sexta-feira, 29 de abril de 2016

Maioria do Supremo considera Lei de Direitos Autorais constitucional

O Plenário do Supremo Tribunal Federal começou a julgar, nesta quinta-feira (28/4), se é constitucional a reforma na Lei de Direitos Autorais que criou uma entidade pública de controle da arrecadação de direitos autorais de músicas no país. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Marco Aurélio, mas já há maioria acompanhando o voto do relator, ministro Luiz Fux, pela constitucionalidade da lei.

De acordo com o relator, a Lei 12.853/2013 aumenta a participação do Estado no setor dos direitos autorais e tem como diretrizes o combate a fraudes e introduzir regras de ampla transparência e uma “política indutora de preços competitivos para o licenciamento de direitos autorais”.

A lei é questionada em duas ações diretas de inconstitucionalidade de autoria de diversos escritórios de arrecadação de direitos autorais. Eles são contra a mudança na forma de distribuição do dinheiro a artistas. Antes da lei, era o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) quem fazia a distribuição da verba arrecadada pelos diversos escritórios, como Abramos e UBC. A nova lei dá os poderes do Ecad a um órgão estatal.

No entendimento de Fux, a nova organização foi resultado da CPI do Ecad, tocada pelo Senado, que concluiu ser o Escritório Central um órgão pouco transparente e omisso diante do cometimento de diversos desvios. “A Comissão concluiu que os problemas diagnosticados não seriam meros episódios isolados, mas reais sintomas da falta de funcionalidade do modelo regulatório até então vigente. Alterar a disciplina jurídica do tema passou a ser prioridade”, escreveu o ministro.

Para os escritórios de arrecadação, o modelo criado pela Lei 12.853 é inconstitucional por violar os direitos de livre associação, de livre iniciativa e da propriedade privada. No entendimento deles, a lei dá ao Estado controle sobre o dinheiro de artistas, que exercem atividade privada.

Para Fux, os conceitos elencados pelos autores das ações de inconstitucionalidade não são incompatíveis com a intervenção estatal. “Aliás, o próprio monopólio do Ecad é produto de intervenção do Estado, tendo sido chancelado por este STF sob aplausos das associações requerentes. Daí a necessária cautela para que a retórica dos direitos fundamentais não se torne insaciável, devoradora do espaço político de deliberação coletiva.”

O ministro também afirma que diversos países encontraram formas diferentes de tratar dos direitos autorais. E entre as diferenças, está o grau de presença estatal. “A pluralidade de regimes sugere que não existe um modelo único, perfeito e acabado de atuação estatal neste campo. O maior ou o menor protagonismo do Poder Público depende das escolhas políticas das maiorias eleitas”, concluiu Fux.

ADI 5.062
ADI 5.065
Clique aqui para ler o voto do ministro Luiz Fux.

sábado, 23 de abril de 2016

Compliance e defesa da concorrência

Relatório da OCDE revelou que o número de cartéis detectados e de empresas reincidentes em práticas anticompetitivas não cedeu

Relatório de 2011 da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), com dados sobre as maiores economias do mundo, apontou que autoridades antitruste têm enviado há anos mensagens cada vez mais duras para potenciais ofensores do direito concorrencial. O relatório, contudo, revelou que o número de cartéis detectados e de empresas reincidentes em práticas anticompetitivas não cedeu.

Esse cenário aponta para a importância de medidas de cunho preventivo --como o desenvolvimento de programas de "compliance" concorrencial por empresas. Tais programas, que visam incentivar funcionários a seguirem as normas existentes, podem ser importantes aliados para evitar infrações à ordem econômica. Muitas companhias, cientes dos benefícios de medidas preventivas, investem em iniciativas de adequação às normas concorrenciais.

O número crescente de propostas de acordos de leniência ou de cessação de conduta que tem chegado ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) é um sinal disso. Em 2010, praticamente triplicou a procura à autoridade para a celebração de acordos de leniência. O mesmo ocorreu desde 2013 em relação aos acordos de cessação de conduta. Por meio desses instrumentos, as empresas contribuem para a elucidação dos fatos, comprometem-se a cessar a conduta e, em alguns casos, admitem sua participação nos fatos investigados.

As autoridades de concorrência também têm o seu papel a desempenhar na adoção de programas de "compliance". A Comissão Europeia e as agências do Reino Unido e da França, por exemplo, têm estimulado empresas a desenvolver esses programas por meio da elaboração de cartilhas com orientações sobre o tema. Organizações internacionais têm feito estudos a respeito, com vistas a compreender e comparar melhor as diferentes abordagens em matéria de "compliance" por autoridades públicas ao redor do mundo.

