segunda-feira, 28 de outubro de 2019

PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE NULIDADE DE MARCA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. DIREITO DE EXCLUSIVIDADE. MITIGAÇÃO. MARCA FORMADA POR EXPRESSÃO DE USO COMUM.



RELATORA
:
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE
:
COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV
ADVOGADOS
:
DANIELA SOARES DOMINGUES  - RJ106850

CARLOS ROBERTO DE SIQUEIRA CASTRO  - RJ020283

TALITA CASTRO AYRES  - RJ159321

MARINA DE ARAUJO LOPES  - DF043327
RECORRIDO
:
RENATO PASSARIN E FILHOS LTDA
ADVOGADO
:
MARISTELA BASSO  - SP171969A
INTERES. 
:
INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL


RECURSO ESPECIAL Nº 1.833.422 - RJ (2018⁄0019031-0)


RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):

Cuida-se de recurso especial interposto por COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV fundamentado nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional.
Ação: de nulidade de ato administrativo, ajuizada por RENATO PASSARIN E FILHOS LTDA. em face da recorrente, com o objetivo (i) de que fosse declarada a invalidade da marca LIBER (ii) de que o INPI fosse condenado a se abster de conceder o registro relativo ao pedido 826.894.160.
Sentença: julgou parcialmente procedente o pedido, para declarar a nulidade da marca LIBER.
Acórdão: negou provimento à apelação interposta pela recorrente.
Embargos de Declaração: interpostos pela recorrente, foram rejeitados.
Recurso especial: aponta a existência de dissídio jurisprudencial e alega violação dos artigos: 535, II, do CPC⁄73; 462 do CPC⁄73; 195, III, da Lei 9.279⁄96 e 4º da Lei 8.078⁄90; 124, XIX, da Lei 9.279⁄96; 6, quinquies, “c“, 1, da Convenção de Paris; e 124, VI, da Lei 9.279⁄96. Além de negativa de prestação jurisdicional (omissão), assevera que o Tribunal a quo deveria ter levado em consideração o fato superveniente ocorrido antes do julgamento dos embargos de declaração, consubstanciado na caducidade dos registros do recorrido. Afirma que o recorrido é contumaz em tentar se aproveitar de sinais marcários notórios, conduta que caracteriza concorrência parasitária e desleal, sobretudo quando se percebe que sua marca nunca foi utilizada para designar cervejas. Argumenta que os sinais sobre os quais versa o presente litígio não apresentam similitude gráfica, fonética e semântica, além de serem utilizados para designar produtos distintos (sidra e cerveja sem álcool). Entende que a coexistência das marcas não gera confusão nos consumidores e que cada produto possui público-alvo distinto. Ademais, tratando-se de signo fraco, dotado de baixa distintividade, deve seu titular suportar o ônus da convivência.
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.833.422 - RJ (2018⁄0019031-0)
RELATORA
:
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE
:
COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV
ADVOGADOS
:
DANIELA SOARES DOMINGUES  - RJ106850

CARLOS ROBERTO DE SIQUEIRA CASTRO  - RJ020283

TALITA CASTRO AYRES  - RJ159321

MARINA DE ARAUJO LOPES  - DF043327
RECORRIDO
:
RENATO PASSARIN E FILHOS LTDA
ADVOGADO
:
MARISTELA BASSO  - SP171969A
INTERES. 
:
INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL
EMENTA

RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE NULIDADE DE MARCA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. DIREITO DE EXCLUSIVIDADE. MITIGAÇÃO. MARCA FORMADA POR EXPRESSÃO DE USO COMUM.
1. Ação distribuída em 20⁄8⁄2009. Recurso especial interposto em 10⁄4⁄2015. Autos conclusos à Relatora em 16⁄2⁄2018.
2. O propósito recursal, além de examinar se houve negativa de prestação jurisdicional, é verificar a higidez do ato administrativo que concedeu o registro da marca LIBER à recorrente, ante eventual conflito com a marca LÍDER, concedida anteriormente à recorrida.
3. Inexistindo omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido, a rejeição dos embargos de declaração contra ele interpostos não configura negativa de prestação jurisdicional.
4. O âmbito de proteção de uma marca é delimitado, acima de tudo, pelo risco de confusão ou associação que o uso de outro sinal, designativo de produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, possa ser capaz de causar perante o consumidor.
5. Tratando-se, todavia, de marca que apresenta baixo grau de distintividade, por se constituir de expressão dicionarizada e de uso comum, como ocorre no particular, este Tribunal tem reconhecido que a exclusividade conferida ao titular do registro comporta mitigação, devendo ele suportar o ônus da convivência com outras marcas semelhantes, afigurando-se descabida a alegação de anterioridade de registro quando o intuito da parte for o de assegurar o uso exclusivo de expressão dotada de baixo vigor inventivo. Precedentes.
6. Não sendo o recorrido reconhecido pelo público consumidor como fabricante do mesmo tipo de bebida identificado pela marca da recorrente (cerveja sem álcool), não se vislumbra situação fática apta a evidenciar a possibilidade de confusão ou associação indevida.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.833.422 - RJ (2018⁄0019031-0)
RELATORA
:
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE
:
COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV
ADVOGADOS
:
DANIELA SOARES DOMINGUES  - RJ106850

CARLOS ROBERTO DE SIQUEIRA CASTRO  - RJ020283

TALITA CASTRO AYRES  - RJ159321

MARINA DE ARAUJO LOPES  - DF043327
RECORRIDO
:
RENATO PASSARIN E FILHOS LTDA
ADVOGADO
:
MARISTELA BASSO  - SP171969A
INTERES. 
:
INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):

O propósito recursal, além de examinar se houve negativa de prestação jurisdicional, é verificar a higidez do ato administrativo que concedeu o registro da marca LIBER à recorrente, ante eventual conflito com a marca LÍDER, concedida anteriormente à recorrida.

1. BREVE DELINEAMENTO FÁTICO
O recorrido, titular dos direitos de propriedade industrial derivados da concessão da marca LÍDER, ajuizou a presente ação em face de COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS - AMBEV com o intuito de que fosse declarada a invalidade do ato administrativo que concedeu a esta o registro da marca nominativa LIBER, bem como que o INPI fosse obstado de deferir o pedido de registro para a marca mista CERVEJA LIBER 0,0% ÁLCOOL QUALIDADE BRAHMA.
O juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos, declarando a invalidade da marca nominativa LIBER ao argumento de que se trata de expressão gráfica e foneticamente semelhante àquela registrada pelo recorrido, cujos significados, ainda que distintos, são de difícil percepção pelo público consumidor.
Tal entendimento foi mantido pelo Tribunal a quo, cujas razões foram sintetizadas na seguinte ementa:
APELAÇÃO CÍVEL - PROPRIEDADE INDUSTRIAL - REGISTRO DE MARCA - IMPOSSIBILIDADE - IDENTIDADE GRÁFICA E FONÉTICA DAS MARCAS EM COTEJO QUE ESTÃO REGISTRADAS NA MESMA CLASSE- SEGMENTOS MERCADOLÓGICOS AFINS – POSSIBILIDADE DE CONFUSÃO - OCORRÊNCIA - INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE - APLICAÇÃO DO INCISO XIX DO ART. 124 DA LEI 9.279⁄96.

  • 1- Impossibilidade de coexistência das marcas em cotejo, ante todo um conjunto probatório que demonstra claramente que as marcas destinam-se a distinguir produtos ou serviços idênticos, semelhantes e afins, suscetíveis de causar confusão ao público consumidor, alcançando o mesmo segmento mercadológico e a mesma clientela;
  • 2- Os produtos assinalados pelas marcas em análise, em regra, encontram-se à disposição para venda nos mesmos tipos de estabelecimentos comerciais (mercados, bares, restaurantes, etc.) e posicionam-se fisicamente quase sempre próximos um do outro, o que pode vir a induzir o consumidor no sentido de supor que ambos os produtos originam-se do mesmo fabricante, da mesma empresa. Somando-se todos esses pontos ao fato de as marcas apresentarem também extrema semelhança gráfica e fonética ("LIDER" - da apelada e "LIBER" - da apelante), onde se verifica somente a variação de uma consoante, trocou-se o "D" por "B", afigura-se definitivamente impossível a convivência no mercado das marcas de ambas as empresas;
  • 3- Inviável, da mesma forma, a pretensão da apelante no sentido de sustentar ser cabível a aplicação do princípio da especialidade com o fim de respaldar a coexistência das marcas em cotejo, pois as marcas pertencem a mesma classe, ou seja NCL(8)32, alcançando os mesmos produtos;
  • 4- Remessa necessária, considerada como feita, e apelação conhecidas, mas não providas.

