quarta-feira, 20 de novembro de 2019

COBRANÇA ILEGAL TJ-RJ aplica teoria do desvio produtivo para condenar concessionária de energia




A 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro condenou a concessionária de energia Light a pagar indenização de R$ 5 mil por ter cobrado multa de maneira irregular e arbitrária. Por unanimidade, o colegiado decidiu aplicar ao caso a teoria do desvio produtivo: por culpa exclusiva da empresa, a consumidora teve de interromper suas atividades normais para resolver um problema que não foi causado por ela.


Prestadores de serviço da Light, concessionária de energia no Rio de Janeiro

Em primeiro grau, o juiz havia condenado a Light apenas a interromper a cobrança do termo de ocorrência e inspeção (TOI) e devolver o valor cobrado em dobro. Mas negou o pedido de danos morais. O TJ, no entanto, seguiu o voto da desembargadora Regina Lúcia Passos para incluir a indenização, com base na teoria do desvio produtivo.

Desenvolvida no Brasil pelo advogado Marcos Dessaune, a teoria procura introduzir no cálculo das indenizações o tempo gasto por consumidores para resolver problemas causados exclusivamente por fornecedores. Conforme a teoria, esses seriam casos de danos extrapatrimoniais.

No caso da Light, a consumidora contou nos autos que em maio de 2018, sem qualquer aviso prévio ou notificação, recebeu um TOI de R$ 666,86. Em julho, a companhia passou a incluir na conta de luz da consumidora parcelas de R$ 29, como pagamento da multa.

Segundo a empresa, houve alteração de uma ligação elétrica para que fossem computados gastos menores de energia que os reais. A perícia judicial, entretanto, não encontrou qualquer indício de alteração ou fraude.

A desembargadora Regina Passos acrescentou ainda que, conforme a Súmula 256 do TJ-RJ, a concessionária precisa comprovar a legitimidade do TOI, o que não aconteceu no caso. Também é necessário que o consumidor esteja presente durante a lavratura do termo, que deve ser feita por peritos qualificados pela empresa. E nada disso aconteceu.

“Decerto que, houve transtornos fora do normal na vida da autora e mácula a Direitos de sua Personalidade, eis que foi tachada de fraudadora, tendo-lhe sido imposto débito de grande monta, cujo pagamento teve que suportar, além de lhe causar o temor de ver o serviço essencial suspenso”, escreveu a relatora, no voto. “Com a cobrança de dívida inexigível, configura-se a ilegalidade da mesma.”


Apelação Cível  0024656-53.2018.8.19.0206

Pedro Canário é chefe de redação da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 19 de novembro de 2019, 20h40

sexta-feira, 15 de novembro de 2019

Para a comprovação de união estável, para fins de concessão de benefício de pensão por morte, sendo bastante, para tanto, a prova testemunhal

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA PELA PROVA TESTEMUNHAL. POSSIBILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO CONTRÁRIO À JURISPRUDÊNCIA DO STJ. RESTABELECIMENTO DA SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU.

1. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem indeferiu o pedido de pensão por morte, porquanto não ficou comprovada a condição de dependente da autora em relação ao de cujus. Asseverou (fl. 160, e-STJ): "As testemunhas arroladas as fls. 81/82 e 103, foram uníssonas em comprovar que a autora vivia em união estável com o de cujus e ele custeava os gastos familiares, porem somente a prova testemunhal é insuficiente para comprovar o alegado".

2. No entanto, o entendimento acima manifestado está em confronto com a jurisprudência do STJ de que a legislação previdenciária não exige início de prova material para a comprovação de união estável, para fins de concessão de benefício de pensão por morte, sendo bastante, para tanto, a prova testemunhal, uma vez que não cabe ao julgador criar restrições quando o legislador assim não o fez.

3. Nesse sentido, os seguintes precedentes: AgRg no REsp.
1.536.974/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 18.12.2015; AR 3.905/PE, Terceira Seção, Rel. Min. conv. Campos Marques, DJe 1.8.2013; AgRg no REsp. 1.184.839/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 31.5.2010; REsp. 783.697/GO, Sexta Turma, Rel. Min.
Nilson Naves, DJU 9.10.2006, p. 372.

4. Recurso Especial de Cleuza Aparecida Balthazar provido para restabelecer a sentença de primeiro grau. Agravo do INSS prejudicado.
(REsp 1824663/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2019, DJe 11/10/2019)

quinta-feira, 14 de novembro de 2019

A prova escrita constitui requisito indispensável para a configuração da sociedade de fato perante os sócios entre si.

