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domingo, 27 de abril de 2014

Dicas - Jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais sobre o tema affectio societatis


Apelação Cível 1.0024.11.328275-0/001 3282750-32.2011.8.13.0024 (1) Relator(a): Des.(a) Luiz Carlos Gomes da Mata Data de Julgamento: 10/04/2014 Data da publicação da súmula: 15/04/2014
Ementa: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - CERCEAMENTO DE DEFESA - PROVA INÚTIL - PRELIMINAR REJEITADA - DISSOLUÇÃO TOTAL DA SOCIEDADE - DENUNCIAÇÃO A LIDE - AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES DO ARTIGO 70 DO CPC - DENUNCIAÇÃO REJEITADA - TÉRMINO DA AFFECTIO SOCIETATIS - PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. - Revelando-se inútil a prova requerida, impõe-se a rejeição da preliminar de nulidade por cerceamento de defesa. - Ausentes as hipóteses elencadas no artigo 70 do Código de Processo civil, impõe-se a confirmação da rejeição da denunciação da lide. - Extinta a affectio societatis, impõe-se a confirmação da dissolução da sociedade comercial.


Agravo de Instrumento Cv 1.0024.12.299437-9/002 0230949-35.2013.8.13.0000 (1) Relator(a): Des.(a) José Marcos Vieira Data de Julgamento: 03/04/2014 Data da publicação da súmula: 14/04/2014
Ementa: EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CAUTELAR. ADMINISTRAÇÃO CONJUNTA. PODER GERAL DE CAUTELA. DECISÃO PARCIALMENTE REFORMADA.
- Ante a demonstração de indícios de fraude e de forte abalo na affectio societatis, pode ser deferida, em sede de exercício do poder geral de cautela, a administração conjunta da sociedade, como forma de resguardar os interesses de sócio destituído de poderes de administração.

Apelação Cível - 1.0479.07.131975-6/001 1319756-42.2007.8.13.0479 (1) Relator(a): Des.(a) Rogério Medeiros Data de Julgamento: 07/02/2014 Data da publicação da súmula: 14/02/2014
Ementa: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE - JUSTA CAUSA - COMPROVAÇÃO - EXCLUSÃO DE SÓCIA - NECESSIDADE - RECURSO IMPROVIDO. A pratica de atos incompatíveis com os interesses da sociedade e a quebra da affectio societatis configuram justa causa à exclusão de sócia, a fim de que não haja comprometimento da idoneidade e saúde financeira da empresa no mercado, apurando-se os haveres da excluída na forma do contrato social.


Apelação Cível - 1.0024.11.331352-2/004 3313522-75.2011.8.13.0024 (1) Relator(a): Des.(a) Estevão Lucchesi Data de Julgamento: 31/01/2014 Data da publicação da súmula: 07/02/2014
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. FUNDAMENTAÇÃO CONCISA. PROVAS. PRECLUSÃO. QUEBRA DA CONFIANÇA E DA AFFECTIO SOCIETATIS. AFASTAMENTO DO SÓCIO. APURAÇÃO DE HAVERES. EFEITOS. As decisões interlocutórias, os despachos e as sentenças podem ser exteriorizados por meio de fundamentação concisa, breve, sucinta, sendo certo que concisão e brevidade não significam ausência de fundamentação. Não obstante o réu tenha pleiteado, genericamente, a produção de provas em contestação, é indispensável à ratificação de seu interesse quando é intimado pelo juiz para especificar as provas que pretende produzir, sob pena de preclusão, porquanto é no momento da especificação probatória que o demandante confirma ou não aquele intento. Sendo clara nos autos a quebra de confiança entre os sócios e perda da affectio societatis, não resta outro caminho senão dissolver parcialmente a sociedade com apuração dos haveres do sócio dissidente. A decisão que decreta a dissolução parcial da sociedade possui natureza constitutiva, por tal razão, a exclusão do sócio e a apuração de seus respectivos haveres deve ocorrer após o trânsito em julgado da sentença. A apuração de haveres deve ser resguardada para momento oportuno, sendo descabida a discussão acerca de eventual distribuição dos lucros.

Apelação Cível - 1.0024.11.317232-4/001 3172324-50.2011.8.13.0024 (1) Relator(a): Des.(a) Nilo Lacerda Data de Julgamento: 30/10/2013 Data da publicação da súmula: 08/11/2013
Ementa: EMENTA: APELAÇÃO - SOCIEDADE COMERCIAL - RETIRADA DE SÓCIO - ART. 1.031 DO CÓDIGO CIVIL - A dedução judicial de pedido de retirada de sócio de sociedade comercial, em razão da ausência da "affectio societatis", deve ser julgada procedente, determinando-se a apuração de haveres, em liquidação de sentença, nos termos do art. 1.031 do Código Civil.
Apelo não provido.


Apelação Cível - 1.0024.09.568023-7/001 5680237-60.2009.8.13.0024 (1) Relator(a): Des.(a) Wagner Wilson Data de Julgamento: 23/10/2013 Data da publicação da súmula: 04/11/2013
Ementa: EMENTA: APELAÇÃO. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES. DATA-BASE. MANIFESTAÇÃO DO SÓCIO DA SUA INTENÇÃO DE RETIRADA. 1. Ocorrendo a quebra da affectio societatis, impõe-se a dissolução parcial da sociedade e apuração de haveres sociais, em fase de liquidação de sentença. 2. A apuração dos haveres mediante balanço deverá ocorrer no momento em que houve a efetiva manifestação do sócio em retirar-se da sociedade, uma vez que é neste momento que se opera o fim da affectio societatis.
V.V.P. EMENTA: APELAÇÃO. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES. DATA-BASE. NOTIFICAÇÃO DA RETIRADA DOS SÓCIOS. critério de apuração. percentual. patrimônio líquido atualizado da sociedade. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA E IMPORTÂNCIA DA CAUSA. TEMPO E TRABALHO EXIGIDO. MAJORAÇÃO. CABIMENTO.
1 - "O balanço de determinação é o levantado para a finalidade específica de se determinar o valor da quota reembolsável ao sócio desligado
(...) O quinhão do sócio que se despede é apurado com base na representação proporcional de suas quotas sobre o patrimônio líquido da sociedade, apontado pelo balanço
(...) O momento do afastamento não se confunde com o da perda da condição de sócio. (...) essa perda, na saída contenciosa, só ocorre com o trânsito em julgado da sentença que acolhe o respectivo pedido." (CELSO BARBI FILHO, in "Dissolução Parcial de Sociedades Limitadas". - Belo Horizonte, Ed. Mandamentos, 2004, p. 482, 483 e 506)
2 - À falta de cláusula acerca da resolução contratual, como estabelece a inicial invocando o Art. 1.031 e seus §§1º e 2º, do Código Civil: "A apuração dos haveres deve levar em conta o valor de mercado do patrimônio da sociedade [à data da resolução], o qual é composto por todos os bens tangíveis e intangíveis da sociedade (com citação de Acórdão referente a que o cálculo dos haveres do sócio retirante deve basear-se no patrimônio líquido e atualizado da sociedade na época da retirada)."3 - nos termos da norma do §4º, do artigo 20, do cpc, nas causas em que não houver condenação, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas "a" (o grau de zelo do profissional), "b" (o lugar de prestação do serviço) e "c" (a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço), conforme §3º do mesmo dispositivo legal.


Apelação Cível - 1.0024.11.332996-5/001 3329965-04.2011.8.13.0024 (1) Relator(a): Des.(a) Rogério Medeiros Data de Julgamento: 10/10/2013 Data da publicação da súmula: 18/10/2013
Ementa: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE - INÉPCIAL DA INICIAL, AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR E CERCEAMENTO DE DEFESA - PRELIMINARES REJEITADAS - QUEBRA DA AFFECTIO SOCIETATIS - DIREITO DE RETIRADA DO SÓCIO - DISSOLUÇÃO TOTAL SOCIEDADE -DOIS SÓCIOS - CONSENSO - POSSIBILIDADE - LIQUIDAÇÃO - EMBARGOS PROTELATÓRIOS - CABIMENTO DE MULTA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. O pedido inicial está apto a ser processado, uma vez que forneceu adequadamente os elementos fáticos e jurídicos para a devida prestação jurisdicional, além de ser certo e determinado, razão pela qual rejeita-se a preliminar. O interesse do autor se consubstancia na necessidade demonstrada de obter do Judiciário o reconhecimento do seu direito de retirada da sociedade, já que encontrou entraves para exercer o direito extrajudicialmente. Corroborados nos autos elementos de prova documental suficientes à formação do juízo de convencimento do julgador, não há se falar em cerceamento de defesa por ofensa ao contraditório e ampla defesa, se julgada antecipadamente a lide. Pode o sócio de sociedade por cotas de responsabilidade limitada pleitear em juízo a sua retirada da referida sociedade, com a dissolução parcial desta, com fundamento na quebra da affectio societatis, a qual está evidenciada na espécie, sendo irrelevante o fato de a sociedade possuir um único bem. Havendo concordância dos dois únicos sócios na extinção da pessoa jurídica, deve ser acolhido o pedido de dissolução total da sociedade, haja vista a inegável quebra da affectio societatis, elemento subjetivo essencial das sociedades de pessoas. Decretada a extinção da pessoa jurídica, procede-se à liquidação, segunda fase do processo de dissolução, apurando-se os ativos e realizando-se os passivos, com partilha entre os sócios, na medida de sua participação no capital social da empresa, de eventual remanescente. Tratando os embargos declaratórios de manifestamente protelatórios, deve o embargante, ora apelante, pagar a multa de 1% sobre o valor dado à causa, nos termos do artigo 538, parágrafo único, do CPC.

