreço."

Clique aqui para ler a decisão

Processo 1027811-06.2023.8.26.0100

Revista Consultor Jurídico, 25 de junho de 2023, 14h49


sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Leitura interessante sobre EMPRESAS X PESSOAS - “Há pessoas que choram por saber que as rosas têm espinhos e há outras que sorriem por saber que os espinhos têm rosas”


SOCIEDADES S.A.
Gerir pessoas é imprescindível e inadiável
Por Carlos Alberto Bitinas

Sua organização pratica uma gestão de pessoas de forma estruturada, planejada, com diagnóstico profissionalizado dos problemas existentes e com objetivos claros a atingir?

O nosso Machado de Assis dizia que “Há pessoas que choram por saber que as rosas têm espinhos e há outras que sorriem por saber que os espinhos têm rosas”. Lembro-me dessa citação quando ouço, e com frequência, a queixa de como é difícil gerenciar pessoas.

A missão pode ser, digamos, espinhosa, pois, de fato, gerir pessoas não é lá muito simples. Dentre os recursos que compõem um sistema de gestão, os recursos humanos, ou as pessoas, possuem natureza e características muito diferentes dos demais recursos.

As pessoas são únicas, cada qual com a sua história, com sua expectativa em relação ao que a cerca e com sua própria perspectiva de vida; elas interagem entre si de forma complexa e não homogênea, formando, reformando ou deformando relacionamentos, grupos e equipes; elas estão em constante transformação, agindo e reagindo permanentemente em relação a si mesmas e ao mundo; elas tratam de colocar a organização em funcionamento, que ficaria inerte sem a atuação humana.

Há algo que pode ser considerado a mais crítica das características: as pessoas são o único dos recursos que tem vontade e poder de decisão própria. Elas podem deixar o trabalho no final de um dia e simplesmente não retornar no dia seguinte. E sem as pessoas, as organizações não funcionam.

Se por um lado é cada vez mais universal o acesso ao capital, à tecnologia, à informação, ao conhecimento e aos ativos em geral, por outro, a disputa pelos talentos é crescente, individualizada e acirrada, assumindo valor estratégico cada vez maior.

Por onde começar
Apesar de todos desejarem pessoas e equipes motivadas, lideranças positivas e abundância de talentos, nem sempre é isso que se tem. Há, é verdade, bons programas de recursos humanos que geram retorno positivo, mas no médio e longo prazos, os resultados podem sumir, gerando a sensação de esforço inútil e de frustração.

O que tenho observado é que, em geral, ações e programas de recursos humanos são realizados como esforços isolados, desconectados de um plano diretor para gestão de pessoas, que raramente existe e, principalmente, desvinculados do planejamento estratégico da organização.

O norte que orienta as ações de recursos humanos é necessariamente o planejamento estratégico, incluindo aí sua carta de visão, missão e valores, que aponta para onde caminhar e com que ações: energia, sustentabilidade, agressividade, cuidados, desejos, investimentos e recursos — dentre eles, os recursos humanos.

Surge aqui, então, um fato importante: para se ter uma boa gestão de pessoas, é condição indispensável o alinhamento das diretrizes e ações de recursos humanos às estratégias da organização e do seu negócio. O não sincronismo entre a gestão de recursos humanos e o rumo da organização é prenúncio certo de muitos e duradouros problemas com pessoas.

Dificuldades com talentos
Muito se fala e se escreve sobre como reter pessoas. Planos podem ser elaborados, considerando múltiplas e simultâneas ações de treinamento, remuneração, administração do clima organizacional, desenvolvimento de competências, planos de carreira, comunicação institucional e outros itens. Em princípio, nada há de errado com esses programas, que são saudáveis, muito embora nem sempre suficientes para atrair e reter pessoas.

Existem quatro fatores importantes que gosto de acrescer a este cenário, contribuindo com a necessidade de contar com bons talentos:

O primeiro, conceitual, é de que qualquer ação de retenção pode ser frágil, na medida em que a decisão de permanecer na organização é do livre arbítrio do profissional. Lembre-se: ele pode simplesmente ir embora e não voltar mais. O que orienta sua decisão de ficar ou não é um conjunto extenso, complexo e não necessariamente muito claro de quesitos que determinam a satisfação de suas expectativas e desejos pessoais e profissionais, mediatos e imediatos. O desafio que se coloca para os gestores é o de entender esses quesitos e, de maneira mais ampla e genérica do que individualizada, atendê-los dentro das possibilidades, interesses e estratégias da empresa.