STJ - Família. Recurso especial. Direito de família, processual civil e civil. Divórcio. Separação convencional de bens. Pacto antenupcial. Regime adotado. Sociedade de fato. Prova escrita. Necessidade. Inexistência. Vida em comum. Apoio mútuo. Justa expectativa. CCB/2002, art. 981 e CCB/2002, art. 987. Violação. CCB/2002, art. 990. CCB/2002, art. 999.

«1 - Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência, do CPC/2015 (Enunciado Administrativo 2/STJ e Enunciado Administrativo 3/STJ).

2 - O regime jurídico da separação convencional de bens voluntariamente estabelecido pelo ex-casal é imutável, ressalvada manifestação expressa de ambos os cônjuges em sentido contrário ao pacto antenupcial.

3 - A prova escrita constitui requisito indispensável para a configuração da sociedade de fato perante os sócios entre si.

4 - Inexistência de affectio societatis entre as partes e da prática de atos de gestão ou de assunção dos riscos do negócio pela recorrida.

5 - Recurso especial provido.»

INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES:

«Não há falar em sociedade de fato quando o regime adotado é o da separação convencional de bens. É premissa basilar que, sob a égide de tal regime, não se presume comunhão de bens e que eventual interesse em misturar os patrimônios deve ser expressa e não presumida».

«[...] ainda que se admitisse a possibilidade de os cônjuges casados sob o regime de separação de bens constituírem, eventualmente, uma sociedade de fato, por não lhes ser vedado constituir eventual condomínio, esta não decorreria simplesmente da vida em comum, já que dentre os deveres decorrentes do consórcio, o apoio mútuo é um dos mais relevantes [...].

Tem evidência própria que, na falta de mancomunhão, a vontade de adquirirem juntos um mesmo bem ou, como no caso dos autos, de se tornarem sócios de um mesmo negócio jurídico, deveria ter sido explicitada de forma solene, o que não ocorreu».

«[...] para que tivessem uma sociedade civil ou comercial em conjunto, ainda que não regularmente constituída, indispensável seria, ao menos, demonstrar que administravam tal empresa juntos, o que, de fato, não é possível se extrair dos autos. A autora, em verdade, alega ter trabalhado para o ex-marido, sem, contudo, ter fornecido capital ou assumido os riscos do negócio ao longo da relação».

«A condição para se admitir a existência de uma sociedade é a configuração da affectio societatis (que não se confunde com a affectio maritalis) e a integralização de capital ou a demonstração de prestação de serviços. Tais requisitos são basilares para se estabelecer qualquer vínculo empresarial».

«[...] não há notícia acerca de prática de atos de gestão pela recorrida nem de prestação de contas de valores administrados por ela. Além disso, não restou configurada a indispensável affectio societatis voltada ao exercício conjunto da atividade econômica ou à partilha de resultados, como exige o CCB/2002, art. 981 do Código Civil».

PRECEDENTES CITADOS:

Civil. Separação convencional de bens. Impossibilidade de reconhecimento de sociedade de fato (REsp 404088).
Civil. Separação convencional de bens. Condomínio. Não decorrência da vida em comum (REsp 30513).
Civil. Separação convencional de bens. Comunicação dos bens adquiridos na constância do casamento. Necessidade de comprovação do esforço comum para aquisição (EREsp 1623858).
Civil. Sociedade comercial. Ato oneroso. Negócio jurídico comutativo (EREsp 1104363).

(STJ (3ª T.) - Rec. Esp. 1.706.812 - DF - Rel.: Min. Ricardo Villas Bôas Cueva - J. em 03/09/2019 - DJ 06/09/2019

Prazo prescricional. Ação de cobrança. Boleto bancário. Relação contratual. Dívida líquida. Instrumento público ou particular. Prazo quinquenal.

STJ - Prescrição. Prazo prescricional. Ação de cobrança. Boleto bancário. Relação contratual. Dívida líquida. Instrumento público ou particular. Prazo quinquenal. Correção monetária. Juros de mora. Termo inicial. Vencimento da obrigação. Recurso especial. Súmula 568/STJ. CCB/2002, art. 205. CCB/2002, art. 206, §§ 1º, 2º e 3º, IV e § 5º, I.

«1 - Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência, do CPC/2015 (Enunciado Administrativo 2/STJ e Enunciado Administrativo 3/STJ).

2 - Cinge-se a controvérsia a discutir a) o prazo prescricional aplicável à pretensão de cobrança, materializada em boleto bancário, ajuizada por operadora do plano de saúde contra empresa que contratou o serviço de assistência a médico-hospitalar para seus empregados e b) o termo inicial da correção monetária e dos juros de mora.

3 - Não se aplica a prescrição ânua (CCB/2002, art. 206, § 1º, II às ações que discutem direitos oriundos de planos ou seguros de saúde. Precedentes.

