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segunda-feira, 23 de março de 2015

DIREITO EMPRESARIAL. MITIGAÇÃO DA EXCLUSIVIDADE DECORRENTE DO REGISTRO NO CASO DE MARCA EVOCATIVA.

 Ainda que já tenha sido registrada no INPI, a marca que constitui vocábulo de uso comum no segmento mercadológico em que se insere associado ao produto ou serviço que se pretende assinalar pode ser utilizada por terceiros de boa-fé. Com efeito, marcas evocativas, que constituem expressão de uso comum, de pouca originalidade, atraem a mitigação da regra de exclusividade decorrente do registro, possuindo um âmbito de proteção limitado. Isso porque o monopólio de um nome ou sinal genérico em benefício de um comerciante implicaria exclusividade inadmissível a favorecer a detenção e o exercício do comércio de forma única, com prejuízo não apenas à concorrência empresarial impedindo os demais industriais do ramo de divulgarem a fabricação de produtos semelhantes através de expressões de conhecimento comum, obrigando-os a buscar nomes alternativos estranhos ao domínio público , mas sobretudo ao mercado geral, que teria dificuldades para identificar produtos similares aos do detentor da marca. Nesse sentido, a Lei 9.279/1996, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, em seu art. 124, VI, dispõe não ser registrável como marca sinal de caráter genérico, necessário, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para designar uma característica do produto ou serviço. Vale destacar que a linha que divide as marcas genéricas não sujeitas a registro das evocativas é extremamente tênue, por vezes imperceptível, fruto da própria evolução ou desenvolvimento do produto ou serviço no mercado. Há expressões, por exemplo, que, não obstante estejam diretamente associadas a um produto ou serviço, de início não estabelecem com este uma relação de identidade tão próxima ao ponto de serem empregadas pelo mercado consumidor como sinônimas. Com o transcorrer do tempo, porém, à medida que se difundem no mercado, o produto ou serviço podem vir a estabelecer forte relação com a expressão, que passa a ser de uso comum, ocasionando sensível redução do seu caráter distintivo. Nesses casos, expressões que, a rigor, não deveriam ser admitidas como marca por força do óbice contido no art. 124, VI, da Lei 9.279/1996 acabam sendo registradas pelo INPI, ficando sujeitas a terem sua exclusividade mitigada. Precedente citado: REsp 1.166.498-RJ, Terceira Turma, DJe 30/3/2011. REsp 1.315.621-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 4/6/2013.

terça-feira, 29 de maio de 2012

REGISTRO DE PESSOA JURÍDICA. USO DO NOME COMERCIAL. EXCLUSIVIDADE. E USO DA MARCA SEM REGISTRO E COM REGISTRO



RECURSO ESPECIAL Nº 971.026 - RS (2007?0171997-0)

RELATOR : MINISTRO SIDNEI BENETI
RECORRENTE : GANG COMERCIO DO VESTUARIO
ADVOGADO : EDUARDO DORFMANN ARANOVICH
ADVOGADA : NATÁLIA DE CAMPOS ARANOVICH
RECORRIDO : GANG STREET CONFECCOES LTDA
ADVOGADO : GIRNEI ROBERTO DA CÁS

RELATÓRIO

O EXMO SR. MINISTRO SIDNEI BENETI (Relator):

1.- GANG COMERCIO DO VESTUÁRIO LTDA. interpõe recurso especial com fundamento nas alíneas "a" e "c" do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Relator o Desembargador LEO LIMA, cuja ementa ora se transcreve (fls. 162):


REGISTRO DE PESSOA JURÍDICA. USO DO NOME COMERCIAL. EXCLUSIVIDADE.

Preliminar de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, rejeitada.

Preliminar de nulidade da sentença, por ausência de fundamentação, também rejeitada.

A proteção conferida ao nome comercial, em razão do registro, limita-se ao estado da federação a que pertença a Junta Comercial, diferentemente do que ocorre com a proteção concedida à marca, que é nacional. Caso em que a autora não comprovou também haver requerido o registro perante a Junta Comercial de São Paulo. Tampouco se verificando verdadeira colidência de nomes empresariais.