Apelação Cível - 1.0208.08.003496-9/001 0034969-84.2008.8.13.0208 (1) Relator(a): Des.(a) Sebastião Pereira de Souza Data de Julgamento: 02/10/2013 Data da publicação da súmula: 11/10/2013
Ementa: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE - ANÁLISE - RESPONSABILIDADE - DILAPIDAÇÃO DO PATRIMÔNIO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA - IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. A análise acerca da responsabilidade dos sócios por eventuais prejuízos não está inserida no âmbito da ação de dissolução de sociedade. Com efeito, no bojo da aludida ação é verificada apenas se houve ou não a quebra da affectio societatis a alicerçar a procedência do pedido. Assim, por não ser cabível a discussão acerca de eventual responsabilidade de um dos sócios na alegada dilapidação do patrimônio da sociedade empresária no bojo da ação de dissolução da sociedade infere-se que não merece amparo o inconformismo da parte ré. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.


Agravo de Instrumento Cv 1.0024.12.184939-2/001 0132372-22.2013.8.13.0000 (1) Relator(a): Des.(a) Tibúrcio Marques Data de Julgamento: 05/09/2013 Data da publicação da súmula: 13/09/2013
Ementa: EMENTA: PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DISSOULUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. TUTELA ANTECIPADA. AUSENTES REQUISITOS. DECISÃO REVOGADA. Uma vez não demonstrada a prova inequívoca capaz de levar à verossimilhança das alegações, haja vista que a comprovação das alegações iniciais e a conseqüente quebra da affectio societatis, que ensejariam da dissolução societária, só restarão definitivamente reconhecidas após a instalação do contraditório, principalmente se considerada as alegações do réu em sua peça recursal no que se refere à existência de débitos pendentes, é de se revogar a concessão da tutela antecipada.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Dicas

"Não é correto atribuir-se ao comerciante individual, personalidade jurídica diferente daquela que se reconhece a pessoa física." (Resp n. 102.539/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU de 01.09.97)
"É uníssono o entendimento desta corte de justiça de que na firma individual, a mesma pessoa que atua na esfera civil atua em âmbito comercial, não havendo distinções entre elas, inclusive em relação às dívidas ou aos créditos." (Ap. Cív. n. 2003.028842-2, de Curitibanos, Rel.ª Des.ª Salete Silva Sommariva, DJ de 28.11.05).
 "A pessoa física pode pleitear indenização sofrida pela firma individual em razão da identidade fática existente entre ambas." (Ap. Cív. n. 2002.027793-8, de São José, Rel.ª Des.ª Salete Silva Sommariva, DJ de 16.09.04).
"EMPRESA EXTINTA. Somente pode postular a tutela jurisdicional quem tem capacidade de exercer seus direitos. Com a extinção da empresa, termina a sua existência jurídica, desaparece sua personalidade jurídica e perde sua capacidade processual." (TRF 1ª Reg., 3ª T., Ap. n. 102928/BA, Rel. Juiz Vicente Leal, j. em 19.04.91).

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

LEI Nº 12.846, DE 1º DE AGOSTO DE 2013.


Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1o  Esta Lei dispõe sobre a responsabilização objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira.

Parágrafo único.  Aplica-se o disposto nesta Lei às sociedades empresárias e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, bem como a quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente.

Art. 2o  As pessoas jurídicas serão responsabilizadas objetivamente, nos âmbitos administrativo e civil, pelos atos lesivos previstos nesta Lei praticados em seu interesse ou benefício, exclusivo ou não.

Art. 3o  A responsabilização da pessoa jurídica não exclui a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores ou de qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito.

§ 1o  A pessoa jurídica será responsabilizada independentemente da responsabilização individual das pessoas naturais referidas no caput.

§ 2o  Os dirigentes ou administradores somente serão responsabilizados por atos ilícitos na medida da sua culpabilidade.

Art. 4o  Subsiste a responsabilidade da pessoa jurídica na hipótese de alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária.

§ 1o  Nas hipóteses de fusão e incorporação, a responsabilidade da sucessora será restrita à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado, até o limite do patrimônio transferido, não lhe sendo aplicáveis as demais sanções previstas nesta Lei decorrentes de atos e fatos ocorridos antes da data da fusão ou incorporação, exceto no caso de simulação ou evidente intuito de fraude, devidamente comprovados.

§ 2o  As sociedades controladoras, controladas, coligadas ou, no âmbito do respectivo contrato, as consorciadas serão solidariamente responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei, restringindo-se tal responsabilidade à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado.

CAPÍTULO II

DOS ATOS LESIVOS À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NACIONAL OU ESTRANGEIRA

Art. 5o  Constituem atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira, para os fins desta Lei, todos aqueles praticados pelas pessoas jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1o, que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, assim definidos:

I - prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada;

II - comprovadamente, financiar, custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei;

III - comprovadamente, utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados;

IV - no tocante a licitações e contratos:

a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público;

b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público;

c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo;

d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente;

e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo;

f) obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; ou

g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração pública;

V - dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir em sua atuação, inclusive no âmbito das agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização do sistema financeiro nacional.

§ 1o  Considera-se administração pública estrangeira os órgãos e entidades estatais ou representações diplomáticas de país estrangeiro, de qualquer nível ou esfera de governo, bem como as pessoas jurídicas controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público de país estrangeiro.

§ 2o  Para os efeitos desta Lei, equiparam-se à administração pública estrangeira as organizações públicas internacionais.

§ 3o  Considera-se agente público estrangeiro, para os fins desta Lei, quem, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, exerça cargo, emprego ou função pública em órgãos, entidades estatais ou em representações diplomáticas de país estrangeiro, assim como em pessoas jurídicas controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público de país estrangeiro ou em organizações públicas internacionais.

CAPÍTULO III

DA RESPONSABILIZAÇÃO ADMINISTRATIVA

Art. 6o  Na esfera administrativa, serão aplicadas às pessoas jurídicas consideradas responsáveis pelos atos lesivos previstos nesta Lei as seguintes sanções:

I - multa, no valor de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo, excluídos os tributos, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação; e

II - publicação extraordinária da decisão condenatória.

§ 1o  As sanções serão aplicadas fundamentadamente, isolada ou cumulativamente, de acordo com as peculiaridades do caso concreto e com a gravidade e natureza das infrações.

§ 2o  A aplicação das sanções previstas neste artigo será precedida da manifestação jurídica elaborada pela Advocacia Pública ou pelo órgão de assistência jurídica, ou equivalente, do ente público.

§ 3o  A aplicação das sanções previstas neste artigo não exclui, em qualquer hipótese, a obrigação da reparação integral do dano causado.

§ 4o  Na hipótese do inciso I do caput, caso não seja possível utilizar o critério do valor do faturamento bruto da pessoa jurídica, a multa será de R$ 6.000,00 (seis mil reais) a R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais).

§ 5o  A publicação extraordinária da decisão condenatória ocorrerá na forma de extrato de sentença, a expensas da pessoa jurídica, em meios de comunicação de grande circulação na área da prática da infração e de atuação da pessoa jurídica ou, na sua falta, em publicação de circulação nacional, bem como por meio de afixação de edital, pelo prazo mínimo de 30 (trinta) dias, no próprio estabelecimento ou no local de exercício da atividade, de modo visível ao público, e no sítio eletrônico na rede mundial de computadores.

§ 6o  (VETADO).

Art. 7o  Serão levados em consideração na aplicação das sanções:

I - a gravidade da infração;

II - a vantagem auferida ou pretendida pelo infrator;

III - a consumação ou não da infração;

IV - o grau de lesão ou perigo de lesão;

V - o efeito negativo produzido pela infração;

VI - a situação econômica do infrator;

VII - a cooperação da pessoa jurídica para a apuração das infrações;

VIII - a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica;

IX - o valor dos contratos mantidos pela pessoa jurídica com o órgão ou entidade pública lesados; e

X - (VETADO).

Parágrafo único.  Os parâmetros de avaliação de mecanismos e procedimentos previstos no inciso VIII do caput serão estabelecidos em regulamento do Poder Executivo federal.

CAPÍTULO IV

DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DE RESPONSABILIZAÇÃO

Art. 8o  A instauração e o julgamento de processo administrativo para apuração da responsabilidade de pessoa jurídica cabem à autoridade máxima de cada órgão ou entidade dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que agirá de ofício ou mediante provocação, observados o contraditório e a ampla defesa.

§ 1o  A competência para a instauração e o julgamento do processo administrativo de apuração de responsabilidade da pessoa jurídica poderá ser delegada, vedada a subdelegação.

§ 2o  No âmbito do Poder Executivo federal, a Controladoria-Geral da União - CGU terá competência concorrente para instaurar processos administrativos de responsabilização de pessoas jurídicas ou para avocar os processos instaurados com fundamento nesta Lei, para exame de sua regularidade ou para corrigir-lhes o andamento.

Art. 9o  Competem à Controladoria-Geral da União - CGU a apuração, o processo e o julgamento dos atos ilícitos previstos nesta Lei, praticados contra a administração pública estrangeira, observado o disposto no Artigo 4 da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, promulgada pelo Decreto no 3.678, de 30 de novembro de 2000.

Art. 10.  O processo administrativo para apuração da responsabilidade de pessoa jurídica será conduzido por comissão designada pela autoridade instauradora e composta por 2 (dois) ou mais servidores estáveis.

§ 1o  O ente público, por meio do seu órgão de representação judicial, ou equivalente, a pedido da comissão a que se refere o caput, poderá requerer as medidas judiciais necessárias para a investigação e o processamento das infrações, inclusive de busca e apreensão.