4 - Conforme disposição expressa do CCB/2002, art. 205, o prazo de 10 (dez) anos é residual, devendo ser aplicado apenas quando não houver regra específica prevendo prazo inferior.

5 - Na hipótese, apesar de existir relação contratual entre as partes, a cobrança está amparada em boleto bancário, hipótese que atrai a incidência do disposto no CCB/2002, art. 206, § 5º, I, que prevê o prazo prescricional de 5 (cinco) anos para a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular.

6 - Nas dívidas líquidas com vencimento certo, a correção monetária e os juros de mora incidem a partir da data do vencimento da obrigação, mesmo quando se tratar de obrigação contratual. Precedentes.

7 - Recurso especial não provido.»

PRECEDENTES CITADOS:

Ações que discutem direitos oriundos de seguros saúde. prescrição. Prazo trienal (REsp. 1360969 (Tema 610/STJ). REsp. 1361182 (Tema 610/STJ). EDcl no AgRg no REsp 1560239).

Cobrança de despesas médico/hospitalares contra a operadora do plano de saúde. prescrição decenal (AgInt no AREsp. 929189. AgInt no AREsp. 1029462. AgInt no REsp 1742038).

Cobrança de dívida líquida fundada em documento público ou particular. prescrição quinquenal (AgInt no REsp. 1520788. AgInt no AREsp. 1362148. AgInt nos EDcl no AREsp 1225929).

Dívidas líquidas com vencimento certo. correção monetária e juros de mora. termo inicial. Súmula 568/STJ.
(AgInt no REsp. 1727601. AgInt no AREsp. 1079466, REsp. 1651957. AgInt no AgRg no REsp 1153050).

(STJ (3ª T.) - Rec. Esp. 1.763.160 - SP - Rel.: Min. Ricardo Villas Bôas Cueva - J. em 17/09/2019 - DJ 20/09/2019-

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Venda de carro com placa clonada o despachante que efetou a transferência do veículo

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. INEXISTÊNCIA. DANO MORAL.
VALOR DA INDENIZAÇÃO. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO STJ.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA. DECISÃO MANTIDA.

1. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmula n. 7 do STJ).

2. No caso concreto, o Tribunal de origem concluiu pela responsabilidade exclusiva da recorrente. Alterar esse entendimento demandaria o reexame das provas produzidas nos autos, o que é vedado em recurso especial.

3. O entendimento desta Corte é no sentido de que a incidência da Súmula n. 7/STJ impede o exame do dissídio jurisprudencial, por faltar identidade entre os paradigmas apresentados e os fundamentos do acórdão, tendo em vista a situação fática do caso concreto, com base na qual a Corte de origem deu solução à causa. Precedentes.

4. Somente em hipóteses excepcionais, quando irrisório ou exorbitante o valor da indenização por danos morais arbitrado na origem, a jurisprudência desta Corte permite o afastamento do referido óbice, para possibilitar a revisão. No caso, o valor arbitrado pelo Tribunal de origem não se distancia dos parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade.

5. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 1489485/MG, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 21/10/2019, DJe 25/10/2019)

O estado de perigo, nos termos em que definido pelo artigo 156 do Código Civil

AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.260.512 - SP (2018/0054964-1)


RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

AGRAVANTE : REDE D'OR SAO LUIZ S.A

ADVOGADOS : DUARTE ALBERTO LOJAS ANES - SP282803

BIANCA MARIA DE SOUZA MACEDO PIRES - SP319483A VITOR CARVALHO LOPES E OUTRO(S) - SP241959A NOELY EMILIA OLIVEIRA COSTA - SP315396

AGRAVADO : JOAO VILLA

ADVOGADOS : JÚLIA BEATRIZ ARGUELHO PEREIRA E OUTRO(S) - SP227659

GERALDO DA SILVA PEREIRA - SP349641



EMENTA

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL DE 2015. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL, CUMULADA COM COBRANÇA. ALEGADA AFRONTA AO ART. 1022 DO CPC NÃO DEMONSTRADA. ACÓRDÃO RECORRIDO. DESPESAS COM INTERNAÇÃO E TRATAMENTO HOSPITALAR. CONFIGURAÇÃO DO ESTADO DE PERIGO (ART. 156 DO CC) PELA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. ENTENDIMENTO DIVERSO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICA. INADMISSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ.
AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.



VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator):

Eminentes colegas, o agravo interno não merece guarida.

Em que pese o arrazoado, entendo que a ausência de qualquer novo subsídio trazido pelo agravante, capaz de alterar os fundamentos da decisão ora agravada, faz subsistir incólume o entendimento nela firmado.

