quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Bancos não podem questionar ordem de cliente para sustar cheques


Bancos não podem questionar a ordem de cliente para sustar o pagamento de cheques. Foi com esse entendimento que a 2ª Câmara de Direito Comercial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina deu provimento parcial à apelação de um correntista do Banco do Brasil que acabou inscrito em cadastro de inadimplentes, depois de ter dois cheques devolvidos por falta de fundos. Os cheques estavam entre os 33 que o cliente mandou o banco sustar.

O relator do caso, desembargador Luiz Fernando Boller, explicou que o cliente não tem a obrigação de emitir qualquer juízo sobre o que o motivou a sustar o pagamento. “A lei assegura ao emitente a faculdade de sustar a respectiva quitação, desde que manifestada tal intenção por escrito, diligência esta efetivamente encetada pelo autor apelante, que, malgrado isto, foi indevidamente inscrito no rol de maus pagadores, suportando, inclusive, tarifas relativas à ulterior devolução dos títulos por insuficiente provisão de fundos”, diz Boller.

A 2ª Câmara instituiu a indenização em R$ 15 mil, acrescida de juros de mora a contar da data do evento, além de custas e honorários advocatícios em 15% sobre o valor atualizado da condenação. A decisão foi unânime.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

STJ aplica desconsideração inversa de personalidade jurídica para proteger direito de cônjuge em partilha

A desconsideração inversa da personalidade jurídica poderá ocorrer sempre que o cônjuge ou companheiro empresário se valer de pessoa jurídica por ele controlada, ou de interposta pessoa física, para subtrair do outro cônjuge direito oriundo da sociedade afetiva. 

A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que reconheceu a possibilidade de desconsideração inversa da pessoa jurídica, em ação de dissolução de união estável. 

A desconsideração da personalidade jurídica está prevista no artigo 50 do Código Civil (CC) de 2002 e é aplicada nos casos de abuso de personalidade, em que ocorre desvio de finalidade ou confusão patrimonial. Nessa hipótese, o magistrado pode decidir que os efeitos de determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. 

A desconsideração inversa, por sua vez, ocorre quando, em vez de responsabilizar o controlador por dívidas da sociedade, o juiz desconsidera a autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizá-la por obrigação do sócio. 

No caso analisado pela Terceira Turma, o juízo de primeiro grau, na ação para dissolução de união estável, desconsiderou a personalidade jurídica da sociedade, para atingir o patrimônio do ente societário, em razão de confusão patrimonial da empresa e do sócio que está se separando da companheira. 

Máscaras societárias

A alegação do empresário no recurso interposto no STJ é de que o artigo 50 do CC somente permitiria responsabilizar o patrimônio pessoal do sócio por obrigações da sociedade, mas não o inverso. Contudo, a relatora, ministra Nancy Andrighi, entende que a desconsideração inversa tem largo campo de aplicação no direito de família, em que a intenção de fraudar a meação leva à indevida utilização da pessoa jurídica. 

“A desconsideração da personalidade jurídica, compatibilizando-se com a vedação ao abuso de direito, é orientada para reprimir o uso indevido da personalidade jurídica da empresa pelo cônjuge (ou companheiro) sócio que, com propósitos fraudatórios, vale-se da máscara societária para o fim de burlar direitos de seu par”, ressaltou a ministra. 

A ministra esclareceu que há situações em que o cônjuge ou companheiro esvazia o patrimônio pessoal, enquanto pessoa natural, e o integraliza na pessoa jurídica, de modo a afastar o outro da partilha. Também há situações em que, às vésperas do divórcio ou da dissolução da união estável, o cônjuge ou companheiro efetiva sua retirada aparente da sociedade, transferindo a participação para outro membro da empresa ou para terceiro, também com o objetivo de fraudar a partilha. 

Assim, a ministra ressaltou que o objetivo da medida é “afastar momentaneamente o manto fictício que separa os patrimônios do sócio e da sociedade para, levantando o véu da pessoa jurídica, buscar o patrimônio que, na verdade, pertence ao cônjuge (ou companheiro) lesado”. 

