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sexta-feira, 24 de julho de 2015

Apesar de legislação controversa, atuação do Bacen e do Cade se complementam

João Grandino Rodas

A experiência nacional no tocante à aplicação de diferentes marcos regulatórios para diversos setores da economia, por meio de agências reguladoras especializadas, se por um lado deixou clara a importância de preservação de sua autonomia e capacitação técnica, por outro apontou para a necessidade de consolidação, uniformização e harmonização institucional dessa importante função estatal. Em especial, no referente à divisão de tarefas na regulação de determinado mercado e de monitorar a concorrência.

Via de regra, agências reguladoras e Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) desempenham suas competências com parcimônia e de forma complementar. Este previne infrações à ordem econômica, por meio do controle prévio de estruturas e repressão de condutas anticompetitivas, em consonância com a lei concorrencial. Enquanto aquelas focam-se na  mitigação  ou eliminação das falhas de mercado na prestação de serviços públicos, buscando mimetizar condições propícias de concorrência; bem como na elaboração de  regulamentos pró-competitivos. Agências não julgam atos de concentração, nem processos de formação de cartel, por exemplo; e o Cade não interfere em questões regulatórias. Tem funcionado assim para os setores de transportes, telefonia, energia elétrica, e vários outros, mas não para o setor bancário.

Nos últimos anos, Banco Central e Cade vêm disputando a competência para julgar fusões bancárias. Por conta de uma legislação controversa, o Bacen se acha no direito de aprovar atos de concentração e coibir práticas anticoncorrenciais. Assim, diferentemente do que ocorre nas demais áreas da economia, os bancos no Brasil estariam livres da investigação tradicional dos órgãos do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência. Os defensores dessa corrente alegam que somente o Bacen deteria o conhecimento técnico e a agilidade necessária para julgar um processo envolvendo instituição financeira, com o intuito de assegurar a higidez e segurança necessárias para a instituição e seus acionistas, bem como para os poupadores e a economia como um todo. Opositores dessa visão argumentam que a lei do Cade não excepcionou a competência do órgão para analisar quaisquer questões concorrenciais; devendo os bancos, portanto, se submeterem a tal regra. Rebatem que a Lei 4.595/64 dispõe que o Bacen, em seu exercício fiscalizador, regulará a concorrência entre instituições financeiras, coibindo-lhes os abusos. Seria, ademais, competência privativa do Bacen conceder autorização às instituições financeiras, para que possam ser transformadas, fundidas, incorporadas ou encampadas. Advogam que tal lei seria hierarquicamente superior, por regulamentar o artigo 192 da Constituição Federal; enquanto a do Cade seria lex generalis.

O histórico de atuação regulatória do Bacen revela fazer ele uso, máxime, de dois instrumentos básicos: a regulação prudencial, de caráter mais técnico; e a regulação sistêmica, de caráter predominantemente político. A prudencial protege o depositante e preserva a solvência, a higidez e a qualidade dos serviços de cada instituição isoladamente considerada. Já a sistêmica vela pelo sistema bancário como um todo e, indiretamente, pelo depositante.

Contudo, por mais que o Bacen utilize esses instrumentos para promover um ambiente regulado estável, há críticas de que não estaria implementando política de concorrência para o setor. Estaria ele focando excessivamente na prevenção do risco sistêmico, e, ao não atuar suficientemente para garantir a concorrência no setor bancário, propiciaria condições para que os agentes desse mercado exercessem seu poder econômico com maior liberdade, além de aumentar o risco moral (moral hazard) e os riscos de captura pelos entes regulados.

O Superior Tribunal de Justiça, em 2010, decidiu que as fusões bancárias caberiam unicamente ao Bacen. Em Recurso Extraordinário, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, negou seguimento à matéria, em 2014, ratificando a competência exclusiva da autoridade reguladora, Bacen, para julgar fusões e aquisições de instituições financeiras. Em desfavor desta decisão, o Cade apresentou agravo, que ainda deverá ser analisado pela 2ª Turma do Supremo.