Nesse sentido, com o intuito de fornecer subsídios para as empresas criarem ou aperfeiçoarem seus programas de "compliance" concorrencial no Brasil, o Cade abriu diálogo com advogados, acadêmicos e empresários para discutir modelos, melhores práticas --inclusive em outros países-- e o papel de cada agente nesse processo. Os debates ocorrerão durante seminário internacional sobre "compliance" e defesa da concorrência, em 28 e 29 de agosto, em São Paulo.

A combinação de diferentes tipos de abordagem --repressão eficiente aliada ao estímulo a ações educativas e preventivas-- é a melhor e mais completa forma de assegurar o respeito às normas concorrenciais.

Ações preventivas já desempenham um papel fundamental na política de defesa da concorrência. O Cade, ao analisar fusões e aquisições, atua para impedir a dominação de mercados --que gera ineficiência, produtos e serviços de baixa qualidade, pouca inovação tecnológica, preços abusivos e aumento da concentração de renda. Trata-se de uma abordagem preventiva, cuja lógica é a de evitar que efeitos nocivos ao mercado se concretizem.

Essa atividade é tão crucial para o bem-estar econômico da sociedade que, há dois anos, o Brasil deixou de ser uma das poucas jurisdições no mundo em que as fusões passavam pelo crivo da autoridade antitruste só depois de já estarem consumadas. A nova legislação (lei nº 12.529/11), entre outros avanços, corrigiu essa distorção, para que o país passasse a contar com ferramentas mais eficazes no combate ao abuso do poder econômico, como prevê a Constituição Federal.

Sob o regime de análise prévia de operações, o Cade não mediu esforços para se tornar mais ágil e eficaz. A autarquia brasileira está entre as oito melhores agências antitruste do mundo e o tempo médio de apreciação de operações empresariais em nosso país (cerca de 23 dias) é um dos mais rápidos, segundo a britânica "Global Competition Review".

Agora, ao colocar em pauta o fomento a programas de "compliance", o Cade busca promover mais um ganho de efetividade no combate ao abuso do poder econômico em nosso país. Afinal, o melhor cenário não é aquele no qual mais se pune, mas aquele em que menos práticas anticompetitivas ocorrem.

Artigos para leitura sobre Direito Empresarial



domingo, 17 de abril de 2016

Patrimônio insuficiente não basta para desconsideração

Por Livia Scocuglia

Insuficiência de patrimônio social não é requisito suficiente para autorizar a desconsideração da personalidade jurídica e o consequente avanço sobre o patrimônio particular dos sócios. Isso depende da prova de que houve abuso de direito nos caso de desvio de finalidade ou na confusão patrimonial. O entendimento é da ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar um caso de dissolução irregular. No caso, ficou comprovado que não houve abuso da personalidade jurídica pelos sócios e por isso, não há motivo para a desconsideração.

As partes discutiam se o encerramento irregular da sociedade empresária, que não deixou bens que pudessem ser penhorados, é motivo suficiente para fundamentar a desconsideração da personalidade jurídica.

Segundo a ministra, a personalidade jurídica protege o patrimônio dos sócios na “justa medida de sua atuação legítima”, segundo a finalidade da sociedade. Essa proteção deixa de existir se ocorrer o desvirtuamento da atividade empresarial, por constituir abuso de direito dos sócios. Nesses casos, e de maneira excepcional, há a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade, para permitir, momentaneamente, que sejam atingidos os bens da pessoa natural, “de modo a privilegiar a boa-fé nas relações privadas”, afirmou a ministra.

Ela entende que a insuficiência de bens necessários à satisfação das dívidas contraídas consiste, “a rigor”, em pressuposto para a decretação da falência e não para a desconsideração da personalidade jurídica.

No Brasil, a extinção de uma sociedade empresarial depende de Certificado de Regularidade do FGTS, emitido pela Caixa Econômica Federal; Certidão Negativa de Débitos para com o INSS; Certidão de Quitação de Tributos e Contribuições Federais para com a Fazenda Nacional, entre outros documentos, o que, segundo a ministra, torna quase impossível para uma empresa em dificuldades financeiras sujeitar-se ao procedimento legal de extinção.