§ 2o  A comissão poderá, cautelarmente, propor à autoridade instauradora que suspenda os efeitos do ato ou processo objeto da investigação.

§ 3o  A comissão deverá concluir o processo no prazo de 180 (cento e oitenta) dias contados da data da publicação do ato que a instituir e, ao final, apresentar relatórios sobre os fatos apurados e eventual responsabilidade da pessoa jurídica, sugerindo de forma motivada as sanções a serem aplicadas.

§ 4o  O prazo previsto no § 3o poderá ser prorrogado, mediante ato fundamentado da autoridade instauradora.

Art. 11.  No processo administrativo para apuração de responsabilidade, será concedido à pessoa jurídica prazo de 30 (trinta) dias para defesa, contados a partir da intimação.

Art. 12.  O processo administrativo, com o relatório da comissão, será remetido à autoridade instauradora, na forma do art. 10, para julgamento.

Art. 13.  A instauração de processo administrativo específico de reparação integral do dano não prejudica a aplicação imediata das sanções estabelecidas nesta Lei.

Parágrafo único.  Concluído o processo e não havendo pagamento, o crédito apurado será inscrito em dívida ativa da fazenda pública.

Art. 14.  A personalidade jurídica poderá ser desconsiderada sempre que utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei ou para provocar confusão patrimonial, sendo estendidos todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica aos seus administradores e sócios com poderes de administração, observados o contraditório e a ampla defesa.

Art. 15.  A comissão designada para apuração da responsabilidade de pessoa jurídica, após a conclusão do procedimento administrativo, dará conhecimento ao Ministério Público de sua existência, para apuração de eventuais delitos.

CAPÍTULO V

DO ACORDO DE LENIÊNCIA

Art. 16.  A autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública poderá celebrar acordo de leniência com as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo, sendo que dessa colaboração resulte:

I - a identificação dos demais envolvidos na infração, quando couber; e

II - a obtenção célere de informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração.

§ 1o  O acordo de que trata o caput somente poderá ser celebrado se preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:

I - a pessoa jurídica seja a primeira a se manifestar sobre seu interesse em cooperar para a apuração do ato ilícito;

II - a pessoa jurídica cesse completamente seu envolvimento na infração investigada a partir da data de propositura do acordo;

III - a pessoa jurídica admita sua participação no ilícito e coopere plena e permanentemente com as investigações e o processo administrativo, comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento.

§ 2o  A celebração do acordo de leniência isentará a pessoa jurídica das sanções previstas no inciso II do art. 6o e no inciso IV do art. 19 e reduzirá em até 2/3 (dois terços) o valor da multa aplicável.

§ 3o  O acordo de leniência não exime a pessoa jurídica da obrigação de reparar integralmente o dano causado.

§ 4o  O acordo de leniência estipulará as condições necessárias para assegurar a efetividade da colaboração e o resultado útil do processo.

§ 5o  Os efeitos do acordo de leniência serão estendidos às pessoas jurídicas que integram o mesmo grupo econômico, de fato e de direito, desde que firmem o acordo em conjunto, respeitadas as condições nele estabelecidas.

§ 6o A proposta de acordo de leniência somente se tornará pública após a efetivação do respectivo acordo, salvo no interesse das investigações e do processo administrativo.

§ 7o  Não importará em reconhecimento da prática do ato ilícito investigado a proposta de acordo de leniência rejeitada.

§ 8o  Em caso de descumprimento do acordo de leniência, a pessoa jurídica ficará impedida de celebrar novo acordo pelo prazo de 3 (três) anos contados do conhecimento pela administração pública do referido descumprimento.

§ 9o  A celebração do acordo de leniência interrompe o prazo prescricional dos atos ilícitos previstos nesta Lei.

§ 10.  A Controladoria-Geral da União - CGU é o órgão competente para celebrar os acordos de leniência no âmbito do Poder Executivo federal, bem como no caso de atos lesivos praticados contra a administração pública estrangeira.

Art. 17.  A administração pública poderá também celebrar acordo de leniência com a pessoa jurídica responsável pela prática de ilícitos previstos na Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, com vistas à isenção ou atenuação das sanções administrativas estabelecidas em seus arts. 86 a 88.

CAPÍTULO VI

DA RESPONSABILIZAÇÃO JUDICIAL

Art. 18.  Na esfera administrativa, a responsabilidade da pessoa jurídica não afasta a possibilidade de sua responsabilização na esfera judicial.

Art. 19.  Em razão da prática de atos previstos no art. 5o desta Lei, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, por meio das respectivas Advocacias Públicas ou órgãos de representação judicial, ou equivalentes, e o Ministério Público, poderão ajuizar ação com vistas à aplicação das seguintes sanções às pessoas jurídicas infratoras:

I - perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;

II - suspensão ou interdição parcial de suas atividades;

III - dissolução compulsória da pessoa jurídica;

IV - proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos.

§ 1o  A dissolução compulsória da pessoa jurídica será determinada quando comprovado:

I - ter sido a personalidade jurídica utilizada de forma habitual para facilitar ou promover a prática de atos ilícitos; ou

II - ter sido constituída para ocultar ou dissimular interesses ilícitos ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados.

§ 2o  (VETADO).

§ 3o  As sanções poderão ser aplicadas de forma isolada ou cumulativa.

§ 4o  O Ministério Público ou a Advocacia Pública ou órgão de representação judicial, ou equivalente, do ente público poderá requerer a indisponibilidade de bens, direitos ou valores necessários à garantia do pagamento da multa ou da reparação integral do dano causado, conforme previsto no art. 7o, ressalvado o direito do terceiro de boa-fé.

Art. 20.  Nas ações ajuizadas pelo Ministério Público, poderão ser aplicadas as sanções previstas no art. 6o, sem prejuízo daquelas previstas neste Capítulo, desde que constatada a omissão das autoridades competentes para promover a responsabilização administrativa.

Art. 21.  Nas ações de responsabilização judicial, será adotado o rito previsto na Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985.

Parágrafo único.  A condenação torna certa a obrigação de reparar, integralmente, o dano causado pelo ilícito, cujo valor será apurado em posterior liquidação, se não constar expressamente da sentença.

CAPÍTULO VII

DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 22.  Fica criado no âmbito do Poder Executivo federal o Cadastro Nacional de Empresas Punidas - CNEP, que reunirá e dará publicidade às sanções aplicadas pelos órgãos ou entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de todas as esferas de governo com base nesta Lei.

§ 1o  Os órgãos e entidades referidos no caput deverão informar e manter atualizados, no Cnep, os dados relativos às sanções por eles aplicadas.

§ 2o  O Cnep conterá, entre outras, as seguintes informações acerca das sanções aplicadas:

I - razão social e número de inscrição da pessoa jurídica ou entidade no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica - CNPJ;

II - tipo de sanção; e

III - data de aplicação e data final da vigência do efeito limitador ou impeditivo da sanção, quando for o caso.

§ 3o  As autoridades competentes, para celebrarem acordos de leniência previstos nesta Lei, também deverão prestar e manter atualizadas no Cnep, após a efetivação do respectivo acordo, as informações acerca do acordo de leniência celebrado, salvo se esse procedimento vier a causar prejuízo às investigações e ao processo administrativo.

§ 4o  Caso a pessoa jurídica não cumpra os termos do acordo de leniência, além das informações previstas no § 3o, deverá ser incluída no Cnep referência ao respectivo descumprimento.

§ 5o  Os registros das sanções e acordos de leniência serão excluídos depois de decorrido o prazo previamente estabelecido no ato sancionador ou do cumprimento integral do acordo de leniência e da reparação do eventual dano causado, mediante solicitação do órgão ou entidade sancionadora.

Art. 23.  Os órgãos ou entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de todas as esferas de governo deverão informar e manter atualizados, para fins de publicidade, no Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas - CEIS, de caráter público, instituído no âmbito do Poder Executivo federal, os dados relativos às sanções por eles aplicadas, nos termos do disposto nos arts. 87 e 88 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993.

Art. 24.  A multa e o perdimento de bens, direitos ou valores aplicados com fundamento nesta Lei serão destinados preferencialmente aos órgãos ou entidades públicas lesadas.

Art. 25.  Prescrevem em 5 (cinco) anos as infrações previstas nesta Lei, contados da data da ciência da infração ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.

Parágrafo único.  Na esfera administrativa ou judicial, a prescrição será interrompida com a instauração de processo que tenha por objeto a apuração da infração.

Art. 26.  A pessoa jurídica será representada no processo administrativo na forma do seu estatuto ou contrato social.

§ 1o  As sociedades sem personalidade jurídica serão representadas pela pessoa a quem couber a administração de seus bens.

§ 2o  A pessoa jurídica estrangeira será representada pelo gerente, representante ou administrador de sua filial, agência ou sucursal aberta ou instalada no Brasil.

Art. 27.  A autoridade competente que, tendo conhecimento das infrações previstas nesta Lei, não adotar providências para a apuração dos fatos será responsabilizada penal, civil e administrativamente nos termos da legislação específica aplicável.

Art. 28.  Esta Lei aplica-se aos atos lesivos praticados por pessoa jurídica brasileira contra a administração pública estrangeira, ainda que cometidos no exterior.

Art. 29.  O disposto nesta Lei não exclui as competências do Conselho Administrativo de Defesa Econômica, do Ministério da Justiça e do Ministério da Fazenda para processar e julgar fato que constitua infração à ordem econômica.

Art. 30.  A aplicação das sanções previstas nesta Lei não afeta os processos de responsabilização e aplicação de penalidades decorrentes de:

I - ato de improbidade administrativa nos termos da Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992; e

II - atos ilícitos alcançados pela Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, ou outras normas de licitações e contratos da administração pública, inclusive no tocante ao Regime Diferenciado de Contratações Públicas - RDC instituído pela Lei no 12.462, de 4 de agosto de 2011.