2. DA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL
Da análise do acórdão impugnado, verifica-se que a prestação jurisdicional dada corresponde àquela efetivamente objetivada pelas partes, sem vício a ser sanado. O Tribunal a quo se pronunciou de maneira a abordar todos os aspectos fundamentais da controvérsia, dentro dos limites que lhe são impostos por lei.
Desse modo, a alegação da recorrente, no sentido de que teria havido defeito na prestação de prestação jurisdicional, não comporta acolhida.

3. DA VIOLAÇÃO DO ART. 462 DO CPC⁄73
O exame da alegada violação do art. 462 do CPC⁄73 fica prejudicado em razão de o INPI ter indeferido, administrativamente, os pedidos que apontavam a caducidade dos registros do recorrido (suposto fato superveniente indicado pela recorrente), tendo a autarquia reconhecido como comprovado o uso efetivo das marcas.

4. CARACTERIZAÇÃO DA VIOLAÇÃO DA MARCA E DA HIPÓTESE DOS AUTOS.
O direito de uso exclusivo de uma marca, conferido pela norma do art. 129, caput, da Lei 9.279⁄96, bem como o direito que dele decorre – de exigir que terceiros se abstenham de utilizar signos idênticos ou semelhantes àqueles já registrados –, não podem ser considerados direitos absolutos e irrestritos, pois estão condicionados às exceções previstas na própria lei e ao equilíbrio com os valores constitucionais da livre concorrência, da liberdade de expressão e da livre iniciativa.
Segundo se depreende da Lei de Propriedade Industrial (art. 124, XIX e XXIII), a violação do direito de exclusividade conferido pelo registro marcário fica caracterizada quando, para designar produtos ou serviços disponibilizados no mercado, são utilizados sinais que possam gerar confusão no consumidor (compra de um produto por outro) ou que permitam associação com marca alheia anteriormente registrada (compra de um produto sob a equivocada crença de se tratar de uma determinada origem comercial).
Para aferição da existência de confusão ou de associação entre marcas, em primeiro lugar, deve-se ter como parâmetro a perspectiva do consumidor comum, razoavelmente atento e informado (REsp 1.688.243⁄RJ, 4ª Turma, DJe 23⁄10⁄2018), considerado o contexto em que usualmente adquire os produtos assinalados (ou utiliza os serviços prestados).
No que concerne aos elementos passíveis de análise para que se possa concluir pela caracterização ou não da violação ao direito de exclusiva – elencados por esta 3ª Turma quando do julgamento do AgRg no REsp 1.346.089⁄RJ (DJe 14⁄5⁄2015) –, merecem destaque, dadas as circunstâncias da espécie, os seguintes: (i) grau de distintividade da marca paradigma, (ii) grau de semelhança entre as marcas em conflito, (iii) tempo de convivência e (iv) natureza dos produtos ou serviços oferecidos.
Tais critérios, vale consignar, devem ser sopesados à vista das circunstâncias específicas da hipótese, não se podendo estabelecer juízos objetivos a priori sobre a relevância em abstrato de cada um deles.

  • exame da distintividade da marca supostamente violada serve para verificar se o sinal registrado constitui expressão genérica, necessária, comum, vulgar ou descritiva, a configurar o que a jurisprudência veio a definir como marca fraca, caracterizada por seu baixo poder distintivo.
  • Nessas hipóteses, o titular do registro deve suportar o ônus da coexistência, pois optou por desfrutar da vantagem advinda da incorporação à marca de elemento de pouca ou nenhuma inventividade.
  • De fato, conforme assentado recentemente no âmbito desta Turma, “em se tratando de marcas fracas, descritivas ou evocativas, afigura-se descabida qualquer alegação de anterioridade de registro quando o intuito da parte for o de assegurar o uso exclusivo de expressão dotada de baixo vigor inventivo” (REsp 1.773.244⁄RJ, DJe 5⁄4⁄2019).
É essa a situação que se verifica dos autos, pois a expressão registrada pelo recorrente – LÍDER – é passível de ser classificada como de menor grau distintivo, uma vez que constitui termo da língua vernácula, de natureza comum e de pouca originalidade.

