Número Único: 00008570620115020511 (00857201151102004)
Comarca:
Itapevi Vara: 1ª
Data
de Inclusão: 22/06/2012 Hora de Inclusão: 17:21:45
PROCESS0:
0000857-06.2011.5.02.0511
REQUERENTE:
- MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
REQUERIDA:
- B2W GLOBAL DO VAREJO
JUIZ:
MAURO VOLPINI FERREIRA
Sentença
prolatada em 22.06.2012 as 11:00 horas
Nesta
data e horário abriu-se a audiência para a apreciação do processo em questão.
Apregoadas as partes, verificou-se à ausência de ambas. Profere-se a decisão
abaixo.
I-
RELATÓRIO
MINISTÉRIO
PÚBLICO DO TRABALHO ajuizou AÇÃO CIVIL PÚBLICA em face B2W GLOBAL DO VAREJO,
pleiteando a condenação da requerida em obrigação de respeitar a duração do
trabalho normal de seus empregados dentro dos parâmetros constitucionais de 44
horas semanais e 8 horas diárias sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para
cada empregado cuja jornada não respeitar esta determinação legal e, para cada
dia em que for constatado o descumprimento; não prorrogar injustificadamente a
jornada normal de labor dos seus empregados além do limite legal de duas horas
diárias, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado cuja
jornada for prorrogada além do limite legal e, para cada dia em que for
constatado o descumprimento, excetuadas as hipóteses previstas no art. 61 da
CLT que sejam devidamente comprovadas; conceder a seus empregados cujo trabalho
contínuo exceda de seis horas, um intervalo para repouso ou alimentação de, no
mínimo um hora, na forma estabelecida no art. 71 da CLT, sob pena de multa no
valor de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido
intervalo na forma legal; conceder a seus empregados intervalo mínimo de 11
horas consecutivas entre duas jornadas de trabalho, na forma estabelecida no
art. 66 da CLT, sob pena de multa no valor de R$1.000,00, para cada empregado e
a cada vez que não for concedido o aludido intervalo na forma legal; conceder a
seus empregados descanso semanal de vinte e quatro horas consecutivas, na forma
estabelecida pelo art. 67 da CLT e art. 1º da Lei nº 605/59, sob pena de multa
no valor de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o
aludido repouso na forma legal; conceder a seus empregados descanso nos
feriados civis e religiosos de acordo com a tradição local, excetuados os
casos, devidamente comprovados, em que a execução do serviço for imposta pelas
exigências técnicas, conforme art. 70 da CLT e art. 8º da Lei nº 605/49 e
Decretonº 27;048/49, sob pena de multa de R$1.000,00 para cada empregado e a
cada vez que não for concedido o aludido repouso, nos termos da legislação
própria, sendo que as multas deverão serem revertidas ao Fundo de Amparo ao
Trabalhador (FAT).
Ainda,
buscou a condenação da requerida no pagamento de indenização por danos
coletivos no valor de R$5.000,00.
Atribuiu
à causa o valor de R$5.000.000,00 (fls. 27).
Juntou
documentos (um volume apartado).
Primeira
proposta de conciliação rejeitada.
Decisão
concedendo a antecipação de tutela às fls. 24.
A
requerida apresentou defesa escrita (fls. 51/70), argüindo preliminarmente a
ilegitimidade ativa do requerente e, no mérito, afirmou que os fatos teriam
ocorrido de forma sazonal negou os direitos pretendidos pela reclamante.
Juntou
documentos (14 volumes apartados).
Manifestação
às fls. 79/101 com os documentos de fls. 102/111.
Às
fls. 112/116 petição do requerente informando o descumprimento da decisão de
antecipação de tutela com os documentos de fls. 118/145.
Não
foram produzidas provas de audiência (fls. 39).
É o
relatório.
II -
FUNDAMENTAÇÃO
1.
DAS MEDIDAS SANEADORAS
1.1.
Da petição de informação
Observo
às fls. 112/116 petição do requerente informando o descumprimento da decisão de
antecipação de tutela com os documentos de fls. 118/145, sendo que, por
equívoco da Secretaria desta Vara, a mesma não foi concluída para despacho.
