"Nesse contexto, não há sequer espaço para eventual alegação da parte autora de desconhecimento da localização atualizada da ré, visto que poderia ser facilmente obtida mediante consulta às alterações contratuais registradas na Junta Comercial, que confere a tais atos a ampla publicidade que lhe é inerente, bem como aos dados constantes no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica da Receita Federal, antes mesmo do ajuizamento da demanda, proposta em 14/5/2010".
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domingo, 28 de abril de 2024
sexta-feira, 3 de junho de 2016
Parte 2 - Indicação para leitura complementar: As teorias ajudam a interpretar as leis sobre pessoas jurídicas
Por João Grandino Rodas
João Grandino Rodas [Spacca]Uma vez surgida a personalidade jurídica da sociedade, a partir do século XVIII, a doutrina passou a tecer teorias a respeito. Tais teorizações, longe de serem elucubrações vazias, servem como fundamento para as elaborações das leis sobre sociedades, bem como fornecem subsídios para interpretação da legislação societária existente.
A mais antiga teoria baseava-se na ficção, data do século XIII e tinha suas raízes no direito canônico. Desenvolvida mormente na Alemanha no século XIX teve largo curso, principalmente na própria Alemanha, na França, na Bélgica, na Itália e no Reino Unido[1].
Embora tenha tido outros arautos, tem-se como assente que sua formulação clássica coube a Savigny, que a delineou, como segue. Somente o ser humano é sujeito de direito, devendo o conceito de pessoa coincidir com o de ser humano. Cabe contudo ao direito positivo influir sobre tal princípio, quer negando capacidade a certos seres humanos, quer estendendo-a a entes que não o são. Nesse caso, seres artificiais criados pela mera ficção — fictio juris — terão capacidade jurídica. É o caso da pessoa jurídica. Como a capacidade artificial das pessoas jurídicas só se pode referir a relações de direito privado, pode-se definir pessoa jurídica como sendo um sujeito criado artificialmente, capaz de possuir patrimônio. Dentre as pessoas jurídicas, algumas têm existência natural ou necessária — o Estado —, enquanto outras são artificiais e arbitrárias — caso das corporações e fundações.
A pessoa jurídica, pelo fato de ser simples ficção, de um lado, não é capaz de querer e de agir; de outro, é inimputável. Sua vontade, assim como a dos loucos e impúberes, manifesta-se por meio da representação. Atos ilícitos somente podem ser cometidos por indivíduos que delas participam. Sublinhe-se, ademais, três pontos. Primeiramente, a personalidade jurídica é um atributo concedido pela lei a certo grupo, não sendo decorrência necessária do direito de associação. Em segundo lugar, que uma pessoa jurídica é distinta das de seus membros componentes, podendo teoricamente sobreviver ao desaparecimento do grupo que a tenha constituído. E, finalmente, que a sua supressão como pessoa jurídica não está na alçada da vontade de seus membros.
Dentre as objeções levantadas contra a teoria da ficção, estão as seguintes.
Não é factível ao Legislativo criar fictamente uma pessoa, quando os requisitos básicos estão ausentes. Um relacionamento social tem existência de per si, embora seja possível a esse Poder estabelecer proibições, quando considerar algo ilícito.
A teoria não traz realmente uma solução, pois uma pessoa ficta, por não possuir vontade própria, é uma não-pessoa. Atribuir a uma pessoa jurídica bens não pertencentes a indivíduos é um eufemismo, para dizer que não pertencem a ninguém. Por não terem um titular, em última análise, poderá o Estado facilmente se manumitir em tais bens.
Não se compreende como é possível ao ente coletivo ficto ser independente e ao mesmo tempo estranho às pessoas físicas que o compõe, chegando ao ponto de a existência ideal poder sobreviver a todos os seus membros. O normal seria o reconhecimento de mútua interdependência.
A teoria da ficção preocupou-se com a noção de personalidade moral no direito privado, pois, no âmbito do direito público, considerava aceitável a atribuição da soberania à pessoa física do soberano e não ao Estado. Peça lógica, entretanto, a noção de personalidade jurídica deve ser comum tanto ao direito privado como ao público. O próprio fato de ter a teoria em questão afirmado ser o Estado uma pessoa jurídica necessária, coloca em xeque a própria teoria, ao admitir a possibilidade do sacimento de uma pessoa jurídica, por outro modo que não pela vontade da lei.
