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sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

CONTRATO DE FRANQUIA. INTERFERÊNCIA DA FRANQUEADORA NAS ATIVIDADES DA FRANQUEADA. POSSIBILIDADE

 Franquia empresarial. Franqueado e Franqueador 

Não há nenhuma irregularidade na interferência da franqueadora nas atividades da franqueada, a fim de garantir o fomento econômico dessas atividades. Isso porque o contrato de franquia visa, precipuamente, ao estímulo da atividade empresarial pelo franqueado. No caso, a interferência da franqueadora se deu com intuito de melhorar o atendimento dos clientes da marca Shell, não configurando ingerência nas atividades da franqueada. 

STJ, AgInt no AREsp 1343618 / PR

quarta-feira, 4 de outubro de 2023

A diluição, fenômeno de existência reconhecida no Direito de Marcas, consiste na perda gradual da força distintiva de determinado signo

SENTENÇA E ACÓRDÃO RECORRIDO QUE ADOTARAM O ENTENDIMENTO DE QUE AS MARCAS FAMOSAS SÃO PROTEGIDAS CONTRA DILUIÇÃO, INDEPENDENTEMENTE DE ALTO RENOME. ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 125 DA LPI. OCORRÊNCIA. PROTEÇÃO ESPECIAL CONTRA A DILUIÇÃO QUE, NO DIREITO BRASILEIRO, SE LIMITA ÀS MARCAS DE ALTO RENOME. ÚNICA EXCEÇÃO EXPRESSA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO AO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. 


Caso concreto em que a controvérsia recursal versa acerca da possibilidade de se reconhecer proteção contra diluição da marca que, embora famosa, não goze de alto renome.

A diluição, fenômeno de existência reconhecida no Direito de Marcas, consiste na perda gradual da força distintiva de determinado signo, decorrente do uso, por terceiros, da mesma marca para produtos ou serviços distintos, ainda que não haja confusão, tornando cada vez menos exclusivo o uso do signo, que virtualmente se dilui em meio a tantos outros usos.

Proteção contra a diluição que surgiu da verificação de que as marcas, além exercerem a função de identificar a origem comercial de produtos e de serviços, também podem servir de veículo de comunicação ao consumidor, veiculando valores, imagens e sensações, tornando-se agente criador de sua própria fama e reputação.

Quando uma marca se torna especialmente famosa, passando a ter mais valor do que o próprio produto ou serviço a que se refere, maior se torna sua exposição a tentativas de aproveitamento parasitário, do que decorre uma necessidade de maior proteção.


Acórdão

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

As provas imprescindíveis do Trade Dress.

No caso dos autos, a recorrida (autora da demanda originária) não promoveu a dilação probatória necessária à comprovação do fato constitutivo de seu direito – a existência de conduta competitiva desleal –, devendo, por isso, suportar o ônus estático da prova (art. 333, I, do CPC/1973). 


Recurso Especial 1.591.294-PR

domingo, 11 de setembro de 2022

Uso indevido de marca dispensa prova de dano material e moral

A jurisprudência do STJ também entende que é devida reparação por danos patrimoniais (a serem apurados em liquidação de sentença) e por danos extrapatrimoniais na hipótese de se constatar a violação de marca, independentemente de comprovação concreta do prejuízo material e do abalo moral resultante do uso ilícito.

Com esse entendimento, a Quarta Turma, no julgamento do REsp 1.507.920, manteve em R$ 15 mil a indenização por danos morais a que a empresa Sonharte Brasil foi condenada pelo uso indevido da marca de outra empresa do mesmo ramo, a Sonhart.

As instâncias de origem reconheceram que a Sonharte se valeu da expressão para a divulgação de seus serviços e produtos, a despeito de ser inequivocamente semelhante à marca da concorrente, e concluíram que houve violação do direito de propriedade intelectual da Sonhart.

Para a relatora, ministra Isabel Gallotti, houve concorrência desleal e aproveitamento parasitário, mediante a comercialização de produtos com o uso de nome "praticamente idêntico" ao registrado pela concorrente "no mesmo ramo de atividade econômica, de forma a induzir em erro o consumidor".

sábado, 3 de setembro de 2022

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER C/C PERDAS E DANOS POR USO INDEVIDO DE MARCA

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER C/C PERDAS E DANOS POR USO INDEVIDO DE MARCA – ACÓRDÃO QUE DECLAROU NULA A SENTENÇA EX OFFICIO E DETERMINOU O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM, VISANDO MAIOR INSTRUÇÃO PROCESSUAL PARA O DESLINDE DA CONTROVÉRSIA, DECLARANDO PREJUDICADO O RECURSO INTERPOSTO PELA EMBARGADA – AVENTADO JULGAMENTO EXTRA PETITA E ALEGADA OMISSÃO NO QUE DIZ RESPEITO À NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL EM DISCUSSÃO SOBRE PROTEÇÃO DA MARCA (LEI DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL) – IMPROCEDÊNCIA IN CASU – MERO INCONFORMISMO – REDISCUSSÃO DO MÉRITO – PRETENSÃO DE REEXAME DESCABIDA – AUSÊNCIA DE ELEMENTOS APTOS A AFASTAR A CONCLUSÃO TOMADA À UNANIMIDADE PELO COLEGIADO – DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA, COM EXPOSIÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA E DE BAIXA DOS AUTOS PARA CONFECÇÃO DA PROVA TÉCNICA DE OFÍCIO – PRECEDENTES – DELIMITADA A IMPRESCINDIBILIDADE DE MAIOR INSTRUÇÃO PROBATÓRIA QUANTO AOS FATOS ALEGADOS PELA AUTORA, HAJA VISTA O ELEVADO RISCO DE CONFUSÃO OU ASSOCIAÇÃO INDEVIDA ENTRE AS MARCAS POR PARTE DOS CONSUMIDORES, BEM COMO QUANTO À AFIRMAÇÃO DE CONCORRÊNCIA DESLEAL DESENCADEADA – DÚVIDA ACERCA DA UTILIZAÇÃO UNIVERSAL DO PREFIXO “CRED” E DO COMPLEMENTO “SUL”, DE MODO QUE TEMERÁRIA QUALQUER CONCLUSÃO SOBRE A EXCLUSIVIDADE DO SEU USO SEM A PRÉVIA CONFECÇÃO DE LAUDO POR EXPERT DO RAMO – COMPLETA OBSERVÂNCIA DAS CIRCUNSTÂNCIAS FACTUAIS E DOS ELEMENTOS ARGUMENTATIVOS – PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO – VÍCIO INEXISTENTE – ADVERTÊNCIA QUANTO À APLICAÇÃO DE MULTA PECUNIÁRIA DOS ARTIGOS 77, 80, 81 E 1.026, TODOS DO NCPC – DELIBERAÇÃO MANTIDA – ACLARATÓRIOS CONHECIDOS E REJEITADOS.