Assim, neste ato conhecimento de tal peça e, portanto, garantindo o
contraditório, determino a intimação da requerida para que, no prazo de dois
dias, se manifeste sobre as informações mencionadas. Após a expiração do prazo,
deverá a Secretaria concluir os presente autos imediatamente para análise do
requerido, devendo ainda, verificar as causas da não conclusão desta petição
procedendo as alterações necessárias para que isso não mais ocorra.
2.
DEFESA INDIRETA DE PROCESSO
2.1.
PEREMPTÓRIAS (preliminares)
2.1.1.
Da ilegitimidade ativa
Arguiu
a requerida a ilegitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho para a
propositura desta ação, afirmando não se tratarem de direitos difusos, tampouco
a direitos coletivos em sentido estrito,posto que, embora determináveis os
interessados, estes não compartilham com a empresa , uma mesma relação jurídica
indivisível, pois como é cediço, o contrato de trabalho possui natureza bilateral,
perfazendo-se entre cada empregado e a empresa, uma relação jurídica distinta.
Acrescentou que os direitos declinados na inicial seriam verdadeiros direitos
heterônomos, direitos individuais ao quais não perfazem objeto da ser tutelado
por esta espécie de ação coletiva.
Sem
nenhuma razão a requerida, pois de acordo com o disposto no art. 129, III da
Constituição Federal de 1988, é função do requerente promover ação civil
pública para a proteção de outros interesses difusos e coletivos.
Ainda,
fixa o inciso III do art. 83 da Lei Complementar nº 75/93 ser atribuição do
Ministério Público do Trabalho promover a ação civil pública no âmbito na
Justiça do Trabalho, para a defesa de interesses coletivo, quando
desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos, bem como,
define o inciso II do art. 81 da Lei nº 8.078/90 que interesses ou direitos
coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais de
natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas
ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica de base.
Sem
dúvida que a violação de direitos como os arguidos pelo requerente, geram
pretensões individuais a cada um daqueles trabalhadores, no entanto, não podemos
perder de vista que, quando isso ocorre com a coletividade de empregados da uma
empresa como a reclamada, surge concomitantemente a violação dos interesses
coletivos consistentes no direito de trabalhar em um ambiente salubre. Ocorre
que salubridade do meio ambiente de trabalho não decorre tão somente a
inexistência de agentes físicos ou químicos, ou sua anulação por meio de EPI's,
mas também de pessoas que não estejam submetidas a condições abusivas de
trabalho que levam a fadiga, ao erro e finalmente ao aumento da ocorrência de
acidentes.
Desta
forma, considero o requerente parte legítima para compor o pólo passivo da
presente ação, rejeitando, por conseguinte, a presente preliminar.
3.
DO MÉRITO
3.1.
DEFESA INDIRETA DO MÉRITO
3.2.
DEFESA DIRETA DO MÉRITO
3.2.1.
Dos fatos
Arguiu
o requerente, que a requerida vem descumprindo com as normas que garantem a
salubridade do trabalho prestado pelos seus empregados, exigindo que estes
trabalhe além dos limites máximos de jornada diária e semanal, sem gozar intervalo
intrajornada e interjornadas legais, em domingos e feriados, gerando, com isso,
lesão a direitos desta coletividade de trabalhadores.
A
requerida se defendeu (item U.1- fls. 58) argumentando que em determinados
meses, mais precisamente no mês de agosto de 2010 (auge da crise) teria sofrido
dificuldades grandes no que se refere à distribuição dos seus produtos, em
razão do grande acréscimo de vendas ocorrido, nessa modalidade de comércio
eletrônico, o que levou a configuração de dificuldade de logística. Ainda,
esclareceu que para solucionar o problema, foram contratados como empregados,
mais de 2.500 trabalhadores que eram terceirizados, sanando os problemas
constatados pelo requerente relativos aos meses de junho, julho e agosto/2010,
os quais não mais ocorreram.
Assim,
como bem pode ser visto, a requerida não negou os fatos articulados pelo
requerente na presente ação, mas tão somente, deduziu causa impeditiva do
direito pretendido, qual seja, que as violações descritas pelo requerente não
mais ocorreriam e, portanto, não haveria razão da propositura da presente ação.
Em
primeiro lugar é necessário observar que a presente ação não versa apenas sobre
obrigações de fazer e não fazer, mas também o requerente pleiteou a condenação
da requerida no pagamento de indenização por danos morais coletivos, em face do
qual, a situação de ter cessado as violações de direitos dos trabalhadores da
requerida não teriam qualquer relevância, exceto como parâmetro balizador de
eventual indenização a ser arbitrada, quando analisada pelo seu viés
pedagógico.