Apelo desprovido, por maioria.


2.- Os embargos de declaração opostos (fls. 191?198) foram rejeitados (fls. 201?202).

3.- A recorrente alega que o pedido formulado na inicial era de reconhecimento de ato de concorrência desleal fundamentado na prática de ato ilícito (artigo 187 do Código Civil). Afirma que a causa de pedir essencialmente apresentada era, portanto, o ato ilícito perpetrado pelas recorridas, consistente em mercanciar a poucos metros do estabelecimento da autora produtos semelhantes aos seus, com marcas semelhantes, capazes de confundir os consumidores e de desviar a sua clientela. O Tribunal de origem, tendo julgado a causa com fundamento nas regras sobre o uso de nome comercial e o direito sobre marcas (contrafração e usurpação de marcas), teria incorrido em julgamento extra petita com ofensa ao artigo 460 do Código de Processo Civil.

4.- Destaca que também teria havido contrariedade aos artigos 130 e 330 do Código de Processo Civil, porque os atos de concorrência desleal e o desvio de clientela arguídos só poderiam ser comprovados mediante prova oral e?ou pericial, não sendo de se admitir o julgamento antecipado da lide.

5.- Aduz que o documento de fls. 29?32 não foi impugnado pela parte contrária, de modo que não se poderia cogitar de controvérsia quanto a sua autenticidade, sob pena de ofensa aos artigos 334, III, do Código de Processo Civil e 61, § 2º, do Decreto nº 1.800?96.

6.- Indica negativa de vigência aos artigos 33 e 34 da Lei nº 8.934?94 e 62 do Decreto nº 1.800?96, porque a o acórdão considerou que a proteção ao nome empresarial tem caráter regional e não deve obedecer os princípios da anterioridade e da novidade. Quanto ao tema aponta dissídio jurisprudencial com relação a julgados desta Corte, os quais reconheceriam que a proteção ao nome comercial vige, em todo o território nacional, a partir do registro dos atos constitutivos da sociedade empresária na Junta Comercial.

7.- Por meio da Petição nº 65521 (fls. 290?292) e dos memoriais distribuídos, a recorrente informa que adquiriu o registro da marca "GANG" no INPI e que isso seria um fato superveniente (artigo 462 do Código de Processo Civil) que autorizaria o retorno dos autos Tribunal de Origem para que fosse novamente julgado o recurso de apelação.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 971.026 - RS (2007?0171997-0)


VOTO

O EXMO SR. MINISTRO SIDNEI BENETI (Relator):

8.- GANG COMERCIO DO VESTUÁRIO LTDA. ajuizou ação ordinária contra CLITTER FASHION LTDA. e GANG STREET CONFECCÕES LTDA. alegando que estas estariam se apropriando do "nome comercial" da autora e usando-o indevidamente. O ilícito, segundo colocado na petição inicial, estaria resumido na seguinte conduta, verbis (fls. 03):

A prática dolosa está configurada através da comercialização pela primeira Ré, e da fabricação pela segunda Ré de artigos do vestuário em que consta o nome GANG STREET estampado.

Ao final, formulou os seguintes pedidos (fls. 20):

A. defira 'in limine litis' a antecipação de tutela para (1) ordenar a segunda Ré se abstenha de usar o nome GANG, que pertence à Autora e é de sua utilização exclusiva; (2) determinar a apreensão de todos os produtos fabricados pela primeira Ré e comercializados pela segunda Ré como nome da Autora, para posterior destruição; e, (3) imponha uma multa diária de (...).

B. julgue procedente a demanda, para (1) condenar a segunda Ré a abster-se de utilizar o nome e os sinais distintivos identificados como GANG, sob pena de cominatória diária (...); (2) determine a apreensão definitiva de todos os produtos fabricados ou comercializados pelas Rés com o nome da Autora, assim como a destruição dos mesmos, por serem objeto de atividade criminosa; e (3) condene as rés a repararem todos os danos derivados de tal ato, incluindo os danos emergentes e lucros cessantes, os danos patrimoniais e os extrapatrimoniais, a serem apurados em liquidação de sentença.


9.- Importante delimitar bem o que a autora submeteu ao Poder Judiciário por intermédio da petição inicial.