No caso analisado pelo STJ, o TJRS seguiu o entendimento do juízo de primeiro grau e concluiu pela ocorrência de confusão patrimonial e abuso de direito por parte do sócio majoritário. Alterar a decisão quanto ao ponto, conforme a ministra, não seria possível sem o reexame de fatos e provas, o que é vedado pela Súmula 7 do STJ. 

Legitimidade ativa

Conforme a decisão, a legitimidade ativa para requerer a desconsideração é atribuída, em regra, ao familiar lesado pela conduta do sócio. No caso analisado, a sócia detinha apenas 0,18% das cotas sociais, sendo a empresa gerida pelo ex-companheiro. 

Segundo a relatora, detendo a recorrida uma parcela muito pequena das cotas sociais, seria extremamente difícil – quando não impossível – investigar os bens da empresa, para que fosse respeitada sua meação. “Não seria possível, ainda, garantir que os bens da empresa não seriam indevidamente dissipados, antes da conclusão da partilha”, analisou a ministra. 

“Assim, se as instâncias ordinárias concluem pela existência de manobras arquitetadas para fraudar a partilha, a legitimidade para requerer a desconsideração só pode ser daquele que foi lesado por essas manobras, ou seja, do outro cônjuge ou companheiro, sendo irrelevante o fato deste ser sócio da empresa”, concluiu. 

A ministra esclareceu que, no caso, a legitimidade decorre não da condição de sócia, mas em razão da sua condição de companheira. 

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Recuperação judicial não suspende execução contra avalistas e fiadores


O processamento da recuperação judicial de empresa ou mesmo a aprovação do plano de recuperação não suspende ações de execução contra fiadores e avalistas do devedor principal recuperando. Esse é o entendimento da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça. A decisão foi tomada em julgamento de recurso especial sob o rito dos repetitivos, estabelecido no artigo 543-C do Código de Processo Civil.

A Seção fixou a seguinte tese: "A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções, nem tampouco induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos artigos 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o artigo 59, caput, por força do que dispõe o artigo 49, parágrafo 1º, todos da Lei 11.101/2005".

Segundo o relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, a controvérsia é bastante conhecida no STJ. Após o deferimento da recuperação judicial e, mais adiante, com a aprovação do plano pela assembleia de credores, surgem discussões acerca da posição a ser assumida por quem, juntamente com a empresa recuperanda, figurou como coobrigado em contratos ou títulos de crédito submetidos à recuperação.

Frequentemente, os devedores solidários da empresa em recuperação pedem a suspensão de execuções contra eles invocando a redação do artigo 6º da Lei 11.101/05: “A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário”.

Salomão explicou que o artigo alcança os sócios solidários, pois na eventualidade de decretação de falência da sociedade, os efeitos da quebra estendem-se a eles. A situação é bem diversa, por outro lado, em relação aos devedores solidários ou coobrigados. Para eles, a disciplina é exatamente inversa, prevendo a lei expressamente a preservação de suas obrigações na eventualidade de ser deferida a recuperação judicial do devedor principal.

O artigo 49, parágrafo 1º, da Lei 11.101 estabelece que “os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso”.

Assim, o relator afirmou que não há suspenção da execução direcionada a codevedores ou devedores solidários pelo simples fato de o devedor principal ser sociedade cuja recuperação foi deferida, pouco importando se o executado é também sócio da recuperanda ou não, uma vez não se tratar de sócio solidário.

Salomão ressaltou que na I Jornada de Direito Comercial feita pelo CJF/STJ foi aprovado o Enunciado 43, com a seguinte redação: "A suspensão das ações e execuções previstas no artigo 6º da Lei 11.101/2005 não se estende aos coobrigados do devedor".

Novação de créditos
No caso julgado, o avalista de Cédula de Crédito Bancário pretendia suspender execução ajuizada contra ele pelo Banco Mercantil do Brasil. No curso do processo, foi aprovado o plano de recuperação judicial e concedida a recuperação, com novação da dívida.  

O ministro Salomão afirmou que, diferentemente da primeira fase, em que a recuperação é deferida pelo juiz e é formado o quadro de credores, nessa segunda fase, em que já há um plano aprovado, ocorre a novação dos créditos e a decisão homologatória constitui, ela própria, novo título executivo judicial.