Em
relação aos demais pedidos, entendo que a requerida igualmente não tenha razão,
pois ainda que na atualidade não estejam havendo quaisquer violações de
direitos dos seus empregados, em sua própria inicial aquela declarou que o
problema é sazonal, ou seja, sempre se repete em uma época do ano. Assim, se
evidenciado o descumprimento de normas como arguido pelo requerente, o fato de
no momento isso não estar ocorrendo, não afasta o interesse processual, pois
conforme a reclamada reconheceu, o problema é sazonal.
Ainda,
apenas para não se argumentar que este juízo deixou de conhecer a questão no
todo, explico que o argumento de que o problema foi resolvido com a contratação
dos trabalhadores terceirizados não é prova de que as violações não continuaram
a ocorrer, pois não há nos autos qualquer prova de correlação entre as
atividades econômicas da requerida e o número de trabalhadores que atuam em sua
atividade, sem o que, impossível reconhecer que o número um pouco maior ou
menor representa de fato, diminuição de carga a ser distribuída a cada
empregado que não mais justificasse as violações cometidas no assim denominado
auge da crise.
3.2.2.
Dos descansos semanais remunerados e feriados
Arguiu
o requerente ter sido verificado trabalhadores que laboravam por 27 dias
consecutivos, sem nenhum descanso, como por exemplo, o caso da operadora de
estoque Sra. Maria Rubia Damasceno Assunção e da Supervisora II Marluce Pereira
de Brito.
O
requerida se defendeu argüindo que o art. 7º, XV da C.F. prevê a concessão de
repouso semanal remunerado apenas preferencialmente aos domingos, admitindo-se
a concessão do repouso semanal remunerado submetido a negociação. Ainda,
acrescentou que o disposto na Lei nº 605/49 é no mesmo sentido.
Com
razão a requerida em relação ao trabalho aos domingos, no entanto, não se
apercebeu que o requerente não deduziu argumentação divergente, mas pelo
contrário, apenas afirmou que aquela não estaria observando a concessão de
descanso semanal de 24 horas consecutivas, como bem pode ser visto pelo pedido
elencado sobre a letra e (fls. 20). Tanto é assim, que a causa de pedir não
aponta o fato de que algum trabalhador não teria gozado descanso semanal em
domingo, mas sim que existem trabalhadores que teriam trabalhado por até 27
dias consecutivos sem que houvesse dia reservado ao descanso. Acrescento que o
fato das CCT autorizarem a realização de trabalho em dias de domingos, feriados
nacionais e religiosos, de forma alguma elide o direito do trabalhador ao
descanso semanal, o qual deve ser concedido em outro dia. Ressalto, que a lei
que regulamente o direito ao descanso semanal, tem como objeto a salubridade do
trabalho prestado, pois é inegável que a ausência de descansos aumenta os
riscos relacionados com aspectos psicofísicos, tais como fadiga, familiares
(por ausência no convívio familiar), e sócio-econômico (decorrente da maior
probabilidade de ocorrência de acidentes de trabalho pela fadiga) e, portanto,
sua violação é admitida de forma extraordinária, mas não de forma reiterada
como a requerida vem impondo a seus funcionários.
No
tocante aos feriados prevê o art. 8? Lei nª 605/49:
Excetuados
os casos em que a execução do trabalho foi imposta pelas exigências técnicas
das empresas, é vedado o trabalho em dias feriados civis e religiosos,
garantida, entretanto, aos empregados a remuneração respectiva, observados os
dispositivos dos arts. 6? e 7? desta Lei.
É
necessário explicar que a requerida não se enquadra nas situações que o art. 7º
do Decreto º 27.048/49 expressamente autoriza o trabalho nos feriados e,
portanto, o trabalho realizado nestes dias é ilegal.
Assim,
a argumentação da requerida sobre a autorização para a possibilidade do
empregado trabalhar em domingos e feriados é estéril, pois apenas tentar
desviar a atenção para o foco real da questão, qual seja, a violação ao direito
ao descanso semanal por 24 horas do trabalhador.
3.2.3.