Inicialmente, registra-se que o recurso em análise foi interposto contra decisão publicada na vigência do Novo Código de Processo Civil, de forma que deve ser aplicado ao caso o entendimento firmado no Enunciado Administrativo n. 3 do Plenário do STJ, segundo o qual "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

No tocante à alegada afronta ao art. 1022, inciso I, do CPC/2015, sem razão o recorrente, uma vez que, conforme a jurisprudência desta Corte, estando devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e fundamentado corretamente o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há que se falar em violação ao referido dispositivo da legislação processual.

A propósito, o julgado a seguir:


  • PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO CPC/73. AGRAVO REGIMENTAL TEMPESTIVO. CONHECIMENTO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. APRECIAÇÃO. INVIABILIDADE. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMPUGNAÇÃO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 165, 458 E 463, TODOS DO CPC/73. AUSÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. INTIMAÇÃO DO ADVOGADO. IMPRENSA OFICIAL. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA Nº 517 DO STJ. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. IMPUGNAÇÃO TEMPESTIVA. FUNDAMENTO NÃO IMPUGNADO. SÚMULA Nº 283 DO STF, POR ANALOGIA. ART. 512 DO CPC/73. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. INDICAÇÃO DE OFENSA A DISPOSITIVO LEGAL QUE NÃO GUARDA PERTINÊNCIA COM A FUNDAMENTAÇÃO TRAZIDA NO RECURSO ESPECIAL. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS NºS 282 E 284, AMBAS DO STF, POR ANALOGIA. VERIFICAÇÃO DOS VALORES BLOQUEADOS. PRETENSÃO RECURSAL QUE ENVOLVE O REEXAME DE PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7 DO STJ. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS. EFEITOS INFRINGENTES. AGRAVO NÃO PROVIDO.

(...)

4. Não há que se falar em violação dos arts. 165, 458 e 463, todos do CPC/73, quando o acórdão recorrido, de forma clara e fundamentada, aborda todos os pontos necessários para o desate da controvérsia.

5. A orientação jurisprudencial firmada pelo Superior Tribunal de Justiça estabelece que, no cumprimento de sentença, o devedor deve ser intimado na pessoa de seu advogado, mediante publicação na imprensa oficial, para efetuar o pagamento no prazo de 15 dias. Inteligência, ainda, da Súmula nº 517 do STJ.

6. A não impugnação de um dos fundamentos que levaram ao reconhecimento da ausência de prejuízo quanto a alegada nulidade da intimação, atrai a incidência da Súmula nº 283 do STF, de forma analógica.

7. A Corte de origem não se manifestou acerca do art. 512 do CPC/73. Ausente, portanto, o prequestionamento, o que atrai a aplicabilidade da Súmula nº 282 do STF, por analogia.

8. A fundamentação declinada pelo recorrente em suas razões recursais deve guardar pertinência temática com o conteúdo normativo dos dispositivos legais tidos por afrontados, sob pena de incidência da Súmula nº 284 do STF.

9. A alteração das conclusões do acórdão recorrido exige reapreciação do acervo fático-probatório da demanda, o que faz incidir a Súmula nº 7 do STJ.

10. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes, para conhecer do agravo regimental e a ele negar provimento. (EDcl no AgRg nos EDcl no AREsp 744.734/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/06/2018, DJe 01/08/2018)

Além disso, o acórdão refutado não apresentou a eivada contradição indicada, nos moldes estabelecidos pela legislação processual e jurisprudência desta Corte, porquanto essa somente se opera quando demonstrada a existência de premissas inconciliáveis internas ao julgado, ônus do qual a parte não se desincumbiu em demonstrar.

No mérito, o Tribunal de origem, com base na análise do conjunto probatório carreado aos autos, concluiu pelo deferimento do pedido veiculado na ação declaratória de inexistência de débito por estar caracterizado à ocorrência de vício no consentimento - estado de perigo - referente ao negócio jurídico retratado na demanda, consoante se observa nas seguintes fundamentações do acórdão recorrido (fl. 1820, e-STJ):

Está provado, portanto, que o estado da sogra do autor, ao ser levada ao hospital réu, era extremamente grave, tanto que ela faleceu pouco tempo depois, estando presentes os requisitos necessários à configuração do estado de perigo, quais sejam, a necessidade de o autor salvar pessoa da família, a atualidade do dano e o conhecimento do perigo pela outra parte, a assunção de obrigação excessivamente onerosa, tudo conforme prevê o art. 156 do Código Civil, que estabelece: "Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa".

É exatamente a hipótese dos autos, em que o autor, sentindo-se compelido a salvar sua sogra, em estado objetivamente grave de saúde, assumiu obrigação de pagar despesas médico-hospitalares excessivamente onerosas.