A sentença e o Acórdão do Tribunal de origem fundaram-se em que a autora, à época do ajuizamento da ação (3.7.2001, fls. 2), já era titular do nome GANG, em virtude de arquivamento de atos constitutivos na Junta Comercial do Estado do Rio Grande do Sul (datado de 27.4.1976 – fls. 29), mas não era titular da marca GANG (que lhe veio a ser cedida por terceiros titulares em 5.2.2009, autorizando-se a requerer o registro no INPI (doc. Fls. 286?289 – juntado aos autos na pendência do julgamento deste Recurso neste Tribunal).

Julgando improcedente a ação, a sentença e o Acórdão distinguiram entre nome (cujo registro vale para o Estado em cuja Junta Comercial arquivado) e marca (cujo registro no INPI vale para todo o território nacional), firmando, ambos os julgamentos, que a autora, ora Recorrente, tinha o registro do nome no Estado do Rio Grande do Sul, mas não possuía o da marca no INPI – anotando-se que a ré, ora Recorrida, por sua vez, tem seu registro na Junta Comercial de São Paulo desde 20.11.1995, sob a denominação “Gang Street Ltda”, fls. 84).

Possui, a autora, ora Recorrente, portanto, apenas a proteção do nome comercial no Estado do Rio Grande do Sul, não havendo como amparar a proteção à marca, que somente ocorreria nacionalmente se registrada no INPI (o que a autora, ora Recorrente, informou estar promovendo por aquisição em 5.2.2009 – fls. 29).

10.- É bem sabido que marca e nome empresarial não se confundem. A marca, cujo registro é feito no Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI, destina-se a identificar produtos, mercadorias e serviços. O nome empresarial, a seu turno, está voltado à identificação da própria sociedade empresarial.

11.- O juiz de primeiro grau, tendo em vista essa distinção, cuidou logo de início de esclarecer que não se poderia apreciar os pedidos relativos à proteção da marca GANG, porque ela não estaria registrada no INPI. O objeto da lide deveria, nesses termos, ser limitado aos temas concernentes à proteção do nome empresarial da autora.

Nessa medida, afirmou que esta proteção estaria limitada geograficamente ao Estado federado em cuja Junta Comercial tivesse havido o registro da sociedade. Assim, não seria possível impedir a Ré GANG STREET CONFECCÕES LTDA. de continuar a usar essa denominação. Isso porque tinha ela seus atos constitutivos depositados na Junta Comercial do Estado São Paulo enquanto a autora havia registrado seus atos constitutivos na Junta Comercial do Estado do Rio Grande do Sul.

Acrescentou que também não seria devido obstar a segunda ré de usar a expressão GANG em seu nome empresarial, porque (fls. 143):

(...) mesmo que a autora possuísse sua empresa registrada na JUCESP, não poderia se admitir a colidência, uma vez que o nome da segunda ré deriva da combinação dos nomes GANG e STREET, formando, então uma expressão própria denominada "GANG STREET".


12.- O Tribunal de origem igualmente assinalou que o tema em debate era a definição do âmbito de proteção do nome empresarial.

Tendo isso em vista, concluiu, por maioria, que a apelação não merecia provimento. Tal qual consignado na sentença, entendeu-se que o âmbito de proteção do nome comercial circunscrevia-se à unidade federativa de jurisdição da Junta Comercial em que registradas as empresas autora e ré.

13.- A irresignação manifestada no Recurso Especial não merece prosperar.

14.- Quanto à alegação de fato superveniente, consistente no registro da marca no INPI, para efeito de julgamento do Recurso Especial, toma-se como preliminar essa alegação, como o pedido de devolução dos autos ao tribunal de origem formulado com fundamento nos artigos 462 e 471 do Código de Processo Civil, mas não há nenhuma possibilidade de acolhimento.

O artigo 462 do Código de Processo Civil dispõe que:

Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento da lide, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a sentença


Nos termos do referido dispositivo, os fatos supervenientes à propositura da ação só podem ser levados em consideração até o momento da sentença (ou do acórdão).