Do intervalo intrajornada
Em
relação a esta questão, a requerida se defendeu argumentando que o requerente
teria afirmado não ter verificado a existência de marcação de ponto do
intervalo intrajornada, e que tal fato não ensejaria a conclusão de que seus
trabalhadores não gozassem o mesmo.
Neste
ponto, entendo que realmente a requerida tenha razão, pois o§2º do art. 74 da
CLT não exige sua anotação, mas tão somente sua prévia assinalação. Assim, o
fato dos empregados da reclamada não registrarem o horário do intervalo não tem
como efeito gerar a presunção de que não estaria usufruindo do mesmo.
3.2.4.
Das horas extraordinárias
No
tocante a esta questão, observo que a requerida inicia sua defesa argumentando
com a legalidade da exigência de horas extraordinárias até o limite de 10
horas, no entanto, tal defesa é estéril, pois em momento algum o requerente
pleiteou que aquela não mais exigisse dos seus empregados trabalho em horas
extraordinárias, mas pelo contrário, a causa de pedir deduzida diz respeito à
violação do limite imposto pelo art. 59 da CLT, qual seja, de superação do horário
normal no máximo por mais duas horas. Como pode ser visto, o requerente
demonstra que existem trabalhadores da requerida que laboram até 7 horas a mais
do que a jornada normal, atingindo 77horas semanais de trabalho, o que ao meu
ver, é um absurdo.
Lembro,
que o fato da requerida argumentar estar pagando o trabalho realizado em horas
extraordinárias com o adicional devido, de forma alguma afeta o pedido
formulado pelo requerente, pois este não busca o cumprimento de direitos
individuais dos empregados da reclamada e sim, o cumprimento de normas de
salubridade e segurança do trabalho despendido por aqueles. Se por um lado a
realização de trabalho em horas extraordinárias gera o direito a
contraprestação deste com o adicional legal ou convencional fixado, de outro é
inegável que a extrapolação aos limites impostos pela CLT a esta prática, levam
ao desgaste físico do trabalhador em inegável violação de direito coletivo, ou
seja, ao direito de ter uma jornada digna que não ofenda a capacidade física do
trabalhador, além da qual teremos a extenuação destes, com perda da capacidade
de concentração e conseqüente majoração das falhas humanas que resultam em
acidentes individuais, quando não, coletivos. Um trabalhador em situação de
fadiga, não expõe somente sua integridade física em risco, mas também a dos
demais colegas, situação esta que não representa violação de direito
individual, mas sim de direito coletivo ao meio ambiente de trabalho salubre.
Refutado
o primeiro argumento da requerida, passo a analisar o subseqüente.
Arguiu
a requerida em sua defesa, que o labor extraordinário constatado pelo
requerente teria decorrido de situação de necessidade imperiosa e/ou inexecução
de tarefa que acarrete em prejuízo, situações autorizadas pelo art. 61 da CLT.
Ora,
pela própria argumentação da requerida, qual seja, de que teria sofrido
dificuldades grandes no que se refere à distribuição dos seus produtos, em
razão do grande acréscimo de vendas ocorrido, nessa modalidade de comércio
eletrônico, o que levou a configuração de dificuldade de logística, pode ser
visto que a situação não se enquadra no disposto no art. 61 da CLT. Uma leitura
mais atenta deste artigo demonstra que o legislador autorizou a superação do
limite máximo de trabalho em uma jornada para situações imperiosas, explicando
em sequência, que esta se refere a situações de força maior ou para atender a
realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa
acarretar prejuízo manifesto.
Em
relação à primeira hipótese, é óbvio que o aumento de vendas por ventura
realizado pela requerida assim não pode se enquadrado, pois se este resolveu
vender além da sua capacidade de exercício de atividade, o fez por vontade
própria, pois poderia ter limitado as vendas. Assim, se a ganância levou a requerida
a vender além de sua capacidade, isso não pode ser considerado força maior.