Diante de tais considerações, o reexame dos elementos fáticos que serviram de lastro para que o Tribunal de origem decidir a controvérsia posta a julgamento, demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, providência vedada nesta sede especial a teor da Súmula 07 do STJ.

A propósito:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO MONITÓRIA. DESPESAS COM INTERNAÇÃO E TRATAMENTO HOSPITALAR. CONFIGURAÇÃO DO ESTADO DE PERIGO (ARTIGO 156 DO CÓDIGO CIVIL) PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. DECLARAÇÃO PARCIAL DE NULIDADE DA OBRIGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7/STJ.

1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional pelo fato de o Tribunal de origem ter decido, de forma fundamentada, em sentido contrário às pretensões do recorrente.


  • 2. O estado de perigo, nos termos em que definido pelo artigo 156 do Código Civil ("Configura-se estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa") restou demonstrado no caso concreto, conforme assentado no acórdão. Rever tal entendimento demandaria o reexame do contexto fático-probatório, procedimento vedado na estreita via do recurso especial, a teor da Súmula nº 7 desta Corte Superior.


3. Negócio jurídico anulado pelo Tribunal de Justiça apenas na parte em que foi considerado excessivamente oneroso.

4. Agravo regimental não provido. (AgRg no Ag 830.135/PR, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA,
julgado em 01/03/2012, DJe 07/03/2012)

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.



TERMO DE JULGAMENTO

TERCEIRA TURMA

AgInt no AREsp 1.260.512 / SP

Número Registro: 2018/0054964-1 PROCESSO ELETRÔNICO

Número de Origem:
10181724220158260003 20170000326560 20170000444479 2229055562015 22290555620158260003
22290555620158260000

Sessão Virtual de 15/10/2019 a 21/10/2019

Relator do AgInt
Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MOURA RIBEIRO

segunda-feira, 28 de outubro de 2019

PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE NULIDADE DE MARCA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. DIREITO DE EXCLUSIVIDADE. MITIGAÇÃO. MARCA FORMADA POR EXPRESSÃO DE USO COMUM.



RELATORA
:
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE
:
COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV
ADVOGADOS
:
DANIELA SOARES DOMINGUES  - RJ106850

CARLOS ROBERTO DE SIQUEIRA CASTRO  - RJ020283

TALITA CASTRO AYRES  - RJ159321

MARINA DE ARAUJO LOPES  - DF043327
RECORRIDO
:
RENATO PASSARIN E FILHOS LTDA
ADVOGADO
:
MARISTELA BASSO  - SP171969A
INTERES. 
:
INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL


RECURSO ESPECIAL Nº 1.833.422 - RJ (2018⁄0019031-0)


RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):

Cuida-se de recurso especial interposto por COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV fundamentado nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional.
Ação: de nulidade de ato administrativo, ajuizada por RENATO PASSARIN E FILHOS LTDA. em face da recorrente, com o objetivo (i) de que fosse declarada a invalidade da marca LIBER (ii) de que o INPI fosse condenado a se abster de conceder o registro relativo ao pedido 826.894.160.
Sentença: julgou parcialmente procedente o pedido, para declarar a nulidade da marca LIBER.
Acórdão: negou provimento à apelação interposta pela recorrente.
Embargos de Declaração: interpostos pela recorrente, foram rejeitados.
Recurso especial: aponta a existência de dissídio jurisprudencial e alega violação dos artigos: 535, II, do CPC⁄73; 462 do CPC⁄73; 195, III, da Lei 9.279⁄96 e 4º da Lei 8.078⁄90; 124, XIX, da Lei 9.279⁄96; 6, quinquies, “c“, 1, da Convenção de Paris; e 124, VI, da Lei 9.279⁄96. Além de negativa de prestação jurisdicional (omissão), assevera que o Tribunal a quo deveria ter levado em consideração o fato superveniente ocorrido antes do julgamento dos embargos de declaração, consubstanciado na caducidade dos registros do recorrido. Afirma que o recorrido é contumaz em tentar se aproveitar de sinais marcários notórios, conduta que caracteriza concorrência parasitária e desleal, sobretudo quando se percebe que sua marca nunca foi utilizada para designar cervejas. Argumenta que os sinais sobre os quais versa o presente litígio não apresentam similitude gráfica, fonética e semântica, além de serem utilizados para designar produtos distintos (sidra e cerveja sem álcool). Entende que a coexistência das marcas não gera confusão nos consumidores e que cada produto possui público-alvo distinto. Ademais, tratando-se de signo fraco, dotado de baixa distintividade, deve seu titular suportar o ônus da convivência.
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.833.422 - RJ (2018⁄0019031-0)
RELATORA
:
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE
:
COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV
ADVOGADOS
:
DANIELA SOARES DOMINGUES  - RJ106850

