Apelação Cível n. 2009.044582-3, de São José
Relator: Des. Subst. Stanley da Silva Braga
- APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL CUMULADA COM PARTILHA DE BENS. DATA DO INÍCIO DA UNIÃO. TESTEMUNHOS INCONCLUSIVOS. DOCUMENTO, DEVIDAMENTE DATADO, DE DECLARAÇÃO DE DESLOCAMENTO PARA O VALE TRANSPORTE, FIRMADO PELO AUTOR/APELANTE, CITANDO COMO SUA RESIDÊNCIA A MESMA DOS PAIS DA REQUERIDA/APELADA. CONVIVENTES QUE, INCONTROVERSAMENTE, NO INÍCIO DA UNIÃO RESIDIRAM NA CASA DOS PAIS DA DEMANDADA. DOCUMENTO UNILATERAL, PORÉM SEM IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. VIOLAÇÃO POR PARTE DA RÉ AOS ARTS. 300 E 302 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PROVA HÁBIL E EFICAZ À COMPROVAÇÃO DA DATA DE INÍCIO DA CONVIVÊNCIA. AUSÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO. REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. INTELIGÊNCIA DO ART. 1.725 DO CÓDIGO CIVIL. EMPRESA CONSTITUÍDA DURANTE A UNIÃO. PARTILHA DEVIDA, NA PROPORÇÃO DE 50% (CINQUENTA POR CENTO) PARA CADA CONVIVENTE. ARTS. 1.658 E 1.660, I, DO CPC. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
Documento unilateral firmado pelo autor/apelante é prova válida
e eficaz à comprovação da data de início da união estável, quando sobre ele não
há impugnação específica por parte da requerida/apelada, que a respeito se
omite tanto na contestação quanto nas alegações finais, assim como em sede de
contrarrazões do apelo, violando ao disposto nos arts. 300 e 302 do CPC.
- "Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens" (Art. 1.725 do CC/2002).
- Empresa adquirida na constância da união estável, ainda que em nome de só um dos conviventes, integra o patrimônio comum do casal, devendo ser partilhada na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada litigante.
- Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2009.044582-3, da comarca de São José (1ª Vara da Família), em que é apelante F. T. P., e apelada M. C. V. R.:
- A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas legais.
- O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Jaime Luiz Vicari, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Ronei Danielli. Funcionou como Representate do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Paulo Roberto de Carvalho Roberge.
- Florianópolis, 15 de março de 2012.
- Stanley da Silva Braga
- Relator
RELATÓRIO
Nos termos da decisão de Primeiro Grau (fls. 109-111):
- "F. T. P. aforou a presente Ação de Dissolução de Sociedade de Fato contra M. C. V. R., alegando em síntese: que manteve um relacionamento equiparado à sociedade de fato com a requerida durante o período de fevereiro de 2004 até abril de 2007; que adquiriram com esforço comum um apartamento financiado e os móveis que guarnecem o lar; além de constituírem uma ema empresa (farmácia).
Pleiteou a citação da requerida, a produção de provas e a
procedência da ação.
Valorou a causa e juntou documentos.
Foi designada audiência e determinada a citação da requerida.
Em audiência, a proposta conciliatória restou inexitosa. Tendo
sido determinado que se aguardasse em cartório o prazo de contestação.
Na mesma oportunidade, foi determinada, ainda, a juntada de
cópia da decisão proferida nos autos n. 064.07.013670-3, que refere-se ao
acordo feito entre as partes com relação à partilha do apartamento e dos bens
móveis que guarneciam o lar.
Citada, a requerida apresentou contestação e juntou documentos
às fls. 58/65 e 67/69.
O autor impugnou a contestação às fls. 75/78.
Foi realizada audiência de instrução e julgamento, na qual foram
ouvidas duas testemunhas arroladas pelo autor. No mesmo ato, foi encerrada a
instrução e aberto prazo para alegações finais.
As partes apresentaram alegações finais às fls. 102/104 e
105/107".
Restando o litígio assim decidido na Instância a quo:
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos para:
Reconhecer como data de início da união estável maio de 2004 e
data final abril de 2007.
Deixar de partilhar a farmácia descrita à fl. 21, uma vez que
restou comprovado que pertence exclusivamente à requerida.
Com relação a existência da sociedade de fato, a partilha do
imóvel e dos bens que guarneciam a residência, tais questões já foram acordadas
e homologadas em juízo.
Sem custas, uma vez que defiro a gratuidade da justiça ao autor
e o benefício da assistência judiciária à requerida.