Art. 31.  Esta Lei entra em vigor 180 (cento e oitenta) dias após a data de sua publicação.

Brasília, 1o de agosto de 2013; 192o da Independência e 125o da República.

DILMA ROUSSEFF

José Eduardo Cardozo

Luís Inácio Lucena Adams

Jorge Hage Sobrinho

Este texto não substitui o publicado no DOU de 2.8.2013

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Emitente é responsável por pagar por cheque emprestado

Quem deve garantir o pagamento de cheque é o emitente, mesmo que a folha tenha sido emprestada para namorada. A decisão é da 4ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina que negou indenização a um homem que teve seu nome inscrito no cadastro nacional de inadimplentes. O fato ocorreu após sua ex-namorada quitar um curso para formação de motorista com cheque de sua propriedade.

Em primeira instância, o juiz negou o pedido de indenização feito pelo homem. Ele entrou com recurso no TJ-SC alegando que emprestou a folha para que a ex-namorada pagasse o valor que devia em uma autoescola. Segundo ele, a obrigação teria de ser cobrada somente da ex.

No TJ-SC, o desembargador Luiz Fernando Boller, relator da matéria, afirmou que a Lei do Cheque garante ser o emitente aquele que detém a responsabilidade pelo pagamento do valor expresso no título. Sendo assim, o fato de os serviços prestados pela autoescola terem sido contratados pela ex-namorada não é motivo bastante para que o homem seja indenizado, “visto que, segundo o estatuído no artigo15 da Lei 7.357/85, ‘o emitente garante o pagamento, considerando-se não escrita a declaração pela qual se exima dessa garantia", afirmou na decisão.

Sobre o atraso na retirada do nome do cadastro — a dívida foi liquidada com 10 meses de atraso, e o nome do jovem permaneceu negativado por mais oito meses — o relator afirmou que já havia inscrição da mesma pessoa por conta de outro desajuste comercial com terceiros. “A reiteração da conduta inadimplente impede o demandante de ser indenizado por suposto abalo anímico, porquanto o conceito de dano moral está intimamente ligado à ideia de probidade e pontualidade”, anotou o relator. A decisão foi unânime. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-SC.

Apelação Cível 2013.069256-6

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Responsabilidade de um dos sócios quando se trata de sociedade familiar

Não é possível afastar a responsabilidade de um dos sócios quando se trata de sociedade familiar, na qual mãe e filha detêm cada uma 50% do capital social votante, se não ficou comprovado na demanda quem atuou como gerente ou administrador da empresa. A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso em que uma das sócias, a filha, pedia para não figurar na demanda, com a alegação de que não tinha participado das decisões da empresa. No caso, a filha ajuizou exceção de pré-executividade, após ser declarada a desconsideração da pessoa jurídica da empresa para satisfazer um cheque no valor de pouco mais de R$ 2.500. O Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE) considerou que a confusão patrimonial impunha a responsabilização de ambas. (REsp 1315110, STJ 17.9.13)

sexta-feira, 19 de julho de 2013

STJ reforma decisão que aplicou a desconsideração da personalidade jurídica rejeitada anteriormente


  • Por maioria de votos, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso especial contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que admitiu nova apreciação de pedido de desconsideração de personalidade jurídica de processo já transitado em julgado. Primeiramente negada, a desconsideração foi aplicada pela decisão contestada. 
  • Além de verificar que a justiça paulista já havia rejeitado o pedido em decisão transitada em julgado, o relator do recurso, ministro Raul Araújo, destacou que só se aplica a desconsideração da personalidade jurídica quando houver a prática de ato irregular e limitadamente aos administradores ou sócios que o praticaram. 
  • A situação envolveu um antigo sócio de uma sociedade limitada, que se desligou da empresa em 1982. O negócio que deu origem ao litígio foi firmado um ano antes, em 1981, mas a ação judicial só foi ajuizada em 1993. Além disso, o ex-sócio não figurou como parte no processo. 
  • Responsabilização afastada 
  • A ação foi julgada em 2003. O TJSP não admitiu a desconsideração da personalidade jurídica da empresa para comprometimento de patrimônio dos sócios, por entender que não houve comprovação de fraude no negócio jurídico. Também afastou a responsabilização do ex-sócio pela impossibilidade da ação alcançar terceiro que não é parte da relação processual. Essa decisão transitou em julgado. 
  • O TJSP sustentou ainda que sequer houve citação das rés solidariamente sucumbentes, o que afrontaria o revogado artigo 611 do Código de Processo Civil (CPC) que determinava que, uma vez julgada a liquidação, a parte promoverá a execução, citando pessoalmente o devedor. 
  • Novo julgamento
  • Mesmo diante da coisa julgada material, a parte contrária voltou a ajuizar ação em 2008 insistindo no pedido de reconhecimento da desconsideração da personalidade jurídica. Desta vez, o juízo de primeiro grau deferiu o pedido e a mesma 5ª Câmara de Direito Privado do TJSP, que havia negado a desconsideração da personalidade jurídica em 2003, confirmou a sentença. 
  • Para o TJSP, não haveria coisa julgada, pois o primeiro acórdão foi fundamentado na inexistência de citação das empresas executadas à época, e que, após regular citação, houve nova apreciação do pedido de desconsideração, o qual restou deferido. 
  • Acórdão reformado
  • Ao apreciar o recurso especial do ex-sócio, o ministro Raul Araújo, relator, entendeu que a decisão do TJSP violou a coisa julgada, uma vez que a corte local já havia decidido sobre a inexistência dos pressupostos materiais e processuais necessários à aplicação da desconsideração da personalidade jurídica. 
  • Além disso, disse o ministro, “não bastasse o fato de a matéria da desconsideração da personalidade jurídica estar revestida pelo manto preclusivo da coisa julgada, vê-se também que o acórdão recorrido, assim como a decisão agravada, não apontam nenhum fundamento para se aplicar a desconsideração da personalidade jurídica antes rejeitada”. 
  • Araújo ressaltou que a simples inexistência de patrimônio suficiente para satisfazer o pagamento de dívida não é motivo justo e legal para considerar abusiva a conduta do devedor e aplicar a desconstituição da personalidade jurídica. 
  • Seguindo o voto do relator, a Turma reconheceu ofensa à coisa julgada e o acórdão do TJSP foi reformado para reconhecer a inviabilidade de aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica em desfavor do ex-sócio. 

quinta-feira, 18 de julho de 2013

NEGÓCIO JURÍDICO PRATICADO POR SÓCIO-DIRETOR SEM PODERES

  • Processo REsp 906193 / CE RECURSO ESPECIAL 2006/0220351-9 Relator(a) Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO (1140) Órgão Julgador T4 - QUARTA TURMA Data do Julgamento 08/11/2011 Data da Publicação/Fonte DJe 29/11/2011 
  • Ementa CIVIL E COMERCIAL. NEGÓCIO JURÍDICO PRATICADO POR SÓCIO-DIRETOR SEM PODERES PARA TANTO. LIMITAÇÃO ESTATUTÁRIA. VENDA DE BENS AFETADOS AO
  • ATIVO PERMANENTE DA SOCIEDADE. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO COM O OBJETO SOCIAL. ANULAÇÃO. ACÓRDÃO APOIADO EM MAIS DE UM FUNDAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 283/STF. 
  • 1. "É inadmissível o recurso extraordinário quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles" (Súmula n. 283/STF). 
  • 2. O que limita o campo de ação da sociedade é a chamada especialização estatutária. Se a pessoa jurídica é constituída em razão de uma finalidade específica (objeto social), em princípio, os atos consentâneos a essa finalidade, praticados em nome e por conta da sociedade, por seus representantes legais, devem ser a ela imputados. Vale dizer, o ponto nevrálgico para aferir a validade em relação a terceiros, concernentes a atos praticados por diretores em nome da sociedade, mas com excesso de poder, é sempre e sempre saber se o negócio é de interesse da sociedade ou estranho ao seu objeto. Precedentes. 
  • 3. No caso, trata-se de alienação de bens do ativo permanente da empresa por sócio sem poderes para tanto, em razão de limitação estatuária, circunstância que revela que o referido negócio jurídico fora praticado para além das forças do sócio subscritor, exatamente porque não guarda relação com o objeto social da empresa e por isso não pode mesmo ser a ela imputado, mostrando-se de rigor sua anulação.
  • 4. Recurso especial não conhecido.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Desconsideração da personalidade jurídica: proteção com cautela



A distinção entre pessoa jurídica e física surgiu para resguardar bens pessoais de empresários e sócios em caso da falência da empresa. Isso permitiu mais segurança em investimentos de grande envergadura e é essencial para a atividade econômica. Porém, em muitos casos, abusa-se dessa proteção para lesar credores. A resposta judicial a esse fato é a desconsideração da personalidade jurídica, que permite superar a separação entre os bens da empresa e dos seus sócios para efeito de determinar obrigações.

A ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), conta que a técnica jurídica surgiu na Inglaterra e chegou ao Brasil no final dos anos 60, especialmente com os trabalhos do jurista e professor Rubens Requião. “Hoje ela é incorporada ao nosso ordenamento jurídico, inicialmente pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC) e no novo Código Civil (CC), e também nas Leis de Infrações à Ordem Econômica (8.884/94) e do Meio Ambiente (9.605/98)”, informou. A ministra adicionou que o STJ é pioneiro na consolidação da jurisprudência sobre o tema.