  • Acresça-se a isso a circunstância de que as marcas em conflito – LÍDER e LIBER –, apesar de sua parcial colidência gráfica e fonética, apresentam significados completamente diversos, evocando ou sugerindo ideias distintas: a primeira remete a uma situação de superioridade ou predomínio, enquanto a segunda sinaliza liberdade, autodeterminação.
  • Oportuno destacar que esta Corte Superior já se manifestou no sentido de que nem mesmo a reprodução integral de elementos nominativos é circunstância suficientemente apta, por si só, a ensejar a decretação de nulidade de registro, devendo, para tal desiderato, averiguar-se a presença de outros elementos capazes de ensejar confusão ou associação de marcas (nesse sentido, o REsp 863.975⁄RJ, 3ª Turma, DJe 16⁄11⁄2010).
  • Pode-se vislumbrar, outrossim, que, apesar do longo tempo de convivência entre as marcas em conflito (ao menos desde 2003, ano do depósito da marca LIBER - e-STJ fl. 100), sequer foram deduzidas, no curso da ação, alegações no sentido de que algum consumidor tenha sido confundido ou que tenha associado a marca da recorrente à do recorrido.
  • Na hipótese de ter havido, em algum momento, confusão ou associação errônea, o decurso desses anos de coexistência teria sido suficiente para que surgissem ao menos indícios nesse sentido.
  • Vale anotar que a análise do elemento temporal constitui critério já utilizado por esta Corte Superior para fins de se assentar a possibilidade de convivência de marcas idênticas, como ocorrido nas ocasiões em que foram julgados os recursos especiais 863.975⁄RJ (3ª Turma, DJe 16⁄11⁄2010) e 14.367⁄PR, 4ª Turma, DJ 21⁄9⁄1992.
  • Por fim, quanto à natureza dos produtos designados pelas marcas em disputa, constata-se que, enquanto a expressão registrada pela recorrente serve para assinalar, exclusivamente, cervejas (classe NCL(8) 32), os registros titularizados pela parte adversa foram expedidos para que ela os utilizasse na identificação de um espectro bem mais amplo de bebidas, aí incluídos, além de cervejas, xaropes, sucos, refrigerantes e refrescos.
De se gizar que a mera constatação de que os produtos assinalados pelas marcas em litígio estão insertos em uma mesma categoria – bebidas – não constitui circunstância suficiente a atrair a presunção de que o consumidor possa vir a confundi-los. Nesse sentido, mutatis mutandis, já decidiu esta Corte: REsp 863.975⁄RJ, 3ª Turma, DJe 16⁄11⁄2010.

  • No particular, sobreleva atentar para o fato de que o recorrido atua, basicamente, no segmento de vinhos e espumantes, jamais tendo utilizado a expressão LÍDER para designar qualquer tipo de cerveja (fato incontroverso).
Desse modo, não sendo ele reconhecido pelo público consumidor como fabricante do mesmo tipo de bebida identificado pela marca da recorrente (cerveja sem álcool), não se vislumbra situação fática apta a possibilitar a ocorrência de confusão ou associação indevida.
Diante desse contexto, e a partir da interpretação conferida à legislação de regência pela jurisprudência consolidada nesta Corte, impõe-se concluir que as circunstâncias fáticas subjacentes à hipótese – natureza comum da expressão LÍDER (marca fraca), grau de distintividade entre os sinais, utilização da marca em produtos diversos e tempo de coexistência – impedem que se reconheça que a marca registrada pela recorrente deva ser invalidada.
O uso da marca LIBER não traduz circunstância que implique, ao menos potencialmente, violação dos direitos do recorrido, não configurando hipótese de aproveitamento parasitário, desvio de clientela ou concorrência desleal.

5. CONCLUSÃO
Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial, para julgar improcedente o pedido formulado na inicial e, como corolário, inverter os ônus decorrentes da sucumbência.

Documento: 100757308
RELATÓRIO, EMENTA E VOTO


quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Compra e venda de imóvel. Programa minha casa, minha vida. Longo atraso na conclusão da obra. Prorrogação do prazo mediante acordo homologado judicialmente. Descumprimento do acordo. Indenização por danos morais.