Fixo em 15 URH's os honorários da defensora nomeada à requerida
(fl. 60).
Foi aforado Recurso de Apelação
Cível
(fls. 122-127) por F. T. P. que teceu argumentação e concluiu requerendo a
reforma da sentença, para determinar a divisão da empresa (farmácia), porquanto
adquirida na constância da união estável, uma vez que esta teve início em
fevereiro de 2004.
As contrarrazões foram oferecidas às fls. 135-138.
A tempo e modo, ascenderam os autos a esta Instância.
Lavrou parecer pela douta
Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Aurino Alves de Souza, que opinou no sentido de não caber intervenção do
Ministério Público no feito (fls. 143-144).
Este é o relatório.
VOTO
Da admissibilidade:
Presentes os pressupostos legais o
recurso é conhecido.
Do julgamento:
Preliminares:
Não foram suscitadas preliminares.
Mérito:
Cuida-se de ação de dissolução de união estável c/c partilha de
bens movida por F. T. P. em desfavor de M. C. V. R.
A sentença foi julgada parcialmente procedente para: (a)
reconhecer como data de início da união estável maio de 2004 e data final abril
de 2007; (b) deixar de partilhar a farmácia descrita à fl. 21, uma vez que
restou comprovado que pertence exclusivamente à requerida.
Irresignado, o autor apelou sustentando que a união teve início
em fevereiro de 2007, motivo pelo qual deve haver a divisão da empresa
(farmácia), pois adquirida durante a constância da união estável.
Esclarece que, inicialmente, os litigantes residiram na casa dos
pais da requerida e, após, adquiriram apartamento próprio.
Afirma que as provas produzidas nos autos comprovam a sua
assertiva, pois, conforme documento de fl. 30, informou ao seu empregador, na
data de 10-3-2004, novo endereço para fins de recebimento de vale transporte,
justamente o endereço da residência dos pais da apelada (fl. 31).
Pois bem. Constam dos autos as seguintes provas documentais:
1. Contrato de compra e venda demonstrando que os litigantes
adquiriram residência própria em novembro de 2004 (fls. 10-20);
2. Comprovante de inscrição da empresa em questão (farmácia), em
nome da requerida (firma individual), na Junta Comercial na data de 6-4-2004
(fls. 21-22);
3. Declaração de deslocamento para o vale transporte, datada de
dezembro de 2003, firmada pelo apelante a sua empresa empregadora, informando
seu endereço na Rua Paula Ramos, bairro Coqueiros, Florianópolis/SC (fl. 29);
4. Declaração de deslocamento para o vale transporte, datada de
10-3-2004, firmada pelo apelante a sua empresa empregadora, informando seu
endereço na Rua Açores, bairro Forquilhinhas, São José/SC (fl. 30).
5. Comprovante de residência em nome de C. S. B. R., pai da
recorrida (fl. 62), cujo endereço é o mesmo suso (fl. 31).
Além da documentação acima noticiada, foram inquiridas duas
testemunhas do autor/apelante:
Que conheceu M. C.em 2004; que acredita que namoravam desde
2002 ou 2003, mas não tem certeza, pois só foi conhecer M. C. quando foram
morar em Barreiros, não recordando a data. Porém, no ano de 2004 foi duas vezes
em Forquilhinhas e sabia que no local moravam o autor e a requerida; que,
fevereiro ou março de 2004 ao conversar com F. sobre o aniversário de sua filha
ele comentou que teria ido morar em Forquilhinhas com M.C.; que não sabe nada sobre
uma farmácia que o casal ia abrir juntos; que sempre conversou muito e várias
vezes com F., pois são amigos de infância; que F nunca comentou nada sobre uma
farmácia (Rodrigo Cardoso, fl. 97).
E:
Que conhecia F porque trabalhou como enfermeiro do irmão do
declarante, quando este estava doente; não tem conhecimento de abertura de
farmácia pelas partes; que conheceu a requerida quando os dois iniciaram o
relacionamento; que o irmão do declarante faleceu em 2001 ou 2002; que em
meados de 2002 F alugou um quarto na residência do declarante; que F saiu da
residência do declarante para residir com a requerida; que F falou para o
declarante que iria morar com C. (Geraldo keller, fl. 98).
Como se pode ver, as testemunhas são pouco esclarecedoras a
respeito do início da união estável havida entre as partes, bem como dizem nada
saber acerca da empresa em comento (farmácia).
De fato, a prova documental é mais eficaz no sentido de
comprovar o início da união, já em março de 2004, e não somente em maio do
citado ano.
