A pessoa jurídica pode se valer dos meios próprios de impugnação para defender sua autonomia e administração, desde que o faça sem invadir a esfera de direitos dos sócios ou administradores incluídos no polo passivo da demanda.
O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao analisar recurso interposto por uma empresa de embalagens que sofreu desconsideração da personalidade jurídica.
O recurso questionava decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que não conheceu da apelação da empresa interposta para impugnar decisão interlocutória.
O TJSP considerou que a pessoa jurídica não tem legitimidade para questionar decisão que desconsidera sua personalidade, em razão do interesse exclusivo dos sócios em fazê-lo.
Véu protetor
A empresa recorreu ao STJ com o argumento de que ingressou em juízo para defender seu interesse, e não para agir em nome dos sócios. O objetivo era demonstrar em juízo que não encerrou suas atividades e que não houve abuso na gestão da sociedade.
Conforme o artigo 50 do Código Civil de 2002, verificado o abuso da personalidade jurídica, pode o juiz decidir que os efeitos de certas relações obrigacionais sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
Segundo a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, “a personalidade jurídica é véu que protege o patrimônio dos sócios na justa medida de sua atuação legítima, segundo a finalidade para a qual se propõe a sociedade existir”.
A iniciativa para manter esse véu, de acordo com a ministra, pode partir dos sócios ou, excepcionalmente, da própria pessoa jurídica.
Segundo ela, “o interesse na desconsideração ou, como na espécie, na manutenção do véu protetor pode partir da própria pessoa jurídica, desde que, à luz dos requisitos autorizadores da medida excepcional, esta seja capaz de demonstrar a pertinência de seu intuito, o qual deve sempre estar relacionado à afirmação de sua autonomia, vale dizer, à proteção de sua personalidade”.
Precedentes
Nancy Andrighi mencionou precedentes da Primeira Seção do STJ no sentido de que não é legítima a pessoa jurídica para recorrer de decisão que incluiu os sócios gerentes no polo passivo da execução.
O fundamento que embasa essa conclusão, segundo ela, é o de que a desconsideração, em tese, “pode preservar o patrimônio da sociedade ou minorar sua diminuição, pois mais pessoas estariam respondendo pela dívida contra ela cobrada originalmente”. Daí a legitimidade apenas dos sócios para impugnar a decisão que desconsidera a personalidade da pessoa jurídica.
No recurso analisado pela Terceira Turma, afirmou-se que pessoa jurídica pode se insurgir na defesa de interesse próprio, demonstrando o prejuízo que lhe tenha sido causado pela decisão.
“Sem pretender esgotar aqui as hipóteses em que a pessoa jurídica possa demonstrar a existência de interesse próprio em se voltar contra a decisão interlocutória que desconsidera sua personalidade, tem-se por possível, pelo menos, em tese, que esta se valha dos meios próprios de impugnação existentes para defender sua autonomia e regular administração, desde que o faça sem se imiscuir indevidamente na esfera de direitos dos sócios/administradores incluídos no polo passivo por força da desconsideração”, afirmou a relatora.
Com a decisão, o TJSP deverá apreciar o mérito da apelação interposta pela empresa.
Esta notícia se refere ao processo: REsp 1421464
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