No
tocante à segunda hipótese, explica Arnaldo Süssekind que quanto aos serviços
inadiáveis, como emana do próprio texto legal, são aqueles cuja realização
imediata se torna imperiosa para evitar o perecimento de um bem econômico ou o
prejuízo manifesto que certamente adviria de sua inexecução. Neles não podem
ser incluídas situações deliberadamente criadas pelo empregado com o fim de
obter a prestação do trabalho extraordinário, senão as que decorrem das
próprias exigências da produção ou aquelas tendentes a preservar o bom
andamento dessa mesma produção. São destarte, situações que de muito se
aproxima do conceito de força maior, dela se diferenciando, apenas, no que concerne
à intensidade dos requisitos essenciais à sua existência Assim, fica claro que
a situação arguida como justificadora do trabalho extraordinário, não se
enquadra nesta hipótese, pois se realmente houve aumento expressivo de vendas
fato este nem mesmo comprovado por óbvio isso decorreu da vontade da requerida
ou falta de habilidade na condução de sua atividade, o que nem de perto se
aproxima da situação extraordinária fixada na lei.
Em
relação ao intervalo interjornadas, observo que a requerida incluiu tal questão
neste mesmo item, no entanto, não deduziu uma palavra sequer sobre o mesmo, em
face do que, concluo não haver justificativas para que seja descumprido este
direito dos trabalhadores.
Passo
a analisar as condições normais autorizadoras da superação do limite de
jornada.
Em
relação à jornada, o art. 57 da CLT expressamente fixa que a duração normal do
trabalho dos empregados em qualquer atividade não deveria exceder a 8 horas
diárias, a não ser que fixado expressamente outro limite. Já o art. 59 da CLT
fixa que a duração normal do trabalho, ou seja, de 8 horas ou outra
expressamente fixada, poderá ser acrescida de horas suplementares até o limite
de duas horas, mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou
mediante contrato coletivo de trabalho, devendo ficar claro que a necessidade
da formalização por escrito se dava, inclusive, pelo fato do §1º deste artigo
exigir que naquele constasse o valor da hora suplementar, o qual não poderia
ser menor do que 50%. Lembro, que o caput do art. 59 da CLT exige a formalidade
apenas para a prorrogação da jornada nada falando sobre a compensação em face
do que, entendo que esta pode ser realizada independente de autorização
expressa, bastando, portanto, a existência do acordo de prorrogação, o qual, por
conseqüência lógica, atua como autorizador da compensação.
Com
o advento da Constituição Federal de 1988, acabou a liberdade das partes
poderem fixar jornada contratual normal além das 08 horas, tendo sido fixado no
art. 7º, XIII, como direito do trabalhador a duração do trabalho normal não
superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a
compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção
coletiva de trabalho.
Como
bem pode ser visto, o legislador constitucional acabou revogando não somente a
liberdade dos contratantes fixarem jornada contratual normal com duração além
de 8 horas diárias, mas também criou um segundo critério, qual seja, a redução
do limite semanal para 44 horas. Mas não foi só, pois também acabou fixando a
possibilidade de compensação por acordo coletivo de trabalho ou convenção
coletiva de trabalho, casos estes em que não haveria necessidade da existência
de acordo individual ou contrato coletivo - ambos escritos - firmados com os
empregados, mas tão somente a autorização em documentos normativos.
Em
relação ao número máximo de horas que podem ser admitidas além da jornada
normal, registro evolução de meu entendimento, pois, anteriormente, defendia
que as normas constitucionais em relação a normas infraconstitucionais
restritivas, não poderiam ser interpretadas ampliativamente e, portanto, quando
estas afirmam a existência de um direito, não podemos tirar de tal declaração a
negação de outros que pré-existiam, exceto se houvesse conflito entre os
mesmos. Nessa linha de raciocínio, como o legislador celetista fixou a
possibilidade de superação da jornada normal no máximo por duas horas, tinha o
entendimento que o fato do legislador constitucional ter admitido o direito à
compensação de horas, não teria representado a possibilidade de superação da
hora normal sem nenhum limite e, portanto, concluía que o limite de 10 horas
diárias fixadas na CLT não tenha sido derrogado pela Constituição Federal de
1988. Ocorre que o C. TST há muito tem decidido pela legalidade das jornadas de
12 x 36, 12 x 12, 12 x 24 e até da semana espanhola de 24 x 72 (OJ 323 da
DSI-I), sob o argumento de que as mesmas favorecem o trabalhador, o qual acaba
tendo maior tempo ao seu dispor. Entretanto, alguns ainda argumentavam pelo
abuso deste tipo de jornada, as quais atentariam a salubridade do trabalhador
pelo excesso de horas de trabalho. Ocorre que, com o advento da Lei nº
11.901/2009, a qual dispõe sobre a profissão de bombeiros, tal discussão caiu
por terra.