Recurso especial. Direito civil. Compra e venda de imóvel. Programa minha casa, minha vida. Longo atraso na conclusão da obra. Prorrogação do prazo mediante acordo homologado judicialmente. Descumprimento do acordo. Indenização por danos morais. Cabimento na espécie. Dano moral. CCB/2002, art. 186 e CCB/2002, art. 927. CF/88, art. 5º, V e X. Lei 11.977/2009.

«1 - Controvérsia acerca das consequências do atraso na entrega de um imóvel financiado pelo programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV, com subvenção econômica estatal.

2 - Cabimento de indenização por danos morais em virtude do longo atraso na entrega do imóvel (mais de doze meses após o período de tolerância) por se tratar de imóvel adquirido por família de baixa renda no âmbito do «Programa Minha Casa, Minha Vida», com auxílio estatal por meio de subvenção econômica. Julgado anterior desta TURMA.

3 - Existência de acordo, homologado judicialmente, mediante o qual se prorrogou o prazo de entrega do imóvel para além do período contratual de tolerância.

4 - Descumprimento do acordo pelas demandadas, não tendo sido concluída a obra no novo prazo pactuado.

5 - Circunstância agravante da culpa das demandadas, intensificando o abalo psíquico sofrido pelos adquirentes.

6 - Cabimento da indenização por danos morais na espécie.

7 - Restabelecimento dos comandos da sentença, em que a indenização fora arbitrada em R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor que se mostra adequado aos parâmetros de razoabilidade adotados por esta Corte Superior em casos semelhantes.

8 - RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

PRECEDENTES CITADOS:

Mero atraso na entrega de imóvel. Indenização por danos morais. Não configuração (AgInt no REsp 1656217. AgInt no AREsp 1211877).
Programa minha casa minha vida. Longo atraso na entrega do imóvel. Danos morais (AgInt no REsp 1639991).
Valor do dano moral. Proporcionalidade (AgInt no AREsp 1395171. AgInt no AREsp 1367859).»

(STJ (3ª T.) - Rec. Esp. 1.818.391 - RN - Rel.: Min. Paulo de Tarso Sanseverino - J. em 10/09/2019 - DJ 19/09/2019)

Condomínio em edificação. Taxa condominial. Ação de cobrança. Arrematação. Imóvel arrematado em hasta pública. Informação no edital acerca da existência de débitos condominiais. Caráter propter rem da obrigação. Responsabilidade do arrematante. Sucessão no polo passivo da execução.

STJ - Condomínio em edificação. Taxa condominial. Recurso especial. Direito civil e processual civil ( CPC/1973). Ação de cobrança. Cotas condominiais. Cumprimento de sentença. Arrematação. Imóvel arrematado em hasta pública. Informação no edital acerca da existência de débitos condominiais. Caráter propter rem da obrigação. Responsabilidade do arrematante. Sucessão no polo passivo da execução. Cabimento. Súmula 211/STJ. Súmula 284/STF. CPC/1973, art. 535. CF/88, art. 105, III, «a» e «c». CPC/2015, art. 1.022.

«1 - Controvérsia em torno da possibilidade de inclusão do arrematante no polo passivo da ação de cobrança de cotas condominiais na fase cumprimento de sentença.

2 - O CPC/2015, art. 204, e os CPC/1973, art. 686 e CPC/1973, art. 711, não contêm comandos capazes de sustentar a tese recursal, atraindo o óbice da Súmula 284/STF.

3 - Apresenta-se deficiente a fundamentação do recurso especial em que a alegação de ofensa ao CPC/1973, art. 535 se faz de forma genérica, não havendo a demonstração clara dos pontos do acórdão que se apresentam omissos, contraditórios ou obscuros.

4 - Inviável o conhecimento de recurso especial cujas normas apontadas como violadas não foram devidamente prequestionadas pelo acórdão de origem, por força do que dispõe a Súmula 211/STJ.

5 - É vedado ao STJ o reexame do conjunto fático probatório dos autos, a teor do que dispõe a Súmula 7/STJ.

6 - Em se tratando a dívida de condomínio de obrigação «propter rem», constando do edital de praça a existência de ônus incidente sobre o imóvel, o arrematante é responsável pelo pagamento das despesas condominiais vencidas, ainda que estas sejam anteriores à arrematação, admitindo-se, inclusive, a sucessão processual do antigo executado pelo arrematante.

7 - Precedentes do STJ específicos acerca do tema.