Entendimento recente do STJ foi de que a dissolução irregular da sociedade não pode ser fundamento isolado para o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, mas, aliada a fatos concretos que permitam deduzir ter sido o esvaziamento do patrimônio societário “ardilosamente provocado” de modo a impedir a satisfação dos credores em benefício de terceiros, é circunstância que autoriza induzir existente o abuso de direito. Esse abuso poderia ser caracterizado pelo uso ilegítimo da personalidade jurídica para fraudar o cumprimento das obrigações (desvio de finalidade) ou na ausência de separação entre o patrimônio da pessoa jurídica e o de seus sócios (confusão patrimonial), artigo 50 do Código Civil.

Sendo assim, a ministra levou em consideração a decisão do TJ-SP de que, no caso, não há nenhum indício de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial por parte da empresa. Ela então decidiu que, o fato de o credor não ter recebido seu crédito frente à sociedade, em decorrência da insuficiência de patrimônio social, não é requisito bastante para autorizar a desconsideração da personalidade jurídica.

Clique aqui para ler a decisão.
Recurso especial 1.395.288 


sexta-feira, 15 de abril de 2016

Sócios de serraria afastam penhora de imóvel avaliado em R$ 13,5 milhões

Um casal de sócios e administradores da Indústria Trevo, do Paraná (massa falida), reverteu no Tribunal Superior do Trabalho decisões que determinavam a penhora do seu bem de família de alto valor localizado em Curitiba (PR).  Ao julgar dois processos em fase de execução ajuizados por empregados demitidos em setembro de 2005, a Terceira Turma considerou que, de acordo com a lei, a impenhorabilidade não pode ser afastada em razão do valor do bem, como fez o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR).
 
Indicado para penhora nas duas ações trabalhistas contra a Trevo - empresa de serrarias de madeiras para assoalhos criada em 1987, que decretou falência em abril de 2007 – o imóvel foi visitado por oficiala de justiça, que constatou que, no local, moravam os sócios, um filho, dois netos e quatro bisnetos.
 
Em um dos processos, ajuizado por um técnico de segurança, cuja execução estava em R$ 11 mil em 2015, o juízo da 11ª Vara do Trabalho de Curitiba (PR) rejeitou o pedido de penhora, por se tratar de bem de família. O TRT-PR, porém, entendeu que o bem de família "suntuoso" não deveria prevalecer em detrimento do crédito alimentar trabalhista, e determinou a reserva de R$ 1 milhão do produto da arrematação para os administradores da Trevo comprarem outro imóvel.
 
No recurso ao TST, os dois sócios alegaram que a propriedade, apesar do valor, seria impenhorável por ser o único imóvel de sua propriedade, ser bem de família e se destinar à sua moradia. Sustentaram, ainda, que houve excesso de penhora e violação dos artigos 1º, 5º, e 6º da Constituição da República, 1º, 3º, incisos I a IV, e 5º da Lei 8.009/90 (relativa à impenhorabilidade do bem de família), 10, parágrafo 3º, do Estatuto do Idoso e 620 e 668 do CPC.
 
O trabalhador contestou a argumentação dos empresários alegando que, além de serem proprietários do imóvel, eram sócios de uma empresa que faliu e que, "ao fechar, deixou mais de 200 trabalhadores sem sequer receber suas verbas rescisórias, dentre outras irregularidades". Afirmou também que as verbas rescisórias são extremamente importantes para um trabalhador cujo contrato é cessado, pois podem garantir a sua sobrevivência até a obtenção de novo emprego.
 
TST

No julgamento do recurso de revista, o relator, ministro Alexandre Agra Belmonte, explicou que o artigo 5º, inciso XXII, da Constituição consagra o direito de propriedade, e o artigo 6º garante a moradia do indivíduo como direito social. "Por esse motivo, o artigo 1º da Lei 8.009/90 prevê a impenhorabilidade do bem de família, protegendo, dessa forma, o núcleo familiar e a sua residência", ressaltou. Ele assinalou que a regra comporta exceções, mas que a impenhorabilidade não pode ser afastada em razão do valor do bem, como fez o Tribunal Regional, salientando que o TST já adotou esse entendimento em diversos precedentes.
 
Nesse mesmo sentido foi a decisão do outro processo, ajuizado por um auxiliar de produção contra a Trevo, cuja execução estava em cerca de R$ 6 mil em 2014. Nos dois processos, os recursos de revista foram providos pela Terceira Turma para desconstituir a penhora realizada sobre o imóvel.
 
A decisão foi por maioria.
(Lourdes Tavares/CF)
 
Processo: RR-1849500-05.2005.5.09.0011 e RR-95700-83.2006.5.09.0012