Um exemplo é o recurso especial (REsp) 693.235, relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão, no qual a desconsideração foi negada. No processo, foi pedida a arrecadação dos bens da massa falida de uma empresa e também dos bens dos sócios da empresa controladora. Entretanto, o ministro Salomão considerou que não houve indícios de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, requisitos essenciais para superar a personalidade jurídica, segundo o artigo 50 do CC, que segue a chamada “teoria maior”.

Segundo Ana de Oliveira Frazão, advogada, professora da Universidade de Brasília (UnB) e especialista no tema, hoje há duas teorias para aplicação da desconsideração. A maior se baseia no antigo Código Civil e tem exigências maiores. Já na teoria menor, com base na legislação ambiental e da ordem econômica, o dano a ser reparado pode ter sido apenas culposo, bastando a insolvência da empresa.

“Acho a teoria menor muito drástica, pois implica a completa negação da personalidade jurídica. Todavia, entendo que pequenos credores, como consumidores, e credores involuntários, como os afetados por danos ambientais, merecem tutela diferenciada”, opina a professora.

Teoria menor

Um exemplo da aplicação da teoria menor em questões ambientais foi o voto do ministro Herman Benjamin no REsp 1.071.741. No caso, houve construção irregular no Parque Estadual de Jacupiranga, no estado de São Paulo. A Segunda Turma do STJ considerou haver responsabilidade solidária do Estado pela falha em fiscalizar.

Entretanto, a execução contra entes estatais seria subsidiária, ou seja, o estado só arcaria com os danos se o responsável pela degradação ecológica não quitasse a obrigação. O ministro relator ponderou que seria legal ação de regresso que usasse a desconsideração caso o responsável pela edificação não apresentasse patrimônio suficiente para reparar o dano ao parque.

Outro julgado exemplar da aplicação da teoria menor foi o REsp 279.273, julgado pela Terceira Turma do STJ. Houve pedido de indenização para as vítimas da explosão do Shopping Osasco Plaza, ocorrida em 1996. Com a alegação de não poder arcar com as reparações e não ter responsabilidade direta, a administradora do centro comercial se negava a pagar.

O relator do recurso, ministro Ari Pargendler, asseverou que, pelo artigo 28 do CDC, a personalidade jurídica pode ser desconsiderada se há abuso de direito e ato ilícito. No caso não houve ilícito, mas o relator afirmou que o mesmo artigo estabelece que a personalidade jurídica também pode ser desconsiderada se esta é um obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.

Cota social

Entre as teses consolidadas na jurisprudência do STJ está a aplicada no REsp 1.169.175, no qual a Terceira Turma, seguindo voto do ministro Massami Uyeda, decidiu que a execução contra sócio de empresa que teve sua personalidade jurídica desconsiderada não pode ser limitada à sua cota social. No caso, um professor sofreu queimaduras de segundo grau nos braços e pernas após explosão em parque aquático.

A empresa foi condenada a pagar indenização de R$ 20 mil, mas a vítima não recebeu. A personalidade da empresa foi desconsiderada e a execução foi redirecionada a um dos sócios. O ministro Uyeda afirmou que, após a desconsideração, não há restrição legal para o montante da execução.

Desconsideração inversa

Pessoas físicas também tentam usar pessoas jurídicas para escapar de suas obrigações. No REsp 948.117, um devedor se valeu de empresa de sua propriedade para evitar execução. Para a relatora, ministra Nancy Andrighi, seria evidente a confusão patrimonial e aplicável a “desconsideração inversa”. A ministra ressalvou que esse tipo de medida é excepcional, exigindo que se atendam os requisitos do artigo 50 do CC.

Empresa controladora

Outro exemplo de aplicação da desconsideração da personalidade foi dado no REsp 1.141.447, relatado pelo ministro Sidnei Beneti, da Terceira Turma do STJ. No caso, desconsiderou-se a personalidade jurídica da empresa controladora para poder penhorar bens de forma a quitar débitos da sua controlada.

O credor não conseguiu encontrar bens penhoráveis da devedora (a empresa controlada), entretanto a empresa controladora teria bens para quitar o débito. Para o ministro Beneti, o fato de os bens da empresa executada terem sido postos em nome de outra, por si só, indicaria malícia, pois estariam sendo desenvolvidas atividades de monta por intermédio de uma empresa com parco patrimônio.

Entretanto, na opinião de vários juristas e magistrados, a desconsideração não pode ser vista como panaceia e pode se tornar uma faca de dois gumes. A professora Ana Frazão opina que, se, por um lado, aumenta a proteção de consumidores, por outro, há o risco de desestimular grandes investimentos. Esse posicionamento é compartilhado por juristas como Alfredo de Assis Gonçalves, advogado e professor aposentado da Universidade Federal do Paraná, que teme já haver uso indiscriminado da desconsideração pelos tribunais.

A ministra Nancy Andrighi, entretanto, acredita que, no geral, os tribunais têm aplicado bem essa técnica. Ela alertou que criminosos buscam constantemente novos artifícios para burlar a legislação. “O que de início pode parecer exagero ou abuso de tribunais na interpretação da lei, logo se mostra uma inovação necessária”, declarou.

Fraudes e limites

A ministra do STJ dá como exemplo um recente processo relatado por ela, o REsp 1.259.018. A principal questão no julgado é a possibilidade da extensão dos efeitos da falência a empresas coligadas para reparar credores. A ministra Nancy apontou que haveria claros sinais de fraude, com transferência de bens entre as pessoas jurídicas coligadas e encerramento das empresas com dívidas. Para a ministra, os claros sinais de conluio para prejudicar os credores autorizaria a desconsideração da personalidade das empresas coligadas e a extensão dos efeitos da falência.

Impor limites ao uso da desconsideração também é preocupação constante de outros magistrados do STJ, como manifestado pelo ministro Massami Uyeda em outro processo. No REsp 1.080.682, a Caixa Econômica Federal, por meio da desconsideração, tentou cancelar a transferência de imóvel para pessoa jurídica em processo de falência.

O bem pertencia ao ex-administrador da empresa falimentar e, segundo a Caixa, seria uma tentativa de mascarar sua verdadeira propriedade. Contudo, o ministro Uyeda apontou que a transferência do imóvel ocorreu mais de um ano antes da tentativa de penhora. Além disso, naquele momento, o proprietário do imóvel não administrava mais a empresa.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Responsabilidade dos herdeiros do avalista pelo adimplemento da dívida


RECURSO ESPECIAL Nº 260.004 - SP (2000?0049927-7)
RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO
RECORRENTE : BANCO DO BRASIL S?A
ADVOGADO : LUIZ ANTÔNIO BORGES TEIXEIRA
RECORRIDO : ALFREDO MARIANO BRICKS E OUTROS
ADVOGADO : JOÃO BAPTISTA MARIANO BRICKS
RECORRIDO : MARIA DE FÁTIMA MARIANO BRICKS E CÔNJUGE
ADVOGADO : SILAS D'ÁVILA SILVA

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO:  O BANCO DO BRASIL S?A ajuizou ação ordinária de cobrança em desfavor de MARIA CRISTINA MARIANO BRICKS e outros,  visando o recebimento de duas notas de crédito comercial, avalizadas por seu falecido pai, sustentando que a obrigação seria transmitida aos herdeiros, nos limites do patrimônio sucedido. Diz ter sido realizado o inventário e a partilha, sem que fosse resguardado o montante devido.

O pedido foi julgado improcedente em 1º grau. Houve apelação, a qual restou improvida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em julgado assim ementado:

"CAMBIAL - Cédula de crédito comercial - Ajuizamento contra os herdeiros dos bens deixados pelo avalista - Descabimento - Falecimento do devedor posterior ao do vencimento dos títulos - Aplicação analógica do artigo 1.501 do CC - Cobrança improcedente - Recurso improvido."


Daí a interposição do presente recurso especial, fundamentado nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, onde é argüida afronta aos artigos 1.501 e 1.796 do Código Civil de 1916, bem como divergência jurisprudencial. Sustenta o recorrente que o aval é obrigação autônoma e transmissível aos herdeiros, a despeito de o óbito do autor da herança haver ocorrido antes do vencimento dos títulos de crédito.

Sem contra-razões, inadmitiu-se o recurso na origem, ascendendo os autos a esta Corte por força de agravo de instrumento.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 260.004 - SP (2000?0049927-7)
RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO
RECORRENTE : BANCO DO BRASIL S?A
ADVOGADO : LUIZ ANTÔNIO BORGES TEIXEIRA
RECORRIDO : ALFREDO MARIANO BRICKS E OUTROS
ADVOGADO : JOÃO BAPTISTA MARIANO BRICKS
RECORRIDO : MARIA DE FÁTIMA MARIANO BRICKS E CÔNJUGE
ADVOGADO : SILAS D'ÁVILA SILVA

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO:  Cinge-se a controvérsia à discussão sobre a existência de responsabilidade dos herdeiros do avalista pelo adimplemento da dívida, nos limites da herança, na hipótese em que o óbito ocorreu antes do vencimento dos títulos.

As instâncias ordinárias concluíram pela intransmissibilidade. Em primeiro grau, sob fundamento de que a obrigação se constituiria apenas no vencimento do título, entendeu-se que não haveria falar em responsabilidade dos herdeiros, uma vez que o falecimento ocorrera em data anterior. Em apelação, por sua vez, o tribunal a quo, embora reconhecendo a autonomia do aval, afirmou que ele seria temporalmente limitado pela morte do avalista.

A situação em debate ocorreu antes da vigência do atual Código Civil e, no silêncio da legislação específica acerca das notas de crédito comercial, são aplicáveis, supletivamente, as normas gerais de direito cambial, por força do artigos 6º da Lei n.° 6.840?1980 e 52 do Decreto-lei n.° 413?1969.