Segundo o relator, a novação prevista na lei civil é bem diversa daquela disciplinada na Lei 11.101. Se a novação civil, como regra, extingue as garantias da dívida, inclusive as reais prestadas por terceiros estranhos ao pacto (artigo 364 do Código Civil), a novação decorrente do plano de recuperação traz, como regra, ao reverso, a manutenção das garantias (artigo 59, caput, da Lei 11.101), as quais só serão suprimidas ou substituídas "mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia", por ocasião da alienação do bem gravado.

“Portanto, muito embora o plano de recuperação judicial opere novação das dívidas a ele submetidas, as garantias reais ou fidejussórias são preservadas, circunstância que possibilita ao credor exercer seus direitos contra terceiros garantidores e impõe a manutenção das ações e execuções aforadas em face de fiadores, avalistas ou coobrigados em geral”, disse o ministro.

As duas turmas de Direito Privado do STJ entendem que tanto na primeira quanto na segunda fase da recuperação não cabe a suspensão das ações de execução, em razão do processamento da recuperação ou extinção, por força da novação. 

O entendimento das duas turmas vale para todas as formas de garantia prestadas por terceiro, sejam elas cambiais, reais ou fidejussórias — garantia pessoal em que terceira pessoa se responsabiliza pela obrigação, caso o devedor deixe de cumpri-la. É o caso da fiança e do aval.

A garantia prestada por terceiro no processo julgado é na modalidade aval, que, diferentemente da fiança, é obrigação cambiária que não tem relação de dependência estrita com a obrigação principal assumida pelo avalizado, subsistindo até mesmo quando a última for nula, conforme explicou o relator.

“Portanto, dada a autonomia da obrigação resultante do aval, com mais razão o credor pode perseguir seu crédito contra o avalista, independentemente de o devedor avalizado encontrar-se em recuperação judicial”, afirmou Salomão no voto. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

REsp 1.333.349

Revista Consultor Jurídico, 9 de dezembro de 2014, 12h45

sábado, 6 de dezembro de 2014

Respostas do Exame de 2014


1ª questão
O que é estabelecimento empresarial? Cite dois exemplos de estabelecimento.
R – Pode ser entendido como qualquer forma de organização dos fatores de produção. É o complexo de meios idôneos materiais e imateriais pelos quais o comerciante explora determinada espécie de comércio. Ou como leciona Fábio Ulhoa: é o conjunto de bens que o empresário reúne para exploração de sua atividade econômica.
Exemplo: mercadorias do estoque, equipamentos e maquinaria (bens materiais); patentes de invenção, marcas registradas, nome empresarial, título do estabelecimento, ponto empresarial (bens imateriais).

2ª questão
O que é ser sócio remisso? Quais as consequências previstas ao sócio remisso? Qual o quorum necessário para a sociedade aplicar sanções ao sócio remisso?
R: Conforme leciona o professor Fábio Ulhôa Coelho, o sócio remisso é aquele que não cumpre com a sua obrigação de contribuir para a formação do capital social. Sobre as consequências que pode sofrer o sócio remisso, dependerá do que a maioria dos demais sócios preferir. Poderá ser à indenização, a exclusão, ou a redução da quota ao montante já realizado.

3ª questão
É obrigatória a criação e o funcionamento do Conselho Fiscal nas Sociedades Anônimas? Explique a resposta.
R – o conselho fiscal é um órgão social que deve estar obrigatoriamente disciplinado pelo estatuto da sociedade, mas cujo funcionamento fica a critério do próprio estatuto, ou de requisição dos acionistas. Trata-se, pois, de um órgão obrigatório de funcionamento facultativo. Tal disciplina decorre da perda do prestígio da fiscalização orgânica feita pelo conselho fiscal, em função da ineficiência demonstrada por tal órgão. (Curso de direito empresarial. Tomazette – p. 529).