O segundo, gerencial, é que a retenção de talentos pode ser vista como o mero resultado final de toda uma política de gestão de recursos humanos, com suas ações e programas subjacentes. Ou seja, praticando boa gestão de pessoas, colhe-se o fruto da retenção de talentos. Por essa ótica, é dispensável fazer um plano específico para retenção de pessoas.

O terceiro, estratégico, é sobre um descuido que as organizações cometem com as pessoas que trabalham em seus quadros. Durante o processo de recrutamento e seleção, há uma preocupação real e ações efetivas para a atração e conquista de talentos. A partir do momento em que a pessoa é admitida e se integra ao seu trabalho, o ímpeto de atrair o profissional se arrefece, sendo substituído pela ética do dever e pelo (quando muito) desejo de retenção. Por que não ter uma diretriz de conquista gradual e continua, que poderia perdurar durante a estada do profissional na organização?

O quarto, essencial, é sobre a melhor prática para a contratação de pessoas. Cuidados básicos, como os citados abaixo, não são tomados, gerando admissões inadequadas:

· Definir com exatidão o perfil do cargo e da própria organização (cultura, estilo, ciclo de vida, metas, obstáculos, perspectivas de crescimento etc.);

· Detalhar com clareza o perfil do profissional desejado (históricos pessoais e profissionais, traços comportamentais, estágio da carreira, competências essenciais etc.);

· Buscar os candidatos no mercado de forma profissionalizada, para atrair os mais adequados talentos;

· Perder bons candidatos nas entrevistas por não possuir bom know how para entrevistá-los. Entrevistar exige técnica, sem a qual não se selecionam boas pessoas.

O assunto, de longe, não se esgota aqui. Vamos escrever mais sobre motivação, trabalho em equipe, carreira, liderança, desenvolvimento, relacionamentos, comunicação e por aí afora. Lembrando Machado de Assis, o passeio pelo “jardim da gestão de pessoas” é longo, e existirão eventuais arranhões provocados pelos espinhos.

Costumo lembrar a grandiosidade que representa o desafio de gerir pessoas, pois, para obter êxito nesse campo, é necessário ter experiência, técnica, talento, sensibilidade e genuíno interesse em lidar com elas. E lidar com paixão, pois, como nos ensinou o filósofo Hegel, “Nada existe de grandioso sem paixão”.

Carlos Alberto Bitinas é consultor, palestrante e professor de desenvolvimento e gestão de pessoas.

Revista Consultor Jurídico, 3 de agosto de 2012

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Função Social da Empresa




Material para pesquisa sobre estudos da empresa e sua função social dentro do contexto nacional. O estudo visa desenvolver um trabalho sobre a questão EMPRESA X SOCIEDADE X DIREITOS SOCIAIS X DIREITOS HUMANOS.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;



Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I - soberania nacional;
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor;
VI - defesa do meio ambiente;
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII - busca do pleno emprego;
IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995)
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.


Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.
§ 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.

Bibliografia:
Empresa&Função Social.
Eloy Pereira Lemos Junior, Juruá.
Tutela dos Direitos da Personalidade na Atividade Empresarial Vol. I e II
Juruá



sexta-feira, 27 de abril de 2012

DIREITO À MORADIA COMO DIREITO FUNDAMENTAL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ESTATUTO DO IDOSO. IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL



RECURSO ESPECIAL Nº 950.663 - SC (2007?0106323-9)

RECORRENTE : BANCO DO BRASIL S?A
ADVOGADO : GILBERTO EIFLER MORAES E OUTRO(S)
RECORRIDO : IZAIR LUIZ POSSATO
ADVOGADO : ELIZABET CORREA E OUTRO


RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

1. Banco do Brasil S?A ajuizou ação de execução em face de Izair Luiz Possato, na qual foi determinada penhora de imóvel, descrito na inicial, atingindo a nua propriedade (fls. 142).

Sobreveio agravo de instrumento (fls. 4-13), provido nos seguintes termos (fls. 170-175):

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA. PENHORA SOBRE BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE REJEITADA, HAJA VISTA RECAIR SOBRE A NUA-PROPRIEDADE. IMPROCEDÊNCIA. DESNECESSIDADE DE RESIDIR O DEVEDOR NO IMÓVEL. MOTIVOS JUSTIFICÁVEIS. REFORMA DA INTERLOCUTÓRIA. RECURSO PROVIDO.