Assim é que não faz sentido devolver os autos para novo julgamento, porque o fato suscitado pela recorrente é superveniente não apenas à propositura da ação, mas ao próprio acórdão recorrido. Não se verifica, pois, o pressuposto básico previsto pelo artigo 462 do Código de Processo Civil - qual seja a pendência de julgamento.

Tampouco se poderia invocar o artigo 471 do Código de Processo Civil, porque ali se cuida de relações jurídicas continuadas, o que não ocorre na presente hipótese.

Por outro lado, não é possível apreciar em sede de Recurso Especial esse tema, ante a exigência constitucional do prequestionamento, evidentemente inexistente, dada a notícia do fato ulteriormente julgado na origem.

Se todo o processo se desenvolveu sob o pálio de uma suposta colidência entre os nomes empresariais das sociedades autora e ré, é também nesses termos que deve ser resolvido o recurso especial.

O fato de a recorrente ter em momento mais recente registrado a marca GANG no INPI poderia, eventualmente, suscitar uma nova discussão, relativa à colidência entre nome empresarial e marca. Mas isso consubstanciaria uma nova causa de pedir (fundamento de direito) que, assim, só poderia ser objeto de um outro processo.

15.- No que tange à alegação de julgamento extra petita fundada em  a ação pretensamente haver se fundamentado em concorrência desleal e não em discussão a respeito de marca, vê-se que, nos termos já da sentença, a partir do relatório, que tal vício não ocorreu.

De fato, a recorrente pleiteou, em sua petição inicial, que fossem examinados os atos ilícitos consistentes no uso indevido do sinal identificador GANG, assim como também requereu que fossem condenadas as rés pelo desvio de clientela. Assim, os atos de concorrência desleal a que faz referência a recorrente consistiriam, justamente, no uso indevido da sua marca e nome comercial, quer dizer, se correto o uso de marca, nunca se poderia concluir por ocorrência de concorrência desleal.

As instâncias ordinárias explicaram que tais pretensões, porque ligadas ao uso indevido da marca, não poderiam prosperar, e, relembre-se, o Juízo  de 1º Grau já restringira a matéria, ao início do processo, ao uso da marca - sem recurso da Recorrente. Não há aí qualquer vício de julgamento extra petita.

Ademais, a petição inicial, ao contrário do alegado pela Recorrente, efetivamente não moveu ação por concorrência desleal, tanto que não alega isso, como causa de pedir, em nenhum momento, assim como, também, em nenhum momento, expõe o que seria o fundamento legal desse tipo de pedido (CC?1916, art. 159), destacado, no Vencido proferido em prol da Recorrente, como necessário ao pedido fundado na alegação de concorrência desleal (cf. Voto do E. Des. UMBERTO GUASPARI SUDBRACK, fls. 176).

Moveu, a petição inicial, ação, alegando que, por ter o nome registrado na Junta Comercial do Rio Grande do Sul, tinha direito a ver respeitado o mesmo escrito na marca, pelas acionadas. Expôs, com efeito, a petição inicial que “as Rés dolosamente estão apropriando-se do nome da Autora, com a finalidade de captar a sua já consagrada clientela, causando uma confusão no consumidor que não sabe distinguir quando se trata de um produto realmente fornecido pela GANG ou não”, vindo, do uso da marca, a alegada “captação de clientela”, por ação de estabelecimento “localizado a poucos metros do da autora” (inicial, passim).

Os fundamentos legais explícitos da inicial também se restringem a nome e a marca e não a concorrência desleal (CF, arts. 5º, X, Lei 8.934?1994, arts. 33 e 34, fls. 5, 9 e 12).

Os dispositivos referentes a concorrência desleal vêm apenas a título de reforço de argumentação, como o vêm, ainda, os relativos a infração à ordem econômica (Lei 9279?96,  arts. 194 e 195, V; Lei 8884?1994, arts; 20 e 21, V), a exemplo, aliás, da invocação de outros dispositivos, como os de Direito do Consumidor e Convenção de Paris).