8 - RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

NOTAS COMPLEMENTARES:

É possível a aplicação da Súmula 284/STF ao recurso especial interposto tanto pela alínea «a» quanto pela alínea «c» na hipótese em que o recorrente não indica qual dispositivo da legislação federal foi objeto da divergência jurisprudencial, de acordo com a jurisprudência deste Superior Tribunal.

«O acórdão recorrido, ao julgar o agravo de instrumento, afirmou que o arrematante, seja através do edital, seja através do auto de arrematação, estava plenamente ciente da existência de diversos ônus sobre o imóvel, dentre eles demandas trabalhistas, tributárias e condominiais [...].

Portanto, elidir as conclusões do aresto impugnado, acatando os argumentos do recorrente de que o edital não continha ressalvas, demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, providência vedada nesta sede especial a teor da Súmula 7/STJ».

«[...] a jurisprudência desta Corte tem excluído a responsabilidade do arrematante pelo pagamento das dívidas condominiais quando o edital de arrematação tenha sido omisso acerca da existência de tais débitos».

«[...] as despesas condominiais, compreendidas como obrigações propter rem, que se caracterizam pela ambulatoriedade da pessoa do devedor, são de responsabilidade daquele que detém a qualidade de proprietário da unidade imobiliária, ou ainda do titular de um dos aspectos da propriedade, tais como a posse, o gozo ou a fruição, desde que esse tenha estabelecido relação jurídica direta com o condomínio».

PRECEDENTES CITADOS:

Processual civil. Recurso especial. Indicação genérica de ofensa a dispositivo de Lei. Fundamentação deficiente. Súmula 284/STF (AgRg no Ag 1130264. REsp. 1253231. REsp. 1268469, REsp 1190865).
Processual civil. Recurso especial. CF/88, art. 105, «a» e «c». Súmula 284/STF (AgRg nos EREsp 382756).
Arrematação de imóvel em hasta pública. Edital de praça. Omissão. Inexistência de responsabilidade do arrematante (AgRg no AREsp. 610546. AgInt no AREsp. 890657. AgInt no REsp 1582933).
Débitos condominiais. Obrigações propter rem (REsp. 1672508. REsp. 1483930 (Tema 949/STJ). REsp. 425015. AgRg no REsp. 1510419. AgRg no AREsp 804332).
Arrematante. Responsabilidade. Despesas condominiais pendentes (REsp. 1523696. REsp. 865462. AgRg no AREsp. 52681. REsp. 659584. AgRg no AREsp 227546).»

(STJ (3ª T.) - Rec

. Esp. 1.817.419 - SP - Rel.: Min. Paulo de Tarso Sanseverino - J. em 10/09/2019 - DJ 19/09/2019)

Dano moral. Pessoa jurídica. Sociedade. Súmula 284/STF. Dano moral. Pessoa jurídica. CCB/2002, art. 52. Proteção de sua personalidade, no que couber. Honra objetiva. Lesão a sua valoração social.

STJ - Dano moral. Requisitos. Pessoa jurídica. Sociedade. Recurso especial. Direito civil. Responsabilidade extracontratual. Embargos de declaração. Omissão, contradição ou obscuridade. Não indicação. Súmula 284/STF. Dano moral. Pessoa jurídica. CCB/2002, art. 52. Proteção de sua personalidade, no que couber. Honra objetiva. Lesão a sua valoração social. Bom nome, credibilidade e reputação. Prova. Indispensabilidade. Súmula 227/STJ. Dano moral. CCB/2002, art. 186 e CCB/2002, art. 927. CF/88, art. 5º, V e X.



«1 - Ação de indenização de danos materiais e lucros cessantes e de compensação de danos morais decorrentes de atraso na conclusão das obras necessárias para o aumento da potência elétrica na área de atividade da recorrida, o que prejudicou seu projeto de aumento da comercialização de picolés e sorvetes durante o verão.



2 - Recurso especial interposto em: 03/12/2018; conclusos ao gabinete em: 07/05/2019; aplicação do CPC/2015.



3 - O propósito recursal consiste em determinar a) quais os requisitos para a configuração do dano moral alegadamente sofrido pela pessoa jurídica recorrida; e b) se, na hipótese concreta, foi demonstrada a efetiva ocorrência do dano moral.