4ª questão
Explique o objeto social das S/A.
R – A S/A é sempre mercantil (empresária), não importando a natureza da atividade exercida. Apesar disso, é sempre necessário que o estatuto da sociedade defina, de modo claro e preciso, o objeto a que essa se destina, vale dizer, não se pode formular genericamente o objeto social. Há que se indicar o gênero e a espécie da atividade desenvolvida (art. 53, § 1º, do Decreto 1.800/96). O objeto social deve ser uma atividade econômica lícita, possível e com fins lucrativos, não se admitindo o exercício de atividades filantrópicas por meio de uma sociedade anônima.  (Curso de direito empresarial. Tomazette – p. 391).



sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO. FURTO DE VEÍCULO DEIXADO COM AS PORTAS ABERTAS E CHAVE NA IGNIÇÃO. AGRAVAMENTO DO RISCO INOCORRENTE. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA MÁ-FE DO SEGURADO. DEVER DE INDENIZAR.


RECURSO ESPECIAL Nº 1.411.431 - RS (2012?0130664-9)
RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
RECORRENTE : MAPFRE SEGUROS GERAIS S?A
ADVOGADO : PAULO ANTÔNIO MULLER E OUTRO(S)
RECORRIDO : RAFAEL ZAMBAN
ADVOGADO : AIRTON SGANZERLA E OUTRO(S)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator):
Trata-se de recurso especial interposto por MAPFRE SEGUROS GERAIS S?A em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado:
APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO. FURTO DE VEÍCULO DEIXADO COM AS PORTAS ABERTAS E CHAVE NA IGNIÇÃO. AGRAVAMENTO DO RISCO INOCORRENTE. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA MÁ-FE DO SEGURADO. DEVER DE INDENIZAR.
1. Para que a seguradora, ora apelada, restasse isenta do pagamento do seguro, a má-fé ou dolo da parte segurada deveria ter sido cabalmente demonstrada, o que não se verificou na hipótese vertente. Imprescindível a intenção do segurado, não bastando mera negligência ou imprudência deste. Destarte, não comprovado o agravamento intencional do risco contratado, ônus que incumbia à parte ré, nos termos do artigo 333, II, do CPC, é devida a indenização securitária.
2. A indenização deve ser calculada segundo os parâmetros vigentes no momento em que o risco foi implementado. Assim, deve ser utilizada, no caso em apreço, a tabela FIPE do mês em que o sinistro ocorreu, diversamente da tese esposada pela seguradora que pretende a adoção daquela vigente à época do pagamento. Precedentes.