Inobstante ter sido muito criticada, é inegável a notável disseminação e a força da teoria em tela até inícios do século XX. Seus próprios detratores a reconhecem, chegando até mesmo a apontar como razões para tanto, além de estar imbricada na tradição, a sua ínsita simplicidade e seu rigor lógico. Na verdade, toda a teoria é deduzida de uma premissa — só o homem é sujeito de direito — de que deriva o corolário, a pessoa jurídica é um entre fictício.
Acreditar no axioma de que unicamente o homem é sujeito de direitos, mas não aceitar a ficção de personalidade, leva à completa desnecessidade da existência de personalidade jurídica e subsequentemente à sua negação. As teorias que surgiram nessa linha e que procuraram uma resposta para a situação do patrimônio da pessoa jurídica, bem como aos direitos por ela exercidos, podem ser didaticamente agrupadas em duas: teoria dos direitos sem sujeito ou teoria do patrimônio de afetação; e teoria individualista.
Desenvolvendo a possibilidade da existência de direitos sem sujeito, afirmada por Windscheid em 1853, e utilizando também formulações do direito romano, Brinz acabou por deduzir a teoria do patrimônio-fim (Zweckvermögen).
Entre os romanos só havia uma espécie de pessoa, a humana. A criação, modernamente, de uma segunda categoria de personalidade - a jurídica – representa um regresso fantasioso, além de desnecessário. Isso porque os bens podem pertencer ad aliquem - a alguém -, mas também ad aliquid - a uma finalidade – a qual não necessita ser personificada para merecer proteção jurídica. Dessa maneira, os bens da pessoa jurídica seriam patrimônio sem fim. Titular dos direitos e deveres seria o patrimônio, e seus representantes agiriam no intuito da finalidade, e não per se.
Bekker trouxe à teoria em tela novos desenvolvimentos. Face ao direito duas são as situações possíveis: o gozo (genus) e a disposição (verfügung). Nem sempre o gozo – potencialidade de usufruir suas vantagens materiais – vem junto com a disposição – direito de agir como proprietário, administrando-os etc. Enquanto o gozo pode também caber a um incapaz, animal ou coisa inanimada, a disposição é privativa de alguém capaz de volição. Além disso, ele bipartiu os patrimônios-fim em independentes e dependentes. Os primeiros repetem a conceituação de Brinz, conjunto de bens afetados a uma finalidade e sem sujeito. Os últimos são bens, embora compondo um patrimônio maior de uma pessoa, servem como autonomia a um objetivo especial.
Centrada na pessoa dos associados e com raízes na doutrina do direito subjetivo de Ihering, Van der Heuvel propôs uma teoria que foi posteriormente desenvolvida por Vareilles-Sommières.
Para Van der Heuvel não é necessário apelar-se para a ficção, de vez que as regras de associação podem ser explicadas por meio dos princípios gerais. Três seriam as diferenças entre sociedades com personalidade e as dela destituídas: (i) mesmo possuindo a sociedade bens imóveis, sempre se considera mobiliário o direito dos sócios; (ii) o ativo social, patrimônio da sociedade, garante apenas os credores da sociedade, não os credores pessoais dos sócios; e (iii) o gerente representa a sociedade em juízo.
A praticidade está na origem da primeira diferença: simplificação do procedimento de transmissão de ações ou partes da sociedade. A segunda encontra sua explicação na separação de patrimônio e na liberdade contratual. Os sócios, ao formarem a sociedade, afetam certos bens à finalidade social e somente esses bens responderão pelas dívidas dessa sociedade. Isso é factível, desde que se acautelem terceiros. A última se dá, pois o gerente representa todos os sócios.
Em conclusão, as pessoas jurídicas seriam associações às quais a lei concedeu alguns privilégios, além de certas derrogações dos princípios comuns, em suma, um conjunto de privilégios.
Vareilles-Sommières parte do pressuposto de que todas as pessoas jurídicas são associações e considera como sendo, na verdade, dos associados os direitos tidos pela doutrina como pertencentes à pessoa jurídica. Os associados, coproprietários do patrimônio social, no exercício de seus direitos, acham-se sob a égide de um regime personificante — régime personnifiant — cujas feições são : a) um associado, somente com o consentimento de todos, poderá alienar a sua parte da massa comum; b) não pode um associado receber separadamente o seu quinhão de crédito social; c) não se pode exigir isoladamente de um sócio a sua parte da dívida social.
Embora se possa depreender dessa trilogia que exista uma pessoa, pelo fato de os associados possuírem conjuntamente o patrimônio social, na realidade inexiste outra pessoa a não ser a dos indivíduos associados. Assim, a gênese da pessoa jurídica não se deve ao legislador, mas sim ao regime a que se submeteram os associados.