(TJPR - 7ª C.Cível - 0014647-64.2019.8.16.0017 - Maringá -  Rel.: DESEMBARGADOR FABIAN SCHWEITZER -  J. 05.08.2022)

sábado, 27 de agosto de 2022

Utilização da marca

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER Marca - Utilização da marca da autora em links patrocinados Inadmissibilidade Empresas que trabalham no mesmo ramo de atividade Possibilidade de causar confusão entre os consumidores Prática inadmitida Decisão que determinou que a ré se abstenha dessa prática mantida - Recurso da ré improvido


INTEIRO TEOR

quinta-feira, 11 de agosto de 2022

Pedro Cardoso acusa produtoras por roubo de autoria de série

 Acusação de utilização indevida de obra intelectual



Segundo o ator, as empresas utilizaram um projeto criado por ele
e a esposa, Graziella Moretto, e depois o excluíram do acordo

No início do vídeo, o artista pediu desculpa e adiantou que iria abordar um assunto delicado e que o deixava aborrecido, mas que não poderia deixar de falar. 

Estou usando essa rede antissocial como cartório público. Quero registrar a minha posição sobre tudo que passou na série Área de Serviço. Eu estou aqui para enterrar uma criação minha e de Graziela que foi "assassinada" ainda recém-nascida pela Dueto Produções e pela WarnerMedia — afirmou.


Notícia completa

terça-feira, 2 de agosto de 2022

A proteção da marca no ambiente do metaverso

"Seja marca empresarial, marca de produto ou até mesmo nome artístico, o metaverso será palco de grandes disputas judiciais muito em breve por uso sem autorização de tais nomes comerciais", frisa o advogado especialista em direito digital e cofundador da startup MyMarca- Propriedade Industrial & Intelectual

Por Frederico Cortez

O mundo virtual já não é nenhuma novidade, ainda mais nesse momento de pós-pandemia. As medidas de restrições de enfrentamento à Covid-19 descortinaram uma necessidade, até então não encarada como urgente por todos nós. O continuísmo da vida social e profissional num ambiente de limitação física foi o ponto desencadeador, de toda essa movimentação tecnológica inovadora da plataforma metaverso.

A transição mesmo que temporária das relações pessoais e profissionais para o mundo digital, chama a atenção agora para a proteção legal sobre a marca nesse mundo paralelo. Seja marca empresarial, marca de produto ou até mesmo nome artístico, o metaverso será palco de grandes disputas judiciais muito em breve por uso sem autorização de tais nomes comerciais. A Lei de Propriedade Industrial – LPI (Lei 9.279/96) e a Lei de Direito Autoral- LDA (Lei 9.610/98) trazem em seu conjunto de normas uma proteção ampla, com alcance também para o metarverso.

Destaque-se que o art. 189, incisos I e II da LPI (Lei 9.279/96) tipifica como crime a reprodução sem autorização do titular, no todo ou em parte, marca registrada, ou imita-a de modo que possa induzir confusão; como também enseja ilícito a alteração de marca registrada de outrem já aposta em produto colocado no mercado. Para este crime, a pena imposta é de detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. Soma-se ainda que, a LDA (Lei 9.610/98) em seu art. 5ª, V, assegura a proteção no mundo do metaverso quando a comunicação ao público de determinada obra intelectual for colocada “por qualquer meio ou procedimento e que não consista na distribuição de exemplares”. Aqui, o ilícito é caracterizado pelo crime de contrafação, cuja pena é de até 4 anos e multa conforme o disposto no art. 184 do Código Penal Brasileiro.

Quanto ao formato da proteção nos institutos da propriedade industrial e da obra intelectual, precioso elencar que a titularidade sobre a marca somente nasce com o seu registro junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Já o garantismo da obra intelectual surge com a sua publicação com alcance ao público em geral, sendo admitido todos os meios. Inclui-se aqui, o digital também!

Por enquanto, a sociedade digital do metaverso ainda não é uma realidade para todos, o que não afasta o seu início por grandes corporações econômicas. O mais importante a se saber é que seu conceito já foi aceito pelo mercado e que a sua proposta não se enquadra em nenhum ilícito. De acordo com a publicação de janeiro deste ano do site Forbes, empresas como a Nike, Ralph Lauren, Itaú, Vans, Fortnite, Gucci, Balenciaga Burberry, Stella Artois e Lojas Renner já estão ambientadas no metarverso. Outras companhias também já começaram a dar o seu primeiro passo para ocupar espaço na plataforma virtual, como é o caso das redes Outback e MacDonald’s.

Um outro elemento deve ter a sua importância no metaverso, que são as imagens de artistas e digital influencer notoriamente conhecido. O uso indevido de imagens de personalidades públicas com a finalidade econômica e sem a devida autorização do titular, considera-se como crime de uso indevido de imagem. Assim, digital influencers conhecidos, atores, atrizes, cantores e bandas musicais estão também blindados contra aproveitadores no mundo do metaverso.

Do mesmo modo que a novidade do metaverso invade o mercado, nasce uma demanda sobre a compreensão legal para a proteção da marca nesse novo mundo virtual. A complexidade da matéria aliada à falta de julgados sobre o mataverso, como base de uma jurisprudência norteadora para novos casos, abre um novo nicho de mercado de trabalho para profissionais do direito especializados em propriedade industrial, propriedade intelectual e direito digital.

Sejam todos bem-vindos ao universo do metaverso!


sábado, 5 de dezembro de 2020

Disputa entre Gradiente e Apple pela marca "iphone" será objeto de mediação no STF


O ministro Dias Toffoli determinou a remessa do caso ao Centro de Conciliação e Mediação da Corte, criado este ano.


04/12/2020 17h31 

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), encaminhou o Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1266095, em que se discute a exclusividade do uso da marca Iphone no Brasil, ao Centro de Conciliação e Mediação da Corte. O órgão, criado pela Resolução 697/2020, tem o objetivo de atuar na solução consensual de questões jurídicas sujeitas à competência do STF.

Registro

Em 2000, a IGB Eletrônica, dona da marca Gradiente, solicitou junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) o registro da marca Gradiente Iphone, para designar aparelhos celulares e produtos acessórios de sua linha de produção. O pedido foi deferido somente em 2008, e, em 2013, a empresa norte-americana Apple, fabricante do iPhone desde 2007, ajuizou ação contra a IGB e o Inpi visando à nulidade parcial do registro.

Sem exclusividade

O juízo da 25ª Vara Federal do Rio de Janeiro (RJ) julgou o pedido procedente e determinou ao Inpi que o concedesse “sem exclusividade sobre a palavra iphone isoladamente”.

A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que entendeu que o direito de uso exclusivo da marca não é absoluto. Segundo o TRF-2, é preciso levar em consideração o fato indiscutível de que os consumidores e o mercado, quando pensam em iphone, “estão tratando do aparelho da Apple”. Assim, o uso isolado da marca por qualquer outra empresa poderia causar “consequências nefastas” à Apple.

Fato consumado

No ARE, a Gradiente argumenta que, conforme registrado no acórdão do TRF, é incontroverso que o depósito da marca foi feito em 2000 e que o registro só foi deferido pelo Inpi em janeiro de 2008. “Nesse momento, o iPhone da Apple, lançado em 2007, já era uma febre mundial, muito em razão de enormes investimentos em publicidade”, afirma.

Segundo a empresa brasileira, o fundamento adotado para o acolhimento do pedido da Apple teria sido a existência de um fato consumado, e a definição do titular da marca teria levado em conta o critério da opinião dos consumidores. Para a Gradiente, esse entendimento do TRF “subverte completamente o sistema brasileiro de propriedade intelectual, substituindo o princípio da prioridade no depósito pelo do sucesso na exploração”.