E os pedidos formulados são inequívocos ao restringir a pretensão à proteção marcária (fls. 20), pois requerem:


“A. defira 'in limine litis' a antecipação de tutela, para (1) ordenar que a segunda Ré se abstenha de usar o nome GANG, que pertence à autora e é de sua utilização exclusiva; (2) determinar a apreensão (...);  (3) imponha uma multa diária (...).


“B. julgue procedente a demanda, para (1) condenar a segunda Ré a abster-se de utilizar o nome os sinais distintivos identificados como GANG (...); (2) determine a apreensão (...); (3) condene as Rés a repararem todos os danos derivados de tal ato (...).


Como se vê, circunscrita a matéria, pela Recorrente, à questão de uso da marca (nacional), por ter ela o registro do nome (de proteção estadual).

Questão correlata, não posta, com a detalhada exposição de causa de pedir e pedido necessária, pela inicial, pela sentença ou pelo Acórdão, de modo que de aqui de impossível enfoque, seria definir se empresa de nome semelhante pode instituir filial próxima para venda de produtos semelhantes, matéria que resta fora do foco do presente julgamento.

16.- Nessa toada também é de se rechaçar a alegação de ofensa aos artigos 130 e 330 do Código de Processo Civil. Se o Tribunal de origem, afirmou que a questão relativa ao uso indevido da marca não podia ser apreciada, não fazia sentido permitir a produção de prova oral e pericial relativa a atos de concorrência desleal e desvio de clientela.

Não configura cerceamento de defesa o julgamento da causa, sem a produção de prova pericial, quando o Tribunal de origem entender substancialmente instruído o feito, declarando a existência de provas suficientes para seu convencimento.

Hão de ser levados em consideração os princípios da livre admissibilidade da prova e do livre convencimento do juiz que, nos termos do artigo 130 do Código de Processo Civil, permitem ao julgador determinar as provas que entender necessárias à instrução do processo, bem como o indeferimento das que considerar inúteis ou protelatórias.

Dessa forma, não há falar em nulidade processual, por ausência de produção de prova, uma vez que a decisão vergastada procedeu à devida análise dos fatos e a sua adequação ao direito. Além disso, rever os fundamentos, que levaram a tal entendimento, demandaria reapreciação do conjunto probatório, o que é vedado em recurso especial, a teor da Súmula 7 deste Superior Tribunal de Justiça.

17.- Quanto à autenticidade do documento de fls. 29?32 e, bem assim, quanto à suposta violação dos artigos 334, III, do Código de Processo Civil e 61, § 2º, do Decreto nº 1.800?96, observa-se que o Tribunal de origem, a despeito dos embargos de declaração suscitados, não se manifestou sobre o tema. De outra parte, é certo que as razões do recurso especial não apontam ofensa ao artigo 535 do Código de Processo Civil. Falta, assim, o necessário prequestionamento, merecendo aplicação as Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal.

18.- No que respeita ao âmbito geográfico de proteção dispensado ao nome comercial, verifica-se, tal como destacado pela recorrente, a existência de julgados dessa Corte no sentido de que o registro dos atos constitutivos da sociedade na Junta Comercial confere àquela sociedade, direito de exclusividade sobre o uso do nome em todo o território nacional.


Nesse sentido: REsp 9569?RJ, Rel. Ministro FONTES DE ALENCAR, QUARTA TURMA, DJ 26?05?1997; REsp 6169?AM, Rel. Ministro ATHOS CARNEIRO, QUARTA TURMA, DJ 12?08?1991; REsp 9142?SP, Rel. MIN. SALVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, DJ 20?04?1992; REsp  6.872?GO, Rel. Ministro EDUARDO RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, DJ 28?03?1994.

Tais precedentes estão fulcrados no artigo 8º da Convenção de Paris de 1883, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto nº 75.572?75, nos termos do qual o arquivamento dos atos constitutivos no Registro do Comércio era bastante para conferir ao nome comercial proteção nacional e internacional.

O acórdão recorrido, a seu turno, busca fundamento no artigo 61 Decreto nº 1.800?96, que regulamentou a Lei nº 8.934?94, o qual estabelece:

Art. 61. A proteção ao nome empresarial, a cargo das Juntas Comerciais, decorre, automaticamente, do arquivamento da declaração de firma mercantil individual, do ato constitutivo de sociedade mercantil ou de alterações desses atos que impliquem mudança de nome.