As características do regime personificante, por seu turno, estão em consonância com os princípios gerais de direito obrigacional. Nessa linha, a pessoa jurídica seria um conjunto de cláusulas, devidamente aceitas pelos associados.
Embora creditando à teoria dos direitos sem sujeito, o fato de ter realçado o elemento teleológico no conceito de personalidade jurídica, são as seguintes as objeções mais frequentes contra tal teoria.
A possibilidade da existência da pessoa jurídica destituída de patrimônio comprova que os conceitos de patrimônio-fim e de pessoa jurídica não se superpõem. Qualquer patrimônio, inclusive o pertencente a um indivíduo, serve a uma finalidade. A pessoa jurídica é muito mais que uma simples coleção de bens. A existência de sujeito é imprescindível para que haja direito. Embora se possa imaginar a junção dos direitos patrimoniais em um todo, foge à compreensão como no patrimônio possam residir direitos de outras naturezas, como, exemplificativamente, os corporativos.
Já a teoria individualista ocasionou, mormente, as críticas a seguir:
Não aquilatou a importância do reconhecimento legal no surgimento da associação, acabando por, inter alia, deixar de reconhecer as diferenças entre associações não reconhecidas e pessoas jurídicas, na verdade existentes. Não é possível que a personalidade jurídica se cinja à exterioridade da associação, pois os próprios associados encontram-se perante um ente, o qual inclusive pode pelos mesmos ser acionado.
Ambas as teorias patrimonialistas foram acoimadas de serem apropriadas apenas ao direito privado, não tendo dado explicações à existência das pessoas jurídicas de direito público[2].
Ainda há uma terceira vertente teórica sobre as pessoas jurídicas, a que afirma sua personalidade real. Esta merece ser tratada, em outro momento, especificamente. Do exame das três visões teóricas sobre pessoas jurídicas e da meditação à respeito, exsurge compreensão holística da natureza jurídica dessas pessoas, fundamentais no mundo contemporâneo.
1 Rodas, João Grandino, A evolução que criou a pessoa jurídica merece ser conhecida, Revista eletrônica ConJur, 21 de abril de 2016.
2 Rodas, João Grandino, Sociedade Comercial e Estado, São Paulo, Editora Saraiva, 1995, p. 18/23
João Grandino Rodas [Spacca]Uma vez surgida a personalidade jurídica da sociedade, a partir do século XVIII, a doutrina passou a tecer teorias a respeito. Tais teorizações, longe de serem elucubrações vazias, servem como fundamento para as elaborações das leis sobre sociedades, bem como fornecem subsídios para interpretação da legislação societária existente.
A mais antiga teoria baseava-se na ficção, data do século XIII e tinha suas raízes no direito canônico. Desenvolvida mormente na Alemanha no século XIX teve largo curso, principalmente na própria Alemanha, na França, na Bélgica, na Itália e no Reino Unido[1].
Embora tenha tido outros arautos, tem-se como assente que sua formulação clássica coube a Savigny, que a delineou, como segue. Somente o ser humano é sujeito de direito, devendo o conceito de pessoa coincidir com o de ser humano. Cabe contudo ao direito positivo influir sobre tal princípio, quer negando capacidade a certos seres humanos, quer estendendo-a a entes que não o são. Nesse caso, seres artificiais criados pela mera ficção — fictio juris — terão capacidade jurídica. É o caso da pessoa jurídica. Como a capacidade artificial das pessoas jurídicas só se pode referir a relações de direito privado, pode-se definir pessoa jurídica como sendo um sujeito criado artificialmente, capaz de possuir patrimônio. Dentre as pessoas jurídicas, algumas têm existência natural ou necessária — o Estado —, enquanto outras são artificiais e arbitrárias — caso das corporações e fundações.
A pessoa jurídica, pelo fato de ser simples ficção, de um lado, não é capaz de querer e de agir; de outro, é inimputável. Sua vontade, assim como a dos loucos e impúberes, manifesta-se por meio da representação. Atos ilícitos somente podem ser cometidos por indivíduos que delas participam. Sublinhe-se, ademais, três pontos. Primeiramente, a personalidade jurídica é um atributo concedido pela lei a certo grupo, não sendo decorrência necessária do direito de associação. Em segundo lugar, que uma pessoa jurídica é distinta das de seus membros componentes, podendo teoricamente sobreviver ao desaparecimento do grupo que a tenha constituído. E, finalmente, que a sua supressão como pessoa jurídica não está na alçada da vontade de seus membros.