4 - A ausência de expressa indicação de obscuridade, omissão ou contradição nas razões recursais enseja o não conhecimento do recurso especial.



5 - Os danos morais dizem respeito à dignidade humana, às lesões aos direitos da personalidade relacionados a atributos éticos e sociais próprios do indivíduo, bens personalíssimos essenciais para o estabelecimento de relações intersubjetivas em comunidade, ou, em outras palavras, são atentados à parte afetiva (honra subjetiva) e à parte social da personalidade (honra objetiva).



6 - As pessoas jurídicas merecem, no que couber, a adequada proteção de seus direitos da personalidade, tendo a jurisprudência dessa Corte consolidado, na Súmula 227/STJ, o entendimento de que as pessoas jurídicas podem sofrer dano moral.



7 - A tutela da personalidade da pessoa jurídica, que não possui honra subjetiva, restringe-se à proteção de sua honra objetiva, a qual é vulnerada sempre que os ilícitos afetarem seu bom nome, sua fama e reputação.



8 - A distinção entre o dano moral da pessoa natural e o da pessoa jurídica acarreta uma diferença de tratamento, revelada na necessidade de comprovação do efetivo prejuízo à valoração social no meio em que a pessoa jurídica atua (bom nome, credibilidade e reputação).



9 - É, portanto, impossível ao julgador avaliar a existência e a extensão de danos morais supostamente sofridos pela pessoa jurídica sem qualquer tipo de comprovação, apenas alegando sua existência a partir do cometimento do ato ilícito pelo ofensor (in re ipsa). Precedente. 10. Na hipótese dos autos, a Corte de origem dispensou a comprovação da ocorrência de lesão à imagem, bom nome e reputação da recorrida por entender que esses danos se relacionariam naturalmente ao constrangimento pela impossibilidade de manter e de expandir, como planejado, a atividade econômica por ela exercida em virtude da mora da recorrente na conclusão de obras de expansão da capacidade do sistema elétrico. 11. No contexto fático delineado pela moldura do acórdão recorrido não há, todavia, nenhuma prova ou indício da ocorrência de lesão à imagem, bom nome e reputação da recorrida, pois não foi evidenciado prejuízo sobre a valoração social da recorrida no meio (econômico) em que atua decorrente da demora da recorrente em concluir a obra no prazo prometido. 12. Recurso especial parcialmente conhecido e, no ponto, provido.



INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES:



«Embora os danos à honra objetiva da pessoa jurídica demandem prova, não se exige uma precisa e inequívoca demonstração do prejuízo por meio de laudos periciais e contábeis, aptos a indicar exatamente a existência e a extensão do dano por ela sofrido. Realmente, a avaliação dessa espécie de dano pode ser realizada por meio do recurso a regras de experiência e presunções [...]».



PRECEDENTES CITADOS:



Civil. Pessoa jurídica. Honra (REsp 60033).

Civil. Pessoa jurídica. Dano moral. Demonstração. Necessidade (REsp 1497313).»



(STJ (3ª T.) - Rec. Esp. 1.807.242 - RS - Rel.: Minª. Nancy Andrighi - J. em 20/08/2019 - DJ 18/09/2019)

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

CONSEQUÊNCIAS À SAÚDE Consumidor que achou cigarro em garrafa de cerveja será indenizado



Uma fabricante de cerveja terá que pagar R$ 10 mil de indenização por danos morais a um consumidor que encontrou uma carteira de cigarros dentro de um garrafa. Ele não chegou nem a abrir a garrafa.

A decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça seguiu a corrente interpretativa do STJ segundo a qual a compra de produto alimentício contendo corpo estranho na embalagem — mesmo sem haver ingestão do conteúdo — dá direito a indenização por dano moral. Para a outra corrente, o dano moral só se configura quando há consumo efetivo do produto, ainda que parcial.

  • "Apesar da divergência jurisprudencial no âmbito desta corte e com todo o respeito à posição contrária, parece ser o entendimento mais justo e adequado à legislação consumerista aquele que dispensa a ingestão, mesmo que parcial, do corpo estranho indevidamente presente nos alimentos", afirmou a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso do consumidor.


Acompanhando a relatora de forma unânime, a 3ª Turma entendeu que o consumidor foi exposto a grave risco e por isso reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul para condenar a fabricante de cerveja ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais.