CARLOS ROBERTO DE SIQUEIRA CASTRO  - RJ020283

TALITA CASTRO AYRES  - RJ159321

MARINA DE ARAUJO LOPES  - DF043327
RECORRIDO
:
RENATO PASSARIN E FILHOS LTDA
ADVOGADO
:
MARISTELA BASSO  - SP171969A
INTERES. 
:
INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL
EMENTA

RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE NULIDADE DE MARCA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. DIREITO DE EXCLUSIVIDADE. MITIGAÇÃO. MARCA FORMADA POR EXPRESSÃO DE USO COMUM.
1. Ação distribuída em 20⁄8⁄2009. Recurso especial interposto em 10⁄4⁄2015. Autos conclusos à Relatora em 16⁄2⁄2018.
2. O propósito recursal, além de examinar se houve negativa de prestação jurisdicional, é verificar a higidez do ato administrativo que concedeu o registro da marca LIBER à recorrente, ante eventual conflito com a marca LÍDER, concedida anteriormente à recorrida.
3. Inexistindo omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido, a rejeição dos embargos de declaração contra ele interpostos não configura negativa de prestação jurisdicional.
4. O âmbito de proteção de uma marca é delimitado, acima de tudo, pelo risco de confusão ou associação que o uso de outro sinal, designativo de produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, possa ser capaz de causar perante o consumidor.
5. Tratando-se, todavia, de marca que apresenta baixo grau de distintividade, por se constituir de expressão dicionarizada e de uso comum, como ocorre no particular, este Tribunal tem reconhecido que a exclusividade conferida ao titular do registro comporta mitigação, devendo ele suportar o ônus da convivência com outras marcas semelhantes, afigurando-se descabida a alegação de anterioridade de registro quando o intuito da parte for o de assegurar o uso exclusivo de expressão dotada de baixo vigor inventivo. Precedentes.
6. Não sendo o recorrido reconhecido pelo público consumidor como fabricante do mesmo tipo de bebida identificado pela marca da recorrente (cerveja sem álcool), não se vislumbra situação fática apta a evidenciar a possibilidade de confusão ou associação indevida.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.833.422 - RJ (2018⁄0019031-0)
RELATORA
:
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE
:
COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV
ADVOGADOS
:
DANIELA SOARES DOMINGUES  - RJ106850

CARLOS ROBERTO DE SIQUEIRA CASTRO  - RJ020283

TALITA CASTRO AYRES  - RJ159321

MARINA DE ARAUJO LOPES  - DF043327
RECORRIDO
:
RENATO PASSARIN E FILHOS LTDA
ADVOGADO
:
MARISTELA BASSO  - SP171969A
INTERES. 
:
INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):

O propósito recursal, além de examinar se houve negativa de prestação jurisdicional, é verificar a higidez do ato administrativo que concedeu o registro da marca LIBER à recorrente, ante eventual conflito com a marca LÍDER, concedida anteriormente à recorrida.

1. BREVE DELINEAMENTO FÁTICO
O recorrido, titular dos direitos de propriedade industrial derivados da concessão da marca LÍDER, ajuizou a presente ação em face de COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV com o intuito de que fosse declarada a invalidade do ato administrativo que concedeu a esta o registro da marca nominativa LIBER, bem como que o INPI fosse obstado de deferir o pedido de registro para a marca mista CERVEJA LIBER 0,0% ÁLCOOL QUALIDADE BRAHMA.
O juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos, declarando a invalidade da marca nominativa LIBER ao argumento de que se trata de expressão gráfica e foneticamente semelhante àquela registrada pelo recorrido, cujos significados, ainda que distintos, são de difícil percepção pelo público consumidor.
Tal entendimento foi mantido pelo Tribunal a quo, cujas razões foram sintetizadas na seguinte ementa:
APELAÇÃO CÍVEL - PROPRIEDADE INDUSTRIAL - REGISTRO DE MARCA - IMPOSSIBILIDADE - IDENTIDADE GRÁFICA E FONÉTICA DAS MARCAS EM COTEJO QUE ESTÃO REGISTRADAS NA MESMA CLASSE- SEGMENTOS MERCADOLÓGICOS AFINS – POSSIBILIDADE DE CONFUSÃO - OCORRÊNCIA - INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE - APLICAÇÃO DO INCISO XIX DO ART. 124 DA LEI 9.279⁄96.