O
art. 5º da citada lei, prevê expressamente a jornada de 12 x 36 horas. Ora, se
o legislador expressamente considera, ainda que especificamente para aquela
profissão, que tal jornada seja cabível, devemos aplicar o brocardo ubi eadem
ratio ibi edem jus, ou seja, onde houver o mesmo fundamento haverá o mesmo
direito e, portanto, por analogia não mais podemos admitir o argumento de que
tal jornada seria abusiva em relação à salubridade do trabalhador.
Assim,
evoluindo sobre o tema, passei a entender que a previsão constitucional da
possibilidade de prorrogação e consequente compensação da jornada por outros
meios que não os previstos na CLT, ou seja, por acordo ou convenção coletivos
do trabalho, gerou a possibilidade desta prorrogação não mais se ater ao mínimo
fixado na CLT, não se tratando de derrogação de tal limitação, a qual continua
a ser aplicável, mas apenas para as hipóteses de prorrogação previstas na CLT
(acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de
trabalho), e sim de criação de uma nova ordem sobre as prorrogações, as quais,
por exigir a intervenção sindical, a qual confere maior proteção a negociação,
não mais estaria submetida a limites diários, pois não previsto na Constituição
Federal.
Em
sequência história, foi acrescentando o § 2º no art. 59 da CLT, o qual criou o
popularmente chamado banco de horas, autorizando a dispensa do acréscimo de
salário em relação às horas suplementares, desde que implementadas as condições
de existência, quais sejam:
- de
autorização por acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho;
- a
não superação do limite diário de 10 horas;
-
que o excesso de horas em um dia fosse compensado pela correspondente
diminuição em outro dia, de maneira que não se excedesse no período máximo de
um ano, à soma das jornadas semanais de trabalho previstas.
É
evidente, portanto, que o denominado banco de horas não é admissível por acordo
individual escrito ou contrato coletivo e, portanto, somente a modalidade de
prorrogação com compensação semanal permaneceu possível por meio de tais
autorizações.
Assim,
em resumo, atualmente temos:
1.
Sistema de prorrogação com pagamento ou compensação semanal o qual exige:
a)
autorização por acordo individual escrito, contrato coletivo, acordo coletivo
de trabalho ou convenção coletiva
de
trabalho;
b)
não superação do limite diário de 10 horas;
c)
compensação semanal ou pagamento de adicional de no mínimo 50%.
2.
Sistema de prorrogação fixo sem compensação, o qual exige:
a)
fixação por acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho da
jornada diária especial.
b)
jornada total mensal mais benéfica ( menor do que 220 horas).
Peculiaridade:
- Não há limitação da jornada diária até o máximo de 10 horas, bem como, não se
aplica a hora noturna reduzida, a qual acabaria inviabilizando a jornada, bem
como, devem ser considerados remunerados os domingos e feriados trabalhados que
caem na escala do empregado
3.
Sistema de prorrogação com pagamento ou compensação anual o qual exige:
a)
autorização por acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho;
b)
não superação do limite diário de 10 horas;
c)
compensação anual ou pagamento de adicional de no mínimo 50%.
Desta
forma, em situações de normalidade, poderão os empregados da requerida
superarem o limite constitucional de jornada diária e semanal, desde que
atendendo as condições fixadas para cada tipo de sistema acima descrito.
3.2.5.
Das obrigações de fazer
Assim,
foram analisadas todas as objeções deduzidas pela requerida como justificadoras
da incontroversa situação constatada pelo requerente, sendo uma a uma afastada,
com exceção do intervalo intrajornada, ficando configurada, portanto, a
situação de violação dos direitos da coletividade de trabalhadores daquela de
prestaremserviços dentro dos limites impostos pelo legislador na manutenção da
salubridade do meio ambiente de trabalho.