3. Tendo o autor decaído do pedido de indenização por dano morais, não há falar em sucumbência mínima. Ônus sucumbenciais redistribuidos. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO.
No recurso especial, interposto com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, o?a recorrente aponta, além do dissídio jurisprudencial, ofensa ao artigo 768 do Código Civil, porquanto (I) é inequívoco que o sinistro ocorreu em razão, substancialmente, de que as chaves estavam na ignição, as portas estavam abertas, era madrugada e o segurado não se encontrava ao lado do bem segurado, mencionando-se, apenas, a falta de prova da intenção do segurado no agravamento do risco; (II) a referida norma, em que pese registre a intenção do agravamento do risco como fato gerador da perda da indenização, por certo engloba a culpa grave neste rol.
Contrarrazões ao recurso especial às fls. 297?298.
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.411.431 - RS (2012?0130664-9)
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator):
Eminentes colegas. A polêmica do presente recurso especial situa-se em torno da interpretação da regra do art. 768 do Código Civil, que regula a hipótese de perda do direito à garantia securitária pelo agravamento do risco pelo segurado nos seguintes termos: Art. 768. O segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato.
A questão é relevante no caso concreto, pois restou incontroverso, desde a petição inicial, que o veículo foi furtado, durante a madrugada, em posto de gasolina, pois o segurado teria deixado as portas abertas e a chave na ignição (fl. 256).
A discussão é se essa conduta do segurado pode ser considerada como um agravamento intencional do risco objeto do contrato de seguro.
O acórdão recorrido não reconheceu a ocorrência de agravamento intencional, pois era costume do autor e outros clientes deixarem a chave na ignição enquanto estavam no posto de gasolina.
Com a devida vênia, tenho que, no presente caso, se mostra inequívoco o "voluntário e consciente" agravamento do risco do objeto do contrato, que foi determinante para a subtração do veículo.
Ressalte-se que o furto ocorreu às duas horas da madrugada, deixando-se o veículo com as portas abertas e a chave na ignição, não se podendo conceber que tal conduta possa ser qualificada como mero descuido do segurado.
Pelo contrário, essa conduta voluntária do segurado ultrapassa os limites da culpa grave, incluindo-se nas hipóteses de agravamento do risco na linha dos precedentes desta Corte, determinando o afastamento da cobertura securitária.
Nesse sentido:
CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE SEGURO. CULPA IN VIGILANDO. APOSSAMENTO DO BEM POR EMPREGADO INABILITADO. AGRAVAMENTO DO RISCO PELO SEGURADO. DEVER DE INDENIZAR. AUSÊNCIA.
1. Ação de cobrança distribuída em 06.12.2006, da qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 10.10.2013.
2. Cinge-se a controvérsia em definir se a culpa in vigilando da empresa, ao não evitar que empregado inabilitado para dirigir se aposse do bem segurado, afasta a cobertura securitária.
3. À vista dos princípios da eticidade, da boa-fé e da proteção da confiança, o agravamento do risco decorrente da culpa in vigilando da empresa, ao não evitar que empregado não habilitado se apossasse do veículo, tem como consequência a exclusão da cobertura, haja vista que o apossamento proveio de culpa grave do segurado.
4. Recurso especial não provido. (REsp 1.412.816?SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15?05?2014, DJe 30?05?2014)
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. SEGURO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. EMBRIAGUEZ DE TERCEIRO CONDUTOR. FATO NÃO IMPUTÁVEL À CONDUTA DO SEGURADO. EXCLUSÃO DA COBERTURA. IMPOSSIBILIDADE.
1. Para a recusa de pagamento de indenização securitária, o agravamento do risco deve ser imputado à conduta direta do próprio segurado. A presunção de que o segurado tem por obrigação não permitir que o veículo seja conduzido por pessoa em estado de embriaguez é válida até a efetiva entrega do veículo a terceiro.
2. Condições e valores de pagamento estipulados no contrato de seguro deverão ser analisados pelo magistrado de primeira instância.
3. Agravo regimental desprovido. (AgRg nos EDcl no REsp 1.341.392?SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 20?06?2013, DJe 01?07?2013)
DIREITO CIVIL. CONTRATO DE SEGURO. ACIDENTE PESSOAL.  ESTADO DE EMBRIAGUEZ. FALECIMENTO DO SEGURADO. RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA. IMPOSSIBILIDADE DE ELISÃO.  AGRAVAMENTO DO RISCO NÃO-COMPROVADO. PROVA DO TEOR ALCOÓLICO E SINISTRO. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE. CLÁUSULA LIBERATÓRIA DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. ARTS. 1.454 E 1.456 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916.
1. A simples relação entre o estado de embriaguez e a queda fatal, como única forma razoável de explicar o evento, não se mostra, por si só, suficiente para elidir a responsabilidade da seguradora, com a consequente exoneração de pagamento da indenização prevista no contrato.