Opostos embargos de declaração (fls. 185-186) pelo Banco do Brasil, foram acolhidos (fls. 189-194) para mencionar explicitamente os dispositivos legais que fundamentaram a decisão embargada.

A instituição financeira interpôs o presente recurso especial (fls. 198-207), com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, alegando violação aos arts. 1º e 5º da Lei 8.009?90, ao argumento de que a não residência do executado no imóvel impede seja ele considerado impenhorável, máxime em virtude de não subsistir o proprietário e sua família de renda advinda do aluguel do bem.

Foram apresentadas contrarrazões ao recurso (fls. 252-257).

Foi intentado recurso extraordinário (fls. 268).

Ambos os recursos foram admitidos na instância ordinária (fls. 266 e 268).

Em consulta ao sítio do Tribunal estadual, verificou-se que o processo foi temporariamente arquivado em 3?2?2010, aguardando decisão do recurso especial.

É o relatório.


RECURSO ESPECIAL Nº 950.663 - SC (2007?0106323-9)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : BANCO DO BRASIL S?A
ADVOGADO : GILBERTO EIFLER MORAES E OUTRO(S)
RECORRIDO : IZAIR LUIZ POSSATO
ADVOGADO : ELIZABET CORREA E OUTRO


EMENTA



PROCESSO CIVIL. DIREITO CIVIL. EXECUÇÃO. LEI 8.009?90. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA. DEVEDOR NÃO RESIDENTE EM VIRTUDE DE USUFRUTO VITALÍCIO DO IMÓVEL EM BENEFÍCIO DE SUA GENITORA. DIREITO À MORADIA COMO DIREITO FUNDAMENTAL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ESTATUTO DO IDOSO. IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL.

1. A Lei 8.009?1990 institui a impenhorabilidade do bem de família como um dos instrumentos de tutela do direito constitucional fundamental à moradia e, portanto, indispensável à composição de um mínimo existencial para vida digna, sendo certo que o princípio da dignidade da pessoa humana constitui-se em um dos baluartes da República Federativa do Brasil (art. 1º da CF?1988), razão pela qual deve nortear a exegese das normas jurídicas, mormente aquelas relacionadas a direito fundamental.

2. A Carta Política, no capítulo VII, intitulado "Da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso", preconizou especial proteção ao idoso, incumbindo desse mister a sociedade, o Estado e a própria família, o que foi regulamentado pela Lei 10.741?2003 (Estatuto do Idoso), que consagra ao idoso a condição de sujeito de todos os direitos fundamentais, conferindo-lhe expectativa de moradia digna no seio da família natural, e situando o idoso, por conseguinte, como parte integrante dessa família.

3. O caso sob análise encarta a peculiaridade de a genitora do proprietário residir no imóvel, na condição de usufrutuária vitalícia, e aquele, por tal razão, habita com sua família imóvel alugado. Forçoso concluir, então, que a Constituição Federal alçou o direito à moradia à condição de desdobramento da própria dignidade humana, razão pela qual, quer por considerar que a genitora do recorrido é membro dessa entidade familiar, quer por vislumbrar que o amparo à mãe idosa é razão mais do que suficiente para justificar o fato de que o nu-proprietário habita imóvel alugado com sua família direta, ressoa estreme de dúvidas que o seu único bem imóvel faz jus à proteção conferida pela Lei 8.009?1990.



4. Ademais, no caso ora sob análise, o Tribunal de origem, com ampla cognição fático-probatória, entendeu pela impenhorabilidade do bem litigioso,  consignando a inexistência de propriedade sobre outros imóveis. Infirmar tal decisão implicaria o revolvimento de fatos e provas, o que é defeso a esta Corte ante o teor da Súmula 7 do STJ.

5. Recurso especial não provido.




VOTO



O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

2. Cinge-se a controvérsia à definição acerca da impenhorabilidade ou não da nua propriedade de bem destinado à moradia da genitora do proprietário, em virtude de usufruto vitalício.

2.1. Por primeiro, cabe assinalar que o usufruto é direito real personalíssimo, importando o fracionamento do domínio: ao usufrutuário é concedido o direito de desfrutar do bem alheio, percebendo-lhe os frutos e dele podendo retirar proveito econômico;  ao nu-proprietário remanesce tão somente a posse indireta e o direito de dispor desse bem.

