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segunda-feira, 14 de agosto de 2023

AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEMANDA AJUIZADA PELO FILHO EM DESFAVOR DA MÃE, REFERENTE À ADMINISTRAÇÃO DE SEUS BENS, POR OCASIÃO DE SUA MENORIDADE


EMENTA - RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEMANDA AJUIZADA PELO FILHO EM DESFAVOR DA MÃE, REFERENTE À ADMINISTRAÇÃO DE SEUS BENS, POR OCASIÃO DE SUA MENORIDADE (CC, ART. 1.689, I E II). CAUSA DE PEDIR FUNDADA EM ABUSO DE DIREITO. PEDIDO JURIDICAMENTE POSSÍVEL. CARÁTER EXCEPCIONAL. INVIABILIDADE DE RESTRIÇÃO DO ACESSO AO JUDICIÁRIO. RECURSO DESPROVIDO.

1. A questão controvertida neste feito consiste em saber se, à luz do CPC/1973, o pedido formulado pelo autor, ora recorrido, de exigir prestação de contas de sua mãe, na condição de administradora de seus bens por ocasião de sua menoridade, é juridicamente possível.

2. O pedido é juridicamente possível quando a pretensão deduzida se revelar compatível com o ordenamento jurídico, seja por existir dispositivo legal que o ampare, seja por não encontrar vedação legal. Precedente.

3. O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar, são usufrutuários dos bens dos filhos (usufruto legal), bem como têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade, nos termos do art. 1.689, incisos I e II, do Código Civil.

4. Por essa razão, em regra, não existe o dever de prestar contas acerca dos valores recebidos pelos pais em nome do menor, durante o exercício do poder familiar, porquanto há presunção de que as verbas recebidas tenham sido utilizadas para a manutenção da comunidade familiar, abrangendo o custeio de moradia, alimentação, saúde, vestuário, educação, entre outros.

5. Ocorre que esse munus deve ser exercido sempre visando atender ao princípio do melhor interesse do menor, introduzido em nosso sistema jurídico como corolário da doutrina da proteção integral, consagrada pelo art. 227 da Constituição Federal, o qual deve orientar a atuação tanto do legislador quanto do aplicador da norma jurídica, vinculando-se o ordenamento infraconstitucional aos seus contornos.

Assim, o fato de os pais serem usufrutuários e administradores dos bens dos filhos menores, em razão do poder familiar, não lhes confere liberdade total para utilizar, como quiserem, o patrimônio de seus filhos, o qual, a rigor, não lhes pertence.

6. Partindo-se da premissa de que o poder dos pais, em relação ao usufruto e à administração dos bens de filhos menores, não é absoluto, deve-se permitir, em caráter excepcional, o ajuizamento de ação de prestação de contas pelo filho, sempre que a causa de pedir estiver fundada na suspeita de abuso de direito no exercício desse poder, como ocorrido na espécie.

7. Com efeito, inviabilizar, de plano, o ajuizamento de ação de prestação de contas nesse tipo de situação, sob o fundamento de impossibilidade jurídica do pedido para toda e qualquer hipótese, acabaria por cercear o direito do filho de questionar judicialmente eventual abuso de direito de seus pais, no exercício dos encargos previstos no art. 1.689 do Código Civil, contrariando a própria finalidade da norma em comento (preservação dos interesses do menor).

8. Recurso especial desprovido.

REsp 1623098 / MG RECURSO ESPECIAL 2016/0228914-0 RELATOR Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE (1150) ÓRGÃO JULGADOR T3 - TERCEIRA TURMA DATA DO JULGAMENTO 13/03/2018 DATA DA PUBLICAÇÃO/FONTE DJe 23/03/2018 RSTJ vol. 250 p. 461

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