  • 1- Impossibilidade de coexistência das marcas em cotejo, ante todo um conjunto probatório que demonstra claramente que as marcas destinam-se a distinguir produtos ou serviços idênticos, semelhantes e afins, suscetíveis de causar confusão ao público consumidor, alcançando o mesmo segmento mercadológico e a mesma clientela;
  • 2- Os produtos assinalados pelas marcas em análise, em regra, encontram-se à disposição para venda nos mesmos tipos de estabelecimentos comerciais (mercados, bares, restaurantes, etc.) e posicionam-se fisicamente quase sempre próximos um do outro, o que pode vir a induzir o consumidor no sentido de supor que ambos os produtos originam-se do mesmo fabricante, da mesma empresa. Somando-se todos esses pontos ao fato de as marcas apresentarem também extrema semelhança gráfica e fonética ("LIDER" - da apelada e "LIBER" - da apelante), onde se verifica somente a variação de uma consoante, trocou-se o "D" por "B", afigura-se definitivamente impossível a convivência no mercado das marcas de ambas as empresas;
  • 3- Inviável, da mesma forma, a pretensão da apelante no sentido de sustentar ser cabível a aplicação do princípio da especialidade com o fim de respaldar a coexistência das marcas em cotejo, pois as marcas pertencem a mesma classe, ou seja NCL(8)32, alcançando os mesmos produtos;
  • 4- Remessa necessária, considerada como feita, e apelação conhecidas, mas não providas.

2. DA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL
Da análise do acórdão impugnado, verifica-se que a prestação jurisdicional dada corresponde àquela efetivamente objetivada pelas partes, sem vício a ser sanado. O Tribunal a quo se pronunciou de maneira a abordar todos os aspectos fundamentais da controvérsia, dentro dos limites que lhe são impostos por lei.
Desse modo, a alegação da recorrente, no sentido de que teria havido defeito na prestação de prestação jurisdicional, não comporta acolhida.

3. DA VIOLAÇÃO DO ART. 462 DO CPC⁄73
O exame da alegada violação do art. 462 do CPC⁄73 fica prejudicado em razão de o INPI ter indeferido, administrativamente, os pedidos que apontavam a caducidade dos registros do recorrido (suposto fato superveniente indicado pela recorrente), tendo a autarquia reconhecido como comprovado o uso efetivo das marcas.

4. CARACTERIZAÇÃO DA VIOLAÇÃO DA MARCA E DA HIPÓTESE DOS AUTOS.
O direito de uso exclusivo de uma marca, conferido pela norma do art. 129, caput, da Lei 9.279⁄96, bem como o direito que dele decorre – de exigir que terceiros se abstenham de utilizar signos idênticos ou semelhantes àqueles já registrados –, não podem ser considerados direitos absolutos e irrestritos, pois estão condicionados às exceções previstas na própria lei e ao equilíbrio com os valores constitucionais da livre concorrência, da liberdade de expressão e da livre iniciativa.
Segundo se depreende da Lei de Propriedade Industrial (art. 124, XIX e XXIII), a violação do direito de exclusividade conferido pelo registro marcário fica caracterizada quando, para designar produtos ou serviços disponibilizados no mercado, são utilizados sinais que possam gerar confusão no consumidor (compra de um produto por outro) ou que permitam associação com marca alheia anteriormente registrada (compra de um produto sob a equivocada crença de se tratar de uma determinada origem comercial).
Para aferição da existência de confusão ou de associação entre marcas, em primeiro lugar, deve-se ter como parâmetro a perspectiva do consumidor comum, razoavelmente atento e informado (REsp 1.688.243⁄RJ, 4ª Turma, DJe 23⁄10⁄2018), considerado o contexto em que usualmente adquire os produtos assinalados (ou utiliza os serviços prestados).
No que concerne aos elementos passíveis de análise para que se possa concluir pela caracterização ou não da violação ao direito de exclusiva – elencados por esta 3ª Turma quando do julgamento do AgRg no REsp 1.346.089⁄RJ (DJe 14⁄5⁄2015) –, merecem destaque, dadas as circunstâncias da espécie, os seguintes: (i) grau de distintividade da marca paradigma, (ii) grau de semelhança entre as marcas em conflito, (iii) tempo de convivência e (iv) natureza dos produtos ou serviços oferecidos.
Tais critérios, vale consignar, devem ser sopesados à vista das circunstâncias específicas da hipótese, não se podendo estabelecer juízos objetivos a priori sobre a relevância em abstrato de cada um deles.