2. A legitimidade de recusa ao pagamento do seguro requer a comprovação de que houve voluntário e consciente agravamento do risco por parte do segurado, revestindo-se seu ato condição determinante na configuração do sinistro, para efeito de dar ensejo à perda da cobertura securitária, porquanto não basta a presença de ajuste contratual prevendo que a embriaguez exclui a cobertura do seguro. (...) (REsp 780.757?SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 01?12?2009, DJe 14?12?2009)
Pontes de Miranda, ao analisar a questão sob a égide do art. 1.454 do Código Civil de 1916, asseverava que:
Diz o Código Civil, art. 1.454: "Enquanto vigorar o contrato, o segurado abster-se-á de tudo o quanto possa aumentar os riscos ou seja contrarário aos termos do estipulado, sob pena de perder o direito ao seguro". A pena é justificada pelo fato de ter sido o próprio interessado quem transforma 'in peius' a situação de fato, que foi apreciada pelo segurador ao ter de aceitar a oferta do contrato de seguro. Para que haja a pena, é preciso que a mudança haja sido tal que o segurador, se ao tempo da aceitação existisse o risco agravado, não teria aceito a oferta, ou teria exigido prêmio maior. (DE MIRANDA, PONTES. Tratado de Direito Privado - Tomo XLV. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 487)
Sobre o agravamento do risco nos contratos de seguro, Voltaire Marensi refere o seguinte:
Data venia, refletindo melhor sobre o caso ora ventilado, entendo que a agravação dos riscos é efetivamente de ordem subjetiva, notadamente levando-se em consideração o art. 768 do Código Civil de 2002, mas que, também, obedece a parâmetros de ordem econômico-estrutural. Com ensinanças nos mestres estrangeiros, particularmente em Garrigues, J. Contrato de Seguro Terrestre, Madrid, 1982, a seguradora não responde, propriamente, pelo risco em si causado pelo segurado, a não ser nos casos de seguro de responsabilidade civil, no qual ela, seguradora, obriga-se a reembolsar as despesas que seu segurado, por ato culposo, tenha lesado terceiro. (MARENSI, Voltaire. O seguro no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 18).
Por fim, Ernesto Tzirulnik, Flávio de Queiroz B. Cavalcanti e Ayrton Pimentel, ao analisarem o art. 768 do Código Civil, corroboram o entendimento aqui sustentado, verbis:
Agravar o risco equivale a aumentar a probabilidade de ocorrência da lesão ao interesse garantido, ou a severidade dessa lesão.
(...)
Como já afirmado, o novo Código, no seu art. 757, adotou orientação bastante diversa, mais correta e mais moderna, isto é, a prestação da seguradora é a garantia do interesse legítimo exposto a risco.
Há retidão conceitual na norma. Quando durante a execução do contrato celebrado o segurado agrava intencionalmente o risco, o comportamento revela o perecimento do interesse legítimo, objeto do contrato. Afinal, para que seja legítimo o interesse garantido é imprescindível que o segurado deseje preservar o status quo e não queira, nem lhe seja vantajosa, a realização do risco.
(...)
É necessário diferenciar a intenção de agravar o risco da prática intencional de ato que leva despercebidamente a essa agravação. Neste último caso, a solução dependerá da gravidade ou intensidade dos efeitos gravosos do comportamento. Comportando-se o segurado de maneira que a realização do risco ou aumento da intensidade dos seus efeitos se torne previsível, é de se aplicar a regra da caducidade. (in o Contrato de Seguro. 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 80-81)
Finalmente, a interpretação do enunciado normativo do art. 768 do Código Civil deve ser feita à luz do princípio da boa-fé objetiva, que constitui um dos pilares do Direito do Seguro.
Aliás, no Código Civil de 1916, a regra do art. 1443 ("O segurado e o segurador são obrigados a guardar no contrato a mais estrita boa-fé e veracidade, assim a respeito do objeto, como das circunstâncias e declarações a ele concernentes"), reproduzida, com pequenas alterações, pelo art. 765 do atual CC, era o único momento em que se fazia referência expressa ao princípio da boa-fé objetiva.
Essa disposição legal está atualmente redigida nos seguintes termos:
Art. 765 - O segurado e o segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto, como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.
Extrai-se desse enunciado normativo que a boa-fé é uma estrada de duas mãos, aplicando-se tanto ao segurador, como ao segurado, que devem manter uma conduta pautada por seus ditames (lealdade, honestidade, probidade) desde a celebração do contrato de seguro, mantendo-se ao longo da execução da relação obrigacional dele nascida, conforme também estatuído no art. 422 do CC.
Portanto, merece provimento ao recurso especial, reconhecendo-se a ocorrência de violação ao art. 768 do Código Civil pelo acórdão recorrido e julgando-se improcedente a demanda.
Ante o exposto, voto no sentido de dar provimento ao recurso especial para julgar improcedente a demanda, condenando o autor ao pagamento das custas e honorários advocatícios fixados em R$ 5.000,00.
É o voto.