Desta
forma, acolho os seguintes pedidos formulados pelo requerente, condenando a
requerida nas seguintes obrigações:
-
respeitar a duração do trabalho normal de seus empregados dentro dos parâmetros
constitucionais de 44 horas semanais e 8 horas diárias, podendo prorrogar a
jornada até o limite de duas além da jornada contratada, desde que atenda as
condições impostas nos três sistemas autorizadores de prorrogação e compensação
de jornadas explicadas no item 3.2.4 desta fundamentação, sob pena de multa no
valor de R$1.000,00 para cada empregado cuja jornada não respeitar estas
determinações e, para cada dia em que for constatado o descumprimento,
excetuadas as hipóteses previstas no art. 61 da CLT que sejam devidamente
comprovadas;
-
conceder a seus empregados intervalo mínimo de 11 horas consecutivas entre duas
jornadas de trabalho, na forma estabelecida no art. 66 da CLT, sob pena de
multa no valor de R$1.000,00, para cada empregado e a cada vez que não for
concedido o aludido intervalo na forma legal;
-
conceder a seus empregados descanso semanal de vinte e quatro horas consecutivas,
na forma estabelecida pelo art. 67 da CLT e art. 1º da Lei nº 605/59, sob pena
de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for
concedido o aludido repouso na forma legal;
-
conceder a seus empregados descanso nos feriados civis e religiosos de acordo
com a tradição local, excetuados os casos, devidamente comprovados, em que a
execução do serviço for imposta pelas exigências técnicas, conforme art. 70 da
CLT e art. 8º da Lei nº 605/49 e Decreto nº 27.048/49, sob pena de multa de
R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido
repouso, nos termos da legislação própria, sob pena de multa no valor de
R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido
repouso na forma legal.
3.2.6.
Do dano moral coletivo
Pretende
o requerente a condenação da requerida no pagamento de indenização por dano
moral coletivo no valor de R$5.000.000,00, tendo em vista as violações supra
analisadas.
A
requerida se defendeu argumentando que não existem razões éticas, técnicas e de
fato, para sua condenação, pois não comprovada a violação de direitos coletivos
(lado sensu), pelo fato de jamais ter praticado humilhações, maus tratos,
pressões psicológicas e rigor excessivo no ambiente de trabalho, bem como, por
nunca ter havido tratamento discriminatório ou desrespeitoso por parte de
qualquer pessoa de empresa.
Com
o devido respeito que a requerida é merecedora, os argumentos deduzidos dizem
respeito a violações de direitos individuais, os quais não foram deduzidos pelo
requerente como causa de pedir. O que o requerente afirmou foi que a repetição
de atos ilegais, conforme os praticados pela ré, faz criar no inconsciente
coletivo a passividade diante de situações injustas e à margem do ordenamento jurídico,
levando toda coletividade a concluir, de forma desanimadora, que a conduta
reprovável é impune, e, portanto, aceitável.
Concordo
com o requerente, pois a conduta da requerida de violar tantos direitos de seus
trabalhadores, gerando situação absurda de desgaste físico e psicológico, sem
contar o aumento dos riscos da ocorrência de acidentes, apenas sob o argumento
de que isso seria decorrência de uma situação de aumento de atividade é, no
mínimo, absurda, pois se a requerida resolveu vender além de sua capacidade,
isso decorreu de sua ganância desenfreada ou mau gerenciamento, não podendo os
trabalhadores serem punidos por este descalabro. Lembro, que a situação gerada
por esta empresa já é de conhecimento notório, tanto é assim que foi punida com
a determinação Judicial de suspensão temporária de suas atividades, bem como,
com a obrigação de pagar multa no valor de R$1.744.000,00, por violação do
direito dos consumidores em face de atrasos na entrega das transações
realizadas . Como pode ser visto, a reprovável atitude da requerida lesou
direitos não somente de seus clientes, mas também, como constatado nesta ação,
do universo coletivo de seus trabalhadores, em face do que, entendo que tal
situação exija realmente punição exemplar, principalmente pelo viés didático de
tal medida, para que atingindo o único interesse que norteia a requerida, qual
seja, o lucro, esta aprenda que este realmente pode e deve ser almejado dentro
do sistema capitalista em que vivemos, mas que sua busca deve ser pautada pela
observância aos fundamentos da República Federativa deste país, conforme
previsto no art. 1º da Constituição Federal de 1988, em especial à dignidade da
pessoa humana e aos valores sociais do trabalho. Por estes fundamentos e diante
da capacidade econômica da requerida, a qual fatura mais de quatro bilhões por
ano segundo os jornais econômicos, decido condená-la a pagar indenização por
dano moral coletivo ora arbitrado em R$3.000.000,00 (três milhões de reais)
revertidos ao FAT.
3.2.7.