Em junho, o ministro Dias Toffoli negou seguimento ao recurso interposto ao STF, assentando que a análise da causa demandaria interpretação da legislação infraconstitucional e reexame dos fatos e das provas, o que não é cabível em recurso extraordinário. Em seguida, a Gradiente interpôs agravo regimental visando à reforma da decisão monocrática.

Mediação

Ao suspender e processo e remetê-lo ao Centro de Conciliação e Mediação, Toffoli lembrou que o relator pode adotar essa providência em qualquer fase processual, para que sejam realizados os procedimentos a fim de buscar a composição consensual da lide. A decisão da remessa levou em conta que a questão discutida no recurso versa sobre direitos patrimoniais disponíveis.

sábado, 12 de outubro de 2019

Titular da marca Chandelle utilizada para designar produto de chocolate em creme, e que a recorrida inseriu no mesmo mercado, sobremesa cremosa de chocolate sob a marca Chocomilk.


RECURSO ESPECIAL Nº 1.591.294 - PR (2014⁄0025337-9)


RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:

Cuida-se de recurso especial interposto por BRF Brasil Foods S.A. fundamentado nas alíneas a e c do permissivo constitucional.

Depreende-se do autos que Nestlé Brasil Ltda. e outras propuseram ação inibitória cumulada com perdas e danos contra a recorrente.

Em sua inicial, afirmou ser titular da marca Chandelle utilizada para designar produto de chocolate em creme, e que a recorrida inseriu no mesmo mercado, sobremesa cremosa de chocolate sob a marca Chocomilk. Alegou, em síntese, que o novo produto possui composição visual que imita o conjunto-imagem (trade dress) dos produtos que comercializa.

Em sentença, o pedido foi julgado improcedente.

Interposto recurso pelas ora recorridas, o Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade, deu parcial provimento à apelação, nos termos da seguinte ementa (e-STJ, fls. 950-951):

  • PROPRIEDADE INDUSTRIAL - AÇÃO COMINATÓRIA CUMULADA COM PERDAS E DANOS - OCORRÊNCIA DE CONTRAFAÇÃO E CONCORRÊNCIA DESLEAL - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA - AGRAVO RETIDO - ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA - PREJUDICADO - OS PEDIDOS SE CONFUNDEM COM O MÉRITO DO RECURSO DE APELAÇÃO - APELAÇÃO CÍVEL - PROTEÇÃO AOS OUTROS SIGNOS DISTINTIVOS (ART. 5, XXIX DA CF) EM COMBATE AOS ATOS DE CONCORRÊNCIA DESLEAL (ART. 195 E INCISOS DA LEI N.º 9.279⁄96) - CONTRAFAÇÃO AO CONJUNTO IMAGEM, "TRADE-DRESS" - OCORRÊNCIA - SEMELHANÇA ENTRE OS ELEMENTOS POSTOS NA EMBALAGEM - INDIVIDUALMENTE SÃO SIGNOS DISTINTOS, MAS QUANDO ANALISADOS PERANTE O CONJUNTO DE IMAGEM GERAM CONFUSÃO AOS CONSUMIDORES - AS PEQUENAS DISTINÇÕES NAS EMBALAGENS NÃO LHES GARANTEM DISTINTIVIDADE - PRESENTES OS REQUISITOS CARACTERIZADORES DA CONCORRÊNCIA DESLEAL FUNDADA NA CONFUSÃO: ANTERIORIDADE DO PRODUTO CONCORRENTE; EXISTÊNCIA DE IMITAÇÃO E SUSCETIBILIDADE DE SE ESTABELECER A CONFUSÃO - PROTEÇÃO AO "TRADE-DRESS" DO PRODUTO CHANDELLE - NÃO RECONHECIMENTO DE AMPARO AO PRODUTO CHANDELLE LIGHT - AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO A CONCORRÊNCIA ENTRE OS PRODUTOS CHANDELLE LIGHT E BATAVO CREAMY LIGHT - CONDENAÇÃO EM PERDAS E DANOS - LUCRO CESSANTE NOS TERMOS DO ARTIGO 210 DA LEI DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL - DANOS MORAIS - AFASTAMENTO - AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO AO DANO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO - RECURSO ADESIVO - OCORRÊNCIA DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - AFASTAMENTO - MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - PREJUDICADO - NEGADO PROVIMENTO - READEQUAÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - SENTENÇA MODIFICADA.

Opostos embargos de declaração por ambas as partes, foram eles rejeitados.

Nas razões do presente recurso especial, as recorrentes alegam violação dos arts. 124 e 195 da Lei n. 9.279⁄1996; 186 e 944 do CC⁄2002; e 14, 16, 17, 18 e 333 do CPC⁄1973, bem como dissídio jurisprudencial.

Assevera a recorrente que foi atribuída a proteção ao conjunto-imagem (trade dress) da recorrida, em razão da utilização de sinais comuns e da cor da embalagem, elementos que sequer seriam passíveis de registro para utilização exclusiva.

Acrescenta que não ficou demonstrada a utilização anterior do mesmo conjunto-imagem, e que o Tribunal de origem concluiu pela anterioridade da utilização em razão da existência do produto desde 1986, quando o produto da recorrida não era ainda denominado Chandelle, mas sim Chamborcy. Afirma o descumprimento da regra de distribuição do ônus da prova, de modo que o tribunal de origem teria presumido fato que dependia de prova não produzida pela autora, ora recorrida.

Pleiteia ainda o reconhecimento de litigância de má-fé, uma vez que a recorrida apontou, na petição inicial, a imitação de conjunto marcário de Chandelle Light quando este produto ainda não era produzido nem comercializado.

Por fim, concluem que não houve a prática de ato de concorrência desleal, uma vez que seus produtos são comercializados mediante marca própria ostensivamente apresentada na embalagem de forma a afastar a confusão pontencial entre os consumidores.

Contrarrazões apresentadas (e-STJ, fls. 1.272-1.306).

Em juízo prévio de admissibilidade, o Tribunal de origem não admitiu o recurso especial, dando azo à interposição do AREsp n. 472.356-PR, provido para determinar a reautuação do presente recurso.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.591.294 - PR (2014⁄0025337-9)


VOTO

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE(RELATOR):

Cinge-se a controvérsia a verificar o preenchimento dos requisitos para proteção assegurada ao conjunto-imagem de produto ou serviço (trade dress) no que tange à concorrência desleal por confusão.