Dispõe o artigo 43 do Decreto n.° 2.044?1908:

"Art. 43. As obrigações cambiais são autônomas e independentes umas das outras. O signatário da declaração cambial fica, por ela, vinculado e solidariamente responsável pelo aceite e pelo pagamento da letra, sem embargo da falsidade, da falsificação ou da nulidade de qualquer outra assinatura."


No mesmo sentido, a Lei Uniforme estabelece:

"Artigo 31

(...)

O aval considera-se como resultante da simples assinatura do dador aposta na face anterior da letra, salvo se se trata das assinaturas do sacado ou do sacador.

Artigo 32

O dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada."


O aval, espécie de obrigação cambial, é autônomo em relação à obrigação do devedor principal e se constitui no momento da aposição da assinatura do avalista no título de crédito, sendo o transcurso da data do vencimento apenas pressuposto para a sua exigibilidade.

A esse respeito:

"Aval é obrigação formal, autônoma e independente; decorre da simples assinatura do avalista; quem avaliza uma letra de câmbio contrai uma obrigação própria."
(WALDEMAR FERREIRA. Tratado de Direito Comercial, Oitavo Volume. Editora Saraiva. São Paulo: 1962, p. 1962).


Destarte, no momento do óbito, o avalista já era obrigado pela dívida, a despeito de ela ainda não ser exigível. Resta aferir se seria transmissível aos herdeiros, nos limites do patrimônio sucedido.

O artigo 428 do Código Comercial dispunha:

"Art. 428. As obrigações comerciais dissolvem-se por todos os meios que o direito civil admite para a extinção e dissolução das obrigações em geral, com as modificações deste Código."


Por sua vez, o artigo 928 do Código Bevilácqua, estatuía que  "a obrigação, não sendo personalíssima, opera-se, assim entre as partes, como entre os seus herdeiros."

Embora haja a presença da fidúcia no aval, ela não se apresenta como elemento preponderante, como acontece no contrato de fiança. Enquanto a relação de fiança é dependente, somente podendo ser invocada a responsabilidade do fiador no caso de inadimplemento pelo devedor principal, no aval, forma-se uma relação obrigacional nova, autônoma e distinta entre avalista e credor, cuja exigibilidade independente da inadimplência do avalizado.

Destarte, não há caráter personalíssimo no aval, razão pela qual a obrigação dele decorrente é repassada aos herdeiros, nos limites da herança, sendo modalidade de transferência anômala, segundo definição de Cesare Vivante (Tratatto de Diritto Commerciale, 4ª ed., vol. 3, n.º 1.161).

Confira-se a lição de J. X. Carvalho de Mendonça:

"Aos herdeiros transmitem-se, pois, as obrigações, cambiais ativas e passivas (estas nos termos do art. 1.587 do mesmo Código), visto não serem personalíssimas (arg. art. 928 do citado Código). Os herdeiros do credor cambial o substituem; adquirem a propriedade da letra de câmbio por sucessão, provando o seu direito com a partilha. Podem propor a ação cambial ficando sujeitos às exceções pessoais que caberiam contra o de cujus, se vivo fosse. A herança do devedor cambial pode também ser acionada executivamente (Código Civil, art. 1796).

(...) não se se extinguindo a obrigação cambial pela morte do seu signatário, por ela respondem, nos termos do art. 1796 do Código Civil, a herança ou os herdeiros. Cabe, portanto, a ação cambial contra a herança ou os herdeiros ou sucessores do obrigado, legítimos ou testamentários."

(CARVALHO DE MENDONÇA, J. X., at. por Paulo Benasse, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, volume III, tomo II., 1ª edição. Editora Bookseller, Campinas (SP): 2003, pp. 329?330 e 548).


A partir da interpretação da Lei Uniforme, a igual entendimento chegou o Tribunal da Relação do Porto em 04?04?2005, no julgamento dos embargos de executado n.° 0457254, relatado pelo Juiz Desembargador Fernandes do Vale, cujo teor foi obtido por meio de consulta à página eletrônica daquela Corte:

"(...) o facto de o vencimento da livrança haver ocorrido posteriormente ao decesso do respectivo avalista (que a havia subscrito, em tal qualidade, quase nove anos antes da respectiva morte), não pode ter o condão de operar a desresponsabilização cambiária dos herdeiros daquele (os embargantes, no caso dos autos).

Na realidade, como expende o saudoso Cons. Abel Pereira Delgado, na sua conhecida obra 'L.U.L.L., 3ª Ed. (1976), págs. 62,.... 'a obrigação cambiária surge logo no momento da emissão', aí se acrescentando que 'a letra, mesmo antes de preenchida, circula, pois, como título cambiário, estando sujeita ao regime cambiário.

Aliás, a mesma posição é defendida pelo não menos saudoso Prof. Ferrer Correia, quando ensina: 'a doutrina preferível é a da 'emissão'. A entrega do título não é apenas uma 'conditio juris' da eficácia da obrigação cambiária, já perfeita com a subscrição da declaração cartular. Ela é, diferentemente, elemento essencial à própria validade da obrigação. Pelo que esta não surge se não se verificar a emissão da letra pelo seu possuidor (...) a simples declaração cartular é insusceptível, só por si, de realmente obrigar o subscritor; para que ele fique vinculado, é sempre necessário o concurso desse outro requisito: a emissão do título'.

Assim, considerando que o exposto regime jurídico da constituição e existência da obrigação cambiária é de reputar extensivo às livranças, por via do preceituado no mencionado art. 77º, tem de considerar-se que, atenta a factualidade provada e o preceituado no art. 2.024º, do CC, o facto de o vencimento da livrança ter ocorrido muito posteriormente à morte do respectivo avalista, de quem os embargantes são herdeiros, não desresponsabiliza estes da obrigação cambiária por aquele, validamente contraída, nos termos em que ficaram expostos. É que tal obrigação integrava, já à data da respectiva morte, a globalidade das relações jurídicas patrimoniais, de que o mesmo avalista era, então, titular." (grifei)


Por derradeiro, o dissenso pretoriano não restou demonstrado por meio do cotejo analítico, com transcrição de trechos dos acórdãos recorrido e paradigma que exponham a similitude fática e a diferente interpretação da lei federal, conforme exige o artigo 255, § 2º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.

À vista de todo o exposto, e entendendo feridos ambos os dispostivos invocados, conheço do recurso especial e lhe dou  provimento, para julgar procedente o pedido. Em conseqüência, condeno os réus a pagarem o valor contido nas duas notas de crédito comercial objeto do pedido inicial, atualizadas desde o vencimento, acrescido de juros de mora, os quais fluirão no percentual de 0,5% a.m. desde a citação até a entrada em vigência do Novo Código Civil, quando o percentual passará a ser de 1% a.m. A divisão obedecerá à proporção observada na partilha, não podendo exceder a cota recebida por cada herdeiro.

Os réus pagarão honorários, que fixo em 20% sobre o valor da condenação, e arcarão com as custas processuais, devendo o rateio obedecer à proporcionalidade acima estabelecida.

É o voto.


terça-feira, 11 de setembro de 2012

Responsabilidade de sócio por dívidas é limitada



Uma nova tendência da Justiça do Trabalho deve amenizar a situação de inúmeros ex-sócios que têm bens comprometidos para o pagamento de dívidas das empresas nas quais tiveram participação.

Julgados dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) e até do Tribunal Superior do Trabalho (TST) têm aplicado o Código Civil para limitar a responsabilidade do ex-sócio aos fatos ocorridos no período em que ainda estava na companhia.

Pelo entendimento, a responsabilidade só se estenderia a processos iniciados até dois anos após a averbação, na junta comercial, da saída da sociedade. Outras decisões só chamam o ex-sócio ao processo quando há a comprovação de conduta ilícita em sua gestão.

A 7ª Turma do TST, por exemplo, aplicou por unanimidade o Código Civil a um caso recente. Apesar disso, não foi favorável ao ex-sócio de uma transportadora, por não poder rever provas. O acórdão do TRT de São Paulo não indicou a data de averbação de retirada do sócio da empresa na junta comercial.

O antigo sócio alegava ter deixado a sociedade no dia 25 de setembro de 2001. Argumentou que, de acordo com os artigos 1.003 e 1.032 do Código Civil, o sócio somente teria responsabilidade pelas obrigações sociais até dois anos após ser averbada a resolução da sociedade. Ou seja, somente até 25 de setembro de 2003. Como a ação foi ajuizada em 4 de outubro de 2004, alegou que não poderia ser cobrado pelo débito.

Os ministros do TST, apesar de admitirem a aplicação do Código Civil, não reformaram a decisão contrária ao ex-sócio. O relator do processo, Pedro Paulo Manus, porém, concluiu que "à luz do Código Civil, o sócio retirante, quando procede à regular averbação de sua retirada na junta comercial, apenas pode ser responsabilizado pelos débitos relativos ao período em que foi sócio e desde que seja acionado no decurso dos dois anos seguintes à referida averbação". Para completar, indicou outros julgados do próprio TST nesse sentido.

Segundo o advogado Pedro Gomes Miranda e Moreira, do Celso Cordeiro de Almeida e Silva Advogados, tem sido muito comum a Justiça do Trabalho atribuir responsabilidade ao sócio da empresa quando a companhia não tem bens suficientes para garantir o crédito trabalhista. "Os ex-sócios ficam com seu patrimônio exposto a responder por essas dívidas", diz.

Moreira atua em um caso semelhante no TRT paulista, no qual o sócio averbou sua retirada da sociedade em 1999 e está respondendo por uma execução trabalhista iniciada em 2008. "Foram penhoradas participações societárias dele em outras empresas para pagar uma dívida de cerca de R$ 200 mil", afirma o advogado.