Importante ressaltar que, quanto à ocorrência de práticas anticompetitivas no setor bancário, o Cade continuaria exercendo seu protagonismo em investigar, e eventualmente punir acordos e condutas antitruste dos bancos. Nesse sentido, no dia 2 deste mês, instaurou processo administrativo para apurar suposto cartel na manipulação de taxas de câmbio envolvendo o real e moedas estrangeiras. Segundo a assessoria de imprensa do órgão antitruste, “existem fortes indícios de práticas anticompetitivas de fixação de preços e condições comerciais entre as instituições financeiras concorrentes”. Ademais, projeto de lei apresentado pelo senador Antônio Anastasia, do PSDB de Minas Gerais, no mês passado, reforça essa competência de analisar suspeitas de condutas dos bancos ao órgão antitruste; ao mesmo tempo em que propõe que as fusões do setor devam ser subsumidas a ambos os órgãos.

Ressalte-se que o Plenário do STF já entendeu não haver conflito entre o regramento do sistema financeiro e a disciplina da defesa do consumidor, na Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.591/DF interposta pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro, em 2006, aduzindo que a exigência de lei complementar de que trata o artigo 192 da Constituição Federal refere-se apenas à regulamentação da estrutura do sistema financeiro, não abrangendo os encargos e obrigações impostos pelo Código de Defesa da Consumidor (Lei 8.078/1990) às instituições financeiras. Seguindo o mesmo raciocínio, não haveria conflito positivo entre as atividades do Bacen e Cade, mas sim relação de complementaridade.

Apesar de regulação sistêmica e defesa da concorrência no setor bancário poderem representar, aparentemente, valores distintos e irreconciliáveis, não se pode olvidar dos propósitos e da linha tênue que separa a regulação e antitruste para tal área específica, motivada por fatores como a busca de economia de escala, redução de custos, aumento da eficiência e das receitas, acesso ao mercado de capitais, oferecimento de empréstimos e ampliação das linhas de crédito e produtos.

Há vantagens que decorrem da atuação conjunta de instituições independentes e distintas, mas que possuem funções complementares em setores regulados da economia nacional, tais como diminuição do risco de captura e incremento de accountability, do controle social. Há que se buscar a coordenação entre autarquias na persecução de um princípio comum de atuação que tutela os bens da coletividade. Independentemente de decisão judicial que possa dedicar exclusividade no tratamento de fusões bancárias, esta é a lição que subjaz ao debate.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Cade condena empresa por acordo fraudulento em licitação da Sabesp

Uma empreiteira foi condenada pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) por ter desistido de uma licitação que havia vencido e logo depois ter dividido a obra com a segunda colocada na disputa, em 2008. A companhia ganhou uma disputa da Sabesp (companhia de saneamento de SP) para tocar o terceiro lote de obras do Sistema Produtor de Água Mambu/Branco, na Baixada Santista.

O tribunal do órgão responsabilizou a Concic Construções Especiais, a Saenge Engenharia e cinco de seus administradores, com multas que chegam a R$ 19,6 milhões. O órgão entendeu tratar-se da prática de supressão de proposta, um dos principais mecanismos utilizados em cartéis que tentam fraudar licitações. Para o conselho, o acordo prejudicou a livre concorrência. 

Segundo a conselheira relatora do caso, Ana Frazão, as empresas fizeram um acordo particular durante processo de licitação conduzido pela Sabesp (companhia de saneamento de São Paulo). Com a saída da primeira classificada, a Saenge foi contratada por um valor 23,1% superior. Mas a Concic virou sócia oculta da empresa e assumiu 50% da execução das obras.

A conselheira apontou como provas o contrato de sociedade firmado entre as duas quando a Concic ainda estava em primeiro lugar, além de fax e e-mails trocados pelos administradores convocando reuniões e discutindo assuntos relativos ao acordo. Disse ainda que o edital da Sabesp só permitia a subcontratação de até 30% do valor contratado.