Esta Terceira Turma, recentemente, apreciou a questão da proteção ao trade dress sob o enfoque da concorrência desleal por confusão, no intuito de balizar e uniformizar a atuação jurisdicional. Trata-se do julgamento do recurso especial n. 1.353.451⁄MG, assim ementado:

  • PROPRIEDADE INDUSTRIAL. RECURSO ESPECIAL. CONJUNTO-IMAGEM (TRADE DRESS). COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTO AFIM. EMBALAGENS ASSEMELHADAS. CONCORRÊNCIA DESLEAL. ART. 209 DA LEI N. 9.279⁄1996 (LPI). PERÍCIA TÉCNICA REQUERIDA. DISPENSA INJUSTIFICADA. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
  • 1. O conjunto-imagem (trade dress) é a soma de elementos visuais e sensitivos que traduzem uma forma peculiar e suficientemente distintiva, vinculando-se à sua identidade visual, de apresentação do bem no mercado consumidor.
  • 2. Não se confunde com a patente, o desenho industrial ou a marca, apesar de poder ser constituído por elementos passíveis de registro, a exemplo da composição de embalagens por marca e desenho industrial. 3. Embora não disciplinado na Lei n. 9.279⁄1996, o conjunto-imagem de bens e produtos é passível de proteção judicial quando a utilização de conjunto similar resulte em ato de concorrência desleal, em razão de confusão ou associação com bens e produtos concorrentes (art. 209 da LPI).
  • 4. No entanto, por não ser sujeito a registro - ato atributivo do direito de exploração exclusiva - sua proteção não pode servir para ampliar direito que seria devido mediante registro, de modo que não será suficiente o confronto de marca a marca para caracterizar a similaridade notória e presumir o risco de confusão.
  • 5. A confusão que caracteriza concorrência desleal é questão fática, sujeita a exame técnico, a fim de averiguar o mercado em que inserido o bem e serviço e o resultado da entrada de novo produto na competição, de modo a se alcançar a imprevisibilidade da conduta anticompetitiva aos olhos do mercado.
  • 6. O indeferimento de prova técnica, para utilizar-se de máximas da experiência como substitutivo de prova, é conduta que cerceia o direito de ampla defesa das partes.
  • 7. Recurso especial conhecido e provido.
  • (REsp n. 1.353.451⁄MG, desta relatoria, Terceira Turma, DJe 28⁄9⁄2017)

Na oportunidade, reconhecendo a inegável importância crescente dos elementos imateriais da empresa para atração do consumidor e identificação dos produtos e seus fabricantes, assinalou-se a necessidade de se esclarecer a distinção entre marca, desenho industrial e conjunto-imagem (trade dress) e, por consequência, divisar o tratamento jurídico dispensado a cada um. Nessa trilha, enfatizando a ausência de previsão legal específica para o amparo do trade dress, o qual consiste em conjunto visual global de um produto ou a forma de prestação de um serviço,  lembrou-se que sua proteção se fundamenta no dever geral de garantia de livre mercado, especialmente disposto no art. 209 da Lei n. 9.279⁄1996.

Todavia, ao se entrelaçar conceitos e vetores do direito concorrencial no direito de proteção à propriedade industrial, mormente em casos que não se debate propriedades registradas e objetivamente protegidas, a análise da confusão passa do plano abstrato (questão de direito) ao plano concreto (questão de fato) e, assim, inerentemente dependente de prova.

Isso porque não se pode ignorar que, em alguns nichos mercadológicos, os produtos ou serviços são apresentados ao consumidor por meio de elementos comuns e bastante difundidos no mercado. Essa similaridade dispersa, ao contrário de configurar uma conduta anticompetitiva, resulta num benéfico acirramento da competição na medida em que facilita ao consumidor identificar as opções de produtos semelhantes existentes no mercado, para então concluir sua decisão em favor da marca que melhor lhe aprouver, seja pelo critério de preço, seja pelo critério de qualidade, seja por qualquer outro critério que eleja voluntariamente. Desse modo, por resultar em incremento à competição, a entrada de conjunto-imagem semelhante em mercado já assemelhado não deve ser obstada por meio de intervenção judicial. Esta deverá ser excepcional e sempre pautada pela verificação concreta de que se está diante de algo novo e peculiar a ponto de despertar o Estado de sua inércia, consequência da livre concorrência e da liberdade de iniciativa adotadas no Brasil.

Desse modo, para se caracterizar uma atitude anticompetitiva e desleal é imprescindível que a situação concreta demonstre um comportamento imprevisível aos olhos do mercado, o que não se pode reconhecer quando se utiliza elementos comuns, partilhados por uma multiplicidade de concorrentes no mesmo nicho do mercado. Daí esta Terceira Turma ter sublinhado que, nos casos de alegação de concorrência desleal pela utilização de conjunto-imagem assemelhado apta, em tese, a causar confusão nos consumidores, é imprescindível uma análise técnica que tome em consideração o mercado existente, o grau de distintividade entre os produtos concorrentes no meio em que seu consumo é habitual e ainda o grau de atenção do consumidor comum.

2. Alegação de violação do art. 333 do CPC⁄1973

Muito embora seja imprescindível a prova técnica em casos como o dos autos, em que se debate a violação de trade dress por confusão, o acórdão recorrido, ao dar provimento à apelação interposta pela recorrida, entendeu suficiente a aplicação de máximas da experiência para concluir pelo potencial danoso da aproximação visual das embalagens. É o que se evidencia do seguinte trecho (e-STJ, fl. 962):

b) O outro requisito se configura pela simples suscetibilidade de estabelecer confusão entre os produtos, logo, o uso de signos distintivos de forma semelhante é o suficiente para caracterizar uma confusão.
c) Quanto à imitação; ao contrário do que mencionou o apelante, acredito que a nítida semelhança na estilização da linha de produtos da marca nominativa CHOCOMILK se dê pela padronização e não pela má-fé de captar uma classe consumidora (requisito não-obrigatório à concorrência desleal). A padronização das embalagens [de produtos diferentes da mesma fornecedora] é uma técnica de marketing comum às empresas de produtos alimentícios, pois visa promover o aumento nas vendas dos outros segmentos dessa mesma linha.
Todavia, essa tentativa de padronização tornou os conjuntos de imagens empregados pelas partes confundíveis, prática esta que deve ser combatida.

Contudo, ao contrário do fundamentado no acórdão recorrido e na linha das considerações acima, inexistindo registro da embalagem em favor de algum dos litigantes, não se cogita da existência de um direito de exploração exclusiva, de modo que a vedação à utilização por alguma das partes depende mesmo da caracterização efetiva de ato de concorrência desleal. Nesses casos, em que a causa de pedir é exatamente a prática de atos anticoncorrenciais por meio da utilização de conjunto-imagem assemelhado e apto a causar confusão no mercado consumidor, deve-se reconhecer que o cerne do processo repousa em fato cuja caracterização depende, a priori, de conhecimento técnico especial não exigível de um juiz de direito, devendo, por isso, o juiz se servir do auxílio técnico de expert.

Deve-se enfatizar que a necessidade de prova técnica, ainda que passível de dispensa pelo juiz da causa e pelos graus ordinários de jurisdição, conforme reiterada jurisprudência desta Corte Superior, não pode ser afastada ao livre-alvedrio do Julgador, mas em situações justificadas e respaldadas em alguma das hipóteses taxativamente previstas no parágrafo único do art. 420 do CPC⁄1973, vigente à época, e repetidas no atual art. 464, § 1º, do CPC⁄2015.

No caso dos autos, todavia, nem sequer houve o pleito da recorrida, autora da presente ação, para produção de prova apta a demonstrar a existência da confusão entre os produtos concorrentes, o que a ela competia nos termos do art. 333, I, do CPC⁄1973. Ao contrário, na fase de especificação de provas e saneamento processual, a recorrida se manifestou, de forma expressa, pela desnecessidade de produção de provas adicionais de qualquer natureza. É o que se denota do seguinte trecho de sua petição (e-STJ, fls. 443):

5. Informa a Requerente, portanto, que não possui interesse na produção de provas adicionais, reservando-se, obviamente, ao direito de contraditar eventuais provas pleiteadas pela Requerida.