Nesse compasso, em regra, a pessoalidade do usufruto impõe a sua inalienabilidade, a qual, por sua vez, implica a impenhorabilidade desse direito, mas não de seus frutos, os quais, se tiverem expressão econômica, são passíveis de penhora em ação movida contra o usufrutuário, desde que a renda por este obtida seja desprovida de caráter alimentar.

A nua propriedade, a seu turno, é suscetível de constrição, salvo se, sendo o imóvel considerado bem de família, nele resida o nu-proprietário.

Erige-se nesse sentido a jurisprudência desta Corte:

AGRAVO REGIMENTAL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - EMBARGOS À EXECUÇÃO - LEI N. 8.009?90 - PENHORA INCIDENTE SOBRE O DIREITO REAL DE USUFRUTO DE BEM IMÓVEL - IMÓVEL UTILIZADO COMO RESIDÊNCIA PELOS EXECUTADOS E USUFRUTUÁRIOS - IMPENHORABILIDADE - RECURSO IMPROVIDO.
(AgRg no Ag 1013834?SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 07?12?2010, DJe 03?02?2011)

DIREITO CIVIL. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE ALUGUEL. DEVEDORA DETENTORA DE 50% DO USUFRUTO. EXECUÇÃO PROPOSTA PELO NU PROPRIETÁRIO DETENTOR DOS OUTROS 50%. PENHORA DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE USUFRUTO. IMPOSSIBILIDADE.
I - Da inalienabilidade resulta a impenhorabilidade do usufruto. O direito não pode, portanto, ser penhorado em ação executiva movida contra o usufrutuário; apenas o seu exercício pode ser objeto de constrição, mas desde que os frutos advindos dessa cessão tenham expressão econômica imediata.
II - Se o imóvel se encontra ocupado pela própria devedora, que nele reside, não produz frutos que possam ser penhorados. Por conseguinte, incabível se afigura a pretendida penhora do exercício do direito de usufruto do imóvel ocupado pela recorrente, por ausência de amparo legal.
Recurso Especial provido.
(REsp 883.085?SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19?08?2010, DJe 16?09?2010)

2.2. Por outro lado, mas na mesma linha de raciocínio, a jurisprudência deste Tribunal Superior assentou a tese de que  o único imóvel do executado é tido como bem de família, ainda que este não o habite, se nele residir seus filhos e ex-cônjuge.

Confiram-se os seguintes precedentes:

CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. O imóvel em que reside a ex-esposa e os filhos do devedor tem o caráter de bem de família, merecendo a proteção legal da Lei nº 8.009, de 1990. A impenhorabilidade da meação impede que a totalidade do bem seja alienada em hasta pública. Recurso especial conhecido e provido para julgar procedentes os embargos de terceiro.
(REsp 931.196?RJ, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 08?04?2008, DJe 16?05?2008)

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. IMÓVEL OCUPADO POR EX-COMPANHEIRA E PELO FILHO DO DEVEDOR. IMPENHORABILIDADE. RENÚNCIA AO FAVOR LEGAL. INVALIDADE. PRINCÍPIO DE ORDEM PÚBLICA. LEI N. 8.009?90.
I. A proteção conferida à entidade familiar pela Lei n. 8.009?90 se estende à situação em que o imóvel constritado se acha ocupado pela ex-companheira e pelo filho do executado, sendo destituída de validade cláusula contratual em que ele abre mão do favor legal, que, por se cuidar de norma de ordem pública, é sempre preponderante.
II. Tampouco importa em renúncia ao benefício a indicação anterior do bem à penhora.
III. Precedentes do STJ.
IV. Recurso especial não conhecido. (REsp 507.686?SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, Quarta Turma, DJU de 22.03.04)

RECURSO ESPECIAL - PROCESSUAL CIVIL - RESIDÊNCIA DA FAMÍLIA - LEI N° 8.009?90 - IMPENHORABILIDADE.
Se o constituinte buscou proteger a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes considerando-a como entidade familiar (art. 226, § 4º, da CF), afigura-se justo que, no caso em exame, o benefício da impenhorabilidade instituído pela Lei n° 8.009?90 alcance o imóvel em que reside a ex-companheira e os filhos do proprietário desse bem constrito, ainda que este último, por força de acordo firmado na ação de reconhecimento e dissolução de sociedade de fato, não mais resida no mesmo imóvel.
Recurso Especial a que se dá provimento. (REsp 272.742?PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJU de 28.05.2001)

3. O caso sob análise encarta a peculiaridade de a genitora do proprietário residir no imóvel, na condição de usufrutuária vitalícia, e aquele, por tal razão, habita com sua família imóvel alugado.

