quarta-feira, 23 de maio de 2012

Fiquei curioso


  • Apelação cível. Pedido de falência. Franquia. Ainda que seja possível o pedido de falência da franqueado pelo franqueador, é de ser mantida a sentença por fundamentos diversos.  Protesto. Falta de intimação pessoal do representante legal da empresa ou de identificação de quem recebeu a notificação. Formalidades do processo falimentar que devem ser obedecidas. Inteligência do § 1° do art. 10 da Lei de Quebras. Precedentes jurisprudenciais. Apelo desprovido.


Apelação Cível

Quinta Câmara Cível
Nº 70012571048

Comarca de Porto Alegre
T.F. INDúSTRIA E COMéRCIO DE MODAS LTDA.

APELANTE
ULTRA LEVE ROUPAS LTDA.

APELADa

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento à apelação.
Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Leo Lima (Presidente e Revisor) e Des. Pedro Luiz Rodrigues Bossle.

Porto Alegre, 21 de dezembro de 2005.



DR. NEY WIEDEMANN NETO,
Relator.

RELATÓRIO
Dr. Ney Wiedemann Neto (RELATOR)

FORUM CONFECÇÕES LTDA. ajuizou pedido de falência  em face de ULTRA LEVE ROUPAS LTDA., sustentando ser credora da importância de R$ 1.051.940,13.

A demanda contestou, aduzindo que as partes firmaram contrato de adesão de franquia, no qual restou sujeita as disposições contratuais pré-estabelecidas pela autora e, desta forma, não pode ter postulada sua falência, ante a ausência de legitimidade, pois era obrigada a receber as peças e revendê-las pelos preços também determinados. Disse que mesmo não tendo pago os títulos, a autora continuou enviando-lhe mercadorias, o que estaria em desconstituir a mora. Alegou que dos títulos protestados, doze foram emitidos ilegalmente, sendo nulos. Suscitou a irregularidade do protesto, pois a intimação não se deu em um de seus representantes legais. Impugnou o valor da ação, salientando que os juros e correção monetária deveriam ser contados a contar do ajuizamento da ação. Pediu fosse extinto o feito.

Sobreveio sentença, julgando extinta a demanda proposta por impossibilidade jurídica do pedido, com base no art. 267, VI, do CPC. Condenada a autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios de 5%  sobre o valor atualizado da causa.

Apelou a autora, alegando que, quando do ajuizamento da ação estava em vigor o Decreto-Lei 7.661/45, tendo havido o cumprimento dos requisitos legais aplicáveis à espécie. Relativamente ao contrato de franquia, asseverou que este não descaracterizava a natureza da obrigação assumida pela apelada. Disse inexistir no ordenamento jurídico qualquer previsão legal que proíba o franqueador a executar dívidas ou pedir a falência do franqueado, sustentando a possibilidade jurídica do pedido. Pediu o provimento do recurso, para reformar a sentença integralmente, desconstituindo a sentença, com a remessa à origem.  

Após contra-razões, subiram os autos a esta Corte, sendo distribuídos ao em. Des. Leo Lima.

Sem necessidade de intervenção ministerial, vieram-me os autos conclusos.

É o relatório.

VOTOS
Dr. Ney Wiedemann Neto (RELATOR)

Estou em manter a sentença, mas por fundamento diverso do disposto na sentença.

Tenho como possível o pedido de falência da empresa franqueada pelo franqueador, por uma razão muito singela, numa análise perfunctória: o franqueador “adquiriu” as mercadorias do franqueado e não pagou, tratando-se de uma mera relação de compra e venda de mercadoria.

Muito embora se trate do exame de um contrato de franquia empresarial, devidamente demarcado no art. 2 ° da Lei n° 8.955/94 como sendo “o sistema pelo qual o franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços e eventualmente, também ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício.”

Com efeito, cuida-se de relação de comércio na qual o comprador das mercadorias está sujeito ao pedido de falência, pois não se discute aqui o contrato de franquia empresarial em si, contudo uma nuança daquele contrato, que poderia existir, até mesmo sem a celebração deste tipo de pacto.

Feitos estes esclarecimentos, passo ao voto propriamente dito.

O requerimento da falência com fulcro no art. 1° da Lei 7.661/45 exige que traga o credor título líquido e certo devidamente protestado.

Todavia, os protestos juntados são irregulares, pois o representante legal da empresa, o franqueado na hipótese dos autos, não foi intimado pessoalmente, visto que não se pode precisar dos documentos juntados sua efetiva intimação.

Exsurge dos autos, que houve apenas a intimação através de carta em mão própria, sem qualquer menção a quem tenha efetivamente recebido a intimação da carta, e seguindo o entendimento desta Câmara de que a intimação deve ser pessoal do devedor, não assiste razão a apelante, não podendo a falência da apelada ser decretada.

Tenho que o processo de falência é rigorosamente formal, sendo necessária obediência aos ditames legais.

No caso em liça, há de recair a intimação do protesto em pessoa devidamente identificada, com poderes para representar a empresa devedora, conforme disposto no artigo 10, § 1º, da Lei de Quebras.                                                                              
Gize-se que nas certidões de protesto carreadas aos autos, fls. 150, 154, 158, 163, 167, 171, 175, 179, 183, 187, 191, 195, 199, 203, 207, 211, 215, 219, 223, 227 e assim sucessivamente, não consta o nome de quem recebeu a intimação, havendo a vaga declaração de que houve intimação por carta em mão própria sem que se saiba ao certo quem foi intimado. E, por isso, não poderia ter sido decretada a falência.

Frise-se que é o conhecimento do devedor que configura a mora, não podendo os protestos tirados configurarem a impontualidade, vez que impossível precisar se o devedor foi efetivamente cientificado.

A jurisprudência da Corte Superior coaduna-se com esse entendimento:

  • “FALÊNCIA. PROTESTO. Sendo o protesto precedido de notificação, a regularidade dessa exige seja identificada a pessoa que a recebeu. A falta leva a que não se possa, com base naquele título, pedir-se falência. Recurso Especial não provido.” (Resp. nº 109678-SC, 3ª Turma, Rel. Min.Eduardo Ribeiro, j. em 24.05.99, DJ de 23.08.99 p. 00120).


Acerca do tema, colaciono precedentes desta Câmara:

  • FALÊNCIA. PROTESTO. INTIMAÇÃO. Comprovação da intimação do devedor. Requisito indispensável ao protesto como pressuposto do pedido de falência. Apelo improvido. (Apelação Cível Nº 70012670527, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Luiz Rodrigues Bossle, Julgado em 29/09/2005)


  • FALÊNCIA. INTIMAÇÃO DO PROTESTO MEDIANTE CARTA PROTOCOLADA. Preliminar de ilegitimidade ativa repelida, porquanto a Lei de Falências permite, tanto ao credor civil, quanto ao credor comerciante, requerer a quebra do devedor. Porém, o processo deve ser extinto sem julgamento do mérito, por lhe faltar pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido. Intimação da parte devedora, relativamente ao protesto do título executivo judicial que instrui o pedido de falência, que há de restar bem esclarecida, para os fins do art. 11, da Lei de Falências. Caso em que a intimação da devedora se deu mediante carta protolocada, não havendo especificação ou referência à pessoa que a recebeu. Apelação provida. (Apelação Cível Nº 70007277304, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leo Lima, Julgado em 13/11/2003


VOTO NO SENTIDO DO DESPROVIMENTO DO APELO.


Des. Leo Lima (PRESIDENTE E REVISOR) - De acordo.


Des. Pedro Luiz Rodrigues Bossle - De acordo.

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