Por essa trilha, uma vez que a notória semelhança entre os dois produtos – reconhecida pelo TJ⁄PR – não é suficiente para caracterizar a concorrência desleal e que a prova técnica não foi oportunamente requerida (aliás, foi expressamente dispensada), a presente causa se resolve pela distribuição estática do ônus da prova, o qual recai, portanto, sobre a ora recorrida. Assim, não tendo a recorrida se desincumbido de provar o fato constitutivo de seu direito, qual seja, a existência de ato de concorrência desleal, deve mesmo ser provido o presente recurso para julgar improcedente a ação condenatória por ela proposta.

Com esses fundamentos, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para restabelecer a sentença proferida, fixando os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) do valor atualizado da causa.

É como voto.


Documento: 69689931  RELATÓRIO E VOTO    

É inegável a crescente importância da proteção aos elementos imateriais da empresa, entre os quais o nome empresarial, o nome de fantasia, a marca, a embalagem e o conjunto-imagem (trade dress) constituem importantes elementos de atração do consumidor e identificação dos produtos e seus fabricantes.


RECURSO ESPECIAL Nº 1.353.451 - MG (2012⁄0239555-2)


RELATÓRIO


O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:

Cuida-se de recurso especial interposto por Fábrica de Tecidos São João Evangelista S.A. fundamentado nas alíneas a e c do permissivo constitucional.

Depreende-se dos autos que Companhia Manufatora de Tecidos de Algodão propôs ação de obrigação de não fazer cumulada com reparação de danos na modalidade lucros cessantes e compensação de danos morais contra a recorrente.

Em sua inicial, sustentou ser titular da marca APOLO de algodão hidrófilo e derivados, cujos produtos seriam comercializados em embalagens especialmente desenvolvidas com padrão de cores e design afeitos à marca. Asseverou que a recorrente, sua concorrente no mesmo segmento de mercado há longa data, sob a marca FAROL, passou, repetinamente, a utilizar embalagens que faziam "clara alusão ao produto" (e-STJ, fl. 7) da recorrente.

Em sentença, o pedido foi julgado parcialmente procedente, a fim de condenar a recorrente a se abster "de comercializar o produto algodão hidrófilo (em caixa), com a marca 'FAROL', que imite a embalagem de idêntico produto da marca 'APOLO', sob pena de multa a ser fixada por este juízo, em caso de descumprimento" (e-STJ, fl. 444), bem como a pagar indenização a título de perdas e danos, a serem liquidadas por arbitramento.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em julgamento de apelações oportunamente interpostas por ambas as partes, negou provimento ao recurso da recorrente e deu provimento ao recurso da recorrida, nos termos da seguinte ementa (e-STJ, fl. 563):
AÇÃO ORDINÁRIA - CERCEAMENTO DE DEFESA - PRELIMINAR AFASTADA - CONCORRÊNCIA DESLEAL CONFIGURADA - SIMILARIDADE ENTRE AS EMBALAGENS DOS PRODUTOS POSTOS NO MERCADO - DETERMINAÇÃO DE ABSTENÇÃO DE COMERCIALIZAÇÃO - DANO MATERIAL DEVIDO - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - FIXAÇÃO DO QUANTUM - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. - Em matéria de colheita de provas, predomina prudente discrição do magistrado no exame da pertinência das provas requeridas ou não, para a formação do convencimento ante as circunstâncias de cada caso concreto. - Restando evidenciada a concorrência desleal, é procedente o pedido para que a demandada se abstenha de comercializar os produtos com embalagem semelhante à da autora. - Diagnosticada a contrafação e o comportamento reprovável da ré ao obrar em concorrência desleal, a indenização por reparação patrimonial é medida que se impõe. - Independentemente da qualidade do produto contrafeito, o consumidor é enganado e tem subtraída, de forma ardil, sua faculdade de escolha. Ele adquire o produto imbuído em erro, acreditando estar comprando o produto original e de determinada marca, o que ocasiona, por ricochete, usurpação de parte da identidade do fabricante, gerando lesão aos direitos da personalidade. - Tratando-se de ação condenatória, a verba honorária deve ser arbitrada com base no art. 20, §3º, do CPC.


Opostos dois embargos de declaração, ambos foram rejeitados.

Nas razões do recuso especial, alega a violação dos arts. 128, 333, 420, 460 e 535 do CPC⁄1973; 2º, 122, 123, 128, 131, 132, 195, 208, 209 e 210 da Lei n. 9.279⁄1996; e 186, 187 e 297 do CC⁄2002, bem como dissídio jurisprudencial.

  • Em síntese, a recorrente sustenta que a ausência de registro da embalagem, bem como dos signos distintivos nela utilizados perante o INPI inviabiliza a proteção pretendida nesta demanda. Conclui que não havendo registro, não há proteção marcária. Assevera ainda que era necessária a produção de prova pericial requerida, a fim de verificar, concretamente, a possibilidade de confusão dos consumidores diante das embalagens confrontadas, de modo que o indeferimento da prova requerida configurou cerceamento de defesa, em especial por se tratar de nicho em que as embalagens são assemelhadas. Afirma, por fim, a inexistência de presunção de danos morais, uma vez que não se trata de caso de contrafação de produtos, mas de uso de desenho gráfico não registrado e que, na eventualidade de ser mantida a condenação, os valores arbitrados em R$ 30.000,00 (trinta mil reais) é exacerbado, impondo-se sua redução.


Foram apresentadas as contrarrazões (e-STJ, fls. 699-718).

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.353.451 - MG (2012⁄0239555-2)


VOTO


O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE(RELATOR):

Cinge-se a controvérsia a verificar, a par da adequação da prestação jurisdicional entregue, a extensão da proteção assegurada ao conjunto-imagem de produto ou serviço (trade dress) no que tange à caracterização de danos morais e patrimoniais.

1. Alegação de violação dos arts. 128, 460 e 535 do CPC⁄1973

No que se refere à alegada negativa de prestação jurisdicional adequada, assevera a recorrente que o Tribunal de origem teria deixado de enfrentar os seguintes pontos:

i) dies ad quem das astreintes, uma vez que no curso da demanda houve alteração da embalagem impugnada;

ii) a inexistência do registro do trade dress da embalagem de algodão, o que afastaria a tutela jurisdicional para sua proteção; e

iii) a impossibilidade de presunção de dano moral em razão da suposta violação a direito de marca.

Com efeito, verifica-se que todos as questões apontadas como omissas encontram-se imbricadas com o próprio mérito do presente recurso.

Isso porque, na hipótese dos autos, afigura-se imprescindível a definição jurídica do pressuposto do registro e da espécie de direito lesado, a fim de se aquilatar a real necessidade de devolução dos autos ao Tribunal de origem para adequação da tutela jurisdicional.