A questão que se impõe é saber se tal justificativa é suficiente para lhe conferir a proteção engendrada pela Lei 8.009?1990, consoante entendeu o Tribunal de origem.

3.1. O direito à moradia foi citado inicialmente na Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948 pela Assembléia Geral da ONU, tendo o Brasil como um dos seus signatários.

A citada Declaração estabelece que “toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, moradia, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis” (art. 25, §1o).

O principal instrumento legal internacional que trata do direito à moradia, ratificado pelo Brasil e por mais 138 países, é o Pacto Internacional de Direitos Econômicos e Sociais e Culturais - Pidesc, adotado pela ONU em 1966.

O artigo 11, §1º, do Pidesc, dispõe que os Estados partes reconhecem o direito de toda pessoa à moradia adequada e comprometem-se a adotar medidas apropriadas para assegurar a consecução desse direito.

Faz-se mister ressaltar, segundo o entendimento do Supremo Tribunal Federal (entre outros, o RE 349.703?RS, julgado pelo Tribunal Pleno em 3?12?2008), que tratado internacional que versa sobre direitos humanos assume o status de norma supralegal, situando-se abaixo da Constituição, porém acima da legislação ordinária, de modo que o ordenamento jurídico interno deve contemplar formas para implementação dos seus mandamentos.

Nessa senda, a Constituição da República, em seu artigo 6º, encartou a moradia no bojo dos direitos sociais, alçando-a à qualidade de direito fundamental, já que se trata de capítulo inserto no título II da Carta Magna, intitulado "Dos Direitos e Garantias Fundamentais":

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

O constituinte originário exteriorizou a preocupação com a proteção desse direito fundamental à dignidade da pessoa humana em diversos outros dispositivos, tais como, o art. 23, IX, no qual estabelece como dever do Estado, nas suas três esferas, a promoção de programas de construção de moradias e melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico, bem assim o art.  7º, IV, onde o direito à moradia é inserto como necessidade básica dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, que deve ser atendida pelo salário mínimo.

Não se olvida que, anteriormente à Constituição de 1988, o Código Civil de 1916 tenha disciplinado o  bem de família. No entanto, seu extremo formalismo relegou o instituto à vala da aplicação raríssima, não atendendo satisfatoriamente, portanto, aos princípios da dignidade da pessoa humana e da proteção à moradia e à família, insertos na nova Carta.

Nesse contexto, exsurge a Lei 8.009?90, cujo art. 1º estabelece:

Art. 1º. O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.

O mencionado diploma legal institui a impenhorabilidade do bem de família como instrumento de tutela do direito fundamental à moradia da família e, portanto, indispensável à composição de um mínimo existencial para vida digna.

Enfatizando o fundamento constitucional do instituto, Araken de Assis preleciona:

Inicialmente destinado à proteção da família, a evolução do instituto, no direito brasileiro, e a respectiva inserção no ambiente econômico contemporâneo acarretaram mudança significativa no âmbito da sua aplicação. A proteção se estendeu ao obrigado, tout court, haja ou não constituído família, amplitude revelada pela pela tutela dos bens domésticos (art. 2º, parágrafo único, da Lei 8.009?1990) da família sem imóvel residencial próprio. Por sua vez, essa proteção ao obrigado, mediante a técnica da impenhorabilidade, assegura-lhe o chamado patrimônio mínimo. A garantia dos meios mínimos de sobrevivência, que é a morada e seu conteúdo, observa um princípio maior, porque "orienta-se pelo interesse social de assegurar uma sobrevivência digna aos membros da família, realizando, em última instância, a dignidade humana".
É o princípio da dignidade da pessoa humana, portanto, também o responsável pela humanização da execução, recortando do patrimônio o mínimo indispensável à sobrevivência digna do obrigado, sem embargo do dever de prestar que caracterizou o homestead. A norma jurídica (princípio e valor) fundamental, na feliz síntese de Ingo Wolfgang Sarlet, inserida no art. 1º, III, da CF?1988, fornece  o fundamento constitucional do instituto. (Manual da Execução. São Paulo: RT, 2010, p. 275-276).