Das explicações complementares
Desde
já, deixo absolutamente claro às partes, meu entendimento de que o recurso
ordinário possui efeito translativo e, portanto, não é necessário que o
julgador ao fundamentar a decisão tomada tenha que responder a cada um dos
argumentos expostos, bastando que tenha encontrado fundamento suficiente.
Assim, não há que se falar em pré-questionamento, exigência esta somente dos
recursos excepcionais. Da mesma forma devem as partes observar, que o argumento
de equivocada interpretação de provas, não gera omissão ou contradição, sendo
passível de ataque, tão somente, por meio de recurso ordinário.
Este
entendimento, inclusive, já se encontra sedimentado no C. TST por meio de
Súmula:
393.
RECURSO ORDINÁRIO. EFEITO DEVOLUTIVO EM PROFUNDIDADE. ART. 515, §1º, DO CPC.
(redação alterada pelo Tribunal Pleno na sessão realizada em 16.11.2010)
O
efeito devolutivo em profundidade do recurso ordinário, que se extrai do §1º do
art. 515 do CPC, transfere ao Tribunal a apreciação dos fundamentos da inicial
ou da defesa, não examinados pela sentença, ainda que não renovados em
contrarrazões. Não se aplica, todavia, ao caso de pedido não apreciado na
sentença, salvo a hipótese contida no §1º do art. 515 do CPC.
Tais
explicações têm por finalidade advertir as partes do entendimento deste juízo a
fim de evitar a provocação de incidentes manifestamente infundados (art. 17,VI
do CPC).
III
- DISPOSITIVO
Ante
o exposto, rejeito a preliminar de ilegitimidade de parte e, no mérito, julgo
procedentes, EM PARTE, os pedidos formulados pela reclamante MINISTÉRIO PÚBLICO
DO TRABALHO, condenando a reclamada B2W GLOBAL DO VAREJO condenando-a cumprir
as seguintes obrigações:
-
respeitar a duração do trabalho normal de seus empregados dentro dos parâmetros
constitucionais de 44 horas semanais e 8 horas diárias, podendo prorrogar a
jornada até o limite de duas além da jornada contratada, desde que atenda as
condições impostas nos três sistemas autorizadores de prorrogação e compensação
de jornadas explicadas no item 3.2.4 desta fundamentação, sob pena de multa no
valor de R$1.000,00 para cada empregado cuja jornada não respeitar estas
determinações e, para cada dia em que for constatado o descumprimento,
excetuadas as hipóteses previstas no art. 61 da CLT que sejam devidamente
comprovadas;
-
conceder a seus empregados intervalo mínimo de 11 horas consecutivas entre duas
jornadas de trabalho, na forma estabelecida no art. 66 da CLT, sob pena de
multa no valor de R$1.000,00, para cada empregado e a cada vez que não for
concedido o aludido intervalo na forma legal;
-
conceder a seus empregados descanso semanal de vinte e quatro horas
consecutivas, na forma estabelecida pelo art. 67 da CLT e art. 1º da Lei nº
605/59, sob pena de multa no valor de R$1.000,00 para cada empregado e a cada
vez que não for concedido o aludido repouso na forma legal;
-
conceder a seus empregados descanso nos feriados civis e religiosos de acordo
com a tradição local, excetuados os casos, devidamente comprovados, em que a
execução do serviço for imposta pelas exigências técnicas, conforme art. 70 da
CLT e art. 8º da Lei nº 605/49 e Decreto nº 27.048/49, sob pena de multa de
R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido
repouso, nos termos da legislação própria, sob pena de multa no valor de
R$1.000,00 para cada empregado e a cada vez que não for concedido o aludido
repouso na forma legal.
Ainda,
condeno a requerida no pagamento de indenização por dano moral coletivo ora
arbitrado em R$3.000.000,00 (três milhões de reais), revertidos ao Fundo de
Amparo ao Trabalhador.
Custas
pela requerida no valor de R$60.000,00, calculadas sobre o valor da condenação
ora arbitrada em R$3.000.000,00.
Mantenho
a tutela antecipada, em face do que, deverá à Secretaria cumprir o determinado
no item 1.1.
Notifiquem-se
as partes, sendo que o requerente pessoalmente. Cumpra-se. Nada mais.
MAURO
VOLPINI FERREIRA
Juiz
do Trabalho Substituto
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