2. Proteção ao conjunto-imagem (trade dress)

O trade dress ou conjunto-imagem, apesar de não ser questão inédita nesta Corte Superior, é ainda um tema consideravelmente novo e que tem suscitado diversos questionamentos em sede jurisdicional e doutrinária. Isso porque, a despeito de seu reconhecimento pelos Tribunais brasileiros, não há na nossa legislação sua definição, tampouco a previsão dos requisitos necessários para sua proteção ou a previsão clara de sanção na hipótese de eventual lesão.

  • Com efeito, um rápido levantamento da jurisprudência do STJ acerca do tema demonstra que, na maioria dos casos, a caracterização de afronta ao conjunto-imagem tem sido decidida, caso a caso, pelos Tribunais locais. Por consequência, esta Corte Superior tem se restringido a manter as conclusões dos acórdãos diante da inevitável incidência do óbice do enunciado n. 7 da Súmula do STJ. Nesse sentido, cita-se os seguintes acórdãos: REsp n. 1.306.690⁄SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 23⁄4⁄2012; REsp n. 1.284.971⁄SP, Rel. Min. Massami Uyeda, Terceira Turma, DJe 4⁄2⁄2013; e AgRg no REsp n. 1.391.517⁄SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 2⁄3⁄2015; além de decisões monocráticas, entre as quais: AgRg no AREsp n. 523.706⁄SP, Rel. Min. Marco Buzzi, de 16⁄12⁄2016; AREsp n. 969.085⁄SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, de 20⁄9⁄2016; AREsp n. 515.146⁄SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, de 9⁄9⁄2016; AREsp n. 963.276⁄SP, Rel. Min. Raul Araújo, de 8⁄9⁄2016; Resp n. 1.354.609⁄SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, de 5⁄8⁄2016; AREsp n. 527.000⁄SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, de 1º⁄7⁄2016; AREsp n. 688.881⁄SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, de 11⁄5⁄2015.


Esses reiterados julgamentos deixam evidente, por um lado, o reconhecimento da proteção jurisdicional ao conjunto-imagem e, por outro, que a caracterização de sua violação deve se assentar sobre um conjunto fático-probatório que, a princípio, inviabilizaria o controle por esta Corte Superior. Contudo, verifica-se que, diante da lacuna regulatória, os fatos concretos levados em consideração pelas Cortes locais não guardam um padrão, de modo a impor atuação do STJ no sentido de  balizar e uniformizar a atuação jurisdicional.

É inegável a crescente importância da proteção aos elementos imateriais da empresa, entre os quais o nome empresarial, o nome de fantasia, a marca, a embalagem e o conjunto-imagem (trade dress) constituem importantes elementos de atração do consumidor e identificação dos produtos e seus fabricantes. Esse patrimônio imaterial, para além de contribuir na captação de clientes, afeta de forma direta o desenvolvimento e sucesso de diversos empreendimentos, modulando seu prestígio no mercado consumidor. Não é à toa que o constituinte previu de forma expressa a proteção desses direitos no art. 5º, XXIX, da Constituição Federal:

  • XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País;



Nesse cenário, deve-se frisar que o conjunto-imagem, objeto do presente recurso, distingue-se dos institutos denominados marca e desenho industrial, muito embora possa ser formado pela utilização conjunta de ambos, acrescidos, ou não, de outros elementos visuais. Essa distinção é imprescindível para se divisar o tratamento jurídico dispensado a cada caso e as consequências advindas de condutas anticompetitivas praticadas em desrespeito a marca, desenho industrial ou conjunto-imagem. Com efeito, tem-se percebido uma confusão nas cortes locais quanto à utilização desses conceitos, como denuncia recente artigo de José Carlos Tinoco Soares (O emprego inadequado do termo trade dress. in Revista da ABPI, n. 144, set⁄out 2016, p. 3-15).

De fato, os três institutos - marca, desenho industrial e conjunto-imagem - têm, em comum, a finalidade mediata de designar um produto, mercadoria ou serviço, diferenciando-o dos concorrentes. Apesar da finalidade assemelhada, trata-se de institutos independentes.

Enquanto a marca é um sinal que designa a origem do produto, mercadoria ou serviço, o desenho industrial "protege a configuração externa de um objeto tridimensional ou um padrão ornamental (bidimensional) que possa ser aplicado a uma superfície ou a um objeto", conforme esclarece o próprio INPI (http:⁄⁄www.inpi.gov.br⁄menu-servicos⁄desenho⁄desenho-industrial-mais-informacoes). Noutros termos, enquanto a marca cria um vínculo duradouro entre o bem e a pessoa que o colocou em circulação, o desenho industrial insere no mercado uma inovação estética em objeto comum ou facilmente reproduzível em escala industrial. Essa distinção, apesar de parecer sutil, resulta numa gritante diferença quanto à proteção e aos requisitos para sua tutela legal.

Assim, as marcas, para serem registradas, devem atender à distintividade ou novidade relativa, ou seja, dentro do mercado em que se insere o produto, o sinal visivelmente perceptível deve se distanciar do domínio comum, a fim de propiciar a utilização comercial exclusiva por seu titular. Esta fruição exclusiva, que será assegurada por meio do registro,  pode se estender indefinidamente no tempo, desde que promovidas as tempestivas prorrogações. Isso porque o direito de exclusividade da marca tem por escopo assegurar ao consumidor a correspondência entre o produto designado e a empresa que o colocou em circulação.

Já o desenho industrial, por se caracterizar em uma inovação estética facilmente reproduzível em escala industrial, a partir de sua publicidade, passa a integrar o estado da técnica. Nota-se, portanto, que o desenvolvimento de desenhos industriais movimenta-se, ao longo do tempo, numa crescente, podendo ser posteriormente incorporada pelos produtos de seus concorrentes de forma lícita e regular. Ao seu desenvolvedor (autor) é assegurado, mediante registro, o direito de exploração exclusiva, porém temporária (até, no máximo, 25 anos), nos termos do art. 108 da Lei n. 9.279⁄1996:
Art. 108. O registro vigorará pelo prazo de 10 (dez) anos contados da data do depósito, prorrogável por 3 (três) períodos sucessivos de 5 (cinco) anos cada.


Deve-se sublinhar que não são protegidos pelo registro de desenho industrial inovações que resultem em funcionalidades, vantagens práticas, materiais ou formas de fabricação - bens industriais protegidos por meio de patentes. Assim, o escopo imediato do instituto é a geração de incentivo à inovação estética, e a distintividade é dada em relação ao próprio bem, sem o estabelecimento de um vínculo com aquele que introduz essa inovação no mercado.

Em síntese, do ponto de vista do consumidor, a marca identifica o produtor⁄fornecedor, enquanto o desenho industrial identifica o próprio bem, que poderá vir a ser regularmente produzido por terceiros após o prazo de validade de seu registro.

Por sua vez, o denominado trade dress, não disciplinado na legislação nacional atual, tem por finalidade proteger o conjunto visual global de um produto ou a forma de prestação de um serviço. Materializa-se, portanto, pela associação de variados elementos que, conjugados, traduzem uma forma peculiar e suficientemente distintiva de inserção do bem no mercado consumidor, vinculando-se à identidade visual dos produtos ou serviços.