Dentre as objeções levantadas contra a teoria da ficção, estão as seguintes.
Não é factível ao Legislativo criar fictamente uma pessoa, quando os requisitos básicos estão ausentes. Um relacionamento social tem existência de per si, embora seja possível a esse Poder estabelecer proibições, quando considerar algo ilícito.
A teoria não traz realmente uma solução, pois uma pessoa ficta, por não possuir vontade própria, é uma não-pessoa. Atribuir a uma pessoa jurídica bens não pertencentes a indivíduos é um eufemismo, para dizer que não pertencem a ninguém. Por não terem um titular, em última análise, poderá o Estado facilmente se manumitir em tais bens.
Não se compreende como é possível ao ente coletivo ficto ser independente e ao mesmo tempo estranho às pessoas físicas que o compõe, chegando ao ponto de a existência ideal poder sobreviver a todos os seus membros. O normal seria o reconhecimento de mútua interdependência.
A teoria da ficção preocupou-se com a noção de personalidade moral no direito privado, pois, no âmbito do direito público, considerava aceitável a atribuição da soberania à pessoa física do soberano e não ao Estado. Peça lógica, entretanto, a noção de personalidade jurídica deve ser comum tanto ao direito privado como ao público. O próprio fato de ter a teoria em questão afirmado ser o Estado uma pessoa jurídica necessária, coloca em xeque a própria teoria, ao admitir a possibilidade do sacimento de uma pessoa jurídica, por outro modo que não pela vontade da lei.
Inobstante ter sido muito criticada, é inegável a notável disseminação e a força da teoria em tela até inícios do século XX. Seus próprios detratores a reconhecem, chegando até mesmo a apontar como razões para tanto, além de estar imbricada na tradição, a sua ínsita simplicidade e seu rigor lógico. Na verdade, toda a teoria é deduzida de uma premissa — só o homem é sujeito de direito — de que deriva o corolário, a pessoa jurídica é um entre fictício.
Acreditar no axioma de que unicamente o homem é sujeito de direitos, mas não aceitar a ficção de personalidade, leva à completa desnecessidade da existência de personalidade jurídica e subsequentemente à sua negação. As teorias que surgiram nessa linha e que procuraram uma resposta para a situação do patrimônio da pessoa jurídica, bem como aos direitos por ela exercidos, podem ser didaticamente agrupadas em duas: teoria dos direitos sem sujeito ou teoria do patrimônio de afetação; e teoria individualista.
Desenvolvendo a possibilidade da existência de direitos sem sujeito, afirmada por Windscheid em 1853, e utilizando também formulações do direito romano, Brinz acabou por deduzir a teoria do patrimônio-fim (Zweckvermögen).
Entre os romanos só havia uma espécie de pessoa, a humana. A criação, modernamente, de uma segunda categoria de personalidade - a jurídica – representa um regresso fantasioso, além de desnecessário. Isso porque os bens podem pertencer ad aliquem - a alguém -, mas também ad aliquid - a uma finalidade – a qual não necessita ser personificada para merecer proteção jurídica. Dessa maneira, os bens da pessoa jurídica seriam patrimônio sem fim. Titular dos direitos e deveres seria o patrimônio, e seus representantes agiriam no intuito da finalidade, e não per se.
Bekker trouxe à teoria em tela novos desenvolvimentos. Face ao direito duas são as situações possíveis: o gozo (genus) e a disposição (verfügung). Nem sempre o gozo – potencialidade de usufruir suas vantagens materiais – vem junto com a disposição – direito de agir como proprietário, administrando-os etc. Enquanto o gozo pode também caber a um incapaz, animal ou coisa inanimada, a disposição é privativa de alguém capaz de volição. Além disso, ele bipartiu os patrimônios-fim em independentes e dependentes. Os primeiros repetem a conceituação de Brinz, conjunto de bens afetados a uma finalidade e sem sujeito. Os últimos são bens, embora compondo um patrimônio maior de uma pessoa, servem como autonomia a um objetivo especial.
Centrada na pessoa dos associados e com raízes na doutrina do direito subjetivo de Ihering, Van der Heuvel propôs uma teoria que foi posteriormente desenvolvida por Vareilles-Sommières.
Para Van der Heuvel não é necessário apelar-se para a ficção, de vez que as regras de associação podem ser explicadas por meio dos princípios gerais. Três seriam as diferenças entre sociedades com personalidade e as dela destituídas: (i) mesmo possuindo a sociedade bens imóveis, sempre se considera mobiliário o direito dos sócios; (ii) o ativo social, patrimônio da sociedade, garante apenas os credores da sociedade, não os credores pessoais dos sócios; e (iii) o gerente representa a sociedade em juízo.