Segundo a conselheira, “a retirada da proposta comercial em favor da Saenge, que havia apresentado oferta significativamente maior, constitui uma fraude ao caráter competitivo da licitação e uma inequívoca violação ao princípio da livre concorrência”. Com informações da Assessoria de Imprensa do Cade.

PA 08012.009885/2009-21

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Abuso de Posição Dominante


Nos termos da Lei n. 8.884/94, a posição dominante de mercado é “presumida” quando uma empresa ou grupo de empresas controla 20% de mercado relevante. A maioria dos casos de abuso de posição dominante no Brasil envolve algum tipo de conduta cujo efeito ou objetivo é excluir concorrentes do mercado ou impedir que outras empresas entrem em concorrência com a empresa dominante. Todavia, a prática de abuso de posição dominante que tenha unicamente o escopo de explorar posição de relativa fragilidade de parceiros comerciais ou consumidores também pode ser punida.

Dentre as práticas que podem ser consideradas como abusivas estão:


  • Acordos de exclusividade com fornecedores ou distribuidores, para dificultar o acesso por concorrentes a insumos ou canais de distribuição, respectivamente;
  • Discriminação ou recusa no fornecimento de bens e serviços a concorrentes atuais ou potenciais;
  • Dificultar injustificadamente o licenciamento de tecnologias;
  • Obrigação de aquisição de produtos em conjunto (venda casada);
  • Cobrança de preços abaixo do custo, para exclusão de concorrentes (preço predatório);
  • Oferecimento de descontos a distribuidores que tenham o efeito de impedir a entrada de novos fornecedores; e
  • Destruição de matérias primas sem justa causa (açambarcamento).


SDE recomenda punição de donos de postos de combustíveis no RS


A Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (SDE/MJ) recomendou ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) que condene por formação de cartel o Sindicato Intermunicipal do Comércio Varejista de Combustíveis e Lubrificantes do Rio Grande do Sul (Sulpetro). Além da entidade, três dirigentes que atuavam no Sulpetro entre 2004 e 2007, época em que ocorreu a infração, devem ser condenados, segundo publicação no Diário Oficial da União nesta quarta-feira, 9/5.

De acordo com o processo administrativo, os investigados tentavam limitar e impedir o acesso de novas empresas ao mercado e dificultar a abertura, o funcionamento e o desenvolvimento de concorrentes. O sindicato atuava junto às Câmaras de Vereadores de diversos municípios gaúchos para que fossem aprovadas leis que impedissem a instalação e o funcionamento de postos de combustíveis nos estacionamentos de supermercados e shopping centers.

A secretaria verificou que o Sulpetro e seus dirigentes redigiam o texto das leis e, ao encaminhá-las para os legisladores municipais, argumentavam que a intenção era garantir a segurança do cidadão em locais com grande fluxo de pessoas. No entanto, as evidências apontam que era falso o argumento da segurança, pois a real intenção do Sulpetro era evitar a concorrência.

O processo foi aberto em 2010 depois de a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda receber uma denúncia e identificar fortes suspeitas de condutas restritivas à concorrência.

Se condenados pelo Cade, o sindicato e seus dirigentes à época podem pagar multas que variam de cerca de R$ 6.000  a R$ 6 milhões, de acordo com a Lei 8.884/94.

Combustíveis

Desde 2002, o Cade já condenou sete cartéis no mercado de revenda de combustíveis. As condutas anticompetitivas aconteciam em Florianópolis, Lages, Belo Horizonte, Brasília, Goiânia, Guaporé e Recife. Nos últimos quatro anos, a SDE instaurou processos administrativos para apurar a formação de cartel nas cidades de João Pessoa, Belo Horizonte, Vitória e Caxias do Sul e encaminhou ao Cade processos com recomendação de condenação de cartéis em Manaus, Bauru, Santa Maria e Londrina.