O princípio da dignidade da pessoa humana constitui-se um dos baluartes da República Federativa do Brasil (art. 1º da CF?1988), razão pela qual deve nortear a exegese das normas jurídicas, mormente aquelas relacionadas a direito fundamental.

É o que se verifica, por exemplo, em diversos precedentes jurisprudenciais desta Corte Superior que entenderam pela extensão dessa proteção à morada do devedor solteiro, a despeito de o artigo 1º da Lei 8.009?90 ser explícito no sentido de instituir, como beneficiário da impenhorabilidade da residência familiar, o casal ou a entidade familiar.

Confiram-se:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO BANCÁRIO. EXECUÇÃO. INADIMPLEMENTO. OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DO DEVEDOR. REVISÃO DO ENCARGOS.
1. É vedada a esta Corte apreciar violação a dispositivos constitucionais, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal.
2. Não há falar em violação ao art. 535 do Código de Processo Civil. O Eg. Tribunal a quo dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispensável que venha examinar uma a uma as alegações e fundamentos expendidos pelas partes. Precedentes.
3. A falta de prequestionamento em relação aos arts. 585, II, CPC; 955 e 999, I, do CC; art. 6, § 1º, LICC; 9º da Lei 4.595?64; 27, § 5º, II, da Lei 9.069?95 impede o conhecimento do recurso especial. Incidência da súmula 211?STJ.
4. Uma vez realizada a partilha em processo judicial de separação, cujo formal foi devidamente homologado pelo juiz competente, não cabe a penhora de imóvel pertencente a apenas um dos cônjuges, pois a proteção ao bem de família, no caso, se estende ao imóvel no qual resida o devedor solteiro ou solitário.
[...]
11. Recurso especial conhecido em parte e, nesta parte, provido.
(REsp 471.903?RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 06?05?2010, DJe 24?05?2010)

DIREITO CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. CARACTERIZAÇÃO. HIPÓTESE DE DÍVIDA DOS CÔNJUGES QUE, APÓS A PROPOSITURA DA AÇÃO VISANDO AO SEU RECEBIMENTO, PROMOVEM SUA SEPARAÇÃO DE FATO, PARTINDO, CADA UM DELES, PARA RESIDIR EM UM DOS IMÓVEIS INTEGRANTES DO PATRIMÔNIO DO CASAL. PRETENSÃO AO RECONHECIMENTO DA QUALIDADE DE BEM DE FAMÍLIA ÀS DUAS RESIDÊNCIAS. IMPOSSIBILIDADE.
- O Superior Tribunal de Justiça já consolidou seu entendimento no sentido de que a proteção ao bem de família pode ser estendida ao imóvel no qual resida o devedor solteiro e solitário. Esse entendimento, porém, não se estende à hipótese de mera separação de fato entre cônjuges, com a migração de cada um deles para um dos imóveis pertencentes ao casal, por três motivos: (i) primeiro, porque a sociedade conjugal, do ponto de vista jurídico, só se dissolve pela separação judicial; (ii) segundo, porque antes de realizada a partilha não é possível atribuir a cada cônjuge a propriedade integral do imóvel que reside; eles são co-proprietários de todos os bens do casal, em frações-ideais; (iii) terceiro, porque admitir que se estenda a proteção a dois bens de família em decorrência da mera separação de fato dos cônjuges-devedores facilitaria a fraude aos objetivos da Lei.
Recurso especial não conhecido.
(REsp 518.711?RO, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, Rel. p? Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19?08?2008, DJe 05?09?2008)

CIVIL. IMÓVEL QUE SERVE DE RESIDÊNCIA PARA PESSOA SOLTEIRA.
IMPENHORABILIDADE. O imóvel que serve de residência para pessoa solteira está sob a proteção da Lei nº 8.009, de 1990, ainda que ela more sozinha. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 412536?SP, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 03?10?2002, DJ 16?06?2003, p. 334)

Cristalizando esse entendimento, a Súmula 364 deste Tribunal Superior:

O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o
imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.

3.2. De outra parte, a Constituição da República, em seu capítulo VII, intitulado "Da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso", preconizou especial proteção ao idoso, incumbindo desse mister a sociedade, o Estado e a própria família:

Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida.