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Empresa não pode enviar a audiência preposto que não é seu empregado

A 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a revelia de uma empresa de locação por ter enviado um preposto que não era seu empregado para representá-la em audiência na Justiça do Trabalho. Mesmo a empresa tendo apresentado peça de defesa com advogado munido de procuração, a Súmula 377 do TST exige que o preposto seja necessariamente empregado, à exceção dos casos de empregador doméstico e micro ou pequeno empresário.

De acordo com o processo, o trabalhador que ajuizou a reclamação trabalhista contestou a veracidade da relação de emprego do representante enviado pela companhia. O juiz de origem não aplicou a revelia ao analisar cópia das anotações lançadas na carteira de trabalho do preposto, que demonstravam que ele havia sido contratado em julho de 2003, considerando irrelevante a informação de que os depósitos de FGTS teriam passado a ser efetuados por outra empresa a partir de fevereiro de 2006.

Em recurso ordinário, o trabalhador insistiu que a cópia da carteira de trabalho do representante da empresa apresentada durante a audiência era falsa, uma vez que os recolhimentos do FGTS não eram feitos por ela, demonstrando seu desligamento. Alegou que se o preposto era ex-empregado, a sentença estaria em desacordo com a Súmula 377, "além de haver possível crime de falsificação de documento em juízo".

A empresa de locação se defendeu alegando que a companhia responsável pelos depósitos do FGTS do preposto fazia parte do seu grupo econômico, e que a prestação de serviços a mais de uma empresa do mesmo grupo não implica a existência de mais um contrato de trabalho. Sustentou ainda que não seria necessária a produção de prova da existência do grupo, uma vez que isso não era parte do processo.

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) entendeu que a empresa era confessa quanto à matéria de fato, por não ter comprovado a condição de empregado do preposto. Todavia, não decretaram a revelia, sob o fundamento de que a contestação foi apresentada na audiência, caracterizando o ânimo de defesa.

A relatora do recurso do trabalhador ao TST, ministra Delaíde Miranda Arantes, destacou que a Súmula 122 consagrou o entendimento de que a ausência da empresa à audiência em que deveria apresentar defesa importa revelia, independentemente do comparecimento de seu advogado. "Na hipótese dos autos, restou demonstrado que o preposto não era empregado da empresa, o que equivale à ausência da própria parte no processo em razão da irregularidade de representação processual", explicou.

Com a decisão unânime no sentido do reconhecimento da revelia, a Turma determinou o retorno dos autos à Vara do Trabalho que seja proferida nova sentença, desconsiderando a defesa juntada pela empresa.

RR-219800-56.2007.5.09.0245

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Leitura relax - verdade verdadeira


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  • Nele, um desembargador destacado no mundo jurídico narraria que cometeu grave equívoco ao ser corporativo, por ter conseguido evitar a punição disciplinar de um juiz substituto relapso o qual, mais tarde, criou enormes problemas para a magistratura, envergonhando seus colegas. Um advogado poderia contar que participou da campanha pelo fim das férias forenses nos tribunais, sem imaginar que isto só traria confusões, com a mudança constante da composição das câmaras, convocando-se juízes, além de aumentar em 6 dias as férias dos desembargadores. Um  cartorário confessaria que colocava as petições dos advogados que não gostava no último lugar da pilha, prejudicando, com isto, parte na ação  que nem conhecia.
  • Intervalo para o almoço. Às 14h, outro painel: “Minha arrogância foi o meu erro”. Neste, um procurador da República, um delegado de Polícia e um advogado da União contariam suas mazelas pessoais. O primeiro poderia dizer de uma ação de improbidade administrativa pela qual, por orgulho e para mostrar poder, submeteu uma autoridade honesta a um processo de 12 anos. O segundo poderia contar uma prisão em flagrante desnecessária, cujo auto foi lavrado só porque o suspeito era rico e que, com isto, quis mesmo provar que tinha poder. O terceiro poderia falar do mal causado a um autor, por ter interposto recursos especial e extraordinário em uma causa proposta há décadas por um idoso, cuja tese era vitoriosa nas Cortes Superiores, fato que retardou a definição do conflito em anos.