Já no tocante ao mérito, a r. sentença enveredou por senda tecnicamente equivocada.......
Acórdão
na Íntegra APELAÇÃO CÍVEL N. 110538-4, DE ANDIRÁ.
Apelantes
: Benedito Carlos de Oliveira e Outro
Apelado
: ...........Relator
: Des. Luiz Cezar de Oliveira
AÇÃO
MONITÓRIA - CHEQUES PRESCRITOS - EMISSÃO PRO SOLVENDO - ENDOSSO INVESTIGAÇÃO DA
CAUSA DO DÉBITO - PORTADOR QUE NÃO COMPROVA TER CRÉDITO EM FACE DO EMITENTE -
DOCUMENTOS ORIUNDOS DE NEGÓCIO QUE NÃO CHEGOU A BOM TERMO - ALEGAÇÃO DE CONLUIO
ENTRE ENDOSSANTE E ENDOSSATÁRIO - SENTENÇA QUE REJEITA OS EMBARGOS E CONSTITUIU
O TÍTULO EXECUTIVO SEGUNDO OS VALORES DO PEDIDO - MOTIVAÇÃO ARRIMADA NO DIREITO
CAMBIÁRIO - IMPROPRIEDADE - REFORMA E ACOLHIMENTO DOS EMBARGOS - IMPROCEDÊNCIA
DO PLEITO MONITÓRIO.
RECURSO
PROVIDO.
VISTOS,
relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 110538-4, da comarca de
Andirá, em que são apelantes, BENEDITO CARLOS DE OLIVEIRA e OUTRO, e, apelado,
ILSIO RICCI.
1
- Trata-se de apelação cível, tempestiva e preparada, sobre a sentença de fls.
136/142 que rejeitou os embargos à ação monitória, proposta pelo apelado em
face de BENEDITO e respectiva microempresa (firma individual), para cobrança de
cheques não pagos e enviados a protesto, constituindo de pleno direito o título
executivo. Outrossim, condenou o réu ao pagamento das custas processuais e
honorários advocatícios, estes na razão de 15% sobre o valor da causa.
Para
assim decidir, a MMª. Juíza a quo afastou as preliminares de impossibilidade de
cumulações de pedidos em face da pessoa física e da firma individual de
BENEDITO, com base no art. 573 do Código de Processo Civil, e de existência de
equívoco no cálculo apresentado pelo embargado. No mérito, sustentou que: a.
para BENEDITO, emitente dos cheques, eximir-se do pagamento deles, teria que
comprovar o conluio existente entre o endossante e o embargado, o que não
aconteceu; b. em virtude do princípio da inoponibilidade de exceções pessoais
em relações cambiárias, BENEDITO não poderia alegar que comprou mercadorias do
endossante e este não as entregou, nem devolveu os cheques, afirmando que os
teria extraviado; c. não há prova da má-fé do embargado; d. o fato do
endossante não ter cumprido com suas obrigações perante BENEDITO não o exime de
pagar os cheques a terceiro que os recebeu de boa-fé; e. BENEDITO não se
desincumbiu de desconstituir a presunção relativa de boa-fé; f. o fato do
embargado ter ameaçado BENEDITO para que efetuasse o pagamento dos cheques não
exclui a sua boa-fé; g. os cheques foram preenchidos e assinados por BENEDITO,
sendo formalmente válidos; h. eventual inexistência de negócio deve ser
discutida em ação própria entre o embargante e o endossante, Sr. Lazarim,
inicial beneficiário dos cheques.
Em
síntese, BENEDITO alega, às fls. 144/153, que as provas, ignoradas pelo
Magistrado, comprovam a má-fé na transação efetuada entre o apelado e o
endossante dos cheques, Sr. Sérgio Donizete Lazarim, pois este havia declarado
o extravio dos cheques, além de ter autorizado o apelante a sustar o seu
pagamento, sendo possível na espécie a discussão da causa debendi. Pede, ao
final, a reforma da sentença.
Contra-razões
às fls. 157/161, pelo desprovimento do recurso.
2
- O pleito veio instruído com as peças de fls. 6/8, três cheques de emissão do
embargante Benedito Carlos de Oliveira, de conta individual, dois deles na
condição de micro-empresário, entregues pro solvendo - para sem apresentados em
data posterior, todos prescritos.
A
MMª. Juíza singular decidiu acertadamente a preliminar, admitindo o duplo
direcionamento do pleito monitório, desconsiderando a ociosa questão em torno
da possibilidade de Benedito ser incluído no pólo passivo individualmente e
como pessoa jurídica.
Na
verdade, inexiste a vislumbrada duplicidade, eis que não há desdobramento a
decorrer do fato de se tratar de um micro-empresário. Confundem-se os
patrimônios e interesses pessoais e da empresa, para o comerciante individual,
cuja atividade é exercida mediante utilização ostensiva do seu nome.