Para ele, essa limitação da responsabilidade do sócio, que vem ganhando corpo no Judiciário, traz importantes precedentes. Moreira diz que, como a legislação trabalhista é omissa com relação ao assunto, é possível aplicar o Código Civil.

O TRT da 10ª Região, que abrange o Distrito Federal e o Tocantins, ao citar decisões do TST, determinou recentemente o cancelamento da penhora do automóvel de um ex-sócio de uma pizzaria, que estava sendo executada por um antigo funcionário.

Em outro julgado, a 6ª Turma do TRT paulista foi além. Os desembargadores entenderam que a responsabilidade desses ex-sócios não decorre automaticamente e que pressupõe a existência de indícios de fraude na retirada da sociedade para que haja a condenação.

A decisão ainda ressalta a condição de que a ação tenha sido ajuizada no prazo de dois anos após a averbação da alteração societária. Assim, excluíram a responsabilidade de um ex-sócio que se retirou da sociedade três anos antes do ajuizamento da ação e há anos sofria com a constrição de seus bens.

Segundo o voto do relator, desembargador Rafael Pugliese Ribeiro, se a retirada do sócio não se deu com objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação da legislação trabalhista, o ex-sócio não poderia responder pessoalmente pelos créditos trabalhistas.

Para os advogados Simone Rocha, do Homero Costa Advocacia e Cauã Resende, do JCMB Advogados e Consultores, essas decisões, apesar de ainda serem minoria, trazem uma nova perspectiva.

Simone afirma já ter obtido decisão favorável na qual o juiz condenou seu cliente a pagar apenas as parcelas da condenação pelo período em que respondia pela companhia. Para tentar excluir a responsabilidade de um sócio por dívidas trabalhistas, Resende ressalta ser essencial estar em dia com o registro de retirada de sócios na junta comercial para que se possa contar o prazo de dois anos, previsto no Código Civil. "Empresas mais informais se esquecem de registrar essas alterações."

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Responsabilização X A Desconsideração da Personalidade Jurídica



Responsabilização X Desconsideração da Personalidade Jurídica
Lorena Ferreira Fernandes, 2o ano


Responsabilização


Se a sociedade empresária é um ente a quem a lei reconhece – ou outorga - personalidade, para que através dela, se possa agir, temos que é um benefício concedido pelo Estado. Não se pode admitir, portanto, que o uso de um benefício se faça em prejuízo de terceiros. É evidente, que embora sendo uma pessoa individualizada, titular de direitos e deveres, com patrimônio próprio, para agir, a pessoa jurídica é dependente de seus integrantes, em especial, de seus administradores.

Se, no exercício da administração social, o sócio ou administrador age com abuso dos poderes que o ato constitutivo lhe confere ou infringe a lei, fazendo mau uso da pessoa jurídica, trazendo prejuízo a credores e terceiros, tais práticas devem ser coibidas.

Essas situações já atribuem responsabilidade pessoal aos sócios e administradores, entre outros, como liquidantes e prepostos. Esta possibilidade está inscrita em lei. O texto legal expõe uma determinada circunstância e, na sua ocorrência, prevê a responsabilização do agente ou sócio. Prova-se a ocorrência do fato registrado no dispositivo legal e pode-se atingir o patrimônio pessoal, geralmente, de modo subsidiário, ou a pessoa do sócio ou administrador.

É o caso, por exemplo, dos artigos 116, parágrafo único, 117, 153, parágrafo 3º do 155, 158, 165, 238, 245, 246, 281, 282 da lei 6.404/76 (lei da S.A.), do artigo 32 da lei 11.101/05 (lei de falências), do art. 135 do Código Tributário Nacional e, também, do artigo 1.016 do Código Civil. Nesses casos, o alcance do patrimônio pessoal dos sócios, administradores ou terceiros, ou suas pessoas, é previsto em situações especificadas em lei, que, em geral, pressupõem atos praticados com abuso de poder ou infração legal, por isso denominado responsabilização.

A responsabilização por infração à lei ou ao ato constitutivo ou por ato praticado com excesso de poder é legalmente prevista, não necessitando aplicar-se a desconsideração da personalidade jurídica, pois existe legislação específica a ser utilizada para atingir os dirigentes sociais ou seus bens, inclusive reconhecida pelos artigos 592, II e 596 do CPC.

É preciso não se confundir a responsabilização e a desconsideração. Ambas têm em comum o fato de buscar bens no patrimônio pessoal dos responsáveis ou impor sanção aos sócios ou agentes sociais, embora, em cada uma das possibilidades isso se dê de modo diverso. No caso de responsabilização, basta a prova do ato previsto em lei e do prejuízo. Na desconsideração é necessário provar que o ato do qual decorreu o prejuízo foi abusivo, já que, em regra, a aparência é de legalidade.

Essa confusão está presente nos textos dos artigos que prevêem a desconsideração no Código de Defesa do Consumidor e na lei antitruste, demonstrando imprecisão técnica em sua redação. Neles, o legislador arrola como desconsideração várias condutas que correspondem, na verdade, à responsabilização.

Veja-se: excesso de poder, infração à lei, fato ou ato ilícito, violação dos estatutos ou contrato social, falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade provocados por má administração ou sempre que a personalidade jurídica for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos aos consumidores.

Já em primeira constatação, é fácil reconhecer a redundância do legislador consumerista, vez que as hipóteses de violação do estatuto ou contrato social vão estar agasalhadas pela figura de excesso de poder, do mesmo modo que o fato ou ato ilícito e o encerramento ou inatividade irregulares cabem na infração à lei.

Ressalve-se que a confusão não se limita a considerar caso de desconsideração o que é responsabilização, mas, também, quando menciona a falência, o estado de insolvência, a má administração ou sempre que a personalidade jurídica for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos aos consumidores, posto que, desse modo, está-se derrogando a limitação da responsabilidade e a personalidade jurídica como um todo.

Sabe-se, empiricamente, que, em grande parte, os casos de insucesso da atividade empresarial se devem à má administração, já que nenhum tipo de preparo é oferecido àqueles que desejam empreender em nosso país. Tal situação se torna ainda mais crítica devido ao fato de muitos não disporem de alternativa ante um mercado de trabalho retraído, como ocorre entre nós, na atualidade. Sendo a esmagadora maioria das empresas brasileiras constituída de micro e pequenas empresas, muitas são titularizadas por indivíduos excluídos dos postos formais de trabalho, que utilizam seus recursos de FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), amealhados ao longo de toda uma vida laboral, para iniciarem-se na atividade empresarial, tencionando ganharem a vida e o sustento da família, sem nenhum preparo, repita-se.

Outro caso equivocado, a nosso ver, é o do artigo 82 da nova lei de falências, que prevê a responsabilização de sócios de responsabilidade limitada, controladores e administradores de sociedade falida, independentemente da prova de insuficiência de ativo, pois também ignora o princípio da limitação da responsabilidade. O citado artigo 596 do código de rito expressa que a responsabilidade dos sócios é sempre subsidiária. O artigo 82 da lei 11.101/05 parte da má-fé dos sócios, o que é sempre condenável, mormente num sistema falimentar que, há muito, deixou de ser punitivo e infamante. Além disso, alcançando-se os bens dos sócios de maneira prévia, é provável que haja, ao final, saldo positivo para ser devolvido aos titulares das quotas sociais. Ora, pelo menos outros dois princípios, agora de ordem processual, estão sendo também ignorados: o da economia processual e o da execução menos gravosa. 


A Desconsideração da Personalidade Jurídica

Para as situações que a lei não consegue prever, casuisticamente, nas quais o benefício da pessoa jurídica é mal utilizado, tendo como objetivo conseguir uma vantagem indevida em detrimento de prejuízo causado a terceiro, elaborou-se a desconsideração da personalidade jurídica. Em casos tais, há, como mencionado, uma legalidade aparente.

Também chamada teoria da penetração ou teoria da superação, surgiu em 1897, na Inglaterra, para se atingir o patrimônio dos sócios ou administradores envolvidos, em circunstância excepcional, mesmo que o tipo social previsse a responsabilidade limitada.

Entre nós, Rubens Requião foi o primeiro a levantar a questão, autorizando sua utilização:
  • “Diante do abuso de direito e da fraude no uso da personalidade jurídica, o Juiz brasileiro, tem o direito de indagar, em seu livre convencimento, se há de consagrar a fraude ou o abuso de direito, ou se deva desprezar a personalidade jurídica, para penetrando em seu âmago, alcançar as pessoas e bens que dentro dela se escondem para fins ilícitos ou abusivos.”


A aplicação dessa teoria tem o objetivo, como já se disse, impedir que a personalidade jurídica seja instrumento de impunidade a abusos. É o que ensina Lamartine Correa:
  • “Se é em verdade uma outra pessoa que está a agir, utilizando a pessoa jurídica como escudo, e se é essa utilização da pessoa jurídica, fora de sua função, que está tornando possível o resultado contrário à lei, ao contrato, ou às coordenadas axiológicas fundamentais da ordem jurídica (bons costumes, ordem pública), é necessário fazer com que a imputação se faça com predomínio da realidade sobre a aparência.”

Porém, para sua aplicação não basta, por exemplo, a insolvência da sociedade. É necessário que tal fato tenha decorrido do mau uso da pessoa jurídica. É preciso cautela e critério na sua aplicação.

Há inclusive os que entendiam, antes do Código Civil – mas posterior a outros diplomas legislativos que adotavam a desconsideração – que não se deve aplicar a doutrina da desconsideração porque não existe nenhuma forma jurídica que deva ser desprezada pelo juiz.