  • "A simples comercialização de produto contendo corpo estranho possui as mesmas consequências negativas à saúde e à integridade física do consumidor que sua ingestão propriamente dita", disse Nancy Andrighi. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

Revista Consultor Jurídico, 16 de outubro de 2019, 10h25


Protocolização de embargos à execução nos autos da própria ação executiva. Inobservância do CPC/2015, art. 914, § 1º. Erro sanável.


STJ - Direito processual civil. Recurso especial. Ação de execução de título executivo extrajudicial. Protocolização de embargos à execução nos autos da própria ação executiva. Inobservância do CPC/2015, art. 914, § 1º. Erro sanável. Aplicação dos princípios da instrumentalidade das formas e da economia processual. CPC/2015, art. 277. CPC/2015, art. 319. CPC/2015, art. 320.

«1 - Ação de execução de título executivo extrajudicial, tendo em vista a inadimplência no pagamento de cotas condominiais.

2 - O propósito recursal é definir se configura erro grosseiro, insuscetível de correção, a protocolização de embargos à execução nos autos da própria ação executiva, em inobservância ao que dispõe o CPC/2015, art. 914, § 1º.

3 - Com efeito, é inegável que a lei prevê expressamente que os embargos à execução tratam-se de ação incidente, que deverá ser distribuída por dependência aos autos da ação principal (demanda executiva).

4 - Contudo, primando por uma maior aproximação ao verdadeiro espírito do novo Código de Processo Civil, não se afigura razoável deixar de apreciar os argumentos apresentados em embargos à execução tempestivamente opostos - ainda que, de forma errônea, nos autos da própria ação de execução - sem antes conceder à parte prazo para sanar o vício, adequando o procedimento à forma prescrita no CPC/2015, art. 914, § 1º.

5 - Ademais, convém salientar que o CPC/2015, art. 277 preceitua que, quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade.

6 - Recurso especial conhecido e não provido.

NOTAS COMPLEMENTARES:

(VOTO VENCIDO) (MIN. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA)

«O não conhecimento dos embargos do devedor no caso em exame é medida que se impõe, pois o seu processamento nos autos do próprio processo executivo, em flagrante afronta aos expressos ditames legais, causaria inegável prejuízo à parte exequente, apto a ensejar a nulidade do procedimento.

É inegável que a marcha processual da execução restará prejudicada se as teses de defesa apresentadas nos embargos do devedor tiverem que ser apreciadas no mesmo processo da execução, visto que os respectivos procedimentos possuem ritos flagrantemente distintos e muitas vezes incompatíveis entre si.

O equívoco no proceder do executado/embargante, ao juntar sua petição nos autos da execução, viola o disposto no CPC/2015, art. 914, § 1º e constitui erro grosseiro, insuscetível de correção, ainda que sob a perspectiva do princípio da instrumentalidade das formas».»

(STJ (3ª T.) - Rec. Esp. 1.807.228 - RO - Rel.: Minª. Nancy Andrighi - J. em 03/09/2019 - DJ 11/09/2019-

CADEIA DE FORNECIMENTO - Banco não responde por fraude on-line paga via boleto, decide STJ



O banco não é responsável por fraude em compra on-line paga via boleto quando não se verificar qualquer falha na prestação do serviço bancário. O entendimento é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao negar pedido de indenização feito por um consumidor que efetuou uma compra, mas nunca recebeu os produtos.

Na ação, o homem afirmou que fez uma compra em um site, no valor de R$ 4,8 mil. O pagamento foi feito por boleto bancário. Porém, ele nunca recebeu os eletrodomésticos adquiridos. Por isso, pediu que o banco fosse responsabilizado solidariamente a pagar indenização por danos materiais e morais.

Porém, ao manter o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 3ª Turma do STJ afastou a responsabilidade do banco, uma vez que não foi demonstrada nenhuma falha no serviço.

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, não há como considerar o banco como pertencente à cadeia de fornecimento do produto que nunca foi entregue, apenas por ter emitido o boleto utilizado para pagamento.

"Não pertencendo à cadeia de fornecimento em questão, não há como responsabilizar o banco recorrido pelos produtos não recebidos. Ademais, também não se pode considerar esse suposto estelionato como uma falha no dever de segurança dos serviços bancários", concluiu a relatora.


Tadeu Rover é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 16 de outubro de 2019, 12h20