Isso porque, na declaração de deslocamento para o vale
transporte, datada de dezembro de 2003, firmada pelo apelante à sua empresa
empregadora, constou como seu endereço a Rua Paula Ramos, bairro Coqueiros,
Florianópolis/SC (fl. 29).
Contudo, já em 10-3-2004, o apelante informou ao empregador
sobre o seu novo endereço, sendo o mesmo da residência dos pais da requerida
(docs. de fls. 30, 31 e 62).
Não obstante a Declaração de Deslocamento para o Vale Transporte
firmada pelo autor ao seu empregador se trate de documento unilateral, não foi
impugnado especificamente pela requerida, quer na contestação, quer nas
alegações finais, quer na contraminuta do apelo, violando, assim, o disposto no
CPC:
Art. 300. Compete ao réu alegar, na contestação, toda a
matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito, com que impugna o
pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir.
Art. 302. Cabe também ao réu manifestar-se precisamente
sobre os fatos narrados na petição inicial. Presumem-se verdadeiros os fatos
não impugnados, salvo: [...]
Sendo assim, tem-se o documento em tela por válido e eficaz na
demonstração da data de início da união estável.
Dessarte, considerando que a união estável teve início em
10-3-2004, e que a empresa em tela foi constituída em 6-4-2004, o apelante faz
jus à divisão do referido bem, porquanto é bem comum do casal, visto que
sobreveio ao patrimônio da apelada na constância da união.
Nesse sentido, dispõe o Código Civil:
- Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
- Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.
- [...]
- Art. 1.660. Entram na comunhão:
- I - os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges; [...]
Já se decidiu:
- APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DIVISÃO DE BENS. PARTILHA NÃO DECIDIDA NA AÇÃO DE DIVÓRCIO CONVERSÃO. IMÓVEIS ADQUIRIDOS E EMPRESA CONSTITUÍDA NA CONSTÂNCIA DA SOCIEDADE CONJUGAL. REGIME DE BENS. COMUNHÃO PARCIAL. PROVA DA TITULARIDADE DOS BENS EM NOME DO VARÃO. IMÓVEIS. TÍTULO TRANSLATIVO NÃO REGISTRADO. INEXATIDÃO MATERIAL DA SENTENÇA. CORREÇÃO EX OFFICIO. PARTILHA ASSEGURADA SOBRE OS DIREITOS DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMÓVEL. RECURSO DESPROVIDO.
Se o regime era o da comunhão parcial, com o término da
sociedade conjugal os bens adquiridos por título oneroso na constância do
casamento, ainda que só em nome de um dos cônjuges (artigo 271, inciso I, do
Código Civil de 1916, com correspondente no artigo 1.660, inciso I, do Código
vigente), devem ser objeto de partilha (Apelação Cível n. 2007.051323-0, de
Tubarão, rel. Des. Jaime Luiz Vicari, j.1-6-2010).
Bem como:
- "Presume-se o esforço comum na aquisição de bens na união estável, de forma que a divisão é realizada de forma paritária, independentemente se o imóvel encontra-se no nome de um ou dos dois companheiros, conforme explica o art. 5º da Lei 9.278/1996: 'os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do trabalho e colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito' [...]" (Apelação Cível n° 2008.019709-1, de Tubarão, Relator: Des. Carlos Prudêncio, j. 29/04/2011) (Apelação Cível n. 2011.067974-4, de Tubarão, rel. Des. Luiz Fernando Boller, j. 23-11-2011).
Ainda:
- Os bens advindos ao patrimônio dos conviventes após o início da união estável presumem-se adquiridos pelo esforço mútuo do casal, devendo ser partilhados em igual proporção, não importando quem empregou o que na compra, ou seja, independentemente da contribuição monetária de cada um dos consortes para a sua aquisição. Desse modo, o fato de o investimento financeiro de um dos conviventes ter sido menor que o do outro não prejudica a divisão dos bens em fração igualitária [...] (Apelação Cível n° 2008.049755-1, de Porto Belo, Relator: Des. Subst. Stanley da Silva Braga, j, 30/06/2011) (Apelação Cível n. 2008.006427-3, de Tubarão, rel. Des. Luiz Fernando Boller, j. 24-8-2011).
Isso posto, a sentença é reformada em parte, para reconhecer
como data de início da união estável março de 2004, e, assim, determinar a
partilha da empresa (farmácia) em litígio, descriminada à fl. 21, na proporção
de 50% (cinquenta por cento) para cada litigante.
O recurso, portanto, é conhecido e provido.
Este é o voto.
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