O direito brasileiro permite a utilização da desconsideração nos termos do artigo 28 da lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), do artigo 18 da lei nº 8.884/94 (lei antitruste) – praticamente cópia literal do texto do CDC; ambos ainda que eivados de imprecisão técnica, como observado -, do artigo 4º da lei 9.605/98 (lei do meio ambiente) e do artigo 50 do Código Civil.

A aplicação da teoria vinha sendo reconhecida pela doutrina e jurisprudência e independia de previsão legal. Ficava - como fica - porém, sempre condicionada à apreciação judicial.

O espírito da desconsideração foi também incorporado pela lei nº 8.429/92, no artigo 12, superando, de modo inverso, a personalidade jurídica para alcançar a empresa impedindo-a de contratar com o Poder Público, caso mantenha em seus quadros administrador, sócio ou controlador que tenha praticado ato de improbidade administrativa. Também há exemplo da desconsideração inversa na Lei do Sistema Financeiro (Lei nº 4.595/64), que proíbe certos negócios ou operações de serem efetuados entre a instituição financeira e pessoas jurídicas cujo capital tenha sido, de modo majoritário, constituído pelos administradores daquela instituição. A mesma lei responsabiliza, solidariamente, diretores e gerentes das instituições financeiras pelas obrigações assumidas pelas mesmas durante suas gestões.

A desconsideração inversa também tem sido apontada como solução em lides de separação ou divórcio, como informa Fábio Ulhoa Coelho.

O mesmo espírito da teoria da desconsideração da personalidade jurídica está presente em outros diplomas legais, dos quais ainda serve de exemplo, além dos acima citados, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em seu artigo 2º, § 2º, no qual é prevista a responsabilidade solidária, para efeitos de relação empregatícia, da empresa principal e subordinadas, quando constituam um grupo econômico. Mas, como há previsão específica na lei, trata-se de responsabilização. Muito embora o grupo de sociedades dependa de formalização entre as integrantes do grupo e posterior arquivamento na Junta Comercial, a legislação trabalhista, no artigo citado, se refere a grupo econômico, o que, tecnicamente, pode ser entendido de modo diverso do termo grupo de sociedades. Então, mesmo que não haja convenção registrada formalizando o grupo, nos termos do artigo 265 e seguintes da lei 6.404/76, a solidariedade na responsabilização por dívidas trabalhistas seria legítima. Não se exige a prova da fraude ou do abuso, desde que provada a lesão ao direito do empregado.

A Justiça do Trabalho também é pródiga em decisões, já constituindo entendimento cristalizado, que a personalidade jurídica do empregador deve ser desconsiderada e os bens dos membros sociais alcançados sempre para a satisfação do crédito trabalhista, quando a empresa não possuir patrimônio suficiente, mesmo na ausência de fraude ou abuso. A Justiça do Trabalho, na prática, ignora a personalidade jurídica e não reconhece a separação patrimonial e a limitação da responsabilidade.

Esse posicionamento é, no entanto, equivocado porque, como regra, compromete o instituto da personalidade jurídica e o princípio da autonomia patrimonial.  A desconsideração é válida apenas enquanto tem o intuito de preservar a pessoa jurídica e sua autonomia, já que ambos são instrumentos indispensáveis à organização da atividade econômica, sem deixar ao desabrigo terceiros vítimas de fraude.

 No anteprojeto do Código Civil (Projeto de Lei nº 634-B), a previsão de elevar-se a teoria à legislação, se dava na seguinte redação:
  • “art. 50 – a pessoa jurídica não pode ser desviada dos fins estabelecidos no ato constitutivo para servir de instrumento ou cobertura à prática de atos ilícitos ou abusivos, caso em que poderá o juiz, a requerimento de qualquer dos sócios ou do ministério público decretar a exclusão do sócio responsável, ou, tais sejam as circunstâncias, a dissolução da sociedade. Parágrafo único – Neste caso, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, responderão conjuntamente com os da pessoa jurídica, os bens pessoais do administrador ou representante que dela se houver utilizado de maneira fraudulenta ou abusiva, salvo se norma especial determinar responsabilidade solidária de todos os membros da administração”.

A pena de exclusão do sócio ou de dissolução da sociedade, não são conseqüências, originariamente, previstas na disregard doctrine.

Pela imprecisão dos termos, o texto, na versão final, foi bastante reduzido, traçando critérios objetivos (desvio de finalidade e confusão patrimonial) para que o juiz aplique ou não a desconsideração no caso concreto.

A finalidade da desconsideração é afastar, momentaneamente, a personalidade jurídica da sociedade, para atingir os sócios ou administradores ou seus bens, caso tenham agido com abuso ou má-fé, prejudicando terceiros. A simples insolvência, decorrente de atos praticados dentro da normalidade administrativa de uma sociedade não autoriza a desconsideração.

São pressupostos de sua aplicação a existência de mau-uso da pessoa jurídica (agora traduzido em desvio da finalidade ou confusão patrimonial), a ausência de patrimônio social e a autorização judicial para que se entre no patrimônio pessoal dos sócios. Na desconsideração inversa, não se exige a existência de dívidas, mas, sim, a prática de atos condenados legalmente.

O que ocorre, na prática, então, é que para aquele caso isolado, e apenas para ele, de modo transitório e episódico, ignora-se a existência da pessoa jurídica e, portanto, os princípios da separação patrimonial e da limitação da responsabilidade, para que o credor seja satisfeito ou a sanção seja aplicada, sempre atentando-se para o implemento dos requisitos de aplicação. Para tudo o mais, concomitantemente, a personalidade jurídica não sofre qualquer abalo.

Por isso, somos de opinião que referir-se a essa possibilidade pelos termos descaracterização ou desconstituição da pessoa jurídica não atende à essência da técnica. Tais expressões estariam mais próximas da despersonalização, outra medida que pode ser facilmente confundida com a desconsideração.

Enquanto a desconsideração pressupõe a existência de débitos decorrentes da má utilização da pessoa jurídica que a sociedade não tem condições de suportar e, por isso, para o episódio, a personalidade jurídica é, momentaneamente, afastada, a despersonalização é utilizada para pôr fim à pessoa jurídica, em situações decorrentes também do mau uso, mas que não envolvem, necessariamente, débitos, ou seja, quando a empresa da pessoa jurídica vem sendo desenvolvida de modo a causar danos de massa, causando prejuízos à concorrência ou meio ambiente ou aos consumidores ou ao mercado, por exemplo. Geralmente, há um agravamento de penalidades a serem aplicadas nesses casos, que não sendo suficientes para coibir a conduta danosa da sociedade empresária, pode chegar à determinação de extinção da empresa.

Bem assim, embora cientes de que tal determinação pode ser vista como pena para a sociedade transgressora e que o direito penal não comporta interpretação extensiva da lei, sustentamos que, aplicadas todas as medidas possíveis, previstas na legislação antitruste, se nenhuma delas foi capaz de modificar a atuação danosa da sociedade, o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) tem permissão, observadas as circunstâncias mencionadas no artigo 27 da lei 8.884/94, de impor a despersonalização, porque, o que se quer, na verdade, não é a punição da sociedade, mas a salvaguarda do mercado, das relações de consumo, da livre concorrência, enfim, a preservação da higidez do mercado O texto do artigo 24 prevê que, ante a gravidade dos fatos ou em nome do interesse público geral, o CADE pode impor “qualquer outro ato ou providência necessários para a eliminação dos efeitos nocivos à ordem econômica.” 

Voltando à desconsideração, Fábio Ulhoa Coelho faz toda uma elaboração sobre as teorias - maior e menor - dela decorrentes e elucida como pode ser vista como um instrumento de socialização das perdas para manter preços, o que interessa a todos.

Marçal Justen Filho também já diferenciava a intensidade da desconsideração em máxima, que corresponderia à teoria menor de Fábio Ulhoa Coelho, média e mínima, correlata à teoria maior, para concluir, com Lamartine Correa, que a última é a “única compatível com o conceito de desconsideração”.

Fonte:
http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2769

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

SOCIEDADE ANÔNIMA. RESPONSABILIDADE DOS ADMINISTRADORES. CONTAS APROVADAS PELA AGO


A aprovação das contas sem reservas pela assembleia geral ordinária (AGO), salvo se anulada, exonera os administradores e diretores de quaisquer responsabilidades (art. 134, § 3º, da Lei n. 6.404/1976 – Lei das Sociedades Anônimas). Na espécie, a empresa recorrente ajuizou ação indenizatória para obter do recorrido (diretor financeiro da empresa) reparação correspondente ao valor das operações (derivativos) que realizou sem consentimento e que geraram prejuízos em razão da disparidade cambial. Todavia, a regra do art. 134, § 3º, da lei supradita é especial em relação ao art. 159 do referido diploma legal, de modo que, no caso de aprovação de contas, não bastaria a prévia deliberação da assembleia geral para a propositura da ação de responsabilidade civil, como ocorreu na hipótese, mas, mister, antes de tal propositura ou concomitantemente a ela, o ajuizamento da ação de anulação da assembleia que aprovou as contas da sociedade (art. 286 da mencionada lei). Salientou-se ainda que, somente após o trânsito em julgado da sentença que acolher a anulatória (pela ocorrência de erro, dolo, fraude ou simulação), será possível ajuizar a ação de responsabilidade pertinente. In casu, não é cabível ação de responsabilidade civil contra quem dela, por força de lei e do ato jurídico perfeito, foi exonerado. Precedentes citados: AgRg no Ag 640.050-RS, DJe 1º/6/2009; AgRg no Ag 950.104-DF, DJe 30/3/2009, e REsp 257.573-DF, DJ 25/6/2001. REsp 1.313.725-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 26/6/2012.