Regulamentando esse dispositivo, a Lei 10.741?2003 (Estatuto do Idoso) consagra ao idoso - como não poderia deixar de ser - a condição de sujeito de todos os direitos fundamentais:

Art. 2o O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.

Art. 3o É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

Previu ainda o direito à moradia digna no seio da família natural, situando o idoso, por conseguinte, como parte integrante dessa família:

Art. 37. O idoso tem direito a moradia digna, no seio da família natural ou substituta, ou desacompanhado de seus familiares, quando assim o desejar, ou, ainda, em instituição pública ou privada.

4. Dessarte, há enfatizar que a Constituição Federal alçou o direito à moradia à condição de desdobramento da própria dignidade humana, razão pela qual, quer por considerar que a genitora do recorrido é membro dessa entidade familiar, quer por vislumbrar que o amparo à mãe idosa é razão mais do que suficiente para justificar o fato de que o nu-proprietário habita imóvel alugado com sua família direta, ressoa estreme de dúvidas que o seu único bem imóvel faz jus à proteção conferida pela Lei 8.009?1990.

Uma vez mais, cabe o magistério de Araken de Assis, para quem a interpretação literal do art. 1º da Lei 8.009?1990 deixa ao desabrigo diversas situações compatíveis com a noção contemporânea de família:

Na realidade, a composição familiar tutelada na regra abrange o casal unido pelo matrimônio; a união estável e a concubinária; a comunidade monoparental; a coabitação de parentes e até de pessoas sem laços de parentesco; as uniões homossexuais, com ou sem crianças; a comunidade formada pelos filhos de criação, sem vínculo jurídico formal. Todos formam "entidade familiar" perante a lei 8.009?1990.
[...]
Objeta-se que a interpretação extensiva das regras de impenhorabilidade não se harmoniza com o conceito de execução equilibrada. Todavia, no caso da residência familiar, sobrelevam-se os valores constitucionais [...]. (Op Cit. p. 284-285)

Em hipótese similar à dos autos, em que o imóvel era habitado pela mãe e pela avó do proprietário, a Terceira Turma deste Tribunal Superior entendeu por sua impenhorabilidade, corroborando o posicionamento ora perfilhado:

CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. O prédio habitado pela mãe e pela avó do proprietário, cujas dimensões (48,00 m2) são insuficientes para também abrigar sua pequena família (ele, a mulher e os filhos), que reside em imóvel alugado, é impenhorável nos termos da Lei nº 8.009, de 1990. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 186.210?PR, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 20?09?2001, DJ 15?10?2001, p. 259)

5. Ademais, no caso sob análise, o Tribunal de origem, de forma escorreita e com ampla cognição fático-probatória, entendeu pela impenhorabilidade do bem litigioso ante a plausibilidade da justificativa do proprietário pelo fato de lá não residir com seus descendentes, consignando a inexistência de propriedade sobre outros imóveis (fls. 172-173):

Data venia, discordamos da ilustre magistrada. Muito embora reconheça-se a possibilidade de recair a penhora em bem de nu-proprietário, tal não deve ser admitida quando a propriedade for o único bem da família.
A nua-propriedade é aquela na qual o direito de exercer a propriedade do bem somente é alcançado quando cessar a existência de algum motivo impeditivo. Nos presentes autos, refere-se ao usufruto vitalício exercido pela progenitora do executado, o qual impede a este que exerça a propriedade do bem na sua integridade.
Merece reforma a decisão que admitiu tal penhora. O agravante juntou ao recurso de agravo certidão emitida pelo Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Videira, atestando a inexistência de outro bem de sua propriedade, que não aquele que serve de residência à sua mãe.
Embora se alegue que não exista dependência da progenitora para com o agravante, não se pode, no momento, querer apontar os motivos que o levaram a optar por residir em outro município. A busca por melhores condições de vida, em cidade que reúna melhores oportunidades de trabalho, educação e saúde não pode ser contestada, sob pena de se estar a interferir em questões de foro íntimo de qualquer cidadão.
Não obstante, juntou o agravante contrato de locação, bem como recibos de pagamento de aluguel e eletricidade, atestando que o imóvel no qual reside na atualidade não é de sua propriedade.

Infirmar tal conclusão implicaria o revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, o que é defeso a esta Corte, ante o teor da Súmula 7 do STJ.

6. Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.

Intimação do recorrente consoante petição de fls. 283-291.

É o voto.


Documento: 21246505 RELATÓRIO, EMENTA E VOTO