A praticidade está na origem da primeira diferença: simplificação do procedimento de transmissão de ações ou partes da sociedade. A segunda encontra sua explicação na separação de patrimônio e na liberdade contratual. Os sócios, ao formarem a sociedade, afetam certos bens à finalidade social e somente esses bens responderão pelas dívidas dessa sociedade. Isso é factível, desde que se acautelem terceiros. A última se dá, pois o gerente representa todos os sócios.
Em conclusão, as pessoas jurídicas seriam associações às quais a lei concedeu alguns privilégios, além de certas derrogações dos princípios comuns, em suma, um conjunto de privilégios.
Vareilles-Sommières parte do pressuposto de que todas as pessoas jurídicas são associações e considera como sendo, na verdade, dos associados os direitos tidos pela doutrina como pertencentes à pessoa jurídica. Os associados, coproprietários do patrimônio social, no exercício de seus direitos, acham-se sob a égide de um regime personificante — régime personnifiant — cujas feições são : a) um associado, somente com o consentimento de todos, poderá alienar a sua parte da massa comum; b) não pode um associado receber separadamente o seu quinhão de crédito social; c) não se pode exigir isoladamente de um sócio a sua parte da dívida social.
Embora se possa depreender dessa trilogia que exista uma pessoa, pelo fato de os associados possuírem conjuntamente o patrimônio social, na realidade inexiste outra pessoa a não ser a dos indivíduos associados. Assim, a gênese da pessoa jurídica não se deve ao legislador, mas sim ao regime a que se submeteram os associados.
As características do regime personificante, por seu turno, estão em consonância com os princípios gerais de direito obrigacional. Nessa linha, a pessoa jurídica seria um conjunto de cláusulas, devidamente aceitas pelos associados.
Embora creditando à teoria dos direitos sem sujeito, o fato de ter realçado o elemento teleológico no conceito de personalidade jurídica, são as seguintes as objeções mais frequentes contra tal teoria.
A possibilidade da existência da pessoa jurídica destituída de patrimônio comprova que os conceitos de patrimônio-fim e de pessoa jurídica não se superpõem. Qualquer patrimônio, inclusive o pertencente a um indivíduo, serve a uma finalidade. A pessoa jurídica é muito mais que uma simples coleção de bens. A existência de sujeito é imprescindível para que haja direito. Embora se possa imaginar a junção dos direitos patrimoniais em um todo, foge à compreensão como no patrimônio possam residir direitos de outras naturezas, como, exemplificativamente, os corporativos.
Já a teoria individualista ocasionou, mormente, as críticas a seguir:
Não aquilatou a importância do reconhecimento legal no surgimento da associação, acabando por, inter alia, deixar de reconhecer as diferenças entre associações não reconhecidas e pessoas jurídicas, na verdade existentes. Não é possível que a personalidade jurídica se cinja à exterioridade da associação, pois os próprios associados encontram-se perante um ente, o qual inclusive pode pelos mesmos ser acionado.
Ambas as teorias patrimonialistas foram acoimadas de serem apropriadas apenas ao direito privado, não tendo dado explicações à existência das pessoas jurídicas de direito público[2].
Ainda há uma terceira vertente teórica sobre as pessoas jurídicas, a que afirma sua personalidade real. Esta merece ser tratada, em outro momento, especificamente. Do exame das três visões teóricas sobre pessoas jurídicas e da meditação à respeito, exsurge compreensão holística da natureza jurídica dessas pessoas, fundamentais no mundo contemporâneo.
1 Rodas, João Grandino, A evolução que criou a pessoa jurídica merece ser conhecida, Revista eletrônica ConJur, 21 de abril de 2016.
2 Rodas, João Grandino, Sociedade Comercial e Estado, São Paulo, Editora Saraiva, 1995, p. 18/23
quarta-feira, 22 de outubro de 2014
Arbitragem (Leitura complementar)
LEI Nº 9.307, DE 23 DE SETEMBRO DE 1996.
Dispõe sobre a arbitragem.
Capítulo I
Disposições Gerais
Art. 1º As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.
Art. 2º A arbitragem poderá ser de direito ou de eqüidade, a critério das partes.
§ 1º Poderão as partes escolher, livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem pública.
§ 2º Poderão, também, as partes convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio.
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