  • exame da distintividade da marca supostamente violada serve para verificar se o sinal registrado constitui expressão genérica, necessária, comum, vulgar ou descritiva, a configurar o que a jurisprudência veio a definir como marca fraca, caracterizada por seu baixo poder distintivo.
  • Nessas hipóteses, o titular do registro deve suportar o ônus da coexistência, pois optou por desfrutar da vantagem advinda da incorporação à marca de elemento de pouca ou nenhuma inventividade.
  • De fato, conforme assentado recentemente no âmbito desta Turma, “em se tratando de marcas fracas, descritivas ou evocativas, afigura-se descabida qualquer alegação de anterioridade de registro quando o intuito da parte for o de assegurar o uso exclusivo de expressão dotada de baixo vigor inventivo” (REsp 1.773.244⁄RJ, DJe 5⁄4⁄2019).
É essa a situação que se verifica dos autos, pois a expressão registrada pelo recorrente – LÍDER – é passível de ser classificada como de menor grau distintivo, uma vez que constitui termo da língua vernácula, de natureza comum e de pouca originalidade.

  • Acresça-se a isso a circunstância de que as marcas em conflito – LÍDER e LIBER –, apesar de sua parcial colidência gráfica e fonética, apresentam significados completamente diversos, evocando ou sugerindo ideias distintas: a primeira remete a uma situação de superioridade ou predomínio, enquanto a segunda sinaliza liberdade, autodeterminação.
  • Oportuno destacar que esta Corte Superior já se manifestou no sentido de que nem mesmo a reprodução integral de elementos nominativos é circunstância suficientemente apta, por si só, a ensejar a decretação de nulidade de registro, devendo, para tal desiderato, averiguar-se a presença de outros elementos capazes de ensejar confusão ou associação de marcas (nesse sentido, o REsp 863.975⁄RJ, 3ª Turma, DJe 16⁄11⁄2010).
  • Pode-se vislumbrar, outrossim, que, apesar do longo tempo de convivência entre as marcas em conflito (ao menos desde 2003, ano do depósito da marca LIBER - e-STJ fl. 100), sequer foram deduzidas, no curso da ação, alegações no sentido de que algum consumidor tenha sido confundido ou que tenha associado a marca da recorrente à do recorrido.
  • Na hipótese de ter havido, em algum momento, confusão ou associação errônea, o decurso desses anos de coexistência teria sido suficiente para que surgissem ao menos indícios nesse sentido.
  • Vale anotar que a análise do elemento temporal constitui critério já utilizado por esta Corte Superior para fins de se assentar a possibilidade de convivência de marcas idênticas, como ocorrido nas ocasiões em que foram julgados os recursos especiais 863.975⁄RJ (3ª Turma, DJe 16⁄11⁄2010) e 14.367⁄PR, 4ª Turma, DJ 21⁄9⁄1992.
  • Por fim, quanto à natureza dos produtos designados pelas marcas em disputa, constata-se que, enquanto a expressão registrada pela recorrente serve para assinalar, exclusivamente, cervejas (classe NCL(8) 32), os registros titularizados pela parte adversa foram expedidos para que ela os utilizasse na identificação de um espectro bem mais amplo de bebidas, aí incluídos, além de cervejas, xaropes, sucos, refrigerantes e refrescos.
De se gizar que a mera constatação de que os produtos assinalados pelas marcas em litígio estão insertos em uma mesma categoria – bebidas – não constitui circunstância suficiente a atrair a presunção de que o consumidor possa vir a confundi-los. Nesse sentido, mutatis mutandis, já decidiu esta Corte: REsp 863.975⁄RJ, 3ª Turma, DJe 16⁄11⁄2010.

  • No particular, sobreleva atentar para o fato de que o recorrido atua, basicamente, no segmento de vinhos e espumantes, jamais tendo utilizado a expressão LÍDER para designar qualquer tipo de cerveja (fato incontroverso).
Desse modo, não sendo ele reconhecido pelo público consumidor como fabricante do mesmo tipo de bebida identificado pela marca da recorrente (cerveja sem álcool), não se vislumbra situação fática apta a possibilitar a ocorrência de confusão ou associação indevida.
Diante desse contexto, e a partir da interpretação conferida à legislação de regência pela jurisprudência consolidada nesta Corte, impõe-se concluir que as circunstâncias fáticas subjacentes à hipótese – natureza comum da expressão LÍDER (marca fraca), grau de distintividade entre os sinais, utilização da marca em produtos diversos e tempo de coexistência – impedem que se reconheça que a marca registrada pela recorrente deva ser invalidada.
O uso da marca LIBER não traduz circunstância que implique, ao menos potencialmente, violação dos direitos do recorrido, não configurando hipótese de aproveitamento parasitário, desvio de clientela ou concorrência desleal.

5. CONCLUSÃO
Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial, para julgar improcedente o pedido formulado na inicial e, como corolário, inverter os ônus decorrentes da sucumbência.

Documento: 100757308
RELATÓRIO, EMENTA E VOTO