Sua proteção vem sendo assegurada com fundamento no dever geral de garantia de livre mercado, ou seja, no dever estatal de assegurar o funcionamento saudável do mercado, de forma a expurgar condutas desleais tendentes a criar distorções de concorrência. Nesse cenário, dispôs o legislador, no art. 209 da LPI, o direito do prejudicado pela prática de concorrência desleal ao ressarcimento dos prejuízos materiais decorrentes, bem como o respectivo poder-dever de determinar a sustação de eventual violação aos diretos de propriedade industrial atribuído ao Estado-juiz. In verbis:
Art. 209. Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os produtos e serviços postos no comércio.
§ 1º Poderá o juiz, nos autos da própria ação, para evitar dano irreparável ou de difícil reparação, determinar liminarmente a sustação da violação ou de ato que a enseje, antes da citação do réu, mediante, caso julgue necessário, caução em dinheiro ou garantia fidejussória.


Os limites concorrenciais, no quanto se entrelaçam ao direitos de propriedade industrial, introduzem conceitos e vetores imprescindíveis para a definição da amplitude da proteção da propriedade industrial. Não podem, porém, servir de discurso para chancelar o prolongamento temporal da proteção de inventos e desenhos industriais para além dos prazos estabelecidos em lei, tampouco dar proteção de maior envergadura que aquela legalmente estabelecida para bens equivalentes. Noutros termos, não se pode admitir que a pretexto de se proteger o conjunto-imagem de um produto, se assegure o uso exclusivo e indeterminado de uma determinada funcionalidade não registrada, por exemplo.

Assim, o diálogo entre concorrência e direitos exclusivos decorrentes de propriedades industriais é limitado e somente justificará a intervenção do Judiciário para afastar as condutas concorrenciais que desbordem a razoabilidade da disputa legítima, encontrando suas balizas ora na confusão do consumidor decorrente de imitação desleal, ora na usurpação de vantagem alheia decorrente da associação de seu produto ou serviço com a prestação de seu concorrente, situação em que é notório o intuito de "pegar carona" no sucesso obtido pelo investimento de outrem, e não para meramente assegurar um direito de exploração exclusiva a bem não registrado na forma legalmente exigida.

Tendo em vista que, na hipótese dos autos, a recorrida deixou evidente que sua causa de pedir se funda na confusão de seus consumidores (petição inicial à fl. 8, e-STJ) será esta a hipótese de concorrência desleal examinada no presente julgamento, ressalvando-se para outra oportunidade a perquirição necessária sobre os limites resultantes da utilização de associação desleal.

Ao se analisar a confusão entre marcas, Gama Cerqueira, na década de 1980, propunha a necessidade de se levar em conta, para além das semelhanças de apresentação do produto, o grau de atenção do consumidor comum, a natureza do produto e o meio em que seu consumo era habitual (Tratado de propriedade industrial, 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982, v. 2, p. 919), sustentando tratar-se sempre de matéria fática.

Com efeito, ao se enfocar a pretensão de registro de sinal como marca e a proteção exclusivamente marcária, a análise fica adstrita à demonstração de uma distintividade relativa, resultante do confronto com os demais signos registrados em determinada classe. Este exame é realizado em abstrato e levado a cabo pelo órgão técnico competente, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI. Isso porque o potencial de confusão entre marcas depositadas para registro, será analisado a priori e levará em consideração tão somente o signo cujo registro é pretendido e o confronto com os demais preexistentes no mesmo ramo mercadológico, o que se afasta da lição clássica de Gama Cerqueira. Nesse sentido, posicionava-se o saudoso prof. Denis Borges Barbosa (Proteção das marcas: uma perspectiva semiológica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 87-88).

É verdade também que, àquela época, ainda não se debatia a proteção ao trade-dress tampouco se distinguia este dos demais institutos da propriedade industrial. De fato, a proteção ao conjunto-imagem tem origem temporal recente, ganhando contornos jurídicos próprios a partir de decisão da Suprema Corte Norte-Americana de 1992, no caso Taco Cabana, Inc. vs. Two Pesos, Inc (SOARES, José Carlos Tinoco. O emprego inadequado do termo trade dress. in Revista da ABPI, n. 144, set⁄out 2016, p. 5).

Assim, os critérios propostos por Gama Cerqueira parecem insuficientes e superados para o tratamento de conflito de marcas, seja em virtude da sofisticação do mercado global, em especial, em razão da difusão de condutas parasitárias por associação, seja pela praxe desenvolvida a partir da adoção do sistema marcário atributivo. Contudo, deve-se reconhecer que se tratam de critérios relevantes, ainda hoje, para a avaliação da confusão concreta implantada no espírito dos consumidores, especialmente nos casos de confronto de conjunto-imagem. Nesses casos, a argumentação transborda o mero confronto de marcas para alcançar a impressão global experimentada pelos consumidores diante de determinados produtos, a fim de averiguar a possibilidade concreta de induzi-los em erro.

Com efeito, os parâmetros anunciados por Gama Cerqueira já introduziam a importância fundamental dos elementos laterais à marca para captura da atenção e do interesse do público-alvo no momento do posicionamento de produtos no mercado. Nesse contexto, deve-se transpor a fronteira da questão de direito marcário para se adentrar ao campo fático da concorrência desleal, uma vez que se contrapõem marcas dessemelhantes ostensivamente utilizadas, como no caso dos autos, porém se alega que a imagem global do produto é capaz de implantar no imaginário do consumidor a confusão entre os produtos concorrentes.

Daí se extrai o destaque dado ao grau de atenção do consumidor-médio de um produto específico no momento em que é chamado a tomar a decisão de consumir.

Aqui parece ser relevante se reconhecer que, em alguns nichos mercadológicos, os produtos ou serviços são apresentados ao consumidor por meio de elementos comuns e bastante difundidos no mercado. Essa similaridade dispersa, ao contrário de configurar uma conduta anticompetitiva, resulta num benéfico acirramento da competição na medida em que facilita ao consumidor identificar as opções de produtos semelhantes existentes no mercado, para então concluir sua decisão em favor da marca que melhor lhe aprouver, seja pelo critério de preço, seja pelo critério de qualidade, seja por qualquer outro critério que eleja voluntariamente.

Aliás, a exigência do grau de distintividade parece ser uma constante na proteção de símbolos relacionados à exploração de bens de consumo de massa, conforme formulada pela Teoria da Distância alemã, de ampla aceitação na União Europeia, ou nas regras do direito norte-americano, onde também é exigida a distintividade. Nesse sentido, Geert W. Seelig afirma que as marcas muitas vezes idênticas ou semelhantes são usadas em áreas de atividade afim. Em geral, nesses casos, o público usuário está habituado à coexistência das marcas e presta mais atenção às diferenças entre elas. Se, posteriormente, são adicionadas novas marcas ainda semelhantes, não há confusão com as existentes, porque o consumidor já tem o hábito de prestar atenção às diferenças, ainda que pequenas, e, portanto, sabe distingui-las. A consequência deste processo é que o risco de confusão entre as marcas diminui." (apud BARBOSA, Dênis Borges. Da confusão e da associação em matéria de marcas. Disponível em  <http:⁄⁄www.denisbarbosa.addr.com⁄ arquivos⁄novidades⁄marca_de_industria.pdf>, acessado em 7⁄8⁄2017).