§ 1º A proteção ao nome empresarial circunscreve-se à unidade federativa de jurisdição da Junta Comercial que procedeu ao arquivamento de que trata o caput deste artigo.

§ 2º A proteção ao nome empresarial poderá ser estendida a outras unidades da federação, a requerimento da empresa interessada, observada instrução normativa do Departamento Nacional de Registro do Comércio - DNRC.


Tal orientação também foi adotada pelo Código Civil de 2002 que assim determina:

Art. 1.166. A inscrição do empresário, ou dos atos constitutivos das pessoas jurídicas, ou as respectivas averbações, no registro próprio, asseguram o uso exclusivo do nome nos limites do respectivo Estado.

Parágrafo único. O uso previsto neste artigo estender-se-á a todo o território nacional, se registrado na forma da lei especial.


19.- Como se vê, houve uma alteração do tratamento legal dispensado à matéria. Atualmente, força é convir, a proteção ao nome empresarial dá-se, em princípio, apenas no espaço territorial correspondente à competência da Junta Comercial em que registrados os atos constitutivos da sociedade. FABIO ULHÔA, prelecionando sobre as diferenças entre marca e nome comercial, aduz que :


(...) a proteção conferida pela Junta Comercial ao nome se exaure nos limites do Estado a que ela pertence, enquanto que os efeitos do registro de marca são nacionais (CC, art. 1.166). Ou seja, o empresário sediado em Santa Catarina tem, a partir do arquivamento do seu ato constitutivo no registro de empresas, protegido o seu nome empresarial em todo o Estado catarinense. Se abrir filiais no paraná e no Rio Grande do Sul, terá neles a mesma proteção. Nenhum outro empresário poderá se estabelecer, ou abrir filial, com nome idêntico ou semelhante, nestes três Estados. Tais arquivamentos, contudo, não impedem que, em outro Estado da Federação (Rio de Janeiro, suponha-se), seja arquivado ato constitutivo com nome empresarial colidente. Ressalte-se, para precisar, que tanto o empresário catarinense pode vender seus produtos ou serviços no Rio de Janeiro, como o carioca pode fazê-lo em Santa Catarina, Paraná ou Rio Grande do Sul (desde que não tenha filiais). Um, contudo, não poderá impedir que o outro se utilize do nome registrado na respectiva Junta. (COELHO, Fábio Ulhôa. Curso de Direito Comercial. Direito de Empresa, Vol. 1, 12ª ed.: Saraiva, São Paulo, 2008, p. 183).


20.- Nesta Corte, já perfilhando a nova orientação, colhe-se o seguinte julgado:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - OMISSÃO - CARACTERIZAÇÃO - EFEITOS MODIFICATIVOS - POSSIBILIDADE - PRIMEIROS ACLARATÓRIOS - OMISSÃO E CONTRADIÇÃO EM ARESTO DESLINDADOR DE AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - CONFIGURAÇÃO - SOCIEDADES COMERCIAIS - DENOMINAÇÕES SOCIAIS - EXCLUSIVIDADE - LIMITAÇÃO GEOGRÁFICA - MARCAS - PATRONÍMICO DOS FUNDADORES DE AMBAS AS LITIGANTES - PRINCÍPIO DA ESPECIFICIDADE - APLICAÇÃO - CONFUSÃO AO CONSUMIDOR AFASTADA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS - REEXAME DE PROVAS - VALIDADE DO REGISTRO DAS MARCAS DA EMBARGANTE - DECLARATÓRIOS ACOLHIDOS - RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

(...)

4. A proteção legal da denominação de sociedades empresárias, consistente na proibição de registro de nomes iguais ou análogos a outros anteriormente inscritos, restringe-se ao território do Estado em que localizada a Junta Comercial encarregada do arquivamento dos atos constitutivos da pessoa jurídica.

(EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 653.609?RJ, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUARTA TURMA, DJ 27?06?2005).


21.- Ante o exposto, nega-se provimento ao Recurso Especial.


Ministro SIDNEI BENETI
Relator

Documento: 13279379 RELATÓRIO E VOTO