7 de agosto de 2019, 21h01
O presidente Jair Bolsonaro usou uma medida provisória para alterar uma lei que ele próprio sancionou recentemente (Lei 13.818) e atacar a imprensa. A MP 892, publicada nesta terça-feira (6/8), altera a Lei das Sociedades Anônimas e acaba com a obrigatoriedade da publicação de balanços de empresas nos jornais impressos.
Pela medida, as empresas podem publicar seus balanços no site da Comissão de Valores Mobiliários e em seus próprios endereços na internet. Isso impacta na receita dos jornais, que provêm, em boa parte, da venda de espaços para publicações dos balanços.
Advogados e associações de classe ouvidos pela ConJur apontaram que o grande problema da MP é deixar de atender os requisitos constitucionais: relevância e urgência. O presidente deixou claro que a medida é uma "retribuição" às ações da imprensa pelo tratamento que recebeu na campanha eleitoral de 2018.
O advogado Jaime Machado, do escritório RBMDF Advogados, frisa que no caso da MP das sociedades anônimas não fica claro o caráter emergencial. "A MP faz sentido e ela é necessária atualmente, com a realidade da internet. O que não fica claro é a motivação para fazer essa alteração via medida provisório que, aliás, não demonstra urgência", diz. Machado critica o fato de que Bolsonaro não promoveu qualquer debate legislativo prévio sobre a matéria.
Logo depois de anunciada a MP, o Conselho de Comunicação Social (CCS) do Congresso Nacional publicou nota afirmando que o ato de Bolsonaro vai "na direção contrária daquilo que ele próprio e o Congresso deliberaram". Um freio na medida partiu do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, que defendeu que o Congresso faça uma regra de transição sobre a publicação dos atos societários e balanços de sociedades anônimas.
Machado define que a motivação de Bolsonaro para editar a MP é absurda e vai causar "imenso prejuízo para a mídia". Para o advogado, a medida também afronta o princípio da impessoalidade, ao qual o chefe do Executivo deve estar atento.
Vida útil das publicações
O advogado Samuel Mac Dowell de Figueiredo, do escritório RBMDF Advogados, também chama a atenção para o uso da competência presidencial para rebater questões pessoais. Segundo ele, isso é suficiente para anular todo ato e impulsionar o Congresso e o Judiciário a agirem.
Outro ponto crítico da MP, de acordo com a advogada Vera Chemim, é que ela poderá impactar a transparência das informações, já que elas deixarão de ser divulgadas em jornais de grande circulação. "A publicação dos balanços e demais documentos empresariais restritos aos sítios eletrônicos previstos na MP acaba por ferir sutilmente o princípio da publicidade elencado no caput do artigo 37, da Constituição Federal de 1988", explica a advogada, que não vê "ilegalidade flagrante" na medida.
Segundo o presidente da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), Marcelo Rech, o uso de instrumentos legais para intimidar a imprensa afronta preceitos democráticos mínimos. Rech afirmou que a associação recebeu a MP com preocupação e estuda judicializar a questão.
Em nota, a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP, na sigla em espanhol) lamentou ainda que "interesse políticos, partidários e pessoais sejam usados para contrapor a informação".
A MP deverá ser analisada no Congresso por comissão mista e pelos Plenários da Câmara dos Deputados e Senado Federal.
Fernanda Valente é repórter da revista Consultor Jurídico
Revista Consultor Jurídico, 7 de agosto de 2019, 21h01
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