Com efeito, por incrementar a competição, a entrada de conjunto-imagem semelhante em mercado já assemelhado não deve ser obstada por meio de intervenção judicial. Esta deverá ser excepcional e sempre pautada pela verificação concreta de que se está diante de algo novo e peculiar a ponto de despertar o Estado de sua inércia, consequência da livre concorrência e da liberdade de iniciativa adotadas no Brasil.

Desse modo, para se caracterizar uma atitude anticompetitiva e desleal é imprescindível que a situação concreta demonstre um comportamento imprevisível aos olhos do mercado, o que não se pode reconhecer quando se utiliza elementos comuns, partilhados por uma multiplicidade de concorrentes no mesmo nicho do mercado. Nesses casos, ao contrário, a busca de proteção contra um novo competidor é que caracterizará um comportamento imprevisível a denunciar uma conduta anticompetitiva que pretende tão somente dificultar o incremento da competição. Afinal, por que se indignar com um competidor quando tantos outros se utilizam dos mesmos elementos e de trade dress similar?

Em razão dessas nuances trazidas, diferentemente das questões de confrontação de marca, em que, de regra, basta o cotejo de marca a marca, no caso de tutela da concorrência, o exame técnico é recomendável.

Enfatiza-se que no confronto de marca há um registro formal com data específica, que marca o início da proteção e da utilização exclusiva, de modo que em regra é suficiente o confronto entre ambas a fim de verificar a existência de cópia ou similitude. Por sua vez, no caso de tutela da concorrência, o exame acaba sendo mais amplo, devendo se adentrar à situação fática do mercado e à possibilidade real de confusão, e não mais se fazendo suficiente o mero potencial de confusão em razão da semelhança que é atraído pela presunção iuris tantum decorrente do registro perante o INPI e do sistema atributivo adotado pela Lei n. 9.279⁄1996. Daí a necessidade de conhecimento técnico para se avaliar o efeito real da entrada no mercado de produto ou serviço visualmente assemelhado, o que configura o ato de concorrência desleal que dá causa às pretensões de proteção do trade dress.

3. Alegação de violação dos arts. 333 e 420 do CPC⁄1973

No que tange à necessidade de produção de prova pericial, nota-se que o acórdão recorrido enfrentou o tema de forma direta, concluindo pela manutenção do indeferimento da perícia técnica ao fundamento unânime de sua desnecessidade para demonstrar a notória semelhança visual entre as embalagens dos produtos de ambas as litigantes. Acrescentou-se, ainda, que a dispersão de embalagens semelhantes seria juridicamente irrelevante. O voto condutor assim fundamentou (e-STJ, fl. 569):
Demais disso, não se pode antever aceitável a embalagem da ré porque haveria outras embalagens semelhantes àquela no mercado. Ora, embora as embalagens das outras concorrentes possuam características que as diferenciam daquela da demandada e da autora, não se poderia aceitar o argumento de que, havendo certa semelhança entre todas, inexistiria, por si só, concorrência desleal, ou melhor, pelo fato de outras empresas, em tese, exercerem concorrência desleal, a ré estaria eximida de qualquer responsabilidade nesse âmbito.
De outra banda, ainda que conste do Parecer Técnico da ABTG (Associação Brasileira de Tecnologia Gráfica), que as cores e os demais elementos das embalagens são diferentes, é importante registrar que tal análise foi feita de forma técnica, o que nenhum consumidor faz ao adquirir o produto.


Contudo, ao contrário do fundamentado no acórdão recorrido e na linha das considerações acima, inexistindo registro da embalagem em favor de algum dos litigantes, não se cogita da existência de um direito de exploração exclusiva, de modo que a vedação à utilização por alguma das partes depende mesmo da caracterização efetiva de ato de concorrência desleal. Nesses casos, em que a causa de pedir é exatamente prática de atos anticoncorrenciais por meio da utilização de conjunto-imagem assemelhado e apto a causar confusão no mercado consumidor, deve-se reconhecer que o cerne do processo repousa em fato cuja caracterização depende, a priori, de conhecimento técnico especial não exigível de um juiz de direito, devendo, por isso, o juiz se servir do auxílio técnico de expert.

Deve-se enfatizar que a necessidade de prova técnica, ainda que passível de dispensa pelo juiz da causa e pelos graus ordinários de jurisdição, conforme reiterada jurisprudência desta Corte Superior, não pode ser afastada ao livre-alvedrio do Julgador, mas em situações justificadas e respaldadas em alguma das hipóteses taxativamente previstas no parágrafo único do art. 420 do CPC⁄1973, vigente à época, e repetidas no atual art. 464, § 1º, do CPC⁄2015. E, uma vez verificado que a justificativa apontada para seu afastamento não corresponde àquelas hipóteses, estar-se-á diante de uma violação legal sujeita ao controle desta Corte Superior.

Esse é o caso dos autos. Ainda que se esteja diante de uma notória semelhança entre os dois produtos – o que foi reconhecido pelo TJ⁄MG – a questão posta nos autos vai além, sendo imperioso determinar se esta similitude é aceitável do ponto de vista legal, como consectário de técnicas mercadológicas tendentes ao posicionamento de um determinado produto no mercado, ou se na realidade estamos diante de um ato abusivo, usurpador de conjunto-imagem alheio e passível de confundir o consumidor. E a dificuldade que daí emerge reside no fato de que muitas das características que assemelham os produtos se situam numa zona limítrofe entre o que se admite como concorrência saudável – e até desejável – e o que se reputa concorrência desleal e parasitária.

Nesses casos, todavia, não é possível ao julgador consultar única e exclusivamente o seu íntimo para concluir pela existência de confusão de forma ampla e genérica, quando não há sequer o registro de embalagem em favor de alguma das partes. Em síntese, a exclusiva violação da concorrência não é fato dado a presunções atécnicas, mesmo porque sua tipificação legal não é objetiva e taxativa, dependendo do resultado concreto dessas ações, o qual depende, antes de mais nada, de uma análise técnica de propaganda e marketing.

Nota-se que, em situações como a dos autos, quando inexiste perícia técnica, as conclusões alcançadas são comumente extraídas de máximas da experiência – ou quiçá da inexperiência. Embora disciplinadas as presunções judiciais, entre as quais se disciplinou expressamente a utilização das regras de experiência comum ou técnicas, nos termos do art. 335 do CPC⁄1973, não se pode olvidar que essas regras não são meios de prova nem se realizam mediante a participação dos litigantes em contraditório. Nesse sentido, vale ainda o alerta de que "o fato que requer conhecimento técnico não interessa apenas ao juiz, mas fundamentalmente às partes, que têm o direito de discuti-lo de forma adequada, mediante, se for o caso, a indicação de assistentes técnicos" (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Prova e convicção: de acordo com o CPC de 2015. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 850).

Portanto, uma vez que os fatos postos nesses autos na condição de causa de pedir são essenciais ao deslinde da controvérsia e demandam de conhecimento técnico para sua caracterização e que houve oportuno requerimento para a produção de prova pericial pela parte sucumbente, reconheço a existência de violação do art. 420 do CPC⁄1973, que resultou no cerceamento de defesa da recorrente.

Com esses fundamentos, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para cassar a sentença proferida, determinando-se o retorno dos autos à origem para a realização da prova pericial requerida.

É como voto.



Documento: 69332209  RELATÓRIO E VOTO