Já
no tocante ao mérito, a r. sentença enveredou por senda tecnicamente
equivocada, ao tomar como fundamento para a orientação que adotou,
o regramento pertinente ao direito
cambiário, quando se trata de
cheques passados em garantia de negociação celebrada entre o apelante e o
tomador originário, já nascidos sem os aludidos apanágios, os quais
sucumbiram de vez, ao advento da prescrição, que lhes retirou a força
executiva.
Ficou
aberta, obviamente, em tais condições, a investigação da causa debendi, que o
devedor invocou minuciosamente em seus embargos, que a sentença, no entanto,
desconsiderou por completo, optando por
atribuir toda relevância à circularidade característica do cheque, para
considerar legítima a posse ostentada pelo autor/apelado.
Ora,
se o portador recorreu à via
monitória, foi precisamente porque estava munido de títulos não revestidos das
referidas qualidades, que lhe assegurariam ingresso pela via executiva.
Assim, opostos embargos com defesa relacionada à causa subjacente, imperioso
fossem enfrentados em substância.
Note-se
que o apelante expôs claramente que os títulos foram entregues a um terceiro, Sérgio
Donizete Lazarim, num negócio de aquisição de mercadorias (calçados) que não
foram entregues. Os cheques deviam ser devolvidos, mas o apelante recebeu
notícia de que haviam se extraviado. Houve bloqueio no Banco (fls. 31/32),
queixa à Polícia (fl. 30) e o nominado terceiro expediu declarações compatíveis
com as alegações do embargante, como se, ainda, dos documentos anexados à fl.
33.
De
tudo resulta que Benedito Carlos Lazarin não tem qualquer relação negocial com
o autor/apelado Ilsio Ricci e a este nada deve. Note-se, aliás, que na defesa
de suas pretensões creditícias, ILSIO em nenhum momento, ao impugnar os
embargos ou posteriormente, cuidou de oferecer esclarecimento sobre o negócio
pelo qual assumiu a posse dos cheques, não pelas mãos do emitente, mas através
de Sérgio Donizete Lazarim, mediante endosso nominativo lançado no verso das
cártulas. Era com este, portanto, seu vínculo.
O
primeiro cheque foi sacado em 20.11.94, contra o Bamerindus, no valor de
R$1.044,00; o segundo e o terceiro foram emitidos em 16.11.94, contra o
Banestado, no valor de R$640,00 cada um (fls. 6 a 8). Colhe-se dos versos
respectivos, que a primeira apresentação daquele ao Banco sacado deu-se em
26.12.94, e a destes em 18 e 26.01.95.
Os
mencionados documentos de fls. 31 e 32, firmados por Sérgio Donizete Lazarim,
demonstram que a alegação de extravio já fora manifestada em 16.12.94 e
ensejado contra-ordem de pagamento aos Bancos. Porém, são com ela incompatíveis
os endossos expressamente lançados nos cheques, o que sugere ser falso o
conteúdo de tais documentos, decorrendo de manobra solerte entre Sérgio, com ou
sem conluio com o atual portador.
Na
discussão sobre a má-fé, e quem estaria, na verdade, mancomunado para obter
vantagem indevida, a composição do litígio, no contexto, deve favorecer ao
embargante, na medida em que a prova evidencia não terem sido concluídas com
êxito as relações mercantis que este mantivera com Sérgio, e os cheques, bem
por isso, haviam sido inutilizados.
De
outro vértice, e principalmente, é certo que o autor/apelado não é credor do
apelante, e sim de Sérgio Donizete Lazarim. Vale destaque, que aquiesceu em
receber cheques pro solvendo, logo, sabendo que não tinham proteção do direito
cambiário e estavam vinculados à causa de origem. Falta-lhe ainda mais o
direito, se os acolheu depois da primeira ou segunda apresentação, pois já era
certa a existência de óbices ao pagamento, nos Bancos sacados.
Nas
circunstâncias em que tomou os cheques, e na condição de portador atual destes,
ILSIO tem possibilidade de agir, isto sim, contra quem lhos passou, por endosso
expresso, e não em face dos apelantes.
Enfim,
impõe-se o acolhimento do pleito recursal, ao efeito de se reformar a sentença
e acolher os embargos, julgando-se improcedente o pleito monitório, à conclusão
de que o autor não ostenta crédito oponível ao apelante BENEDITO CARLOS DE
OLIVEIRA.
Do
exposto:
ACORDAM
os desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso.
Participaram
do julgamento os Senhores Desembargadores Bonejos Demchuk, revisor, e Domingos
Ramina.
Curitiba,
04 de junho de 2002.
Des.
Luiz Cezar de Oliveira
Presidente
e Relator
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